O ‘momento ruim’ de Zelensky

(Por Seymour Hersh, in SakerLatam.org, 21/09/2023)

BANDO DE IRMÃOS: O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, o procurador-geral da Ucrânia Andriy Kostin, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia Dmytro Kuleba, o enviado climático dos EUA, John Kerry, e o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, ouvem o discurso do presidente Joe Biden na 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York. Cidade de York na terça-feira.

Nota do Saker Latinamérica: A razão para postarmos essa peça de Hersh é fornecer aos nossos leitores uma ideia da extensão da fratura na comunidade de inteligência do Ocidente Coletivo devido às maquinações dos neocons, do ponto de vista da CIA… quase uma declaração oficial. Se me entendem…


Na próxima terça-feira será o aniversárioda destruição de três dos quatro gasodutos do Nord Stream 1 e 2 pela administração Biden. Há mais a dizer sobre isso, mas terá de esperar. Por que? Porque a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, com a Casa Branca continuando a rejeitar qualquer conversa sobre um cessar-fogo, está num ponto de inflexão.

Existem elementos significativos na comunidade de inteligência norte-americana, que baseados em relatórios de campo e em informações técnicas, acreditando que o desmoralizado exército ucraniano desistiu da possibilidade de ultrapassar as linhas de defesa russas de três níveis, fortemente minadas, e de levar a guerra à Crimeia e ao quatro oblasts tomados e anexados pela Rússia. A realidade é que o desgastado exército de Volodymyr Zelensky já não tem qualquer hipótese de vitória.

A guerra continua, segundo me foi dito por um funcionário com acesso à informação atual, porque Zelensky insiste que assim deve ser. Não há discussão em sua sede ou na Casa Branca de Biden sobre um cessar-fogo e nenhum interesse em negociações que possam levar ao fim da matança. “É tudo mentira”, disse o funcionário, falando das alegações ucranianas de progresso incremental na ofensiva que sofreu perdas surpreendentes, ao mesmo tempo que ganhava terreno em algumas áreas dispersas que os militares ucranianos medem em metros por semana.

“Vamos ser claros”, disse o funcionário. “Putin cometeu um ato estúpido e autodestrutivo ao iniciar a guerra. Ele achava que tinha um poder mágico e que tudo o que ele queria iria dar certo.” O ataque inicial da Rússia, acrescentou ele, foi mal planejado, com falta de pessoal e levou a perdas desnecessárias. “Ele foi enganado por seus generais e começou a guerra sem logística – sem maneira de reabastecer suas tropas.” Muitos dos generais infratores foram sumariamente demitidos.

“Sim”, disse o funcionário, “Putin fez algo estúpido, não importa o quão provocado, ao violar a Carta da ONU, assim como nós também” – referindo-se à decisão do Presidente Biden de travar uma guerra por procuração com a Rússia, financiando Zelensky e os seus militares. “E agora temos que pintá-lo de preto, com a ajuda da mídia, para justificar nosso erro.” Referia-se a uma operação secreta de desinformação que visava diminuir Putin, empreendida pela CIA em coordenação com elementos da inteligência britânica. A operação bem-sucedida levou os principais meios de comunicação locais e de Londres a informar que o presidente russo sofria de diversas doenças, que incluíam doenças do sangue e um cancer grave. Uma história muito citada dizia que Putin estava sendo tratado com pesadas doses de esteroides. Nem todos foram enganados. O Guardian relatou com ceticismo em maio de 2022 que os rumores “abrangem toda a gama: Vladimir Putin está sofrendo de câncer ou doença de Parkinson, dizem relatórios não confirmados e não verificados”. Mas muitas das principais organizações de notícias morderam a isca. Em junho de 2022, a Newsweek divulgou o que classificou como um grande furo, citando fontes anônimas que afirmavam que Putin havia sido submetido a tratamento dois meses antes para um câncer avançado: “O controle de Putin é forte, mas não é mais absoluto. A disputa dentro do Kremlin nunca foi tão intensa. . . todos sentindo que o fim está próximo.”

