É lidar com isso

(Marco Capitão Ferreira, in Expresso Diário, 20/09/2017)

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Algo a contragosto, e tão tarde quanto lhes foi possível, as agências de rating lá deram um primeiro sinal de que já nem elas conseguem negar o desempenho da Economia Portuguesa e, muito especialmente, o desempenho da consolidação orçamental que foi possível fazer nesse contexto.

Os dados falaram mais alto, e mesmo não gostando – e não gostam mesmo nada – da forma como os resultados foram conseguidos, isto é, com uma política de alguma reposição de rendimentos e fim progressivo de cortes nas prestações sociais, não se pode negar o défice que baixou e a dívida que vai começar a baixar este ano. Ambos sinais de uma consolidação orçamental bem conseguida, que ainda por cima potenciou o emprego e o crescimento.

Longe vão os tempos, em 2011, em que nos era dito – (Ver aqui) -, que a melhoria do rating da República dependia da entrada em funções de um Governo diferente, e que era questão de seis ou doze meses para isso acontecer. Não foram seis meses, foram seis anos.

Data também dessa altura uma visão polarizada em que, consoante a quem se pergunte, a responsabilidade foi toda da conjuntura internacional ou toda dos Governos. Nenhuma das duas, como é natural, explica satisfatoriamente o que se passou. O problema dessas perspectivas, claro está, é que se erramos no diagnóstico erraremos certamente na cura.

Num País conhecido por alguma bipolaridade à depressão segue-se, normalmente, a euforia. Do ponto de vista do andamento da Economia isto induz um efeito pró-cíclico muito complicado. Concretamente, neste momento, temos de evitar euforias ou a mera ideia de que estamos garantidamente no bom caminho e podemos relaxar.

Não podemos.

Há que explicar isso à classe média-alta e alta. Sim, poderão ter de esperar um pouco pela sua parte no que ainda falta fazer do alívio fiscal. Há que explicar isso à função pública – não se resolvem 10 anos de congelamentos num ano – e a certas classes profissionais, por muito atendíveis que sejam as suas reivindicações.

O risco é evidente. Se tropeçarmos, se houver uma mínima janela de oportunidade para se gerar instabilidade política, se a conjuntura internacional se deteriorar subitamente, se tantas outras coisas, podemos perder muito rapidamente tudo o que nos custou seis anos de dolorosos sacrifícios (necessários, muitos, desnecessários outros, fruto de erros nossos).

O Financial Times pode dar-nos um raro elogio, Mário Centeno pode ser o nome mais forte para o Eurogrupo (e é mesmo, mais não seja porque, para além dos muitos méritos próprios, o próximo presidente deverá vir do sul da europa e da família socialista, agora façam as contas), podemos ter uma queda de desempego histórica, um desempenho da Economia como este século poucas vezes viu. Podemos ter isso tudo. Mas podemos perder isso tudo. Esta geração, aposto, dispensa passar por isso outra vez.

