A importância do adjunto Pinheiro para os destinos da nação

(Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 05/05/2023)

Miguel Sousa Tavares

Podia ao menos chamar-se Carvalho ou Faia, essas árvores majestosas do Norte; ou Sobreiro ou Azinheira, as do Alentejo, que não ardem; ou Oliveira, que resiste a tudo e vive eternamente; ou Alfarrobeira ou Figueira, árvores do Algarve, que dão sombra e frutos e não roubam água, como os queridos abacateiros da ministra da Agricultura. Mas, não, o homem chama-se Pinheiro e, seguramente, da espécie pinheiro-bravo, que não dá sombra nem pinhas mas serve para incendiar a terra, furtar o computador de serviço, espancar as colegas e atirar a bicicleta contra as janelas do Ministério. O ajunto Pinheiro conseguiu a proeza de preencher o vazio dos noticiários num longo fim-de-semana de praia, desassossegar as miniférias do primeiro-ministro na Toscana, deixar a oposição a babar-se de excitação com mais um episódio determinante para o futuro da TAP e pôr o Presidente, que disserta nas feiras sobre a dissolução do Parlamento e do Governo, a declarar que desta vez “o tema é tão particularmente sensível que não pode ser tratado na praça pública”. E, ao longo de toda uma terça-feira que parecia condenada à monotonia habitual — isto é, a seguir à CPI à TAP —, o adjunto Pinheiro tornou-se a figura central da nação, congregando em si mesmo todo o regular funcionamento das instituições democráticas, levando tudo atrás de si, qual onda canhão da Nazaré: o ministro, o SIS, a sobrevivência do Governo, a relação do PM com o PR e até as boas notícias da economia — que, como explicou o Presidente, não têm nada a ver com a boa governação. Assim como nada disto, obviamente, tem a ver com a TAP. Porque tudo isto, não sei se se lembram, acontece a propósito da TAP.

Mas, deixando de lado o humor e o avassalador ridículo do assunto, eu vou contrariar aquilo que o PM classificou, e acertadamente, como a unanimidade dos comentadores e 99% dos portugueses: eu gostei de ouvir as explicações de António Costa para recusar a demissão de João Galamba. E, partindo do princípio de que elas são verdadeiras e sérias, não vejo que, como ele sustentou, a pressão mediática ou popular se devesse sobrepor à sua consciência pessoal. Acho, aliás, eloquente do clima que se vive que, depois de ele as ter apresentado, ninguém se tenha detido a analisar, contrariar, confrontar com outros factos as suas razões, preferindo reduzir tudo a uma guerra de palácios ou a uma jogada táctica de prazos e oportunidades eleitorais. Claro que não o acompanho nos elogios à competência profissional e política do ministro Galamba, que, com muitos outros que fazem parte do Governo, vejo apenas como o refugo do PS. Pensar que, depois de Pedro Nuno Santos e Hugo Mendes, o futuro da TAP, da CP e do novo aeroporto de Lisboa está confiado a João Galamba, claro, deixa-me derrotado. Mas é o que temos, é o que somos, é, seguramente, o que merecemos!

<span class="creditofoto">ILUSTRAÇÃO HUGO PINTO</span>
ILUSTRAÇÃO HUGO PINTO

Os “politólogos”, que sabem destas coisas, encarregar-se-ão de explicar nas suas horas vagas o mistério do absoluto desastre que tem sido o segundo Governo de Costa, um ano e meio desperdiçado em coisa alguma, com uma absoluta alergia a mudar o que quer que seja, sentados sobre uma montanha de impostos saqueados ao país que ainda trabalha e produz e apostados em fazer do Chega o seu principal cabeça de cartaz. Mas não precisaremos dos “politólogos” nem do Marques Mendes (que a tal não se atreveria) para explicar igualmente o que tem sido o previsível patético segundo mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. No primeiro tirou partido da sua popularidade mediática para subjugar o populismo da rua, o que foi inteligente e louvável. E, para glória própria, correu a fazer-se receber pelos grandes do planeta Terra, ainda que pouco recomendáveis, mas enquanto estivessem vivos e em funções: a Rainha de Inglaterra, o Rei de Espanha, o Trump, o Bolsonaro, o Presidente de Angola e todos os dos “palopes”, o Xi Jinping… you name it. Foi a todo o lado, desde a Padaria Portuguesa até à Ovibeja. Discursou, disse coisas bonitas aqui e ali, citou poe­tas, namorou os “agentes culturais”, abraçou sem fim as forças vivas do Minho às Selvagens, invadiu os balneários da Selecção Nacional, condecorou sem descanso e fez-se reeleger sem espinhas — para um segundo mandato onde, então, vem demonstrando não conseguir apagar a sua anterior e eterna pele: a de conspirador.