“Houve algumas penetrações ucranianas nos primeiros dias da ofensiva de junho”, disse o oficial, “nada perto” da primeira das três formidáveis ​​barreiras de defesa de concreto da Rússia, fortemente encurralada, “e os russos recuaram para atraí-los. Todos os ucranianos foram mortos. Depois de semanas de muitas baixas e pouco progresso, juntamente com perdas horríveis de tanques e veículos blindados, disse ele, grandes elementos do exército ucraniano, sem declarar, praticamente cancelaram a ofensiva. As duas aldeias que o exército ucraniano recentemente reivindicou como capturadas “são tão pequenas que não cabiam entre dois cartazes de Burma-Shave” – referindo-se a outdoors que pareciam estar em todas as estradas americanas após a Segunda Guerra Mundial.

Um subproduto da hostilidade neoconservadora da administração Biden à Rússia e à China – exemplificada pelas observações do Secretário de Estado Tony Blinken, que afirmou repetidamente que não aceitará um cessar-fogo na Ucrânia – tem sido uma divisão significativa na comunidade de inteligência. Uma vítima são as estimativas secretas da Inteligência Nacional que delinearam os parâmetros da política externa americana durante décadas. Alguns gabinetes-chave da CIA recusaram-se, em muitos casos, a participar no processo da NIE devido ao profundo desacordo político com a política externa agressiva da administração. Um fracasso recente envolveu uma NIE planejada que tratava do resultado de um ataque chinês a Taiwan.

Tenho relatado durante muitas semanas o desacordo de longa data entre a CIA e outros elementos da comunidade de inteligência sobre o prognóstico da atual guerra na Ucrânia. Os analistas da CIA têm sido consistentemente muito mais cépticos do que os seus homólogos da Agência de Inteligência da Defesa (DIA) quanto à perspectiva de um sucesso na Ucrânia.

A comunicação social americana ignorou a disputa, mas o Economist, com sede em Londres, cujos repórteres bem informados não recebem assinaturas, não o fez. Um sinal da tensão interna dentro da comunidade americana emergiu na edição de 9 de setembro da revista, quando Trent Maul, diretor de análise da DIA, concedeu uma entrevista extraordinária e oficial ao Economist, na qual defendeu os relatórios otimistas da sua agência sobre a Ucrânia. guerra e sua conturbada contra-ofensiva. Era, como observou o Economist numa manchete, “Uma entrevista rara”. Também passou despercebido pelos principais jornais da América.

Maul reconheceu que a DIA “entendeu errado” na sua reportagem sobre a “vontade de lutar” dos aliados da América quando os exércitos treinados e financiados pelos EUA no Iraque e no Afeganistão “desmoronaram quase da noite para o dia”. Maul discordou das queixas da CIA – embora a agência não tenha sido citada nominalmente – sobre a falta de habilidade da liderança militar ucraniana e as suas tácticas na contra-ofensiva. Ele disse ao Economist que os recentes sucessos militares da Ucrânia foram “significativos” e deram às suas forças uma probabilidade de 40 a 50 por cento de romper as linhas de defesa de três níveis da Rússia até ao final deste ano. Ele alertou, no entanto, informou o Economist, que “munições limitadas e piora do tempo tornarão isso ‘muito difícil’”.

Zelensky, numa entrevista ao The Economist publicada uma semana depois, reconheceu ter detectado – como não poderia? – o que a revista citou como sendo “uma mudança de humor entre alguns dos seus parceiros”. Zelensky também reconheceu que o que chamou de “dificuldades recentes” da sua nação no campo de batalha foram vistas por alguns como uma razão para iniciar negociações sérias sobre o fim da guerra com a Rússia. Ele chamou isto de “um mau momento” porque a Rússia “vê o mesmo”. Mas voltou a deixar claro que as conversações de paz não estão em cima da mesa e lançou uma nova ameaça aos líderes da região, cujos países acolhem refugiados ucranianos e que querem, como a CIA informou a Washington, o fim da guerra. Zelensky alertou na entrevista, como escreveu o Economist: “Não há forma de prever como os milhões de refugiados ucranianos nos países europeus reagiriam ao abandono do seu país.” Zelensky disse que os refugiados ucranianos “se comportaram bem. . . e estamos gratos” àqueles que os acolheram, mas não seria uma “boa história” para a Europa se uma derrota ucraniana “encurralasse seu povo”. Foi nada menos que uma ameaça de insurreição interna.

