(Por Batiushka, in Réseau International, 24/12/2022, Trad. Estátua de Sal)
“Para o inferno com Washington” ( Coronel Douglas Macgregor)
Introdução: O Atlântico e a Europa
A julgar pelo seu nome, NATO, a Organização do Tratado do Atlântico Norte só envolveu os Estados Unidos e o Reino Unido, um acordo entre os americanos e o meio-americano Churchill. Afinal, quão importante é o “Atlântico Norte” para a Alemanha báltica ou para a Itália mediterrânea, quanto mais para a Grécia egeia e para a Turquia no mar Negro? Até a Espanha e Portugal olham para as Caraíbas e para o Atlântico Sul, não para o Atlântico Norte. A NATO é claramente uma organização que descende diretamente da Carta do Atlântico, elaborada por Roosevelt e Churchill numa baía da Terra Nova em 1941 (nem mesmo no Atlântico), e depois imposta a todos.
O fim da NATO
Então, o que é que o Atlântico Norte estava a fazer no sopé dos Himalaias, no Afeganistão? Além de ser a sua maior derrota (até agora), o que é que ele lá estava a fazer? E o que é que o Atlântico Norte, ou pelo menos partes dele, está a fazer no Mar da China Meridional? Certamente há uma pista no nome – China? Este mar pertence à China. O que é que a marinha dos EUA e outros estão a fazer nessa região?
É certo que mesmo Liz Truss, que queria que o mundo inteiro fosse governado pela NATO, com os seus fracos conhecimentos de geografia, deve ter pensado que era hora de renomear a NATO? Talvez para Organização Nazi-Americana da Tirania? Dessa forma, poderíamos manter as mesmas iniciais. Como salientou Saker, o primeiro secretário-geral da NATO, o coronel-general Hastings Ismay, nascido na Índia, admitiu sem rodeios que o objetivo da NATO era “manter a União Soviética fora, os americanos dentro e os alemães em baixo”.
E como Saker explicou : “Manter os alemães em baixo” significa esmagar quaisquer europeus que possam ser rivais no controle da Europa Ocidental pela anglosfera, que agora controla toda a Europa, exceto as terras russas livres. “Manter os americanos dentro” significa esmagar todos os movimentos de libertação europeus, os de De Gaulle ou outros. “Manter a União Soviética fora significa destruir a Rússia, para que não liberte a Europa da tirania da anglosfera. Este último objetivo é simbolizado pelas bandeiras americana e britânica, que estão onipresentes, mesmo em itens de moda, camisetas e jeans, desde os anos 1960. É por isso que os verdadeiros europeus se recusam a usar esses itens.
Na realidade, é óbvio que a NATO deveria ter desaparecido em 1 de julho de 1991, dia em que desapareceu o Pacto de Varsóvia. Se tal tivesse ocorrido em 1991, a derrota da NATO teria sido evitada, trinta anos depois no Afeganistão. Na verdade, o facto de não ter sido extinta naquela época é uma tragédia que custou milhões de vidas, principalmente no trágico Médio Oriente, e hoje em toda a trágica Ucrânia.
Curiosamente, a resposta à agressão e intimidação da NATO (a elite americana ainda intimida), o Pacto de Varsóvia, recebeu o nome da capital da Polónia. Ironicamente – e não há nada mais irónico do que a história – é hoje na Varsóvia da “nova Europa”, longe do Atlântico Norte, que encontramos o mais fanático dos seguidores da NATO. Então, afinal, qual é o significado da NATO?
A República americana da Polónia
O nome “Polónia” está relacionado com a palavra inglesa “plain”, de modo que “Polónia” significa literalmente “campos”. Dito de outro modo, não há barreira geográfica entre as terras alemãs e as russas, que começam com a atual Bielorrússia, e a Ucrânia. Ou seja, não há barreiras geográficas entre Berlim e Moscovo. Existe apenas uma barreira política puramente artificial. Os dois povos, polacos e russos, são irmãos genéticos. O seu confronto, como aquele que existe entre outros irmãos genéticos, os croatas e os sérvios, é puramente artificial.
Faz parte do gigantesco complexo de inferioridade dos polacos – suponha que você vive no meio dos imensos campos entre a Alemanha e a Rússia -, imaginar que a Rússia está interessada em conquistar a Polónia. A Rússia realmente não está interessada na Polónia. Mas então, ouço-vos eu perguntar, porquê a Rússia Imperial participou nas três partições prussianas e austríacas da Polónia no final do século XVIII? Porque é que Molotov e Ribbentrop a partilharam? Porque é que Estaline a ocupou?
