(Hugo Dionísio, in Facebook, 12/06/2023)

No meio de uma discussão, na imprensa ressonante e no “multiverso”, que pulula entre a prometida contraofensiva, exigida por Biden e Sullivan, e as inundações provocadas pela destruição da barragem de Novaya-Kharkovka, em que nos fazem crer que, os inimigos de sempre, provocaram mais um acto do seu já proverbial haraquíri (começa a ser fastidioso tanto tiro nos próprios pés!!!!), há um tema que tem sido abordado com alguma atenção, mas, como sempre, com pouca profundidade e muitíssima propaganda. Trata-se da 5G e da Huawei.
Ao contrário dos tanques Lepard2, que eram apresentados como mais uma “wonderwaffe” ocidental, e que, quando usados pela “wolksstrum”, durante o adiado “blitzkrieg”, falharam em assustar o inimigo, que os tem destruído como outra lata velha qualquer; o desenvolvimento, crescimento e expansão da Huaway e da sua 5G ao redor do mundo, bem como da oferta telemóvel, que antes do ataque ameaçava tornar-se líder mundial de vendas, assusta, e de que maneira, os poderes, de facto, do ocidente colectivo.
Mas não é só da Huawei que a Casa Branca tem medo; tem medo do Tik-Tok, como tem medo do Weechat. No fundo, tem medo de toda a alta tecnologia de qualquer país que não controle, sendo que, no caso concreto das tecnologias digitais, Washington, nem aos seus mais submissos vassalos, permite qualquer intervenção nesse domínio.
Enquanto ouvimos, lemos e vemos, vezes sem conta, o chavão ideológico, segundo o qual, os americanos “gostam da competição” porque “a competição fá-los avançar e extrair o que de melhor têm”, quando assistimos ao que tem sido feito para travar o desenvolvimento de tecnologias de fronteira por países que não controlam, rapidamente nos damos conta de que a propaganda é só isso mesmo… propaganda. A susceptibilidade de outros países deterem tecnologias que concorram e superem as suas, ao contrário de ser visto como um estímulo, é visto como algo a abater.
Daí as sanções à Huawei, à venda de chips e máquinas litográficas, ou à aquisição de lítio, pela China. Adoram competir, portanto. Mas com coxos, estropiados, esfaimados e servos. Como qualquer mafioso e batoteiro, os EUA sentem-se os maiores apenas junto dos desgraçados e graxistas. Daí as ameaças, as sanções e os embargos unilaterais e a disputa férrea pelo controlo das tecnologias e recursos vitais, sempre usados como arma de arremesso.
Não obstante a guerra do 5G, o facto de a Huawei se estar a tornar, à data do primeiro ataque e ainda sob Trump, no líder mundial de vendas de telefones constituía, na minha opinião, uma ameaça ainda maior do que o domínio do mercado 5G – daí o ataque à empresa e não apenas ao negócio 5G. Ainda por cima a Huawei que até é uma espécie de cooperativa, provando que o mundo não precisa de “patrões” ou “empresários”, apenas de quem trabalhe.
Edward Snowden já nos tinha dado a conhecer o porquê deste receio, por parte da Huawei, considerado um ataque frontal à segurança dos EUA. No meio das acusações costumeiras das “ligações ao Partido Comunista Chinês” e do acesso à informação “pelo Partido Comunista Chinês”, Snowden, a seu tempo funcionário da NSA (Agência de Segurança Nacional), denunciou que os Iphone eram instrumentos de espionagem e vigilância, abertos às agências de segurança e de investigação do tio Sam.
Mais recentemente, a também banida Kaspersy – um dos mais conhecidos antivírus do mercado – confirmou as denúncias de que o Iphone pode ser infetado com um malaware que permite às agências de segurança do tio Sam aceder aos dados, mas também ao controlo do próprio aparelho, para que este filme e registe áudios do seu portador. A Apple negou, claro!
Ao fazermos uma análise superficial de que tipo de pessoas utilizam Iphone, principalmente os mais vulneráveis à utilização destas portas traseiras “back door” – os mais caros e modernos -, rapidamente nos damos conta de que se tratam de empresários, políticos, dirigentes partidários e associativos, gente da elite ocidental, em geral. E tal é o conhecimento desta situação – abafada pelo poder mediático da Apple e pelo poder coercivo da Casa Branca -, que em alguns países já existem restrições ao uso de Iphones por altos funcionários e dirigentes do Estado. Não, nenhum desses países é do Ocidente colectivo! Ai deles! O Iphone é a sua trela!