A mensagem de Zelensky esta semana à Assembleia Geral anual das Nações Unidas em Nova Iorque trouxe poucas novidades e, segundo o Washington Post, ele recebeu a obrigatória “boa recepção” por parte dos presentes. Mas, observou o Post, “ele proferiu o seu discurso perante uma casa meio cheia, com muitas delegações recusando-se a comparecer e ouvir o que ele tinha a dizer”. Os líderes de algumas nações em desenvolvimento, acrescenta o relatório, estavam “frustrados” porque os vários milhares de milhões gastos sem uma responsabilização séria por parte da administração Biden para financiar a guerra na Ucrânia estavam a diminuir o apoio às suas próprias lutas para lidar com “um mundo em aquecimento, confrontando a pobreza e a miséria, garantindo uma vida mais segura aos seus cidadãos.”

O Presidente Biden, no seu discurso anterior à Assembleia Geral, não abordou a posição perigosa da Ucrânia na guerra com a Rússia, mas renovou o seu apoio retumbante à Ucrânia e insistiu que “só a Rússia tem a responsabilidade por esta guerra” – ignorando, como os líderes da muitas nações em desenvolvimento não o fazem, três décadas de expansão da OTAN para leste e o envolvimento secreto da administração Obama na derrubada de um governo pró-Rússia na Ucrânia em 2014.

O presidente pode estar certo quanto aos méritos, mas o resto do mundo lembra-se, e esta Casa Branca parece que esqueceu, que foram os Estados Unidos que escolheram fazer a guerra no Iraque e no Afeganistão, com pouca consideração pelos méritos da sua justificação para o faze-lo.

Não houve qualquer conversa do presidente sobre a necessidade de um cessar-fogo imediato numa guerra que não pode ser vencida pela Ucrânia e que está a aumentando a poluição que causou a atual crise climática que assola o planeta. Biden, com o apoio do Secretário Blinken e do Conselheiro de Segurança Nacional Jake Sullivan – mas o apoio diminuindo noutras partes da América – transformou o seu implacável apoio financeiro e moral à guerra na Ucrânia numa questão de vida ou morte para a sua reeleição.

Entretanto, um implacável Zalensky, numa entrevista na semana passada com um correspondente bajulador do 60 Minutes, outrora o auge do jornalismo agressivo americano, retratou Putin como outro Hitler e insistiu falsamente que a Ucrânia tinha a iniciativa na sua atual guerra vacilante com a Rússia.

Questionado pelo correspondente da CBS, Scott Pelley, se ele pensava que “a ameaça de guerra nuclear ficou para trás”, Zelensky respondeu: “Acho que ele vai continuar a ameaçar. Ele está esperando que os Estados Unidos se tornem menos estáveis. Ele acha que isso vai acontecer durante as eleições nos EUA. Ele procurará instabilidade na Europa e nos Estados Unidos da América. Ele usará o risco de usar armas nucleares para alimentar isso. Ele continuará ameaçando.”

O oficial de inteligência americano com quem falei passou os primeiros anos da sua carreira a trabalhar contra a agressão e a espionagem soviética, tem respeito pelo intelecto de Putin, mas despreza a sua decisão de ir à guerra com a Ucrânia e de iniciar a morte e a destruição que a guerra traz. Mas, como ele me disse: “A guerra acabou. A Rússia venceu. Não há mais ofensiva ucraniana, mas a Casa Branca e a mídia americana têm de manter a mentira”.

“A verdade é que se o exército ucraniano receber ordens para continuar a ofensiva, o exército vai amotinar-se. Os soldados não estão mais dispostos a morrer, mas isso não se enquadra na besteira de autoria da Casa Branca de Biden.”


Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.

Quem ama realmente a Ucrânia?