A resposta é sempre a mesma. Quem foi invadido tanta vez pela Europa Ocidental, como foi a Rússia, deve criar uma zona tampão para se proteger. Como a geografia não muda, os czares e os bolcheviques foram compelidos, por idêntico receio de agressão e inveja ocidentais, a fazer o mesmo para se protegerem, e isso significava controlar o leste ou toda a Polónia. Nisso, o czar Nicolau II teve muito mais sucesso do que os bolcheviques. Assim, durante a Primeira Guerra Mundial, os alemães e os austríacos nunca entraram na Rússia, permanecendo presos principalmente no leste da Polónia e na Lituânia e causando menos de 670.000 baixas russas em dois anos e meio de guerra. Foi diferente durante a Segunda Guerra Mundial, quando os alemães chegaram ao Volga e causaram quarenta vezes mais vítimas, ou seja, 27 milhões.
É uma explicação, não uma justificação. Alguns dos meus melhores amigos são polacos: pertencem à pequena minoria de polacos que conhecem tudo isso e sabem que a Polónia de hoje é apenas um vassalo dos americanos. Acho que, provavelmente, eles também sabem que se um polaco recebesse o Prémio Nobel da Paz, seria para quem liderasse a Polónia e a levasse a estar em paz com a Rússia, em vez de ir para a guerra. Seria um polaco que rompesse com os americanos, os expulsaria da Polónia e declarasse a independência. E faria o mesmo com a UE, os Estados Unidos da Europa, liderados pelos Estados Unidos. Este é o tipo de patriotismo polaco (totalmente diferente do nacionalismo polaco) que aprovo, porque se trata de afirmar a identidade nacional polaca e não de destruí-la.
Infelizmente, alguns membros da elite política e militar polaca de hoje sonham varrer a Rússia do mapa, como os cruzados católicos da Idade Média. O seu delírio está ao nível do daqueles cruzados. Os polacos não percebem que os americanos (e os britânicos) os deixarão cair (e aos ucranianos) como tijolos quentes, na hora de os esmagar. Como fizeram em 1945, embora os britânicos afirmassem que entraram na guerra em 1939 com o único propósito de defender a Polónia. Isso, afinal, era mentira. Quando é que os polacos descobrirão quem são os seus verdadeiros amigos? Como o Saker disse:
Os Estados Unidos e a NATO precisam de mão-de-obra e de poder de fogo para enfrentar a Rússia numa guerra convencional combinada. Qualquer uso de armas nucleares resultará em retaliação imediata .
Hoje, na Polônia, pelo menos 1 em cada 33 pessoas é um “refugiado” ucraniano. Muitos polacos estão fartos dessa invasão. Isso sujeita o país a uma rude prova.
O futuro
Neste momento, a NATO está a desmilitarizar a Ucrânia. Ironicamente, a Ucrânia é oficialmente um país não pertencente à NATO, o país onde residem algumas das pessoas que no mundo mais odeiam os polacos. Os ucranianos que vivem na fronteira polaca (os galegos) até inventaram uma nova religião para não serem católicos como os polacos (ou ortodoxos como os russos). É o chamado “catolicismo grego”. Não se encontra uma mistura mais estranha e artificial do que essa. Como dizem os russos: “Nem carne nem peixe“. Então, o que acontecerá quando a NATO entrar em colapso? Voltaremos à história do século passado, muita da qual diz respeito à Polónia, da Varsóvia devastada pelos nazis, à Auschwitz libertada pelos soviéticos, de Wroclaw (Breslau) a Gdansk (Danzig).