Contra os factos arrolados por Costa para não demitir o ministro, Marcelo veio contrapor a “percepção pública” — um Presidente e professor de Direito a defender a justiça popular contra a justiça fundada em factos?

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Marcelo, que não conseguiu consumar a sua ambição de governar Portugal, tem uma profunda dor de cotovelo em relação a António Costa, pela maneira subtil como ele chegou lá, como pôs a extrema-esquerda ao seu serviço e depois a dispensou, como alcançou uma impensável maioria absoluta, como geriu a crise bancária e a covid, como reduziu à impotência três presidentes do PSD… E, mesmo agora, que tanto lhe apetece dissolver a Assembleia e despachar Costa, Marcelo tem pela frente um chefe de Governo que apresenta este ano a maior redução do défice público, a maior queda da inflação e o maior crescimento económico entre os 27 da União Europeia.

Apesar dos infatigáveis disparates e das deploráveis cenas do pessoal político do Governo de Costa, apesar da total falta de vocação do PM para ousar navegar em mares nunca antes navegados, a nau de Costa mantém-se a navegar, enquanto com Marcelo ao leme naufragaria rapidamente, minada por intrigas, revoltas na coberta e no porão e humores instáveis do capitão. Se fizesse parte deste Governo, Marcelo Rebelo de Sousa, versão segundo mandato, estaria ao nível dos seus piores ministros e dos seus melhores troublemakers.

Admite-se que o Presidente da República, ainda antes de o PM acabar de falar, publique uma nota a dizer que discorda do que ele está a dizer? Encenada ou não a cena da demissão de Galamba, António Costa apresentou razões fundadas para a recusar. E, contra os factos arrolados por Costa para não demitir o ministro, Marcelo veio contrapor a “percepção pública” — um Presidente e professor de Direito a defender a justiça popular contra a justiça fundada em factos? E, agora, o que fará Marcelo, quando confunde os seus desejos e a sua incontinência com os nossos desejos e a nossa vontade? Se ele, obviamente turvado na sua lucidez e nos seus deveres constitucionais, caminhar para a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições, e se António Costa voltar a ganhar, com maioria absoluta ou simples, só resta a Marcelo uma saída digna: demitir-se no dia seguinte às eleições e dar entrada num mosteiro.

2 Anteontem fui ao enterro do meu compadre José Afonso Muchacho, em Lagos. Conhecemo-nos tinha eu 11 anos e ele 25, na tão fotografada praia D. Ana, a praia da minha infância, que virou cartaz turístico do Algarve e chegou a ser considerada a mais bonita do mundo pela “Condé Nast Traveler”, antes de a sua sobrelotação ter inspirado as inteligências locais a uma operação de alargamento com injecção de areia que para sempre a desvirtuou e prostituiu. Mas, antes disso, quando tudo aquilo era um paraíso, o Zé Afonso vinha buscar-me à praia ao final das tardes e embarcávamos na sua chata à vela de três metros para passarmos a noite inteira à pesca à lula ao largo da Ponta da Piedade, onde hoje a Sonae constrói duas torres de nove andares e a Câmara Municipal promete “sustentabilidade”. Então, porém, éramos apenas um jovem adulto e um miúdo, sozinhos no mar e num céu de estrelas, a partilhar um escabeche de peixe, repetindo o monótono gesto de recolher a toneira com a lula a bordo, enquanto eu escutava fascinado as histórias das suas campanhas ao bacalhau nos bancos da Terra Nova e, por vezes, adormecia sentado no banco, de cansaço ou embriagado pelo cheiro do petromax, de que até hoje guardo uma infinita saudade. Ele fez-me padrinho de baptismo da sua filha e, por isso, e para sempre, tratou-me e tratámo-nos por compadre — essa palavra tão bonita e tantas vezes mal empregue.