(Hugo Dionísio, in Facebook, 31/08/2023)

Daqui a uns dias, a mais absurda “contraofensiva” da história da guerra moderna completará os 3 meses de aniversário. Dezenas de milhares de homens mortos e feridos, centenas de carros de combate destruídos, esta “contraofensiva” preparada pelos “altos” padrões da NATO, comandada pela “inteligência” da NATO e armada com as míticas armas da NATO, não logrou, sequer, chegar à designada linha Surivikin, nomeadamente à primeira de uma série de barreiras fortificadas, atrás das quais aguarda uma reserva militar russa de mais de 250.000 homens que ainda não entraram, sequer, em combate. Para além de uma meia dúzia de vilarejos despovoados, localizados na zona cinzenta, não podemos, com seriedade, contabilizar um único sucesso militar da mais propalada, propagandeada e transparente “contraofensiva” da história.

Rabotino, um vilarejo que no seu esplendor pré-conflito tinha 488 residentes, foi subitamente transformado num significativo e estratégico marco geográfico. Sem qualquer casa de pé, localizado em terra de ninguém e sendo apenas o primeiro ponto de passagem de uma “contraofensiva” que deveria ter chegado há mês e meio atrás ao mar de Azov, continua a revelar-se inultrapassável para as forças do regime de Kiev. E tantas vezes a máquina de mistificação social – que designam como “comunicação social” – anunciou a tomada deste “importantíssimo” vilarejo! Há uma semana era o orgulhoso e arrogante General da NATO, Mark Milley. O tal que dizia que, sob o seu comando e sem apoio aéreo, as forças que comanda, à distância de um clique do seu rato, chegariam a Azov nuns dias (chegou a falar-se em dias!), e que se recusa a ver a sua “contraofensiva” como falhada. Há dois dias foi a vice-ministra da defesa quem o anunciou.

O que é que esta realidade tinha de inesperado? Absolutamente nada! Talvez apenas a teimosia, frieza psicopatológica e teimosia senil, por parte do regime de Kiev, em seguir os ditames dos seus mestres ocidentais e, seguindo-os, continuar a atirar para a morte certa centenas de milhares dos seus homens e mulheres. Para Mark Milley é fácil dizer “não podemos deixar-nos impressionar com as elevadas baixas humanas”. O que já não é compreensível é esta frieza encontrar-se também nos corações da oligarquia política e económica que dirige, hoje, o horrível destino do país “404”.

Se, sem mobilização total, o povo trabalhador era literalmente arrancado à sua vida, fosse na rua, em casa ou nas compras… Como será, agora que foi lançado o próximo passo da loucura? Se, até aqui, o regime tem sobrevivido porque tem enviado para a morte as camadas mais pobres do país, sem voz pública para se fazerem ouvir; daqui para a frente, será o que resta da classe média e pequeno-burguesa a serem afectadas, a não ser que paguem, aos sempre largos bolsos da corrupção, de um regime que, também pela corrupção, aceitou destruir o seu próprio país.

Segundo um estudo apresentado por Scott Ritter (actualmente censurado no Youtube, por dizer demasiadas e inconvenientes verdades) realizado a partir de dados de satélite em que se contabilizou o aumento do número e dimensão dos cemitérios Ucranianos, desde Fevereiro de 2022 estima-se que tenham morrido cerca de 1 milhão de pessoas como resultado da guerra.

Estes são os episódios que faltam na narrativa dos países NATO. Nas fontes informativas NATO, as forças russas estavam “desmoralizadas, mal equipadas, com armas antigas e em mau estado, em motim permanente e comandadas por gente incompetente, cobarde e corrupta”. A sempre prestável Ana Gomes, quando de propaganda se trata, dá-vos um curso sobre como descredibilizar, desumanizar e ridicularizar o inimigo (sem gasóleo para tanques, lembram-se?). Milhazes, sai do curso e fará o resto, escreverá livros, artigos e monólogos inflamados, desdizendo tudo o que disse até 1991. O facto é que, parece que, gente como eles, exageraram tanto na carga de combustível que, a dada altura, os próprios comandantes NATO e os seus patrocinados, começaram a acreditar nos filmes de Hollywood em que se tornaram os telejornais, confundindo-os com a própria realidade. Foi tão caricato que surgiam comentários de comandantes ucranianos afectos ao regime de Kiev, nas redes sociais, dizendo que, quando a “contraofensiva” começasse e os russos os vissem, logo desatariam a fugir e a render-se.