No início de 1917, a Primeira Guerra Mundial durava há dois anos e meio e a Rússia estava apenas a alguns meses da vitória total e da libertação de Viena, Berlim e Istambul. No entanto, a Revolução de Fevereiro organizada pelos britânicos (o embaixador britânico na época, Sir George Buchanan, foi a Victoria Nuland desse tempo) pôs fim a isso. E os aristocratas totalmente incompetentes, mas anglófilos, que os britânicos tinham escolhido para governar a Rússia, abriram as comportas para eclosão da Revolução de Outubro. Sem a interferência britânica, não teria havido a Polónia, que entre 1919 e 1920 ocupou a maior parte da Bielorrússia e do oeste da Ucrânia, lá permanecendo até 1939. E se as tropas russas tivessem entrado em Viena, Berlim e Istambul, não teria havido um cabo austríaco que, em 1939, lançou a segunda parte da Primeira Guerra Mundial, e por isso também não teria havido nenhuma invasão americana da Europa Ocidental em 1944. Logo, também nenhuma tropa soviética teria entrado violentamente em Viena e Berlim em 1945 e, portanto, hoje nenhuma guerra pela libertação da Ucrânia estaria a acontecer.
As intrigas austríacas que contribuíram para a Primeira Guerra Mundial fizeram o jogo dos franceses e britânicos e destruíram o eixo São Petersburgo-Berlim. Foi trágico porque Berlim é o verdadeiro centro da Europa Ocidental e Central e tudo o mais é secundário, incluindo Paris. (Tudo o que os alemães precisam de fazer para garantir a sua liderança, de facto, é agradar à vaidade da elite francesa e dizer-lhes que são muito importantes, isso é o suficiente). Porque a harmonia entre Berlim e São Petersburgo significa a existência de harmonia em toda a Europa Ocidental, Europa Central e na parte norte da Europa Oriental. Pondo de lado a Europa Ocidental, também há partes inteiras da Europa Central e Oriental que não interessam à Rússia, por albergarem culturas que são estranhas à mentalidade russa e mais próximas da história e cultura alemãs. Referimo-nos à antiga Alemanha Oriental protestante, bem como à antiga Polónia católica (incluindo parte do que é hoje o extremo oeste da Ucrânia), a Eslováquia, Áustria, Hungria, Eslovênia, Croácia, o norte da Bósnia e Herzegovina, bem como a ateísta Chéquia.
Tirando esses territórios da equação, chegamos às partes da Europa Oriental nas quais a Rússia está interessada e próxima. São elas: Bielorrússia, Ucrânia (russa), países bálticos, Moldávia, Roménia, Bulgária, Sérvia, sul da Bósnia e Herzegovina, Montenegro, Macedónia do Norte, Albânia, Grécia, e Chipre. Entender-se-á porque pertencem esses territórios ao mundo cultural russo consultando o mapa de Samuel Huntington intitulado “The Eastern Boundary of Western Civilization” (sic). Como ele disse, de acordo com a sua visão etnocêntrica: “A Europa termina onde termina o cristianismo ocidental“. Aqui, a Rússia não precisará de construir um muro, instalar armadilhas de tanques, arame farpado e cimento. Ela tem amigos do outro lado da fronteira.
Este foi o erro de Estaline – criou uma zona tampão que incluía países cuja cultura maioritária era estranha aos russos, em vez de se limitar a países ao sul e ao leste, como se elencou acima. Como ateu, Estaline não tinha mais tempo ou mais compreensão do que os americanos modernos, para as nuances religiosas e culturais dos povos. Foi pena. A Europa do sudeste, a lista de países acima referida, entrará mais uma vez na esfera de influência russa, mas os do norte e oeste pertencem a outra esfera, à esfera alemã e, portanto, à Europa Ocidental.
Conclusão: Depois da NATO
À medida que a NATO continua o seu colapso, que começou em Cabul em agosto de 2021, ficará claro que os Estados Unidos não podem apegar-se à Europa, assim como não podem apegar-se à Ásia. As guerras da NATO logo terminarão. A NATO está a ser desmilitarizada e desnazificada. Na verdade, está em vias de colapsar. Uma vez restaurado o eixo Berlim-Moscovo, o resto da Europa seguirá em frente, não sob uma esfera de influência russa, mas como uma área que deseja estabelecer boas relações com a Rússia, até mesmo com as ex-repúblicas americanas da Polónia, Lituânia, Letónia, Estônia e a Grã-Bretanha americana.
De facto, atrás de Moscovo, há Pequim e toda a Eurásia. E toda a Europa precisa de Pequim e de Moscovo, Pequim para os produtos manufaturados, Moscovo para a energia. A Europa deve voltar às suas raízes, virando as costas à insignificância e à ingerência transatlântica. Em breve tal será passado. Como disse o bom coronel MacGregor: “Para o inferno com Washington”.
Fonte aqui
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