A direita, os trauliteiros de serviço e o Governo

(Carlos Esperança, 03/01/2019)

Enquanto o PSD mais ou menos polido se digladia no duelo em que o mais rústico leva vantagem e o CDS apresenta um candidato a líder por cada deputado, com a ala mais radical a liderar, com Nuno Melo em disputa com o bando de nazis do Chega, os jornalistas da direita, à falta de rumo e de líder, limitam-se a produzir ruído nos jornais onde militam.

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Os jornalistas profissionais dão notícias, mas a maioria vive da opinião que lhes garante o vencimento e a estabilidade pela hostilidade com que ofendem os governantes.

O ministro do Ambiente adverte os moradores de locais inundados, que o Estado teve de evacuar, para a necessidade de habitarem sítios mais seguros, e a matilha pede a sua demissão, não porque o alerta seja inadequado, mas porque devia fazê-lo em período de incêndios, e não com os inundados deslocados. Agora era o tempo de prevenir os donos das habitações entre manchas de pinhal e de eucaliptos.

O ministro dos Negócios Estrangeiros referiu que a qualidade da gestão das empresas é, em Portugal, “fraquíssima”, e logo António Saraiva, presidente da CIP, considerou que o ministro “denegriu injustamente” as empresas e promoveu “a maior desconsideração de sempre de um governo ao tecido empresarial português”.

Aceita-se a quem representa o patronato, ao patrão dos patrões, que não corrobore o ministro, apesar de saber que 55% dos patrões que representa não têm sequer o ensino secundário e que ocupam o primeiro lugar da desqualificação na Europa, que os dados estatísticos do INE e agências internacionais confirmam, incluindo a OCDE.

Não se aceita, a jornalistas profissionais, que o acompanhem na indignação e insultem o ministro por dizer uma verdade ululante e façam tal gritaria que o obriguem a apresentar um pedido de desculpas pela evidência referida, com Portugal no topo da lista europeia de gestores de menos formação, precedendo na impreparação os de Malta, Espanha, Itália e Grécia.

Dos vários almocreves da direita que ulularam diatribes contra o ministro, sobressaiu o arrieiro João Miguel Tavares, a quem o PR adjudicou os dois indizíveis discursos do último 10 de Junho, escriba useiro e vezeiro a bolçar ódio aos governos que enviaram Passos Coelho para uma cátedra e Maria Luís para empregada de um fundo abutre.

A fraquíssima gestão referida pelo ministro Santos Silva, com perda calculada de 30% de produtividade, mereceu ao jornalista do Público e da direita mais caceteira, a alusão a “um dos seus momentos de inspiração trauliteira” do “maior apoiante do pior primeiro-ministro da nossa História” e, à guisa de argumento, destacado em caixa alta, «Fez parte do pior executivo da democracia. A sua existência, essa sim, é o exemplo mais triste da fraquíssima qualidade das nossas instituições». (Público, 31-12-2019, última página).

Com esta clarividência, insultos em vez de argumentos, pode ter chamado a atenção de Belém, mas não teria lugar num jornal que preferisse notícias à propaganda. Não passa do troglodita que, perante um ato de vandalismo a uma escultura de Pedro Cabrita Reis, em Leça da Palmeira, transformou o caso de polícia num ataque político e em desprezo néscio pelo escultor e a sua obra. (Público, 02-01-2020).

Em boa verdade, JMT não é um jornalista profissional, é o estagiário para assessor, num governo de direita, de um qualquer governante igualmente boçal e caceteiro.


A campanha pelo estado de excepção

(In Blog Aspirina B, 27/11/2019)

Pedro Mexia – Se no fim deste processo, num processo desta natureza, contra um ex-primeiro-ministro, o crime realmente grave não é provado... isto é um flop grande. E eu não consegui ainda, em nenhum momento...

João Miguel Tavares – Mas as leis portuguesas estão feitas para esse flop existir, não é?...

Pedro Mexia – 'Tá bem, mas se há um flop probatório...

João Miguel Tavares – Mas a questão é que eu não acho. Acho que a coisa mais importante neste processo, apesar de tudo, é avaliar quem é que é aquele homem.

