Os protestos alemães já começaram

(The Socialist Correspondent, in Resistir, 21/09/2022)

O governo alemão criou um pacote de 65 mil milhões de euros para compensar a sua crise de energia e de custo de vida. Mas isso não será suficiente para salvar a Alemanha da recessão. De acordo com um analista do ING Bank os padrões de vida já estão caindo e o “pacote de socorro” não vai parar isso.

97,5% dos alemães já reduziram o seu consumo de energia – tomando banhos mais curtos e frios, lavando pratos e mãos em água fria e 40% citando o aumento dos custos como sua principal preocupação, de acordo com The Local (2/setembro). Robert Habeck, ministro da Economia da Alemanha (Verdes), supervisiona os aumentos de quatro dígitos das faturas de energia este ano – além do aumento dos preços dos alimentos e de uma sobretaxa de 2,4 cêntimos por quilowatt-hora imposta no mês passado.

Na tentativa de desmotivar as manifestações anti-sanções e os protestos pelo aumento de preços que já começaram, o governo procede a um pagamento único de 300 € aos trabalhadores e pensionistas, enquanto os estudantes receberão 200 € (Bloomberg, 5/setembro). Também serão introduzidos tetos de preços de energia. Mas o “pacote de ajuda” pouco fará para evitar uma enorme queda nos padrões de vida da maioria dos alemães. Como disse a deputada do Die Linke, Sahra Wagenknecht, “o pacote proposto não aliviará a população sequer de uma fração dos custos adicionais.” (t-online, 4/setembro).

A indústria

Em relação à indústria, Habeck diz ser “alarmante” que empresas alemãs sejam forçadas a parar a produção para lidar com o aumento dos preços da energia (FT, 31/agosto). “Isso não é uma boa notícia”, diz ele, “porque pode significar que as indústrias em questão não estão a ser reestruturadas, mas sofrem uma rutura, uma rutura estrutural que ocorre sob uma enorme pressão”. Um exemplo é a gigante siderúrgica ArcelorMittal, que anunciou que estava a parar a produção em duas das suas fábricas alemãs. (Al Jazeera, 4/setembro)

O consumo de gás da indústria alemã caiu 21% em julho em relação a um ano atrás, sinalizando “uma queda drástica na produção”, segundo Siegfried Russwurm, chefe do principal lóbi empresarial da Alemanha, o BDI. Ele classificou esta situação como “a expressão de um problema maciço”.

O modelo de negócio de grande parte da indústria transformadora da Alemanha foi baseado na abundância de gás barato da Rússia, mas que “não voltará tão cedo, se voltar”, admitiu Habeck.

Um inquérito recente mostrou que a confiança empresarial alemã caiu pelo terceiro mês consecutivo. O grupo de reflexão que conduziu a pesquisa afirmou:   “A confiança na competência económica do governo está a desaparecer e as pequenas e médias empresas, em particular, sentem que foram deixadas sozinhas pelas autoridades”.

Enquanto isso, muitas das políticas verdes que recentemente ajudaram a levar [o partido] Verdes ao poder, ao lado do SPD e do FDP, foram descartadas. A Alemanha agora importa gás de fraturação (fraking hidráulico) dos Estados Unidos, o qual é muito mais poluente e três vezes mais caro que o gás natural russo. E mesmo isto não vai compensar a lacuna de abastecimento, dada a falta de navios metaneiros para o transporte de gás natural liquefeito (GNL) e de terminais em terra.

Para compensar a lacuna energética, a Alemanha está a aumentar a sua produção de eletricidade a carvão, de acordo com a Rystad Energy, uma empresa norueguesa de pesquisa energética. Embora muitas centrais a carvão tenham sido fechadas nos últimos anos como parte da descarbonização, a Alemanha ainda dispõe de termoelétricas a carvão que não foram completamente desmontadas. A gigante alemã de serviços públicos Uniper, por exemplo, anunciou recentemente que ligaria temporariamente uma central a carvão para produzir eletricidade provavelmente até o final de abril de 2023. A Alemanha já voltou ao carvão para sua produção de eletricidade: 20,7% de suas necessidades agora vêm da linhita e 10,4% da hulha.

Subserviência à linha dos EUA

A solução óbvia – levantar as sanções contra a Rússia e abrir o gasoduto Nord Stream 2 da Rússia, fechado sob ordens dos EUA – resolveria o problema energético da Alemanha.