Mesmo depois do fracasso do lançamento da “contraofensiva” e do constante bater com a cabeça na parede… Nos EUA começaram a surgir ecos, em especial nos órgãos de enviesamento republicano, em que, envergonhadamente e sempre na lógica de “uma no cravo, outra na ferradura”, alguns articulistas, politólogos e analistas começaram a reconhecer o fracasso da coisa e a desconexão entre a realidade observada e a realidade avaliada.

Contudo, na Europa, em especial aqui no nosso burgo, todos continuaram a acordar, de manhã, com “as forças de Kiev estão a avançar”. Com excepção dos mesmos de sempre, objectividade foi coisa que continuou a não existir, nos meios mainstream. O avanço reportado é tanto que, por esta hora, as forças do regime de Kiev já deveriam ter chegado a Vladivostok.

Na semana passada a CNN Portugal chegou mesmo ao cúmulo de dizer “as forças de Kiev chegaram à Crimeia”. Um barco, com uns quantos suicidas, para efeitos de propaganda mediática, conseguiu, pela calada da noite, chegar à costa e lá colocar uma bandeira, filmar e fotografar. Morreram todos. Esta parte a CNN Portugal não contou. Aliás, mostrou mesmo imagens de veículos militares russos nas ruas de Sebastopol, apresentando-as de forma ao espectador pensar que estaria a ver a tal “unidade” das “forças especiais” de Kiev. Na mesma peça diziam que as forças de Kiev tinham atingido a “linha mais importante de defesa das forças russas”, não dizendo que se tratou de uma incursão suicida que acabou como a da Crimeia. E, por fim, ainda diziam que Kiev tinha feito o maior ataque de drones desde sempre, não dizendo que tinham sido praticamente todos detectados e abatidos ou aterrados por meios de guerra electrónica.

O mesmo tipo de análise é feito quando, numa fase já de total desespero, o regime de Kiev recorre ao terrorismo puro e duro, atirando drones e bombas contra alvos estritamente civis, perpetrando actos de pura execução terrorista, contra determinadas pessoas, cujo único pecado é o de pensarem diferente. A estes actos os órgãos da “credibilidade” e do “fact-checking” apelidam de “ataques”, ou então, fazem como o Milhazes, que os refere como “ataques terroristas”, mas nunca diz quem os perpetrou. A outra técnica é apontar sempre para o Kremlin. O NordStream? Foi o Kremlin; a barragem? Foi o Kremlin; A central nuclear? Foi o Kremlin; Prigozhin? Foi o Kremlin… Quem o diz? “Fontes” da “inteligência britânica”, “americana” ou das “forças ucranianas”!

Ninguém esperaria que, do ponto de vista editorial, estes órgãos tomassem o partido dos “inimigos” declarados. Não podemos também esperá-lo das fontes russas, iranianas, indianas, turcas, latino-americanas não-alinhadas com o Ocidente, sauditas… Mas qualquer dos órgãos de comunicação mais representativos destes países, pela minha experiência, mesmo tomando o partido de quem os domina (há sempre quem domine), faz análises mais alargadas, diversificadas e objectivas do que os órgãos ocidentais.

A comprová-lo…. Está a própria realidade. Uma das características da comunicação capitalista na sua fase neoliberal consiste em alienar o espectador da realidade histórica e factual. Não lhe contando a história, ou apenas revisitando-a de forma parcial ou enviesada, o espectador é remetido para uma realidade desconectada entre si, perdendo a capacidade de organização da informação e passando a depender, ainda mais, do emissor informativo que causa essa dependência.

Notícias surgem, todos os dias, nos nossos jornais, sobre como o sector industrial – em especial no norte do país – se prepara para enfrentar uma enorme crise, em resultado da destruição da base industrial alemã e europeia, em geral. Mais uma vez, como no caso do fracasso da “contraofensiva”, a crise inflacionária, energética, alimentar e industrial na Europa, também nada traz de novo a todos os que, a partir de certa altura (24/02/2022 foi apenas um catalisador), optaram por passar a informar-se em órgãos de comunicação alternativos, passando a integrar a informação ocidental, num leque variado de fontes, ao invés de a utilizar como “a única fonte”.

