O Pedrexit

Fonte: O Pedrexit

(In Blog O Jumento)

Depois do Grexit e do Brexit talvez não fosse má ideia discutir o nosso Pedroxit, a saída do traste político de Massamá que decidiu andar por aí armado em primeiro-ministro no exílio, com direito a bandeirinha, a um Zeca Mendonça a fazer de peão de brega e a entrevistas feitas por jornalistas que o olham com a condescendência dos guardas do Forte de Santo António olhavam para um Salazar que ate morrer estava convencido de que continuava a ser o presidente do Conselho. O ridículo da situação é tão grande que um dia destes o traste de Massamá ainda vai passar a visitar o D. Duarte todas as quintas-feiras par despachar os assuntos do reino.
O traste de Massamá está louco ao ponto de achar que de um dia para o outro deixa de andar sentado em cima de livros sobre Salazar para pousar o traseiro em obras da social-democracia europeia. Está louco ao ponto de pensar que Portugal volta a ter um resgate para que ele possa dar a segunda de mão no seu projecto de reformatação de um país, contra uma Constituição que ignorou, contra um povo a que chamou piegas, contra eleitores que enganou, contra jovens que forçou à emigração e contra quadros da Administração Pública que humilhou.
A dúvida em relação ao próximo Presidente da República não está em saber como se vai relacionar com o primeiro-ministro ou com os partidos que o apoiam. Deve ser bem mais interessante discutir o que quer que seja com uma Catarina Martins do que com personagens como o Marco António ou o outro gajo de Mação, faz mais sentido discutir o futuro da economia com alguém que pena como Jerónimo de Sousa do que com um político que achou que podia transformar um país europeu num tigre asiático sem ninguém dar por isso.
Alguém acredita que Marcelo Rebelo de Sousa achou que aquele nojo de moção do congresso do PSD onde se falava de um cata-vento não o visava? Como é que alguém como Marcelo vai ter paciência para aceitar uma personagem intelectualmente sofrível que um dia o apelidou de cata-vento? Marcelo nunca seria o au mandado de Passos que foi Passos Coelho e nunca o apoiaria da forma como foi apoiado.
É óbvio que a convivência de Marcelo com quem o ofendeu e humilhou sem a frontalidade de referir o seu nome vai ser bem mais difícil do que com os líderes dos partidos de esquerda. É óbvio que Passos Coelho não voltará a poder lançar um programa económico assente na escravatura parcial dos trabalhadores, nem sequer vai ter como parceiro de coligação um dócil comprador de submarinos. Pedro Passos Coelho só tem duas saídas, a porta das traseiras ou a porta do lado, já que perdeu a oportunidade de sair pela porá da frente quando ganhou as eleições.
Depois do Grexit e do Brexit vai ser a vez de se debater o Pedrexit e se o Trsipas continuará a ser primeiro-ministro, o Reino Unido ficará onde os britânicos quiserem todos sabemos que por cá vai ocorrer o Pedrexit, a dúvida está em saber como e quando, já que o rapaz passou-se e esta convencido de que um dia destes regressa a São Bento. É uma questão de tempo para que muitos do que hoje o apoiam percebam que Passos Coelho não passa de um activo tóxico da direita e a única saída é um Pedrexit.

A fuga de capitais como instrumento da conquista moderna

(José Vítor Malheiros, in Público, 28/07/2015)

José Vítor Malheiros

  José Vítor Malheiros

A corrida aos depósitos bancários, que a União Europeia incentivou na Grécia, é apenas mais uma arma da guerra europeia.


1. Mesmo sem saber tudo, temos hoje uma boa ideia do ambiente das negociações que levaram ao terceiro empréstimo da troika à Grécia e dos argumentos que estiveram em cima da mesa. Sabemos que a discussão não foi uma civilizada troca de argumentos mas uma operação de coacção à boa maneira mafiosa, com a reiterada exposição de um catálogo de ameaças feitas à Grécia pelos “parceiros”.

Sabemos que a negociação não foi um jogo de cedências mútuas, mas algo que um dos participantes comparou a uma sessão de tortura. E sabemos, explicadas por Tsipras, as razões fundamentais que fizeram com que o primeiro-ministro grego não desse o famoso murro na mesa e batesse com a porta, mas acabasse por dizer “nai” às propostas a que uma significativa maioria de gregos tinha acabado de gritar “oxi” nas ruas e nas urnas. Antes de mais, o mandato: Tsipras acha que não tinha mandato para bater com a porta porque os gregos, maioritariamente, num exemplo de distorção cognitiva que ficará para a história, não querem sair do euro. Depois, a realidade: a Grécia não tinha (não tem) nem euros nem moeda estrangeira que permitisse criar uma almofada, por mínima que fosse, para garantir as necessárias compras ao estrangeiro.