Agora, que passou um ano que, após longa e ponderada meditação, resolvi trazer os meus livros, os meus quadros, as minhas memórias e os meus olhos para o Algarve, agora que vejo Portugal inteiro nas minhas costas e todo o mar em frente, eu escolheria como comadre, se ela me desse esse privilégio, a Noélia. Porque ela me dá o mesmo que o meu compadre Zé Afonso me deu: descoberta, generosidade, partilha. Outros conhecem-na pela fantástica cozinheira (ou chef, se preferirem) que ela é; eu conheço-a por mais do que isso, pelo sorriso quando olha para mim e me vê sair dali, em Dezembro, Fevereiro ou Março, deliciado e feliz com uma coisa tão aparentemente simples e todavia tão sumptuosa como um grande jantar. Sério, inspirado, genuíno. E sonho que um dia hei-de morrer assim, depois de jantar na Noélia e a seguir me sentar à noite no terraço de casa, vendo as estrelas sobre o mar, onde, era eu miú­do e a Terra Nova estava tão longe, adormecia a pescar lulas na “Senhora do Mar”, do meu compadre Zé Afonso.

Nota: Este artigo foi escrito antes da comunicação ao país do Presidente da República.

Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia


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Afinal, saiu a mãe de todas as remodelações

(Por Valupi, in AspirinaB, 03/05/2023)

(Não é que o Costa seja flor que se cheire mas até quanto aos odores há uma escala de agradabilidade. E se o que aconteceu ontem tivesse sido um combate de boxe entre o Costa e o beijoqueiro-mor do reino, só poderíamos dizer que, quanto ao resultado do prélio, Costa levou Marcelo ao tapete por KO.

Estátua de Sal, 03/05/2023)


No conjunto das pressões para a demissão de Galamba, a mais importante veio do aparelho do PS e demais figuras socialistas de referência. Carlos César agiu como lobista de Marcelo ao vir no domingo dar como fatal uma remodelação que seria alargada a outros nomes. Era a consequência do tal telefonema de sábado onde um Presidente da República tinha exigido a um primeiro-ministro que abdicasse da sua autoridade, do seu mandato popular, para se sujeitar a repetida perversão da Constituição. Para o César, estava tudo bem, era fazível em ordem a comprar mais tempo a Belém. Que se fodesse o Galamba do brinco, ou lá o que é, na orelha.

Por ser assim, foram os socialistas os que mais se espantaram com a decisão de António Costa na recusa de ceder à chantagem de Marcelo Rebelo de Sousa. Para a direita também houve surpresa e choque, mas foram instantaneamente substituídos por raiva e ódio. Nos socialistas o espanto permaneceu como embriaguez. Estavam a assistir ao nascimento de um líder que não conheciam apesar do tanto que conhecem, e gostam, no actual secretário-geral do PS. Este mostrava uma competência nova, quiçá mais imprevista do que a da formação de um Governo minoritário com o apoio do PCP e BE numa legislatura onde uma aliança da direita teve mais votos e mais deputados do que o PS. Consiste em ter cortado o nó górdio que uma oposição decadente alimentada por um Chefe de Estado disfuncional impuseram como quotidiano político. Não se concebe remodelação mais valiosa na política nacional.

Daí a demissão de Galamba, apenas a condição para a sua retomada de posse. O primeiro-ministro iliba o seu ministro e convida a matilha a persegui-lo a ele, o líder. Caso não tivesse pedido a demissão, o ministro das Infraestruturas estaria diminuído na sua capacidade política. Feita, recuperou o estatuto de membro do Governo na plenitude da sua autoridade — ou melhor, com autoridade reforçada. O efeito regenerador estende-se a todo o elenco governativo. A maioria absoluta conquistada em Janeiro de 2022 poderá ter conhecido a 2 de Maio de 2023 o verdadeiro início do seu ciclo.

E se a dissolução da Assembleia ocorrer dentro de dias, semanas ou meses? É indiferente. O que não depende de nós não nos responsabiliza. É o que fazemos com a nossa liberdade que nos define. António Costa, ontem, definiu-se como um líder digno do legado histórico e combativo de Mário Soares. E com isso o PS continua a ser o esteio da democracia portuguesa.


Fonte aqui


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Sr. Primeiro-ministro, será isto uma conspiração?