Mas a guerra e as sanções contra Putin vêm em primeiro lugar, antes dos esforços para limitar a crise económica auto-infligida e proteger o clima. Sublinhando essa política, o chanceler Olaf Scholz anunciou recentemente que a Alemanha entregaria ainda mais armas à Ucrânia, no valor de mais de 500 milhões de euros (Reuters, 23/agosto).

O ex-presidente federal Joachim Gauck disse em fevereiro que o povo alemão deveria “gelar pela liberdade” neste inverno e “suportar… uma baixa geral do nosso estilo de vida”. Macron disse algo semelhante aos franceses, quando anunciou o “fim da abundância”.

Annalena Baerbock, ministra das Relações Exteriores (uma Verde muito belicista), rejeitou categoricamente as negociações com a Rússia ou o fim das sanções. Em fevereiro, ela pediu explicitamente ao Ocidente para “arruinar a Rússia” (25/fevereiro). Durante sua recente visita a Kiev, ela disse que a Alemanha “continuará apoiando a Ucrânia pelo tempo necessário com entregas de armas” (AFP, 10/setembro). Ela assume que isso tem um preço: o empobrecimento do povo alemão. Mas mesmo assim pretende avançar. “Pouco importa o que meus eleitores pensam”, disse ela recentemente num painel público, “Quero responder às expectativas do povo ucraniano” (31/agosto).

No entanto, quando as consequências mais graves das sanções se fizerem sentir neste inverno, as sanções e o armamento da Ucrânia sofrerão uma pressão crescente.

Resistência pública

O estado de espírito do público já está mudando. Uma importante sondagem de opinião junto de 1 011 cidadãos revelou que 77% dos alemães acreditam que o Ocidente deve iniciar negociações para acabar com a guerra na Ucrânia. Os Verdes, em particular, obtêm maus resultados nas sondagens em matéria de economia. Apenas 7% acham que são competentes.

Cada vez menos alemães acreditam que a Rússia é responsável pelo aumento do preço do gás e que o envio de mais armas para a Ucrânia ou sanções contínuas contra a Rússia trarão a paz.

Manifestantes na Rheinmetall.

Manifestantes que desfilaram em Kassel recentemente exigiram que a empresa alemã de armas Rheinmetall parasse de produzir armas para a Ucrânia. Uma dirigente da organização anti-guerra Disarm Rheinmetall, Nina Kemper, disse: “Não se alcança a paz com a guerra” (Deutsche Welle, 2/setembro).

Cerca de 2 000 manifestantes no porto báltico de Lubmin – onde o gasoduto submarino Nord Stream 2 da Rússia chega à terra na Alemanha – pediram a proibição das exportações de armas para a Ucrânia e a renúncia do governo federal (Redaktions Netzwerk Deutschland, 4/setembro). As faixas diziam:  “Nord Stream 2 em vez de gás de fraturação hidráulica” e “Vermelho-amarelo-verde para a frente leste!”, referindo-se às cores dos partidos do governo de coligação SPD, FDP e Verdes.

Enquanto isso, manifestações em Berlim, Colónia (4/setembro), Leipzig e Magdeburg (Politico, 5/setembro) exigiram o comissionamento imediato do Nord Stream 2 e o fim das entregas de armas para a Ucrânia.

Cerca de 2 000 “artesãos pela paz” participaram num comício na semana anterior em Dessau-Roßlau, Saxônia-Anhalt. “Esta foi uma das maiores manifestações em Dessau nos últimos anos”, segundo o Mitteldeutsche Zeitung (2/setembro). A organização “Artesãos pela Paz” planeia expandir os seus eventos em todo o país (Executive Intelligence Review, 29/agosto).

Entre outras manifestações, 800 padarias apagaram as suas luzes por um dia para protestar contra o aumento das contas de energia. A Guilda alemã de padeiros disse: “Hoje é a luz, amanhã será o forno?” (Business Insider Africa, 9/setembro).

Egon Krenz, o último líder do Partido da Unidade Socialista, no poder na Alemanha do Leste, disse ao Morning Star (3/setembro): “Cada entrega de armas é uma licença para matar e prolongar a guerra”. Sevim Dagdelen, deputado do Partido Die Linke, criticou a insistência de Baerbock sobre “A Ucrânia primeiro, os cidadãos não importam” e convocou novos protestos “contra um inverno frio, contra a fome, contra gelar e contra a guerra económica contra a Rússia”.