O diabo acabou de chegar a Massamá…

(In Blog O Jumento, 16/09/2017)
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Quando em Março passado a Standard & Poor’s decidiu manter a notação da dívida portuguesa em BB+, ou lixo, com perspetiva estável, a ex-ministra das Finanças de Passos Coelho e vice-presidente do PSD Maria Luís Albuquerque foi muito clara ao declarar “Eu confesso que não vejo injustiça”, adiantando uma explicação para a sua concordância com a avaliação da S&P:
“O elevado nível de endividamento, a divida pública, que tinha reduzido em 2015 voltou a subir em 2016, o endividamento privado também continua muito elevado, o crescimento reduziu face àquilo que vinha de 2015 e há uma conjunto de medidas que representam potenciais problemas para a competitividade e criação de emprego”
Queixava-se ainda de que o Governo não tinha dado  “melhores argumentos” à S&P para que Portugal saísse “desta situação de lixo”, lamentando-se ainda que era “uma desilusão que o país continue nesta situação e que não consiga registar, de facto, as melhorias que estávamos prestes a registar no final de 2015”.
Poucos meses passados e depois de ter andado a fazer surf nos incêndios e outras desgraças Passo Coelho ignora o que a sua vice-presidente tinha declarada e deu mais uma das suas cambalhotas, tem mesmo o descaramento de chamar a si quase todo o mérito, quase porque deu um danoninho desse mesmo mérito ao Governo dizendo que este “tem o mérito de ter conseguido nestes dois anos provar que os receios que os investidores tinham eram infundados porque o Governo acabou por garantir as metas que eram importantes para os que estabelecem o ‘rating’ para o país”.
A posição de Passos Coelho chega a ser ridícula pois ninguém se esquece de ter anunciado a vinda do diabo em Setembro de 2016, já depois de ter declarado numa entrevista à SIC dada em março de 2016, que “passaria a defender o voto no PS, Bloco de Esquerda e PCP”.
Depois de dois anos a aproveitar tudo o que mau acontecia ou esperava que viesse a acontecer ao país, Passos Coelho humilha-se de uma forma quase ridícula, ao apressar-se a comentar a decisão da mesma Standard & Poor’s para chamar a si todos os louros, chegando ao desplante de dizer que consigo no governo tal notação já teria sido atribuída, lembrando uma declaração de Relvas que em plena crise financeira assegurava que quando o PSD chegasse ao governo as agências de notação recuariam e deixariam de avaliar a dívida portuguesa como lixo.
 Esta notação significa que o diabo vinha mesmo, está agora em Massamá transfomando Passos Coelho em lixo político.

(É ver o vídeo abaixo para constatarem que Passos não passa de um vulgar troca-tintas)


Fonte aqui

A lamentável hipocrisia das três agências

(Nicolau Santos, in Expresso, 03/06/2017)

nicolau

A avalancha de dados positivos sobre a economia portuguesa que se tem sucedido nos últimos dois meses não comove as três grandes agências internacionais de notação financeira, cujos responsáveis, em declarações ao “Diário de Notícias”, não mostram nenhuma disposição para melhorar o rating que atribuem à dívida portuguesa (e que, em linguagem vulgar, é qualificado de lixo, ou seja, algo onde não se deve aplicar dinheiro), nem sequer o outlook, ou seja, a perspetiva, passando-o eventualmente de estável para positivo.

Os argumentos são os seguintes: “O rating pode subir se a consolidação orçamental e a redução da dívida acelerarem significativamente por comparação com as expectativas. Um crescimento económico muito mais forte seria também benéfico” (Moody’s). “É preciso perceber se esta recuperação é sustentável. Como o efeito base é muito baixo, qualquer pequena recuperação resulta num crescimento percentual muito elevado” (Standard & Poor’s). “Esperamos que a tendência pronunciada de redução do défice continue, mas a elevada dívida pública e a qualidade dos ativos bancários ainda pesam no perfil de crédito soberano de Portugal” (Fitch).

A economia portuguesa está bastante melhor. Até quando, senhores das agências, abusareis da nossa paciência, não reconhecendo esta evidência?

Ora, muito bem! A consolidação orçamental tem sido como segue: défices de 3% em 2015 (sem efeito Banif), 2% em 2016, previsão de 1,5% para este ano. E a tendência de queda vem de uns inacreditáveis 11,2% em 2010. O que será preciso para os senhores das agências reconhecerem que esta é uma tendência forte e consolidada? Segunda questão: o crescimento económico. Eis os dados: 0,9% (2014), 1,6% (2015), 1,4% (2016), 1,8% (previsão para 2017, mas o crescimento no primeiro trimestre de 2,8% aponta para um crescimento anual muito superior, podendo chegar aos 2,5% segundo o INE, mais que a média europeia). Há quem diga, contudo, que tudo está dependente do turismo. Não é verdade: as mercadorias explicam 70% do aumento das exportações. Terceira questão: a dívida. É muito elevada (130% do PIB). Mas o Governo prevê antecipar o pagamento de €7200 milhões ao FMI em 2018 e 2019 e até agora já foram reembolsados mais de €14.500 milhões do total de €26 mil milhões. Mais: como os senhores das agências saberão, um crescimento mais forte e acima do previsto, dá uma forte ajuda à redução da dívida em percentagem do PIB. Outra questão: a banca: alguém duvida que CGD, BES, BCP e BPI estão hoje mais sólidos do que em 2011 depois dos seus processos de recapitalização?