(Hugo Dionísio, in Facebook, 18/04/2023)

Tivesse eu a capacidade de sujeitar o Primeiro-ministro António Costa a perguntas e, entre muitas outras questões, colocar-lhe-ia, desde logo, as seguintes:

Face às últimas revelações relativas aos documentos do Pentágono, o que tem ele a dizer sobre o facto de um dos nossos principais aliados vigiar, escutar e monitorizar os órgãos de soberania de países seus aliados? Será isto compatível com uma relação transparente, alicerçada na confiança mútua, na cooperação e na partilha de valores? Será aceitável, em democracia, um estado arrogar-se do direito de vigiar os outros, para que possa saber o que pensam na sua intimidade? Como é possível confiar num aliado destes?

Face às últimas revelações de Elon Musk, numa entrevista à comunicação social, em que revela – e provou documentalmente através dos Twitter files – que os serviços de segurança e vigilância dos EUA praticam uma vigilância intrusiva que abrange todos os utilizadores, americanos e não americanos, utilizando as redes sociais americanas para o efeito; que medidas está o governo a tomar para proteger o direito à privacidade e o direito a opormo-nos à sujeição e à vigilância por parte de regimes políticos estrangeiros?

Não considera o senhor Primeiro-ministro que a vigilância dos nossos cidadãos, por parte de uma potência estrangeira, mesmo que aliada, para além da violação constitucional em matéria de direitos de personalidade, representa também um ataque direto à nossa soberania nacional? Como avalia, no quadro de um sistema democrático, a vigilância absoluta – de metadados e dados pessoais -, de todos os utilizadores das redes sociais?

Tenho a certeza de que o máximo que obteria destas perguntas seria uma rotunda e genérica remissão para: “a União Europeia está a trabalhar no sentido de acautelar possíveis violações desse tipo”… A União Europeia…. Pois. Aquela organização cujos emissários vão ao Sul Global repetir – ipsis verbis – os discursos da Casa Branca.

A divulgação dos documentos do Pentágono, por Jack Teixeira, demonstra em si todo o jogo que está em andamento. A narrativa substitui a realidade. A realidade é uma, a leitura que os EUA fazem da realidade é outra, a informação que proporcionam aos seus “aliados” é ainda outra e, a informação que providenciam à comunicação social que dominam completamente, é o inverso da realidade que constatam. Ouçam uma qualquer TV a referir-se a assuntos de interesse dos EUA – o que é difícil de separar dos demais -, interpretem tudo ao contrário e… ficarão muito mais próximos da realidade.

E a metodologia funciona tão bem que, aplicada aos documentos vazados, atinge a perfeição: a imprensa do regime e alinhada com o regime corrupto de Zelensky consegue fazer um circo enorme em torno dos documentos; mostra a detenção do delator; discute porque o fez ou não fez; refletem horas sobre como o fez… Agora, pense-se… No meio disto tudo, o que é que eles não dizem? Sobre o que é que não falam? O que é que não escrutinam? O conteúdo!

Querem um exemplo paradigmático do que é, na era do capitalismo de vigilância, o papel da comunicação social? Aqui está um exemplo concreto: desviar as atenções, encaminhando-as para onde não causam problemas, ou para onde pretende a propaganda do regime. Neste caso, não falaram das mentiras sobre a guerra, nada referem sobre a vigilância a que os EUA sujeitam os seus principais aliados, nem uma palavra sobre a contratação do New York Times e do Wall Street Journal, para que dominassem a narrativa e “ajudassem” a apanhar o delator, nem uma palavra sobre a informação que os EUA escondem dos seus aliados… Enfim… Tudo o que importaria discutir, no quadro de um regime que se diz democrático… Nada. Fossem estas revelações sobre a Rússia ou a China, e estaríamos já na 3ª guerra mundial de tipo “quente”.

Guerra que já começou! Se estas revelações nos comprovam algo – não nos trazem nada que não tivéssemos tantas vezes deduzido a partir da própria prática dos factos -, é que o nosso país e a Europa, em geral, se encontram amordaçados por um aliado que domina a informação, o discurso e o pensamento. E quando alguém não aceita, praticam atos de assédio e violência moral. No caso do Chipre, Hungria e outros, chega-se mesmo à coerção física, com a sujeição a sanções – sanções aos próprios aliados -, caso resistam a entregar armas à Ucrânia. Contudo, para fora, está tudo muito unido. Tão unido como em qualquer ditadura esquizofrénica e paranoica: à custa da repressão, da chantagem e do medo!

