O Hamas vence a batalha por Gaza

(Por Scott Ritter, in Resistir, 28/11/2023)

O cessar-fogo recentemente anunciado é uma bênção tanto para os palestinos como para os israelenses – uma oportunidade para a troca de prisioneiros, a ajuda humanitária ser distribuída aos necessitados e para as emoções de ambos os lados do conflito arrefecerem.

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A tese dos dois Estados — Um com chuva e outro sem chuva

(Carlos Matos Gomes, in Medium.com, 28/11/2023)


A proposta da ONU, aceite pela comunidade internacional, da coexistência de dois estados na Palestina, após a saída da Inglaterra do vespeiro ali criado após a II Guerra, com a conjugação de interesses do movimento sionista mundial, dos Estados Unidos e da União Soviética, um estado judeu e um estado com o remanescente de palestinianos, foi, desde o início, um logro do género de introduzir uma espécie infestante num dado território — eucaliptos, por exemplo — atribuir uma leira de terra como reserva indígena (carvalhos, ou sobreiros) — e esperar que ambas as culturas convivam em boa paz, que os infestantes respeitem os limites dos autóctones e estes se sintam muito agradados com a invasão. A comparação serve também para os peixes achigãs, vindos do Canadá e lançados nas barragens, que devoraram as espécies indígenas.

É com este conto para pobres de espirito que desde há sete décadas tem sido justificada violência de Israel, eles estão a defender o seu estado: invadindo. O tal estado democrático, o que em termos de interesses estratégicos, de violência e desrespeito pelos direitos dos outros nada vale. Curiosamente, têm sido os ditos estados democráticos — um regime particular desenvolvido na Europa e nas circunstâncias específicas que são conhecidas — que mais invasões têm efetuado nos dois últimos séculos.

A tese da convivência dos dois estados na Palestina recebeu mais uma machadada recentemente, quando alguém decidiu revelar que os democratas israelitas tinham imposto o princípio de divindade da chuva. Agora que surgiram tantos israelitas com cidadania portuguesa, o velho provérbio português de «água deus dará» é contrariado por esses nosssos recentes compatriotas: a chuva que cai nos territórios da Palestina é propriedade dos judeus, representados pelo Estado de Israel, por ser um dom de Jeová aos seus escolhidos. Os infiéis palestinianos não têm direito à água de Jeová e, Alá, segundo os judeus, não faz chover! Por isso os guerreiros de Jeová destroem as cisternas atulhando-as de cimento (foto da UOL — notícias.uol.com.br, de 27/07/2023 — isto para os censores do FB), envenenam os poços e as cisternas onde os palestinianos há milhares de anos recolhiam as águas! Uma blasfémia!

Foi assim levantado mais um problema na falácia dos dois estados: como dividir a água que cai, não dos céus, mas das nuvens terrenas, entre o Estado de Israel e o Estado Palestiniano, a criar? Já existiam os murros, as cercas de arame eletrificado, os controlos, agora há a barreira da chuva e das nuvens!

E aqueles a quem até a água das nuvens criadas pela natureza lhes é negada não têm direito a resistir? É terrorismo lutar pela água, como pela terra, como pelas casas, como pelos rebanhos, como pelas oliveiras ou é terrorismo matar à sede, à fome, bombardear indiscriminadamente? É terrorismo um povo cercado atacar instalações militares designadas colonatos, mas é legítima defesa invasores recentes destruírem um território cercado, densamente povoado, para erradicar dali o povo que sempre ali habitou? E como propor dois estados como solução para uma tão velha questão, que chegou a agora à água da chuva, e que já tinha determinado o controlo pela força do rio Jordão pelos israelitas?

Ainda a propósito da falácia dos dois Estados partilhados entre invasores e invadidos: há algum estado Inca, ou azteca ou guarani na América do Sul? Há algum estado Cherokee nos Estados Unidos? E porque não há nenhum Estado Curdo, ou Arménio?

Por fim, na Palestina existe apenas um Estado, os Estados Unidos da América. O Estado de Israel é mais um Estado da União, uma província como a que existiu no tempo dos romanos, com o seu Herodes Antipas, que calha chamar-se agora Netanyahou. Aos Estados Unidos interessa uma província forte nos confins do império. Os palestinianos estão ali a mais. O resto são nuvens, não de água, mas de explosivos, incluindo de fósforo. Ambas israelitas.

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Gaza: uma pausa antes da tempestade

(Por Pepe Escobar, in TheCradle, 23/11/2023, Trad. Estátua de Sal)

Os EUA e os seus aliados continuarão a apoiar a guerra de Israel em Gaza após uma breve trégua. No entanto, à medida que a defesa do “genocídio” se fortalece, as novas potências multipolares terão de confrontar as antigas hegemonias e o seu Caos Baseado em Regras.


Enquanto o mundo grita “genocídio israelita”, a Casa Branca de Biden entusiasma-se com a próxima trégua em Gaza que ajudou a mediar, como se estivesse realmente “à beira” da sua “maior vitória diplomática”. (Ver aqui).