Governo Sombra – 8 de Novembro


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O Presidente da comissão das comemorações do 10 de Junho de 2019 assumiu há semanas, num programa de televisão, que (i) as instituições e entidades públicas que o escolheram, e que ele aceitou representar, para ser o rosto e a voz de um dos mais simbólicos feriados da Pátria são cúmplices de criminosos e que (ii) a “Operação Marquês” é um processo judicial cuja finalidade não é descobrir se eventuais crimes foram cometidos, e de que modo, e com que gravidade, antes a devassa, humilhação e condenação moral e política de um dado cidadão e do partido a que pertenceu. A seu favor, o facto de não ter sido a primeira vez que bolçou tal, a que se junta a evidência de ser exactamente assim que a indústria da calúnia e a direita decadente têm explorado o processo desde o período em que ele ainda não existia oficialmente mas já circulava no meio político-jornalístico e dava origem a reportagens em Paris e a tentativas de golpadas com a chancela da PGR para ajudar Seguro no páreo com Costa. Também a seu favor o facto de aceitar servir e promover aqueles que, garante e repete com dolorosa vontade de se partir à gargalhada, usam o Estado para ajudar os corruptos a escaparem impunes; logo, que são igualmente corruptos e que, na plena posse dos seus poderes corruptores e corrompidos, o emolduravam em Portalegre – o que faz do João Miguel Tavares, afinal, farinha do mesmo saco, para ir buscar a metáfora favorita do veterotestamentário Jerónimo.

O que releva, em tudo o que diga respeito ao caluniador profissional entronizado por Marcelo Rebelo de Sousa à custa da dignidade da República, é sempre quem lhe paga, ou quem o usa, ou quem se cala. No caso, o primeiro silente foi Pedro Mexia, fulano que ostenta uma licenciatura em Direito pela Universidade Católica no seu currículo. Que diria este licenciado em Estado de direito e seus códigos legais se tivesse de justificar a sua registada concordância com a acusação alucinada e fétida de termos leis feitas de propósito – portanto, com a conivência do Parlamento e dos eleitores, dos Presidentes da República e dos tribunais, passando pelos Governos e pelo Ministério Público, a que se junta a imprensa e a sociedade civil – para permitir impunemente a corrupção das mais altas figuras do Estado? Que diria este infeliz se o destino lhe pregasse a partida de ter de opinar na televisão, ou que fosse da varanda de sua casa, sobre a ideia de poderem existir processos judiciais cujo móbil “mais importante” não é o respeito pela Constituição e a aplicação da Lei, antes a “avaliação” de alvos políticos? E que diria o Sr. Araújo, esse exemplo deslumbrante da inteligência mais apurada ao serviço da liberdade mais indómita, calhando sujeitarem-no à mesma curiosidade? E que diria o alegrete, o pachola, o galhardo representante do mais nobre jornalismo, de seu nome Carlos Vaz Marques, se colocado entre as mesmas perguntas e a parede? E que diria Sérgio Figueiredo, director de informação da TVI, se interrogado sobre a utilidade social e/ou cultural de espalhar no espaço público esse programa político de ódio a Portugal e a certos portugueses que o caluniador profissional acha ser a chave do seu sucesso?

O silêncio, de facto, faz parte do modelo de negócio de quem utiliza meios de comunicação social de grande alcance para apoiar os negacionistas climáticos, para arrotar ignorância pesporrenta sobre o multiculturalismo, para alimentar o revisionismo sobre o Estado Novo, para ligar Vítor Constâncio, a propósito de algo que se provou e comprovou não passar de chicana e calúnia, a Adolf Eichmann, a Hitler, ao Holocausto. Podemos adivinhar o seu gozo, a soberba, ao constatar que pode insultar e ofender tudo e todos. O seu método consiste em olhar para as causas que defendem as pessoas que lhe pagam e para as causas das pessoas decentes, e depois arranjar maneira de se colar às primeiras e emporcalhar as segundas (se lhe cheirar a Sócrates e a esquerda) no limite do escândalo que obrigasse quem lhe paga a assumir responsabilidades editoriais. Poderia ser apenas um modo de vida como outro qualquer, seguramente menos nefando do que andar a traficar pessoas ou a assaltar idosos, mas acontece que é muito mais do que isso. A economia do sucesso deste caluniador está umbilicalmente ligada ao sucesso do que tem sido feito a Sócrates e ao PS pela oligarquia (com a, só aparentemente, paradoxal conivência do próprio Partido Socialista).