Vejamos, uma vez mais, o caso ucraniano, para percebermos como diverge a realidade da narrativa que passa nas TV’s, jornais e livros ocidentais. Diz a narrativa oficial, marcada a letras de ouro nos instrumentos legais da UE, que a Ucrânia sempre foi muito maltratada pelos russos e, ainda pior, pelos bolcheviques. Tal é a narrativa que, até se inventou um genocídio alimentar programado só por vingança. Segundo a narrativa, nunca a Ucrânia, ligada à Rússia, poderia almejar qualquer tipo de liberdade e desenvolvimento. Diz a narrativa que, a história soviética da Ucrânia foi um desastre para o povo ucraniano.

O que nos dizem os factos, a realidade? Primeiro que o ódio ao comunismo era tal que o Presidente Kuschma, do PCU, ganhou todas as eleições até à “revolução Laranja”, fomentada pelos EUA, em 2004. E a “revolução laranja” tratou-se de uma artimanha engenhosa e inconstitucional (eleições presidenciais com uma 3ª volta) fomentada pela CIA, para fazer eleger um presidente que lhe fosse simpático, uma vez que já haviam perdido as esperanças em destronar Putin na Rússia.

Segundo, os pais da República ucraniana são os bolcheviques. Até à fundação da República Socialista Soviética da Ucrânia em 25/11/1917, a Ucrânia era uma região do império russo. Era a “ucrânia (fronteira) da Rússia”, território disputado pelos vários impérios adjacentes ao longo de séculos. Para agravar ainda mais o “ódio” bolchevique à Ucrânia, foi Lenine e não outro que, em 1918 lhe junta o Donbass. Porquê? Porque a “odiava” tanto que queria juntar regiões industrializadas russas, para que, com estas, o território ucraniano, como um todo, se pudesse desenvolver. E como se desenvolveu. 

Com um “ódio” ainda mais doentio, Krushev, em 1954, para reforçar a amizade entre russos e ucranianos, fez integrar o oblast da Crimeia (região autónoma da Rússia), na república ucraniana. Afinal, a água e electricidade da Crimeia vinha da Ucrânia.

O ódio era tão grande e irracional que a evolução demográfica da RSSU diz tudo: Em 1922 tinha 26,2 milhões de habitantes; em 1940 tinha já 41 milhões (e tantos que o “Holodomor” fantasiosamente matou); 31,4 em 1946, graças a Bandera; 51,6 milhões em 1990. Em 1991 já passavam dos 52 milhões. Um ódio tão grande que a população duplicou em menos de 70 anos. Parece a Portuguesa e a da Europa ocidental, não é? Era um território tão mau para se viver que a população duplicou em 69 anos!

Depois, de acordo com a narrativa NATO, veio o amor ocidental. E o amor ocidental foi um sucesso. Mas não para o povo ucraniano. Se na URSS a Ucrânia chegou a ser a 5ª economia europeia e a 10ª do mundo, de 1991 a 2004 era um país com indústria de aviação, aeroespacial, gás, petróleo, uma potência agrícola, mineira, um país letrado, de gente inteligente, culta e com todo o potencial para, mesmo após o colapso da URSS, poder continuar como um potentado europeu. Tudo produzia a Ucrânia, naquele conceito “ultrapassado” de soberania e independência nacional, de que os comunistas tanto gostam, mas que é indispensável para sermos livres nas nossas escolhas e destino colectivo e individual. Mesmo vítima da corrupção crescente, assim mesmo, em 2001, a Ucrânia tinha ainda 48,5 milhões de pessoas.

O “amor” ocidental, o “apoio” e a “cooperação” fizeram cair a população do país para 45,2 milhões em 2014; 39,4 em 2015 (saída da Crimeia); 37,3 em 2022 e 26,5 em 2023. Este país deveria ter, continuando o seu ritmo normal de 1990, cerca de 55,6 milhões…. Tem metade! De revolução “democrática” em revolução “democrática”, tornou-se tão bom aí viver que, entre 2001 e 2023, o país perdeu mais de 22 milhões de pessoas. Um sucesso, esta “cooperação” com o Ocidente.