Sahra Wagenknecht (Die Linke) disse: “A questão é que os objetivos são irrealistas. A Rússia é uma potência nuclear e, se se insistir em expulsar os russos da Crimeia, então esta terrível guerra continuará para sempre. Os russos têm a sua frota do Mar Negro na Crimeia há décadas e não a abandonarão. Vocês querem sacrificar dezenas de milhares, talvez centenas de milhares de vidas por um objetivo totalmente irrealista? Devemos decidir até que ponto apoiamos a liderança ucraniana. A Europa não está interessada numa nova escalada da guerra; temos que explicar isso a Zelensky”. (t-online, 4/setembro).

Os protestos alemães foram acompanhados por grandes manifestações pró-paz e anti-NATO em Paris e Praga (4 a 5/setembro) – o início de uma aguardada resistência europeia ao belicismo predominante da UE e da NATO.

A Alemanha prostra-se diante dos Estados Unidos

Até o início da operação militar russa na Ucrânia, Alemanha e França eram oficialmente a favor de uma solução diplomática para a crise. O então chefe da marinha alemã Kay-Achim Heino Schonbach disse em janeiro, antes de renunciar, que Putin merecia “respeito em igualdade de condições”, expressando as opiniões de grande parte das personalidades e instituições com influência, incluindo o ex-chefe do exército alemão Harald Kujat.

Mesmo Annalena Baerbock concordou na época que a política alemã era nunca enviar armas militares para zonas de conflito (The Guardian, 17/janeiro/2022). Não que a Alemanha ou a França tenham honrado os dois tratados de cessar-fogo de Minsk que assinaram com Moscovo e Kiev, mas pelo menos no papel rejeitaram a guerra.

Enquanto o procurador da NATO na Ucrânia intensificava o bombardeamento à população russa do Donbass, no início de fevereiro, os EUA exerceram enorme pressão sobre a Alemanha para cortar laços com a Rússia. Biden disse ao chanceler Scholz sem rodeios que os EUA fechariam o Nord Stream 2:   “Vamos acabar com isso… Garanto-lhe que poderemos fazê-lo”, disse ele. Essa ameaça de interferência marcou um ponto de viragem.

Os Estados Unidos continuam a ter 40 mil soldados em solo alemão (Voltairenet, 16/fevereiro) – mais do que mantêm em qualquer outro país, exceto no Japão, a outra potência derrotada na Segunda Guerra Mundial – com o seu quartel-general de comando europeu em Estugarda. A Alemanha sentiu claramente que não tinha outra escolha a não ser sacrificar a sua parceria vital com a Rússia.

Por agora, a ambiguidade estratégica da Alemanha entre o Oriente e o Ocidente foi rompida. Isso representa talvez a maior vitória dos Estados Unidos no fomento da guerra: estreitar a unidade do bloco da NATO e enfraquecer o seu rival alemão, em preparação para a sua maior guerra com a China.

O Correspondente Socialista enfatizou no início deste ano (Comentários TSC em 21/fevereiro) que a única maneira de os EUA conseguirem isso era “provocar a Rússia numa guerra contra a Ucrânia, e depois pretender que a NATO se deve unir face à Rússia, por agressão, argumentando que a necessidade militar deve prevalecer sobre os interesses económicos da Alemanha”.

Como explicou o Partido Comunista Alemão:   “O capital monopolista alemão tradicionalmente vê o capital americano como um rival. Mas, por enquanto, a adesão total à posição dos EUA sobre a guerra na Ucrânia – nada de paz negociada, armas para Kiev, dissociação da economia russa qualquer que seja o custo económico – é o consenso oficial por toda a política “oficial” alemã e a linha seguida em público por grandes empresas e também dirigentes sindicais” (Morning Star, 31/agosto).

Embora a Alemanha por agora se tenha curvado perante o poder dos EUA, ela não será contida para sempre. O novo orçamento maciço de 100 mil milhões de euros em armas do regime – elaborado sob as ordens dos EUA para garantir que a Alemanha se envolva plenamente nas metas de guerra dos EUA – criará um monstro armado que até os EUA acabarão por ter dificuldade em controlar.

