(Por Valupi, in AspirinaB, 10/02/2022)

João Miguel Tavares e André Ventura são dois casos miméticos de sucesso meteórico e retumbante na sociedade portuguesa.
O primeiro, até Sócrates o ter processado em 2009 por causa do artigo “José Sócrates, o Cristo da política portuguesa”, era um banal e irrelevante colunista sem conotação ideológica definida. Depois desse episódio, extremado por Sócrates que esgotou todos os meios judiciais na procura de uma reparação, este Tavares tornou-se numa super-vedeta da indústria da calúnia e do laranjal. Rapidamente, saltou do DN para o esgoto a céu aberto. Os 10 anos seguintes foram de crescente, sistemática e maníaca exploração do filão. A um ponto tal que, chegados ao início de 2019, ele já era uma anedota desvairada no seio da própria direita, a começar a perder a paciência para a sua obsessão disfuncional por ser agora fétida canalhice que se ia voltando contra os direitolas que não o coroassem como magno herói das Grandes Guerras Socráticas. Foi nessa fase de esgotamento da fórmula que lhe caiu na vaidade, ex machina, uma das mais altas honras da República: presidir à comissão das comemorações do 10 de Junho. À esquerda ouviram-se raríssimos e abafados protestos de indignação pela degradante afronta. À direita não se conseguiu esconder o espanto com o atrevimento burlesco de Marcelo e soltaram-se alarves gargalhadas com a justificação dada pela Presidência para a escolha, isso de ser uma homenagem ao “jornalismo”. O regime, portanto, validou e celebrou um caluniador profissional apenas e só por ser um caluniador profissional ao serviço do assassinato de carácter de Sócrates e do maior número de personalidades socialistas, e afins, que conseguisse apanhar na sua linha de tiro mediática.
O segundo, até Passos Coelho lhe ter oferecido o PSD como plataforma política, não passava de um comentador chunga que aparecia num canal por cabo chunga a falar de futebol com outros chungas. Qual o seu o currículo, à data, para Passos o escolher como cabeça de cartaz na importantíssima Loures? Uma simples publicação no Facebook em 2016, onde atacava os muçulmanos na Europa no contexto de um atentado em Nice, juntamente com as técnicas de emporcalhamento afinadas na CMTV, fizeram de Ventura o espécimen ideal para uma experiência inovadora em Portugal: testar junto de um eleitorado onde existissem conflitos sociais, insegurança e racismo larvar um discurso securitário e de xenofobia populista sob a chancela de um dos partidos fundadores da democracia. A obscena intenção foi tão descarada que o CDS-PP, honra lhe seja, decidiu romper a coligação com o PSD para essa autarquia. Nada que perturbasse o vale tudo de Passos e seus tenentes, bêbados de rancor por causa de 2015, que subiram para o palco com Ventura e lá ficaram a chocar o ovo. Depois Passos recolheu-se em Massamá à espera de uma manhã de nevoeiro e Ventura saiu do PSD para ir a Fátima aprender a fazer milagres. 5 anos mais tarde, o Chega é a terceira força política no Parlamento e a normalização de quem despreza os direitos humanos, de quem ameaça destruir os pilares constitucionais e de quem pretende instituir uma ditadura policial vai de vento em popa na “imprensa de referência” e no consulado de Rui Rio à frente do PSD.
João Miguel Tavares e André Ventura cultivam com fanatismo babado e asinino a imagem de Passos Coelho. Pintam-no como chefe mítico de uma direita triunfante, imperial. Uma direita capaz de correr os piegas a pontapé para além-fronteiras e de prender os adversários políticos por razões políticas.
Daí a sinergia de agendas, o trabalho de influência que o Público e a TVI/SIC (até ao ano passado também a TSF) exercem ao darem ao caluniador profissional um prestígio máximo como moralista da Grei. Acham que o podem controlar, por não passar de um videirinho, e que entretanto a chicana contra o PS justifica os métodos mais sórdidos.
Enquanto o linchamento de Sócrates for mais importante do que o Estado de direito democrático para a comunidade que somos, o Chega continuará a crescer pois não passa da evolução lógica do que a oligarquia ordenou que o PSD fizesse a partir de 20 de Junho de 2008. Há um ecossistema político e mediático cristalizado onde se pratica o ódio político e se despreza a coragem constitucional. João Miguel Tavares e André Ventura enchem os bolsos à conta dessa decadência, dessa desonra colectiva.