Começa hoje a ser interrogado o acusado que pode chutar o “Processo Marquês” para o arquivamento. Ignoro se o irá fazer, se o irá conseguir e, acima e antes de tudo, ignoro se cometeu algum crime. O que não dá para ignorar, sob pena de perder o respeito por mim mesmo, é a dimensão objectivamente corrupta que dá origem ao que veio a ser a operação de meter Sócrates numa prisão a um ano de umas legislativas onde Passos Coelho concorria, onde Cavaco Silva protegia a direita, onde a procuradora-geral da República mostrava alinhamento político com o Governo e sua bandeira populista – e politicamente dirigida contra o PS – do “fim da impunidade”. Essa operação implicou várias ilegalidades e várias irregularidades, as quais, parece certo, ficarão abafadas pelo regime. Que já o começaram a ser ao se ter afastado as legítimas suspeitas existentes sobre o envolvimento de Carlos Alexandre e o afastamento de Ivo Rosa a partir do momento em que passaram a existir dois juízes no Ticão. Que não geram uma linha de espanto, sequer desconforto, ao se saber como a Caixa Geral de Depósitos foi usada de forma inaudita para se simular ter aí começado uma investigação que já durava há anos e anos.

Chegamos ao fim de 2019 com prováveis 15 anos de espionagem contínua sobre Sócrates, e sobre terceiros do seu círculo íntimo, onde até se obtiveram escutas ilegais de um primeiro-ministro em funções, e ninguém foi capaz de provar directamente uma única ilegalidade. Só existem comportamentos que chocam a moral comum à mistura com fantasias toscas, vergonhosas, e a esperança desesperada de que uma testemunha diga em tribunal o que precisa ser dito para o regime deixar cair a guilhotina.

Conclusão: os milhões atribuídos a Sócrates são a milionésima parte de uma migalha quando comparados com a certeza de termos uma Justiça capaz de se enterrar na luta política mais sórdida e inconstitucional. Daí se compreender tão bem a campanha para que a “Operação Marquês” seja transformada numa concretização do estado de excepção.



Caluniadores profissionais, modo de usar

(Por Valupi, in Blog Aspirina B, 25/07/2019)

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O Presidente da República explicou que o nome de João Miguel Tavares para presidir à comissão organizadora das comemorações do Dia de Portugal foi indicado por “todos os seus conterrâneos” de Portalegre, acrescentando fatores de escolha semelhantes aos dos nomes escolhidos nos três anos anteriores: “independência de pensamento e a capacidade de dar testemunho criativo e corajoso sobre o tema”, bem como “a afirmação do pluralismo de opiniões que deve caracterizar a democracia”.

“O autor da obra, neste momento lançada, correspondeu, cabalmente, quer às razões da sua escolha, nas qualidades que o caracterizaram, quer à pedagogia desejada, traduzida e distinguida inequivocamente de tolerância e intolerância, quer à finalidade de dar voz a anseios, preocupações e, de alguma maneira, gritos de alma que não poderiam ficar de fora da democracia, que temos todos a obrigação de não deixar enclausurar”, afirmou ainda Marcelo Rebelo de Sousa.

Como balanço final, Marcelo Rebelo de Sousa diz registar “com apreço” que os objetivos que tinha em mente com o convite de João Miguel Tavares, “foram plenamente atingidos”.


Fonte aqui


Falar de João Miguel Tavares tem nulo interesse do ponto de vista da sua individualidade. É um arrivista que escreveu um texto canalha e teve a sorte de ser alvo de uma acção judicial de Sócrates. A partir daí, aproveitou a fortuna para fazer uma. Há quem lhe pague, e muito e cada vez mais nesta fase da sua alucinante consagração, para ele continuar a repetir a fórmula que o catapultou para o sucesso: difamações, calúnias e apelos ao ódio dirigidos contra o PS a partir da exploração da figura de Sócrates. Como arranjista que é, e dentro do seu mundo psíquico narcísico e infantilóide onde se concebe como o Ronaldo dos caluniadores profissionais cá do burgo, tem tido o cuidado de avisar que não pertence a nenhum clube. Hoje vive à conta de perseguir Sócrates e os socialistas; amanhã, se mudar o vento e a corrente, sabe-se lá de onde é que virá aquilo com que compra os melões. É nisto, exactamente nisto e apenas nisto, que consiste o seu “liberalismo” – não no respeito pelo Estado de direito, não na defesa da liberdade. Para além do oportunismo rapace publicitado, et pour cause, dedica os seus dias ao vale tudo no vale tudo da política-espectáculo.