A Alemanha já é o quinto maior exportador de armas do mundo, o imperialismo alemão tem um histórico de rápida expansão militar que leva a guerras cataclísmicas. No entanto, os EUA estão desesperados o suficiente para arriscar a ascensão do militarismo alemão, a fim de derrotar a Rússia e depois a China.

Enquanto isso, na Alemanha, alguns políticos proeminentes do partido Die Linke querem que a esquerda fique longe do movimento de protesto, temendo o envolvimento da extrema direita. Mas só uma campanha liderada pela esquerda pode exercer pressão para restaurar os laços com a Rússia e impedir a expansão militar alemã.

12/Setembro/2022

[*] Publicação britânica.

O original encontra-se em www.facebook.com/thesocialistcorrespondent/…


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Rodrigues dos Santos vs Ljubomir: da vergonha alheia ao insulto à democracia

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 03/12/2020)

Daniel Oliveira

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Antes de avançar neste texto, quero dizer três coisas: que compreendo a situação dramática que vive toda a restauração; que simpatizo com parte das suas reivindicações e considero outras impossíveis de responder pelo Estado; e que compreendo que o Governo decida não receber nove empresários, mas apenas organizações que representam o sector. Sei que está na moda a inorganicidade, excelente para todo o tipo de oportunidades e oportunismos, mas um governo não pode negociar com dez milhões de pessoas. É também por isso que a sociedade civil se organiza em associações e sindicatos. Abrir este precedente seria alimentar uma farsa.

Vários políticos, do Chega ao Bloco de Esquerda, têm aparecido nos protestos da restauração. Não acho que isso seja uma forma de aproveitamento político. Faz parte da relação que os partidos mantêm com a sociedade. Claro que é preciso saber fazê-lo. Um líder partidário com experiência política fá-lo com as devidas cautelas, tentando saber previamente como será recebida a sua presença. Para não insultar os que protestam com ela e para não ser insultado de volta. Sobretudo se leva com ele a comunicação social.

No último feriado, Francisco Rodrigues dos Santos foi visitar os empresários da restauração que estão em greve de fome em frente ao Parlamento. Para além de ter atribuído a Agustina Bessa-Luís um poema de Sophia de Mello Breyner – o risco do citador compulsivo que não é leitor compulsivo é o de tropeçar na fraude que alimenta –, o líder do CDS participou num dos momentos mais constrangedores em que alguma vez um líder partidário se viu envolvido.

De fato e gravata num feriado, com outros dirigentes do CDS e a comunicação social atrás, explicou que não estava ali como líder partidário, mas como cidadão. Uma mentira tão óbvia que só poderia correr mal. Depois, sentado com os empresários, criticou o “emplastro” (André Ventura) que se tentou colar à manifestação. A reação não foi boa: “estás a falar como um político”, disse o chef e empresário Ljubomir Stanisic, como se lançasse um insulto. Como há de falar um político? Francisco Rodrigues dos Santos não percebeu logo que aquilo só lhe podia correr mal. E continuou, como cidadão, a falar das propostas do CDS. Até que Ljubomir se dirigiu a ele nestes termos: “Se voltares a falar de um partido vou ter de te pedir para saíres. Não há partidos, querido. Estamos aqui humanamente. Acredita, por favor, respeita-nos como cidadãos. Votámos na Assembleia, é nossa. Já não conseguimos ouvir falar de partidos, é que ninguém está a apoiar-nos. Eu nem sei de que partido tu és.” A tudo isto, o líder do CDS assentiu, obedientemente, de cabeça baixa.

A primeira coisa a dizer sobre isto é óbvia: não é “emplastro” quem quer, é quem sabe. O líder do CDS achou que podia fingir que era um simples cidadão e participou numa cena humilhante. A segunda tem a ver com a primeira: um político nunca deve ter vergonha de ser político. Nunca vai a um acontecimento político como cidadão. Ser político, se o for com orgulho, não o diminui, engrandece-o. Assumir a menoridade da política é ceder.

Depois de ver o vídeo captado por um canal de televisão, fui matutando na vergonha alheia. E cresceu em mim, depois da pena, um sentimento profundo de ofensa. Pela forma como o líder de um dos partidos que fundou a democracia baixou os olhos perante alguém que o tratava condescendente por “querido” e ameaçava mandá-lo embora se ele voltasse a falar do partido que dirige. Como se liderar um partido fosse uma coisa suja. E, no entanto, ao contrário de Ljubomir, Francisco Rodrigues dos Santos foi escolhido por alguém para liderar alguma coisa.