Mas há uma outra razão, de não menor peso, que foi referida por Tsipras mas pouco aparece na imprensa internacional: a fuga de capitais da Grécia nos últimos cinco anos, que está calculada em 250 mil milhões de euros. O problema não é só o facto de o dinheiro não estar nos bancos gregos e não poder alimentar o investimento de que a Grécia precisa. O problema é que, num cenário de saída do euro e violenta desvalorização de uma futura moeda grega – há estimativas de 50% – este capital poderia regressar em força à Grécia para comprar tudo o que tivesse valor e adquirir, no cenário de escassez e confusão que ocorreria nos primeiros meses do Grexit, uma influência desmesurada, equivalente à que 500 mil milhões de euros poderiam conferir hoje. Uma invasão não pelo ar nem pelo mar nem por terra mas “por euro”.

Esta particular fuga de capitais – não apenas a preocupação dos detentores do capital em pô-lo a bom recato para evitar uma eventual desvalorização ou mesmo o seu confisco, mas o seu estacionamento num porto de abrigo para regressar com força redobrada para pilhar o que estiver à mão — é algo a ter em conta. Devido a este fenómeno, uma saída do euro pode ter como consequência um movimento de brutal concentração do capital nas mãos das pessoas que tenham a capacidade para o exportar previamente.

2. A fuga de capitais da Grécia não é um normal fruto da crise do euro. Ao contrário, ela foi activamente estimulada ao longo dos últimos meses (desde a eleição do Syriza) e mesmo antes (desde o crescimento do Syriza) por uma campanha internacional orquestrada que tentou espalhar o medo entre os pequenos e grandes depositantes e investidores convencendo-os de que as suas poupanças e investimentos não estariam seguros numa Grécia governada à esquerda. Basta reler as declarações nas últimas semanas de dirigentes da UE, políticos europeus de todos os costados e analistas diversos, constantemente “alertando” para a possibilidade, conveniência ou inevitabilidade de o governo grego impor um controlo de capitais para perceber a mensagem subliminar.
Há um interessante artigo publicado no site do think-tank americano Peterson Institute for International Economics antes das eleições gregas de Junho de 2012, onde a direita receava um descalabro dos partidos tradicionais e uma enorme subida do Syriza, que tem como título, para quem não queira perceber: “How a Bank Run Can Be Part of the Solution” (“Como uma corrida aos bancos pode ser parte da solução”)

Aí se escreve, preto no branco: “Qualquer pessoa que queira manter a Grécia no euro deve retirar o seu dinheiro dos bancos. Ainda que os políticos que são a favor do programa do FMI provavelmente vão ficar calados, o PASOK e a Nova Democracia deviam de facto encorajar a corrida aos bancos. Podiam, por exemplo, publicar no YouTube as imagens das filas às portas dos bancos para tornar a mensagem mais clara!”

E, mais à frente: “O exemplo da Grécia ilustrou um novo factor: o facto de a ameaça de uma corrida aos bancos acontecer em qualquer país que esteja a considerar sair do euro actua como o equivalente de um ataque nuclear preventivo sobre as forças políticas que defendam essa saída. Devido ao exemplo grego, os populistas em toda a zona euro acordaram para uma nova realidade política: serão acusados de uma destruidora corrida aos depósitos se prosseguirem as suas estratégias de saída do euro.”

O autor deste texto, Jacob Funk Kirkegaard, que esteve em Portugal numa conferência que teve lugar na Assembleia da República sobre dívida pública em Dezembro de 2014, é particularmente brutal, mas declarações deste tipo, às vezes suavizadas por um verniz pseudo-democrático, foram feitas a partir de Bruxelas centenas de vezes nos últimos meses por políticos de diversos quadrantes.

A zona euro são 19. Se a Grécia sai ficam… 6?