Ora, era também neste mercado “flagship” que a Huawei estava a entrar e não apenas no mercado comum. O facto de apresentar telemóveis cada vez mais sofisticados, com as melhores máquinas e que competem com os melhores Iphone e Samsung, estava a colocar em causa a utilização destas estratégias de vigilância pelos mesmos de sempre. No caso dos Huawei, a existirem vulnerabilidades desse tipo – também amplamente negadas, como seria de esperar -, elas funcionam para o outro lado. O facto é que, com a expansão da Huawei, estava a reduzir-se, lenta mas paulatinamente, o campo de recolha de “inteligência” em relação a pessoas de interesse.
Não é preciso ir muito longe para se perceber a importância destas coisas. Quando o Google se generalizou e todos ficámos a saber que a China se tinha recusado a ter um “Google livre”, desse facto saíram dois tipos de conclusões: 1. A da propaganda, segundo a qual “a China é uma ditadura e tem de condicionar o Google”; 2. O Google é um instrumento de controlo de mentes, monitorização de comportamentos e recolha de dados pessoais, logo, um país como a China não poderia dar essa vantagem aos EUA.
Hoje todos sabemos como funciona o Google, a forma como faz a gestão da informação, como a suprime, promove e bloqueia ao sabor dos poderes dos seus criadores e financiadores de facto. A mim, só me admirou, como foi possível que países como a Rússia, a India, o Brasil, a Indonésia ou Irão tivessem ido no conto do vigário, optando por não criar ferramentas nacionais homólogas. Tratou-se de um erro crasso que muito tem custado a suprimir. No início, estas nações, ao contrário da China, prescindiram da luta pelo “multiverso”.
A questão do 5G já não é tão importante, do meu ponto de vista, para o domínio do multiverso. Embora a Casa Branca tenha a intenção e controlar toda a gama de tecnologias digitais de ponta, o facto é que, mesmo assim, nesta área, permite à Suécia – Erickson – e a Finlândia- Nokia – desenvolverem redes 5G. O que a Casa Branca já não permite a ninguém é o desenvolvimento das próprias tecnologias digitais.
Digam-me uma plataforma digital do Top 20 que tenha origem Europeia, Japonesa, Coreana ou Australiana? Pois é aí que se situa o cerne do controlo e monitorização das mentes. E como recentemente divulgado e confirmado pelo próprio Guterres, o tio Sam monitoriza até a sua mãezinha. Não confia em ninguém e ainda menos nos seus mais submissos servos. O líder real sabe sempre que o seu servo de hoje, pode ser o de outro, amanhã.
Desde muito cedo pudemos constatar que, também em Portugal, a 5G da Huawei iria ser banida. Tive mesmo essa discussão com um utópico da IL, que me dizia não ser assim. A própria lei habilitadora e reguladora do 5G denunciava, a alta voz, essa possibilidade, ao criar condições especiais para a entrada de “novos operadores”. Operadores esses que são a Nokia e a Erickson. Huawei e ZTE nem pensar. Santos “fantoche” Silva ainda falou grosso ao embaixador dos EUA: “em Portugal há um governo soberano para decidir essas coisas”, terá dito! Mas era apenas mais um acto da farsa. Portugal não tem, hoje, líderes capazes de lutar pela sua independência real.
Depois de ameaças, bullying e promessas de apoio à candidatura de Costa à presidência do Conselho Europeu (isto sou eu que digo), eis que o resultado final não poderia ser outro. Só os iludidos não o viram logo desde o ataque de Trump. Os países ocidentais não têm soberania para decidir destas coisas. Isto é decidido por gente como Victoria Nuland e Tony Blinken e transmitido à NATO. A 5G da Huawei é banida e veremos o que dirão os tribunais sobre o assunto, mas vendo como vai a justiça… Para já, as regras da concorrência foram todas atropeladas. E os utópicos neoliberais que gostam tanto do “mercado livre”. Uma utopia construída para permitir a acumulação de riqueza pelos que já eram os mais ricos.
Na Imprensa ressonante não se fizeram esperar as explicações do charlatão. Não, não são dadas para salvar o Governo! São dadas para lavar a face da UE e dos EUA. Então, por entre mesas redondas de comentadores plurais, o diapasão afinava todo pela mesma treta “a avaliação que a UE faz hoje da China, não é a mesma que fazia há uns anos”.