Por trás das narrativas auto congratulatórias, a administração dos EUA não está nem remotamente “cautelosa quanto ao fim do jogo de Netanyahu”, mas apoia-o totalmente – incluindo o genocídio – conforme acordado na Casa Branca menos de 3 semanas antes da Operação militar do Hamas de Al-Aqsa, numa reunião de 20.9.2023 entre o presidente israelita, Benjamin Netanyahu, e os manipuladores de Joe “The Mummy” Biden.


A “trégua” mediada pelos EUA/Qatar, que deverá entrar em vigor esta semana, não é um cessar-fogo. É uma medida de relações públicas para suavizar o genocídio de Israel e aumentar o seu moral, garantindo a libertação de algumas dezenas de cativos.


Além disso, os registos mostram que Israel nunca respeita cessar-fogo. Previsivelmente, o que realmente preocupa a administração dos EUA é a “consequência não intencional” da trégua, que “permitirá aos jornalistas um acesso mais amplo a Gaza e a oportunidade de tornar ainda mais clara a devastação que aí existe e tal virar a opinião pública contra Israel”.

Os verdadeiros jornalistas têm trabalhado em Gaza 24 horas por dia, 7 dias por semana, desde 7.10.2023 – dezenas dos quais foram mortos pela máquina militar israelita, no que a Repórteres Sem Fronteiras chama de “um dos números mais mortíferos num século”.

Estes jornalistas não pouparam esforços para ir até ao fim “iluminar a devastação”, um eufemismo para o genocídio em curso, mostrado em todos os seus detalhes horríveis para o mundo inteiro ver.

Até mesmo a Agência de Assistência e Obras da ONU para a Palestina (UNRWA), ela própria implacavelmente atacada por Israel, revelou – de forma um tanto humilde – que este foi “o maior deslocamento desde 1948”, um “êxodo” da população palestina, com a geração mais jovem “forçada a viver os traumas dos seus ancestrais ou pais.”

Quanto à opinião pública em todo o Sul Global/Maioria Global, há muito que “se voltou” contra o extremismo sionista.

Entretanto a, agora, Minoria Global – populações do Ocidente coletivo – observa extasiada, horrorizada e amarga que, em apenas 6 semanas, os meios de comunicação social os expuseram ao que os grandes meios de comunicação esconderam durante décadas. Não haverá como voltar atrás agora que a máscara caiu.

Um antigo estado de apartheid lidera o caminho


O governo sul-africano preparou o caminho, em nível global, para a reação adequada a um genocídio em curso: o parlamento votou pelo encerramento da embaixada israelita, pela expulsão do embaixador israelita e pelo corte dos laços diplomáticos com Tel Aviv. Os sul-africanos sabem alguma coisa sobre o apartheid.

Eles, como outros críticos de Israel, devem ser extremamente cautelosos no futuro.
Qualquer coisa pode ser esperada: um surto de falsas bandeiras “terra terra terra” conduzidas por inteligência estrangeira, calamidades climáticas induzidas artificialmente, falsas acusações de “abuso dos direitos humanos”, o colapso da moeda nacional, do rand, casos de guerra legal, apoplexia atlantista variada, sabotagem da infraestrutura energética.

E mais. Várias nações já deveriam ter invocado a Convenção do Genocídio – dado que os políticos e funcionários israelitas têm-se gabado, publicamente, de arrasar Gaza e de sitiar, deixar passar fome, matar e transferir em massa a sua população palestina. (Ver aqui sobre a referida Convenção).

Nenhum ator geopolítico ousou até agora. A África do Sul, por seu lado, teve a coragem de ir onde poucos Estados muçulmanos e árabes se aventuraram. Tal como as coisas estão, quando se trata de grande parte do mundo árabe – particularmente dos estados clientes dos EUA – eles ainda estão em território do Pântano Retórico.
A “trégua” mediada pelo Qatar chegou precisamente no momento certo para Washington.
Roubou a atenção sobre a delegação de ministros dos Negócios Estrangeiros islâmicos/árabes que visitava capitais selecionadas para promover o seu plano para um cessar-fogo completo em Gaza – além de negociações para um Estado palestino independente.
Este Grupo de Contacto de Gaza, que reúne a Arábia Saudita, o Egito, a Jordânia, a Turquia, a Indonésia, a Nigéria e a Palestina, fez a sua primeira paragem em Pequim, reunindo-se com o Ministro dos Negócios Estrangeiros chinês, Wang Yi, e depois em Moscovo, reunindo-se com o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov.
Este foi definitivamente um exemplo do BRICS 11 já em ação – mesmo antes de terem começado a funcionar em 1.1.2024, sob a presidência russa.

A reunião com Lavrov, em Moscovo, foi realizada simultaneamente com uma sessão extraordinária “online” dos BRICS sobre a Palestina, convocada pela atual presidência sul-africana. O Presidente do Irão, Ebrahim Raisi, cujo país lidera o Eixo de Resistência da região e recusa qualquer relação com Israel, apoiou as iniciativas sul-africanas e apelou aos estados membros do BRICS para usarem todas as ferramentas políticas e económicas disponíveis para pressionar Telavive.