O país passou de ser uma potência económica, para se tornar o mais pobre da europa, estando hoje ligado à máquina de dólares, para não morrer. Literalmente. A Blackrock, Monsanto e outras corporações “amigas” têm comprado, a preço de saldo, tudo o que resta, a indústria está destruída e, em virtude das “vitoriosas” aventuras militares em que se empenharam, estão prestes a perder a ligação ao mar. Ou seja, a paixão do Ocidente pela Ucrânia é de uma toxicidade mortal. É uma espécie de “atracção pelo o abismo”. Ao contrário do que se propagandeia, o país não tem liberdade de expressão, cultural, étnica ou política. Neste país, a única garantia que existe é, ou pagar-se ou ir para à linha da frente, contra os russos, porque o tio Sam manda. Foi para isso que EUA e Inglaterra boicotaram o acordo de Istambul, em Março de 2022. Em cima disto tudo, o país deve mais de 100 biliões aos seus “credores” americanos e europeus. Mais de metade em armas que, ou já queimaram, ou ainda faltam queimar. E como ardem as “wondewaffe” ocidentais, quando levam com os ultrapassados mísseis, drones e projéteis russos.

Seja pela guerra, pela anexação do Donbass e Crimeia pela Rússia ou pela destruição da rede social, económica e cultural existente, este país só está onde está por causa da sua aproximação ao Ocidente e da engenharia social a que a CIA o submeteu, em especial, a partir de 2001. Uma vez mais, esta realidade contrasta totalmente com a narrativa ocidental. Contudo, e também uma vez mais, é corroborada por tantos e tantos países aos quais aconteceu o mesmo. Letónia, Estónia e Lituânia, têm hoje metade da população que tinham em 1991 e das mais baixas taxas de fertilidade do mundo. Qualquer um deles, a ver pelos gastos militares (os mais altos da NATO em % do PIB) e em conjunto com a Polónia, já tirou a senha para se atirar à Rússia, quando a Ucrânia estiver humanamente esgotada. O que, pelas palavras do próprio NYTimes, já acontece. Eis o sucesso do “amor” ocidental.

Assim, três meses após o início de uma contraofensiva que se anunciava falhada, vale a pena relembrar que, quando se tornar, por força das circunstâncias, impossível ao regime de Kiev continuar a acreditar que pode vencer a guerra, há quem o tenha visto, dito e escrito desde o início da “aventura”. E não são poucos… Não passam é na TV!

Quando a Europa se encontrar em pior situação do que aquela em que já se encontra, houve quem o tenha dito, visto e anunciado logo que se instalou a tentação para o abismo. Não se trata de adivinhação: trata-se de diversificação das fontes de informação, sem preconceitos e fugindo à bolha comunicacional que Google, Facebook e Youtube nos colocam à frente.

Nenhuma narrativa substitui a realidade. Apenas a pode esconder por algum tempo. E a realidade diz-nos que a Ucrânia está a morrer e quem a está a matar não são os que, supostamente, aí estão a combater. São os que a “ajudam”, “apoiam” e “suportam”!

Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.

Newsweek e peritos militares norte-americanos: “a contraofensiva ucraniana foi derrotada”

(In observatoriocrisis.com, 11/08/2023)

A contraofensiva ucraniana fracassou: embora os ataques continuem sem parar, permanecem infrutíferos. A imprensa americana aceita o fracasso trágico da NATO, que enviou os ucranianos para a matança, obrigando Kiev a obedecer em silêncio.


A NATO enfrenta a Rússia como se fosse o Iraque…

A NATO e os EUA, conscientes do fracasso, tentam fugir às suas responsabilidades. Para justificar este grave erro estratégico, os estrategas da NATO conseguiram que o New York Times dissesse: “os militares ucranianos tiveram pouco tempo para aprender as táticas da NATO e, como não se sentiam confortáveis com elas, decidiram usar as táticas que melhor conheciam, as táticas da era soviética”.

Em resposta ao artigo do NYT, Ellie Cook, jornalista da prestigiada revista Newsweek, escreveu um artigo de investigação com opiniões importantes de militares e especialistas norte-americanos no seu artigo “Porque é que as táticas da NATO estão a falhar na Ucrânia”. (Ver artigo da revista americana aqui.)