Concluindo: a economia portuguesa está indiscutivelmente melhor do que quando a nossa dívida pública foi classificada como lixo. Por isso, até quando, senhores das agências, abusareis da nossa paciência, não reconhecendo esta evidência? Resposta: até quando a sua hipocrisia entender, mesmo que os factos os desmintam todos os dias.


Um cluster a nascer na Covilhã

Decididamente, a imagem de Portugal está a mudar, entre outros factores porque hoje o país dispõe de recursos humanos muito bem preparados, com uma relação preço/qualidade altamente competitiva no contexto europeu. É seguramente isso que explica que o grupo suíço FM Industries Sycrilor tenha escolhido a Covilhã para abrir o seu novo centro de produção de bijuteria para fornecer algumas das maiores marcas de luxo mundiais, como a Louis Vuitton, Hermès, Dior, Cartier, Tiffany e Mont-Blanc. A nova unidade, que abriu no mês passado e vai criar 90 postos de trabalho, pode ser a chave para o desenvolvimento de um cluster na região dedicado à indústria mecânica de precisão, atraindo outros projetos. Estes são os investimentos que interessam ao país. Vêm para ficar, criam emprego altamente qualificado e podem contribuir para que surjam novas fileiras industriais no país.


Carlos Costa chega tarde

Desde que o sector bancário entrou em dificuldades, Bruxelas tem imposto, para aceitar apoios transitórios do Estado às instituições, programas draconianos de fecho de agências nacionais e no exterior, bem como a forte redução do número de funcionários. Além disso, o BCE não tem escondido a sua preferência por lidar apenas com meia dúzia de grandes bancos na zona euro, que serão os transmissores da política monetária europeia. Esta semana, o governador do Banco de Portugal, que aceitou a resolução do BES e do Banif como inevitáveis, acordou do seu sono letárgico e veio dizer que sempre se opôs a essas medidas e que elas são “um convite descarado e inadmissível para um tratamento” desigual entre o Norte e o Sul da Europa, prejudicando os países do Sul. Infelizmente, o mal já está feito. Carlos Costa devia ter levantado a voz na altura. Agora, o que diz é inútil e não tem qualquer resultado.


Há algo errado com os fundos?

O Expresso publicou no sábado um trabalho da Joana Nunes Mateus, sobre os principais projetos apoiados pelo Portugal 2020. A conclusão é inquietante: 19 dos 20 maiores projetos são para pagar despesa do Estado e só há um privado — um novo complexo industrial em Aveiro da Navigator. A Direção-Geral do Ensino Superior recorre a esses fundos para atribuir bolsas a alunos carenciados, o Instituto de Emprego e Formação Profissional capta aí dinheiro para pagar estágios a jovens e a Fundação para a Ciência e Tecnologia patrocina doutorados por esta via. Ou seja, a descida do défice pode estar a ser apoiada pelos fundos europeus que estarão a substituir os impostos no financiamento de salários e outros gastos com educação e segurança social. Digamos que a acusação, que vem do PSD, merece uma cabal explicação. Não há milagres em economia, Esperemos que não haja trapaça.



A mim,

o brilho fascina-me.

E as pessoas

estão a perder o brilho.

A desilusão é tão grande

que as pessoas perdem

pouco a pouco

o brilho, a luz.

Não há luz

nos olhos das pessoas.

O circo,

de certa forma,

devolve às pessoas

o brilho perdido.


(Teresa Ricou,

a alma, a seiva e o sangue do Chapitô, que esta semana comemora 40 anos, in “Tété — História da Pré-História do Chapitô — 1946-1987”, edições Chapitô)