Tal é o horror à liberdade dos povos, à autodeterminação, à independência e autonomia, que basta ouvir um qualquer comentador na CNN ou Fox, para ouvirmos coisas como “ajudámos Lula da Silva e agora une-se à China”; “apoiámos o México e agora unem-se à China”; “suportamos a Europa, e Macron une-se à China”. Ou seja, não valendo aqui a pena, sequer, discutir o que entendem por “ajudar”, “apoiar” ou “suportar”, penso que todos ficamos a entender como esta gente olha para o mundo, considerando-o como algo que é seu, por um qualquer direito natural, que consigo identificar, mas cuja legitimidade me escapa.

E, com as informações que vamos obtendo, aqui e ali, sobre o estado paranoico, bipolar e esquizofrénico da elite neoliberal e neoconservadora e seus capachos, conclui-se que existe um tema que faz esta gente entrar em colapso nervoso. A China. Julgo mesmo que, a China, por variadas razões, os coloca em maior colapso e histeria, do que os colocava a URSS. Ao contrário da superpotência soviética, a China joga no mesmo campo e não num campo paralelo. E joga mais alto.

Por exemplo, em África, o papel da China, na elevação das condições de vida e desenvolvimento, tem sido tal, que com eles, a autoestima e amor-próprio voltaram a nascer. Passou a ser uma comédia diária assistir aos enviados “especiais” do Ocidente serem enxovalhados, envergonhados e desmentidos, presencialmente, olhos nos olhos, por quem eles achavam ser de uma categoria inferior. Por quem eles achavam poder comprar com umas meras missangas. A tal ponto que Kamala Harris, num discurso vazio de propostas concretas, promete 100 milhões de dólares de investimento para três países. Depois dos biliões investidos em infraestruturas vitais que representam a grande oportunidade de África se desenvolver, a resposta só pôde ser uma: agora trouxeram as missangas, quando é que trazem o ouro?

E tal é a psicose, a identificação de inimigos no revirar das pedras – típica de certos tipos de regime – que esta matéria me leva a outra questão, a qual gostaria de ver respondida pelo senhor Primeiro-ministro António Costa:

Está de acordo com o desacoplamento da nossa economia em relação à chinesa? O que está a ser preparado para substituir a mais do que previsível separação entre a economia chinesa e europeia, sob as ordens da Casa Branca? Vai perguntar ao povo português, se, tal como sucedeu com a economia russa, está preparado para prescindir de um dos maiores investidores e parceiros comerciais? Vai perguntar ao povo português se vai querer enviar milhões de euros em armas para “ajudar” Taiwan? O povo português vai ser consultado sobre a guerra em que entraremos, necessariamente e por ordem da Casa Branca, com a China, nomeadamente em Taiwan?

Ó senhor Primeiro-ministro, não me diga que não sabe que, nos dias de hoje, nos EUA, só se fala em guerra com a China, e no “dever” que os europeus têm de ajudar o sempre disponível e solidário aliado americano. Não me diga que ainda não constatou que a Europa não tem vontade própria e que faz tudo, em dobro, desde que venha da Casa Branca!

Não me diga que não sabe que Taiwan é o “all-in” no jogo de Washington. Se a Ucrânia era uma manobra tática para desviar recursos, Taiwan é o tudo ou nada. E não me diga que não sabe que, um conflito deste tipo, envolvendo – como sempre – o “nosso” principal aliado atlântico, não deixará de produzir roturas profundas, nomeadamente como os nossos povos irmãos, como o brasileiro, angolano ou moçambicano, que não se reveem e se afastarão, como o diabo foge da cruz, deste conflito.

Quando vierem as mentiras sobre invasões, genocídios, ameaças e ingerências que os outros não praticaram; quando vierem as narrativas, ainda mais aterrorizantes e desumanizadoras; quando todos estiverem instilados pelo ódio e pelo medo, pela paranoia e histeria; quando não for permitido pensar diferente e tudo for censurado, do Tik-Tok à CGTN… Como sucedeu agora com a Rússia…

Senhor Primeiro-ministro? Ainda vai dizer que vivemos em democracia?

Como eu gostaria que dissesse e me fizesse acreditar, pelo exemplo da retidão e da luta justa, que estes meus receios são apenas devaneios dos teóricos da conspiração.

Será isto a uma conspiração, Senhor Primeiro-ministro?


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