É a economia, idiota!

(Publicado por Foicebook, 26/08/2022)

Ouvir comentadores e noticiários seria divertido se estivéssemos noutro planeta. Aqui é quase masoquismo, um banho de idiotice sem sentido que deve tomado rapidamente para não fazer mal à saúde mental. O mais que pode esperar é de quem dá uma no cravo, duas na ferradura, para não ser objeto da censura da “liberdade de informação”.

No campo do anedótico recordo aquela senhora que muito excitada afirmava: “a Rússia é capitalismo de Estado, a China é capitalismo de Estado, a União Soviética era capitalismo de Estado!”. Ó minha senhora, ninguém lhe disse que “capitalismo (monopolista) de Estado” é o que os seus confrades dizem ser “os anos de ouro” do capitalismo”!

Outra senhora, com ar dramático, mas assertivo, dizia que a Rússia não pode vencer, seria a derrota do mundo livre, perdermos a nossa liberdade, é preciso fazer sacrifícios (para vencer), etc. A pergunta (que Marx recomendava) é: “quem” ou “para quem”.

Sacrifícios? Os oligarcas do grande capital e grande distribuição, nem sequer admitem um imposto transitório (!) sobre os lucros excessivos extraordinários. Como se para o grande capital, houvesse alguma vez “lucros excessivos”… Será um oximoro ou um pleonasmo?

A primeira questão é: como pensam políticos, comentadores, etc., vencer a Rússia. Teriam que o dizer, porque o que têm feito até agora só nos tem prejudicado. Será que “desnazificar e desmilitarizar a Ucrânia” significa que os “russos” vão assentar arraiais junto ao Tejo? Terá a Rússia recusado algum Tratado de segurança mútua proposto pela pela NATO? Ou foi o contrário no final de 2021?

Quanto ao mundo livre (o “ocidente”) a ser defendido na Ucrânia, temos bons exemplos como foi defendido na Líbia, Afeganistão, Iraque, ex-Jugoslávia, em África (o continente da fome e das transnacionais) América Latina (das prisões políticas, tortura e “desaparecimentos”), na Indonésia, etc.

Para além da verborreia a roçar a idiotice – ou pior – há uma lei económica, que não vem nos livros de economia neoliberal: “o poder do frigorífico é diretamente proporcional ao poder da televisão”. Ou seja, frigorífico vazio, propaganda da TV a tender para zero.

O BCE, afunda-se nas areias movediças do seu neoliberalismo, não controla a inflação que caminha para os 10% – em junho na zona euro, 8,9%. Os juros sobem levando à retração da economia, o que resta da classe média é destruído, os países mergulham na estagflação.

Mas os salários não podem aumentar porque isso causa inflação – assim disseram, assim fazem! Contudo não falta dinheiro nem armas para o protetorado da NATO chamado Ucrânia. Um ministro foi de Lisboa a Kiev entregar 250 milhões de euros… que não causam inflação.

Na UE/NATO “já se catapultaram para a estratosfera da irracionalidade: a desnazificação e a desmilitarização de facto do exército imperial terceirizado na Ucrânia está levando os manipuladores do Império e seus vassalos literalmente à loucura” (Pepe Escobar).

Graças às sanções que iriam derrotar a Rússia em semanas e colocar no Kremlin outro Yeltsin (Navalny, por exemplo!) acabou a energia barata na UE, fundamental para o seu desempenho económico. Um gasoduto na UE está parado, outro funciona a uns 40% da capacidade, o preço do gás por 1000 m3 aumentou 30% num mês, atingindo 3 300 dólares. Todas as soluções alternativas repetidamente anunciadas terão custos astronómicos e prazos de realização de que não se fala, nem se sabe de qualquer plano estruturado as realizar. As consequências para o nível de vida, indústrias, competitividade na UE/NATO são dramáticas. Porém, não deixam de clamar: “Delenda est Moscovo”.

Graças às sanções a economia russa porta-se bem. Segundo a Reuters, citando documentos do Ministério da Economia alemão, as receitas orçamentais russas com exportações de energia crescerão 38% em 2022. Por outro lado, a substituição de importações foi menos difícil do que o esperado graças ao apoio da China, Índia, países da América do Sul, Ásia, África; muitos produtos ocidentais foram substituídos sem problemas e o rublo é a moeda com melhor desempenho em 2022.