Fui ouvir de novo aquelas frases absurdas Ljubomir Stanisic. Estava em frente a um Parlamento, onde a representação dos cidadãos se faz por via dos partidos, mas não queria ouvir falar de partidos. Quer que os políticos o ouçam, mas quer que não sejam políticos quando falam. Diz que ninguém faz nada por eles mas recusa-se a ouvir o que um líder de um partido acha que deve ser feito por eles. Quer ser reconhecido como representante de um protesto mas não quer saber que partido representa a pessoa que está à sua frente. Subitamente, e Deus saberá como isso é uma impossibilidade, senti-me no lugar daquele político trapalhão. Aquele empresário, que diz que fomos “nós” (e isto inclui-me a mim, por isso falava em meu nome) “votámos na Assembleia”, despreza de forma ostensiva aqueles que nós todos (e não apenas eles) elegemos. Mesmo não sendo deputado, Francisco Rodrigues dos Santos lidera um partido com deputados. Ljubomir pode nem querer saber quem é aquela pessoa. E, não primando pela boa educação e respeito pelos outros, pode tratá-lo como se fosse um badameco. Mas não pode fazê-lo em nosso nome, os que “votámos nesta Assembleia”. Isso eu não admito.

O problema destes movimentos inorgânicos não é valerem menos do que a ação organizada de trabalhadores, empresários ou qualquer outra coisa. É, sem qualquer forma de eleição, escrutínio ou representatividade, julgarem que valem mais. Nada disto reduz a minha solidariedade com os dramas que se vive na restauração e com algumas das suas exigências. Mas sempre que, no meio deles, aparece alguém que insulta a democracia, eu próprio me sinto insultado.

Quem quer ser ouvido, ouve. Quem quer ser respeitado, respeita. Mesmo quando tem pela frente um político que não se dá ao respeito e baixa a cabeça em vez de se levantar e sair. Políticos que acham que servem para ser sacos de pancada estão destinados a ser saco de pancada. Mas fazem mal à democracia.


A realidade não existe – imprecação

(José Gabriel, 15/02/2020)

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Não, a realidade não existe. Nunca existiu um ministro das finanças sociopata que, de braço dado com o seu 1º ministro corrupto, extinguiu as reduções fiscais a doentes com incapacidades superiores a 80% e com despesas de retaguarda incomportáveis impostas pelas suas doenças, com consequências dramáticas para muitos deles.

Não, nunca uma ex-ministra das finanças sugeriu o fim do pagamento da hemodiálise a doentes com mais de 70 anos, o que motivaria uma espécie de homicídios em cadeia patrocinados pelo Estado.

Não, nunca houve um deputado a defender que o problema do país era a “peste grisalha”, sobre a qual era preciso tomar medidas, nem aconteceu, longe disso, o homem ter sido promovido a cabeça de lista do seu distrito.

Não, nunca houve mortes por um ministério ter adquirido produtos perigosos para os doentes hemodialisados para poupar uns cobres, perante o entusiasmo dos seus colegas de governo e respectivo 1º ministro de então.

Não, nunca houve uma ministra a saudar as vantagens económicas de um vírus eclodido num outro país.

Não, nunca houve um primeiro ministro a contemplar os seus concidadãos mais sofredores com o epíteto de piegas enquanto lhes sugava a vida.

Não, nunca houve companhias a de seguros a determinar soluções terapêuticas mais vantajosas para os seus lucros que para a vida dos doentes.

Não, nunca houve pessoas que não puderam beneficiar de tratamentos sofisticados para doenças potencialmente fatais por não terem condições económicas para manter as necessárias condições – de assepsia, por exemplo – em sua casa.

Não, nunca houve doentes que morreram por não terem recursos financeiros para continuar a viver.

Não, nunca houve na Assembleia da República deputados que defendem o fim puro e simples do SNS ou a sua destruição em favor de terceiros.

Não, não são nem nunca foram pessoas como estas que, com a respectiva bênção eleitoral, nos governaram, governam e continuarão a governar.

Não, a puta da realidade não existe. Podemos continuar a confiar, está tudo bem.