É o próprio quem não se cansa de expor o que faz e como o faz. Diz que passa os dias fechado em casa, procurando ter uma vida social reduzida ao mínimo inevitável, para que não estabeleça relações humanas positivas, construtivas, saudáveis com outros seres humanos. Aquilo a que alguns, há milénios, chamam relação de estima, de amizade ou de mera civilidade. Ele olha para essas manifestações gregárias com asco e pavor pois de imediato se imagina a perder dinheiro. Por cada “amigo” que fizer, calhando esse novo conhecimento ter potencial para ser alvo de uma presente ou futura pulhice, o caluniador profissional sabe que está a enfraquecer os seus serviços. Veja-se o caso recente da sua amiga Fátima Bonifácio, amizade que o encostou à parede obrigando à traição de ter de se juntar às críticas sob pena de danificar a sua marca. Logo depois, para compensar e mostrar aos amigos do Observador que continuava o bom soldado das mesmas lutas, teve de se enfiar de cabeça no chiqueiro das “culturas superiores”, uma borrada que passou a existir no arquivo do Público só para que JMT exiba cifradamente a bandeira do chauvinismo e do racismo onde o seu populismo mediático encontra audiências e pilim. Quão melhor, partilha ele connosco, poder gozar, insultar, ofender, achincalhar certas pessoas que pode tratar como animais. Aliás, como animais não, que esses não têm culpa de nada. Ele gosta mesmo é de tratar certas pessoas como monstros, e acusá-las de terem culpa de tudo.

Assim, o verdadeiro interesse da atenção à figura está na estrutura de poder – poder financeiro, poder mediático, poder político, poderes fácticos – onde é usado ao serviço de várias agendas. Começando pelo Público, nunca apareceu nenhum director ou accionista a explicar por que razão pagam a um colunista que espezinha o que o próprio órgão define ser a sua Ética e deontologia. Indo para o episódio em que António Costa ocupou parte do seu tempo como governante, e espaços interditos ao público que a República lhe confiou em ordem a exercer a função de primeiro-ministro, numa operação de promoção do caluniador profissional, feita à custa da participação forçada de quatro crianças, foi notável o silêncio cínico que se seguiu ao ponto mais baixo da carreira política do secretário-geral socialista, onde o vimos a ultrapassar a baixeza de ter colaborado com o CM. É que se entendia muito bem o que estava em causa nesta colagem ao caluniador profissional, e o regime e a sociedade aprovaram a inaudita perversidade. Passando para a participação de Mário Centeno numa edição do “Governo Sombra”, a aparente superficialidade da presença da vedeta (sem contágio socrático) do Governo e a diluição desse significado pelos diferentes protagonistas do programa deu ainda mais eficácia ao propósito de António Costa para usar um espaço de calúnias e sistemáticos ataques de baixa política contra o Governo e o PS. Finalmente, a entrega do 10 de Junho por Marcelo a alguém que ganha a vida a espalhar no espaço público a imagem de um País onde os deputados fazem leis com a intenção de permitir que os políticos sejam corruptos impunemente, alguém que enche os bolsos a perseguir inocentes com ataques à sua honra e ataques ao Estado de direito, só se explica pela vantagem percebida e assumida em enviar uma mensagem urbi et orbi: a Presidência da República tem os mesmos alvos políticos do portalegrense e está com igual expectativa a acompanhar um certo processo na Justiça que tanto entusiasmo gera no caluniador profissional e que é a força motriz da sua popularidade.

Marcelo, presente no lançamento do livro do fulano que utiliza uma altíssima honra de Estado para fins comerciais ainda os microfones colocados à sua frente no Dia de Portugal não arrefeceram por completo, diz que a inclusão de João Miguel Tavares no grupo onde já estavam João Caraça, Manuel Sobrinho Simões e Onésimo Teotónio Almeida, estando a caminho Tolentino de Mendonça, se justifica pelo tanto, e tão importante, que os une. Especificamente, diz que a “obra” do caluniador profissional equivale a “gritos de alma” que “temos todos a obrigação de não deixar enclausurar”.

O puro delírio na origem destas afirmações, o debochado insulto à nossa inteligência, aceita-se em Marcelo porque, mais uma vez, é claríssimo o que está em causa. O discurso não tem de ter como referente a realidade, sequer uma vaga representação da mesma, tem é de ser pragmático. Cumpre um papel mistificador e uma função sectária, é sofística clássica. O presidente das comemorações do 10 de Junho que, dias depois do número pícaro que galvanizou a direita decadente e ressabiada, estava a ir buscar o nazismo, o Holocausto, a pessoa de Adolf Eichmann e a reflexão de Hannah Arendt para insultar, ofender e caluniar Vítor Constâncio, mais um número indeterminado de cidadãos, não pode ficar enclausurado, debocha Marcelo, a democracia tem de ir em seu socorro para lhe dar um lugar na tribuna de honra. No fundo, para lhe comprarmos livros e outros artigos que ele tem para vender, pediu-nos o tal Presidente da República que se congratulou com o ribombante sucesso da Operação Plebeu.


Fonte do artigo aqui