Semanada

(In Blog O Jumento, 12/03/2017)

SEMANADA

Depois de ter elogiado Paulo Núncio pela sua elevação de carácter, Assunção Cristas descobriu agora que, afinal, não tinha havido qualquer responsabilidade política. Isto é, o tal momento de elevação de carácter de Paulo Núncio foi um tiro de pólvora seca, desnecessário e dado num momento de atrapalhação e na sequência de várias mentiras. Não havendo responsabilidades políticas por que motivo Assunção Cristas não insiste com Paulo Núncio para retirar o seu pedido de demissão dos cargos no CDS? Depois do momento de elevação de carácter de Núncio é a vez de ser Assunção Cristas a ter um momento idêntico.
Passos Coelho já sabe o que precisava de saber sobre as transferências para os offshores, que não tinha ocorrido qualquer situação fiscal e que o fisco ainda estaria a tempo de controlar. O problema agora é perceber por que motivo Paulo Núncio tudo fez para esconder as transferências dos olhos do povo, já que o argumento do “deixa-os pousar” não pegou.
Passos Coelho passou a semana em jantares de mulheres e talvez por isso se tenha transformado num exemplo de boas maneiras, principalmente nos debates parlamentares. Depois de muitas estratégias falhadas parece que a direita ensaiou uma nova versão de Passos, o líder da oposição é um rapaz muito educado e cheio de mesuras, o primeiro-ministro é um rufia mal-educado, reles e soez.
O Caso Marquês vai finalmente parir uma acusação e por incrível que pareça o BES que não serviu para acusar ninguém, serve agora para acusar José Sócrates. O MP deu a volta ao Mundo, mas em vez de ter começado no sentido da Av. Da Liberdade, onde estava a sede do BES, optou por viajar para nascente, deu a volta ao mundo, passou por paragens como Angola e Venezuela, passou uns tempos em Vale de Lobo, na viagem leram o livro de Sócrates e constituíram arguidos todos os que compraram mais de um exemplar e acabaram no CDT, o Culpado Disto Tudo. Estava escrito nas estrelas que a solução do Caso Marquês, a tal prova que levou três anos a encontrar, estava mesmo aqui ao lado.
Zita Seabra aparece num vídeo da Igreja Católica celebrando o 13 de Maio, estabelecendo a relação entre o centenário das aparições e o da revolução russa, para declarar a vitória de Fátima sobre Lenine. Depois de ver um modelo de virtudes proletárias, a mais dura dos comunistas no tempo de Cunhal, convertida numa beata devota da Nossa Senhora de Fátima, sou capaz de acreditar que um dia destes Maria Cavaco Silva ainda se vai inscrever na JCP, fazendo o percurso inverso ao da camarada Zita.

Apurar toda a verdade

(In Blog O Jumento, 03/03/2017)

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Antes de vir a público tomar uma posição sobre as transferências para as offshores, Passos Coelho, como um bom político que antes de tomar banho na praia sabe onde deixa a roupa, falou com o seu secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, um governante que apesar de depender de Vítor Gaspar e depois de Maria Luís Albuquerque,  respondia perante Paulo Portas, o seu verdadeiro chefe. O pobre homem teve um momento de amnésia e, de acordo com a imprensa, garantiu ao líder do PSD, que estava tudo bem.

Afinal, o desgraçado foi vítima das suas crises de amnésia transitória, esqueceu-se que enquanto governante se tinha esquecido do processo numa gaveta , tudo isso porque no início do seu mandato teve uma dúvida existencial – a divulgação dos dados não iria favorecer os infractores? – dúvida para a qual acabou por não encontra resposta, apesar dos lembretes do director-geral da AT a sua memória iria atraiçoá-lo sistematicamente e por várias vezes se esqueceu de a esclarecer. Aliás, esta pobre alma anda mesmo lelé da cuca, em quatro dias veio com quatro versões, cada vez que falou em público já se tinha esquecido do que tinha dito no dia anterior.

Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, parece ter também graves problemas de memória. Por várias vezes foi alertado para o que estava sucedendo no BES e nada fez, esqueceu-se sempre das suas obrigações e de proteger os interesses do país, do sistema financeiro e dos portugueses. O próprio Passos Coelho também parece ter problemas do género, esqueceu as responsabilidades de Carlos Costa no que sucedeu ao país e reconduziu-o no cargo.

O próprio Cavaco Silva já teve melhores dias; no seu livro das quintas-feiras evidenciou uma crise de amnésia selectiva, o pobre senhor só se recordou do que lhe interessava e por aquilo que escreveu sobre as escutas a Belém ficamos muito preocupados com que poderá estar acontecendo aos seus neurónios, baralhar factos na sua idade não augura nada de bom. E por falar de problemas de memórias com idosos, idade em que as falhas de memória nos fazem recear o pior, veio a Teodora Cardoso falar de milagres, um sinal de que se esqueceu das inúmeras verdades científicas que andou dizendo ao longo do ano.