(Pedro Santos Guerreiro, in Expresso Diário, 22/07/2015)

Pedro Santos Guerreiro

                   Pedro Santos Guerreiro

(Nota: Este texto é interessante. O autor não quer acreditar que Portugal e Espanha tenham querido dificultar as negociações com a Grécia por calculismo político, querendo evitar as consequências, que um eventual sucesso da Grécia nas negociações, teria nos futuros atos eleitorais nesses países, porque isso seria sadismo. Não querer acreditar é um direito legítimo de qualquer um, porque para acreditar é preciso fé. Nesse sentido, verbera mais Juncker por ter dito a verdade do que Passos ou Rajoy por terem feito o que fizeram e por serem o que são, nas palavras do autor, sádicos. Com o enviesamento propagandístico que tem vindo a acentuar-se na linha editorial do Expresso, só me resta perguntar, parafraseando Júlio César: “Também tu, Pedro Santos Guerreiro?” – Estátua de Sal.)

A sucessão de reuniões de Eurogrupo, de cimeiras, de rondas de negociações, de encontros bilateriais, de fugas de informação e de declarações oficiais de responsáveis europeus revelou como a Europa está partida dentro das próprias instituições feitas para garantir a união. As declarações e desmentidos de hoje entre Juncker e Passos Coelho (apoiado por Cavaco) sobre a Grécia são apenas mais um reflexo dessa falha que se aprofunda. E que não prenuncia nada de bom.

Não é normal que o presidente da Comissão Europeia venha revelar quem se opunha e quem favoreceu determinadas negociações. Nem é normal que isso provoque uma reação de desmentido, ainda que educado, do chefe de Governo e do chefe de Estado de um país. Mas foi o que aconteceu ainda hoje. Em entrevista ao jornal belga Le Soir, Jean-Claude Juncker afirmou que “Irlanda, Portugal e Espanha não queriam [uma renegociação da dívida grega] antes das eleições e ficaram irritados comigo”. Já vamos ao conteúdo. Porque na forma nada disto faz sentido. Juncker quer tanto ficar na história como salvador das negociações (ou mesmo da Grécia…) que colocou a importância do seu ego acima da importância do seu cargo.

As feridas estão abertas mesmo dentro dos países, como se vê pelo caso do governo alemão, em que segundo a imprensa local se quebrou uma aliança que havia sido esteio da governação não só externa mas sobretudo interna: a aliança entre a chanceler e o seu ministro das Finanças. Angela Merkel defendeu um acordo com a Grécia, ao passo que Wolfgang Schäuble queria pura e simplesmente promover a saída do euro do país governado por Alexis Tsipras. Como escreveu o Spiegel, o afastamento gerou ressentimento na Alemanha e mal-estar com a França, que pode ter pedido uma governação a seis países nem sequer para eliminar os demais países mas para criar oposição institucionalizada à Alemanha.

A posição portuguesa conta relativamente pouco, não apenas pelo peso específico negocial mas também pela forma apascentada que nos últimos anos assumimos perante os poderosos da Europa. Dizê-lo não é sequer um juízo de valor, é uma observação. Juízo de valor é condenar o governo português por ter querido condenar a Grécia, o que foi sendo indisfarçável ao longo dos últimos meses e sobretudo das últimas semanas. Triste mas indisfarçável. E mais triste ainda se admitirmos que houve cálculo eleitoral nesse desejo. Se o governo espanhol queria que o Syriza fracassasse para dissuadir o voto no Podemos, queria o governo português o desastre na Grécia para valorizar o seu trabalho em Portugal? Não é sequer imaginável imaginar que isso pode ser verdade. Mais que calculismo, seria sadismo. Mas é o próprio Juncker que assume (as palavras são dele) o interesse eleitoral nacional como critério de gestão da negociação com a Grécia.

Pior que a falha diplomática de Juncker nas palavras de hoje é a falha tectónica entre países a favor e contra o acordo com a Grécia, que esta declaração de Juncker talvez involuntariamente até agrave. A gestão da crise mostrou a dificuldade de governo interno nas próprias instituições, que reclamam uma espécie de comité executivo menor e, portanto, mais ágil no debate e na decisão.

O problema não é o tamanho, é a representação. Se for para cristalizar o poder dos países poderosos sobre os países mais pequenos ou fragilizados, então subvertemos totalmente o processo de construção europeia, promovendo nem sequer uma federalização mas uma colonização política através de órgãos que nem sequer são eleitos pelos povos mas que dominarão as decisões que moldam as suas vidas.

É nisto que vamos acabar?