Cook explica que a tática da NATO se baseia no controlo dos céus e a Ucrânia não tem esse controlo. Daí o desastre.

“Ninguém na NATO viveu um combate semelhante ao que os ucranianos viveram nos últimos 18 meses”, disse à Newsweek Davis Ellison, analista estratégico do Centro de Estudos de Segurança de Haia (HCSS).

“A NATO nunca testou seriamente a dinâmica de uma guerra terrestre contra uma grande potência. Isto apesar de décadas de investimento e formação”.

Na invasão do Iraque e na Guerra do Golfo de 1991, “as forças americanas e ocidentais rapidamente estabeleceram uma enorme superioridade aérea”, disse Paul van Hooft, outro analista do HCSS, à Newsweek.

Os falcões da NATO trataram a Rússia como se fosse o Iraque de Saddam ou a Líbia de Kadhafi. Uma dissociação da realidade que custou o sangue do povo ucraniano, uma tragédia à qual se juntam os danos infligidos à economia europeia e mundial, diz muito sobre a lucidez daqueles que prepararam e estão a alimentar esta guerra por procuração contra a Rússia.

Sobre a visão cínica da NATO relativamente à falta de treino dos ucranianos, o artigo da Newsweek cita declarações recentes do general Pat Ryder, secretário de imprensa do Pentágono: “Temos estado a treinar os ucranianos desde 2014”, acrescentando que os EUA “estão confiantes de que continuam a ter uma capacidade de combate significativa à sua disposição e que a utilizarão de uma forma que lhes permitirá continuar a treinar os ucranianos”.

O dogma da NATO na Ucrânia e a tragédia de Zelensky

Curiosamente, sobre a situação ucraniana, James W. Carden escreveu no The American Conservative: “À medida que a guerra na Ucrânia se aproxima da sua desastrosa conclusão, podemos razoavelmente esperar que aqueles que ajudaram a iniciar este conflito – e aqueles que apoiaram esta guerra ridícula e desnecessária desde o início – paguem um preço tão elevado como o pago pelos arquitetos e líderes da claque do fiasco iraquiano: nenhum.

Os únicos que pagarão a fatura serão os ucranianos e a própria Ucrânia, que, no final da guerra, corre o risco de desaparecer do mapa, com as suas regiões orientais controladas pelos russos e as suas regiões ocidentais sob a influência da Polónia, que já está a liderar o processo.

Uma tragédia que poderia ter sido facilmente evitada, escreve Carden: “Uma simples declaração dos Estados Unidos e da NATO de retirar o compromisso assumido em Bucareste em 2008 – de que a Ucrânia e a Geórgia ‘se tornariam membros da Aliança’ – teria facilitado, em muitos aspetos, a coexistência pacífica entre a Rússia e a Ucrânia.

Mas isso não aconteceu. O motor da máquina das últimas quatro administrações dos EUA (Bush, Obama, Trump, Biden) tem sido os ideólogos. E a ideia de que a Ucrânia tinha o “direito de escolher as suas alianças” e de que nós tínhamos o dever de o permitir acabou por ser tratada como se o seu apoio fosse uma escritura sagrada.”

A contraofensiva falhou, mais um problema para Zelensky

Se a Ucrânia se sente mal, Zelensky deve sentir-se ainda pior. Há relatos de alegados ataques russos contra ele. Temos sérias dúvidas sobre quem são os instigadores: não faz sentido matar um fantoche substituível, especialmente agora que ele está em apuros. Pelo contrário, seria extremamente contraproducente, porque criaria um mártir e Moscovo atrairia a desaprovação internacional.

Mas a sucessão de notícias deste tipo diz-nos claramente que há quem queira virar a página na Ucrânia, um pouco como aconteceu com o presidente sul-vietnamita Ngo Dinh Diem: foi assassinado pelos seus generais com a indicação da sua localização pelos americanos.

Para consolidar esta impressão, um artigo do famoso jornal Politico refere que o assassinato de Zelensky não conduziria a um vazio de poder, uma vez que existem substitutos viáveis. Será que o cómico que atua como político vai ser relegado para a representação de uma tragédia? Mas, como acontece frequentemente nas tragédias, o protagonista morre.

Fonte aqui.


Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.