A situação nos EUA não é tão má quanto na UE, mas a recessão na UE terá obviamente consequências negativas para os EUA, que têm de sustentar o que resta da Ucrânia, o seu exército, fornecer armas, pagar a mercenários, inteligência, etc. Os EUA desde janeiro 2021 entregaram à Ucrânia só em armas 13,5 mil milhões de dólares, agora mais um pacote de 2,8 mil milhões. Que raio fazem os ucranianos às armas que lhes dão?!

Entretanto o endividamento dos EUA cresce sem cessar, para o Estado, cidadãos e empresas. Mas à finança apenas lhe interessa receber juros. O FED lá está para lhes fornecer “quantitative easing”…

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3 pensamentos sobre “É a economia, idiota!

  1. Subscrevo este texto por inteiro. Muito bem.

    Porque raio é que Portugal aplica sanções (ILEGAIS e tiro no pé) à Rússia?
    Mesmo que tudo o que dizem na propaganda pró-Nazi/NATO fosse verdade (e não é), nada justifica esta guerra económica contra o povo Russo. Aliás, contra todos os povos da EAEU, do Afeganistão, Síria, Venezuela, Irão, Cuba, etc. Que mal é que estes povos fizeram a outros povos? AInda por cima sanções aplicadas por quem não aplica uma única contra os EUA. É o cúmulo da hipocrisia do Ocidente. As sanções (querer matar um povo à fome, para o convencer a colocar no poder o “nosso” vassalo) metem-me nojo.

    Mas como todas as regras merece excepção, eu abriria uma excepção, caso as sanções fossem aprovadas por esmagadora maioria (digamos 90% da população Mundial) numa Assembleia Geral da ONU, contra o regime criminoso imperialista dos EUA, o invasor ultra-NaZionalista da Ucrânia, ou contra o genocida Apartheid de Israel. Porque aí sim seriam sanções legais, coerentes, e contra povos que fazem mal a outros povos. Aí sim é onde têm de ocorrer as mudanças de regime de forma a parar guerras, e a defender a vida de outros povos.

    E peço tremenda desculpa àqueles de quem não me lembrei. O Mundo está cheio de injustiças e violência, e infelizmente nem mesmo alguém como eu, que procura saber o mais possível sobre todos os pontos do globo, consegue saber de tudo.
    E depois há aqueles discutíveis, como o conflito Kosovo-Sérvia. Quem é o mau agora? A Sérvia que não reconhece o Direito Humano à Autodeterminação do povo Kosovar (de maioria Albanesa), ou os Kosovares que estão prestes a roubar a liberdade de circulação à minoria de etnia Sérvia nessa região, provavelmente a pedido da NATO para também aí provocar mais um conflito que “justifique” a NATO a meter o bedelho contra mais um aliado da Rússia?

    • Concordo consigo, mas recomendo umas leituras sobre a questão do Kosovo. Basicamente, não há “povo kosovar”. O Kosovo foi ao longo dos séculos quase sempre região sérvia, chegando mesmo a ser o “coração” da Sérvia ( daí a Sérvia ter-se oposto à sua independência com tanta firmeza ). O facto de lá se ter formado uma maioria albanesa nada teve a ver com “povos kosovares”, mas porque muitos albaneses, a partir do séc XIX, migraram para esse território, e como tradicionalmente se reproduzem como coelhos, a taxas muito superiores aos sérvios, inevitavelmente acabaram por ficar em maioria. A “luta pela independência” teve por trás, como não podia deixar de ser, a mãozinha da nato, ou não tivesse essa organização benemérita bombardeado intensamente a Sérvia para “defender a auto-determinação dos albaneses” e impedir o seu “genocídio” ( que tal como as armas de destruição massiva do Iraque, nunca se provou ), e não tivesse sido colocada no Kosovo, pouco após a independência, a maior base da nato da europa. Só coincidências. Portanto, isso da “independência” do Kosovo foi apenas forma de “arranjar espaço” para colocar uma base da nato numa região estratégica, dando uma machadada final no que restava da Jugoslávia. O Kosovo é um “país” inventado à pressa, não reconhecido por metade das nações, que vive de ajuda externa, remessas de emigrantes e tráficos diversos. A legitimidade para a independência está ao nível de os turcos exigirem a independência de partes da Alemanha ou da Suécia, de Árabes a declararem a independência de bairros londrinos ou o pessoal do Bangladesh exigir a independência da Alfama. Ou seja, há mais a considerar em questões de independência ou autonomia do que uma simples maioria.

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