Entre problemas de amnésia e crises de senilidade começa a ser evidente que vivemos num país em que é cada vez mais complexo distinguir a verdade da mentira. Já se sabia que no mundo da bola o que é verdade hoje será a mentira de amanhã. Parece que no mundo da política nem dá para considerar que com o tempo as verdades azedam como o vinho, o povo só tem direito a mentiras, porque as verdades são sistematicamente esquecidas.

Até o inquestionável Carlos Alexandre disse ao Expresso que não tinha amigos na magistratura, dizia ele que “devem ser levados em conta como avisos de que eu, realmente, não tendo fortuna pessoal, não tendo amigos na magistratura (não quer dizer que se os tivesse as coisas fossem de forma diferente), estando um pouco isolado como estou — tenho consciência disso —, sou mais vulnerável a qualquer tipo de incidência negativa que me venha a ser dirigida.” Pois, o que era verdade na entrevista do Expresso devido a um problema de amnésia revela-se uma mentira, ainda hoje o Público noticia que Orlando Figueira, o procurador acusado de corrupção, lhe chegou a emprestar dinheiro. Enfim, nem o sóbrio super juiz se consegue escapar a esta epidemia de amnésia.

É uma pena que gente como Passos Coelho considere que só eles têm direito a conhecer toa a verdade e apenas quando esperam que a verdade corresponda às suas conveniências.


Fonte aqui

Uma montanha de carácter

(João Quadros, in Jornal de Negócios, 03/03/2017)

quadros

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, assumiu a sua “responsabilidade política” pela não publicação de dados relativos às transferências de dinheiro para “offshores”, pedindo o abandono das suas funções actuais no CDS-PP. Acho que não chega, e vai em desterro para as ilhas Caimão.

Núncio “quis libertar o partido” a que pertence [CDS-PP] “de quaisquer controvérsias ou polémicas nesta matéria”. Se é para libertar o CDS de controvérsias, o melhor é sair do PP e inscrever-se no PSD.

Assunção Cristas veio dizer que Paulo Núncio, ao assumir a sua “responsabilidade política” pela não publicação de dados relativos às transferências de dinheiro para “offshores”, revela “uma grande elevação de carácter”. Acho que uma elevação com mais de 10 mil milhões já é considerada uma montanha. É pena não haver uma fossa das marianas de lisura para a Assunção mergulhar. Se Paulo Núncio “mostrou uma grande elevação de carácter” ao assumir responsabilidades políticas, como é que fica o carácter de quem disse que foram notícias plantadas?

Recordemos o percurso que nos leva ao topo da elevação de carácter:

1 Núncio diz que é culpa do fisco
2 Cristas diz que são notícias plantadas
3 Fisco desmente Núncio
4 Núncio demite-se do… CDS
5 Cristas diz que Núncio é de grande elevação e que Portugal deve-lhe muito.
Agora, fica a faltar a condecoração ao Núncio. Aliás, com a carrada de dinheiro que voou daqui, e como Assunção Cristas diz que Portugal deve muito a Núncio, o mínimo é dar o nome do homem ao novo aeroporto. Aeroporto Paulo Núncio, voe para paraísos.

Eu mandei um e-mail para agradecer ao Doutor Núncio tudo o que fez por nós mas, infelizmente, tenho um “bug” no sistema informático e ele não recebeu a informação. Sendo assim, se a senhora Assunção não levar a mal, se calhar, vou deixar os agradecimentos ao Núncio para a semana, porque agora estou ocupado a agradecer ao Miguel Macedo o negócio dos Vistos Gold. Seja como for, em 2016, Núncio foi considerado personalidade do ano da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Património. Se calhar, já lhe agradeceram o suficiente.

Em Dezembro, num artigo no jornal online Eco, Paulo Núncio escrevia: “O Natal convoca-nos a perspectivar a nossa vida e a hierarquizar as nossas prioridades” – e passaram quatro quadras natalícias e ele não foi capaz de pôr no topo da hierarquia das suas prioridades as transferências para “offshores”. Tem uma desculpa, estava ocupado a sortear uns Audi para premiar os cidadãos que ajudavam a evitar fugas ao fisco.

Conhecendo as prioridades de Núncio, e como o Natal é quando um homem quiser, fica a pergunta: já investigaram o sorteio dos Audi?


TOP 5

Agradecido

1. SIC: “Técnicos do Banco de Portugal defenderam saída de Salgado nove meses antes da derrocada” – Dava para o Carlos Costa ter um filho.

2. “Arrastão ‘pesca’ bomba ao largo da Nazaré” – A Nazaré tem bombas e canhões, ponham-se a pau com o Trump, ainda a confunde com a Coreia do Norte.

3. Futebol feminino bate recorde de público num jogo com 9.263 pessoas em Alvalade – Madeira Rodrigues diz que eram só 1.000.

4. “Barack e Michelle Obama vendem publicação de memórias por 60 milhões de dólares” – Rói-te, Aníbal.

5. SIC Notícias, Negócios da semana, Tiago Caiado Guerreiro – “não invistam na GGD que aquilo é para enganar velhinhas” – A seguir, anúncio cogumelo do tempo.