Foi também importante ouvir do próprio presidente chinês, Xi Jinping, que “não pode haver segurança no Médio Oriente sem uma solução justa para a questão da Palestina”. Xi sublinhou mais uma vez a necessidade de “uma solução de dois Estados”, a “restauração dos legítimos direitos nacionais da Palestina” e “o estabelecimento de um Estado independente da Palestina”.

Nada disto é suficiente nesta fase – nem esta trégua temporária, nem a promessa de uma negociação futura. A administração dos EUA, ela própria a debater-se com uma reação negativa global inesperada, na melhor das hipóteses, fez um braço de ferro com Telavive para decretar uma curta “pausa” no genocídio. Isso significa que a carnificina continua depois de alguns dias.

Se esta trégua tivesse sido um verdadeiro “cessar-fogo”, em que todas as hostilidades cessassem e a máquina de guerra de Israel se desligasse totalmente da Faixa de Gaza, as opções para o dia seguinte ainda seriam bastante sombrias.

O especialista da Realpolitik, John Mearsheimer, já foi direto ao assunto: uma solução negociada para Israel-Palestina é impossível. Basta uma rápida olhadela no mapa atual para demonstrar graficamente como a solução de 2 Estados – defendida por todos, desde a China-Rússia até grande parte do mundo árabe – está morta. Um conjunto de “bantustões” isolados nunca poderá fundir-se como Estado.


Vamos ficar com todo o gás deles


Tem havido rumores estrondosos em todo o espectro de que, com o advento do “petroyuan” cada vez mais próximo, os americanos precisam urgentemente de energia do Mediterrâneo Oriental comprada e vendida em dólares americanos – incluindo as vastas reservas de gás ao largo da costa de Gaza. É aí que entra o conselheiro de segurança energética da administração dos EUA, destacado para Israel para “discutir potenciais planos de revitalização económica para Gaza centrados em torno de campos de gás natural “offshore” “não desenvolvidos”: que eufemismo adorável. (Ver aqui). Embora o gás de Gaza seja, de fato, um vetor crucial, Gaza, o território, é um incómodo. (Ver aqui). O que realmente importa para Telavive é confiscar todas as reservas de gás palestinas e atribuí-las a futuros clientes preferenciais: a UE. (Ver aqui).
Entra-se no Corredor Índia-Médio Oriente (IMEC) – na verdade, o Corredor UE-Israel-Arábia Saudita-Emirados-Índia – concebido por Washington como o veículo perfeito para Israel se tornar uma potência energética de encruzilhada.
Imagine a fantasia de uma parceria energética EUA-Israel negociada em dólares americanos – substituindo simultaneamente a energia russa para a UE e travando um possível aumento da exportação de energia do Irão para a Europa.

Regressamos aqui ao principal tabuleiro de xadrez do século XXI: o Hegemon vs. BRICS. Pequim tem mantido relações estáveis ​​com Telavive até agora, com investimentos generosos nas indústrias e infraestruturas de alta tecnologia israelitas.
No entanto, o ataque de Israel a Gaza pode mudar esse quadro: nenhum verdadeiro soberano pode proteger-se quando se trata de um verdadeiro genocídio.
Paralelamente, seja o que for que o Hegemon possa apresentar nos seus vários cenários de guerra híbrida e quente contra os BRICS, a China e a sua multimilionária Iniciativa Cinturão e Rota (BRI), mostra que isso não alterará a trajetória racional e estrategicamente formulada de Pequim.

Esta análise de Eric Li é tudo o que precisamos saber sobre o que está por vir. (Ver aqui). Pequim traçou todos os caminhos tecnológicos relevantes a seguir em sucessivos planos quinquenais, até 2035. Neste quadro, a BRI deveria ser considerada uma espécie de ONU geoeconómica sem o G7. Se estivermos fora da BRI – e isso diz respeito, em grande medida, aos antigos sistemas compradores e às elites – estaremos a auto-isolar-nos do Sul Global/Maioria Global.

Então, o que resta desta “pausa” em Gaza? Na próxima semana, os covardes apoiados pelo Ocidente reiniciarão o seu genocídio contra mulheres e crianças, e não irão parar por muito tempo. A resistência palestina e os 800 mil civis palestinos que ainda vivem no norte de Gaza – agora cercados por todos os lados por tropas e veículos blindados israelitas – estão provando que estão dispostos e são capazes de suportar o fardo da luta contra o opressor israelense, não apenas pela Palestina, mas também por todos, em todos os lugares, com consciência. Apesar de um preço tão terrível a pagar com sangue, acabará por haver uma recompensa: a lenta mas segura evisceração da construção imperial na Ásia Ocidental.
Nenhuma narrativa da grande mídia, nenhum movimento de relações públicas para suavizar o genocídio, nenhuma contenção da “opinião pública que se volta contra Israel” poderá alguma vez abafar os crimes de guerra em série perpetrados por Israel e pelos seus aliados em Gaza. Talvez seja isto mesmo que o Doutor – metafísico e não só – receitou à Humanidade: uma tragédia global imperativa, para ser testemunhada por todos, e que também a todos transformará.

Fonte aqui.


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