Por amor… Mas a UE faz alguma avaliação de alguma coisa que não seja a de avaliar como aplica as ordens que lhe são transmitidas directamente de Washington? A UE tem tantos problemas com a China, faz uma avaliação tão terrível deste país, que continuou a aumentar o volume de negócios, parecerias e investimentos com o mesmo, havendo inclusive vários países que até fazem parte da BRI. Eis a avaliação que a UE fez!
Quem não gostou foi o tio Sam, logo vindo colocar os seus grãos de areia na engrenagem, porque esta não funciona a seu favor. E através de um sistema de “reinar para dividir” e do conhecido e experimentado método da “cenoura e do burro”, não demorou muito a que os servos europeus, que se fazem passar por dirigentes políticos, mas não passam de fantoches bem pagos e com trela (Iphone), sucumbissem à derrota dos seus povos, dos seus países. Hoje, é certo que a UE irá entrar em recessão e no final disto tudo sairá com uma economia arrasada. Mas “tudo em nome da democracia” certo?
Se a 5G representa o acesso de um país em vias de desenvolvimento – em tanto mais avançado do que os que se dizem “avançados” – a tecnologias da fronteira tecnológica, o Tik-Tok e o Weechat representam o acesso e a capacidade de disputa do “Multiverso”. O multiverso (universo virtual) é o local onde o tio Sam nos quer encarcerar as mentes para que, vivendo uma vida de miséria, possamos fugir para uma vida falsa de ilusões, onde tudo podemos ser nunca sendo nada. O multiverso é a metáfora perfeita da farsa democrática em que vivemos.
Se o Tik-Tok permite o controlo das mentes, neste caso, ao contrário de Twitter, Facebook, Apple e Google, não contém as portas traseiras e os interruptores censórios ao dispor da Casa Branca. A contê-las, funcionam para outros que não os EUA. Mas, a ver pelas publicações em causa, não entrou na onda da censura.
Se o Weechat permite o controlo do dinheiro, ao contrário do Googlepay, Visa, Mastercard e outros, não concorre para a preservação do dólar como moeda de reserva, antes para a sua desagregação. Também não comporta as portas traseiras de acesso, ao dispor das mais de uma dezena de agências de segurança dos EUA.
Eu não sei se, este tipo de tecnologias, funcionam para o governo chinês como funcionam para o dos EUA. Também não sou ingénuo ao ponto para dizer que não o possam fazer. O que sei é que o ladrão tende a ver todos os outros como ladrões e a espelhar nos outros o mesmo comportamento que assume. É um efeito psicológico conhecido: nós lemos os outros com os nossos próprios olhos.
Sei também que, nunca em toda a história humana um regime político teve nas suas mãos um sistema tão perfeito de vigilância, controlo e manipulação. A diferença é que, este sistema, em utilização no Ocidente e bem traduzido em comportamentos acríticos e de rebanho pela maioria das pessoas, incluindo da elite, é apelidado de “defensor da democracia”. Um sistema destes usado num país competidor, é apelidado de tiranizador.
Mas, no final, tal como se passa no mundo real, que vive numa disputa entre quem defende a unipolaridade – EUA e vassalos – e quem defende a multipolaridade – povos e nações livres -, o multiverso também assiste à mesma disputa. E neste caso, a China está para o real como para o virtual. Assume-se como o grande motor e pilar da transformação da arquitectura mundial. Não se trata de uma questão de gosto, é uma realidade e temos de viver com ela. E eu que pensava que os liberais gostavam muito de “mudança” e “reformas”. Está na hora de saíres da zona de conforto, ó Passos Coelho!
No fundo, no fundo, o multiverso não existe…. Pois não passa de uma extensão do mundo real, das relações reais. Existisse ele de per se, como nos querem fazer crer, e seria um mundo de paz, liberdade e felicidade para nos prender a todos. A prova disso mesmo é a sua disputa pelos imperialistas EUA.
Nenhum império se constrói de quimeras virtuais. O poder imperial é bem real. Sentimo-lo todos os dias nos nossos ossos, hoje, como o sentem os povos do Sul Global de há 500 anos a esta parte. Assim, o “multiverso” não é um mundo independente, é uma ferramenta do mundo que temos.
E o que está em questão com a 5G, os telemóveis, os chips, as plataformas digitais, mais não é do que a disputa do mundo real. Um mundo que agora foge, finalmente, ao Ocidente. É esta a realidade e só existe uma!