Paradise Papers. Nova fuga de informação expõe rainha de Inglaterra

(In Expresso Diário, 05/11/2017)

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(Este artigo mostra que está tudo podre. Os negócios, e o capitalismo, precisam dos Estados para gerirem a ordem social e evitarem a organização e as manifestações de desconforto de quem trabalha. Mas quando se trata de pagar esses “serviços”, fogem a sete pés e os offshores são a sua predilecção. Ninguém sai incólume, da direita à esquerda, de norte a sul, de este a oeste. Curiosamente, a exemplo do que se passou com os Panamá Papers, de Portugal nem rasto de denúncias de “peixe graúdo”. Ou os nossos milionários são uns tesos, ou são muito competentes na fuga aos impostos, ou estão muito bem “protegidos” pelos jornalistas da lusa imprensa, das três uma. Eu, não sei porquê – ou talvez saiba -, aposto que a última hipótese é a mais provável.

Estátua de Sal, 05/11/2017)


São mais de 13 milhões de ficheiros, numa nova fuga de informação global sobre paraísos fiscais investigada pela organização que lançou os Panama Papers. Revelações incluem os negócios do secretário do Comércio de Donald Trump com o círculo próximo de Vladimir Putin e os tentáculos offshore do principal angariador de fundos do primeiro-ministro do Canadá….


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Os Deuses não pagam impostos

(In Blog O Jumento, 14/06/2017)
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Parece que o fisco espanhol puxou a ponta da meada da futebol leaks e apanhou, ou julga ter dados suficientes para considerar, que apanhou o Cristiano Ronaldo com o pé na argola. Não é nada de novo, já outros futebolistas foram apanhados na malha do combate à evasão fiscal, a começar pelo próprio Messi que foi condenado a uma pena de prisão.
Por cá foi um ai Jesus, se fosse um qualquer político ou banqueiro, depois da justiça ter dito mata, já a populaça gritava esfola, mas tratando-se do nosso Ronaldo só se levantaram vozes em sua defesa, até porque o seu estágio não pode ser perturbado. Que Ronaldo fez tudo o que estava ao seu alcance para ser exemplar, que há dúvidas nas regras, que era para equilibrar a balança das perseguições fiscais entre o Real e o Barça, enfim, Ronaldo está inocente.
Pouco tempo depois de a notícia sair já estava Lobo Xavier a dar uma entrevista em defesa de Ronaldo, não se percebendo bem se trabalhava pró bono, se estava no seu horário de voluntariado ou se veio em defesa de uma causa nacional. O conhecido defensor de boas causa não só defendeu Ronaldo, como ainda achou que devia gozar com o fisco espanhol. Que Ronaldo queria saber como cumprir e ninguém saberia e que não faria sentido pagar em Espanha um imposto relativo a um anúncio no Japão.
Pois, Lobo Xavier deve achar que os rendimentos dos anúncios do Ronaldo devem ser pagos em cento e tal países, todos aqueles onde os spot publicitários forem exibidos. Se ganhar uma final no México os rendimentos dos prémios relativos a essa final devem ser tributados no México. E não vale a pena perguntar como fazer ao fisco espanhol porque os nuestro hermanos da Agencia Tributaria são imbecis, o melhor é perguntar ao Xavier.
O que ninguém explicou foi para que serviam as transferências de dinheiro entre off shores para depois ser depositado em contas secretas na Suíça. Não, no caso de Ronaldo as contas secretas na Suíça e as off shores são coisa de gente séria e cumpridora.

Animar em Malta

(Mariana Mortágua, 30/05/2017)

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Em 2013, a organização holandesa SOMO publicou um relatório com o nome “Evitando impostos em tempos de austeridade”. Segundo o documento, o investimento direto estrangeiro português em 2011 cresceu 134%, e o seu maior destino foi a Holanda. Surpreendentemente, 38% do stock de investimento estrangeiro português estava concentrado na Holanda, e apenas metade disso em Espanha. Da mesma forma, o maior país de origem do investimento estrangeiro em Portugal era, imagine-se, a Holanda.

É certo que a Holanda é uma importante economia europeia, mas está longe de ser o nosso maior parceiro económico e comercial. A explicação é outra, e reside nas várias sucursais que as maiores empresas portuguesas criaram lá fora para reduzir a sua fatura fiscal.

Estes dados não refletem verdadeiros fluxos de investimento, mas sim transações financeiras entre empresas do mesmo grupo, por exemplo para transferir lucros para territórios com menos impostos. É o caso da EDP, analisado no relatório, mas também de quase todas as empresas da Bolsa portuguesa.

A Holanda não é caso único. Em 2014, o LuxLeaks revelou como centenas de empresas usavam o Luxemburgo, com o apoio das grandes consultoras internacionais e a cumplicidade do Governo, para fugir aos impostos nos seus próprios países. Em 2015, o SwissLeaks expôs dezenas de milhares de contas secretas, abertas no banco HSBS na Suíça, que serviam para de tudo um pouco, de financiamento do terrorismo à fraude fiscal. Em 2016, conhecemos o Panamá Papers e regressamos agora à Europa, com o trabalho do Consórcio Europeu de Jornalismo de Investigação sobre o regime fiscal de Malta.

De acordo com as notícias do fim de semana, houve 48 sócios portugueses da Deloitte (uma das quatro grandes consultoras internacionais) que, só num ano, receberam 53 milhões de euros em dividendos. O número em si já é astronómico, mas acresce que este dinheiro circulou por Malta, através de um complexo esquema de empresas, para chegar a Portugal tendo pago apenas 5% de imposto. É só um caso, muitos outros haverá.

Há quem olhe para estes esquemas de planeamento fiscal agressivo e veja formas legítimas de fazer negócios. Há ainda quem se prefira esconder na impotência face à chantagem da fuga de capitais. É um erro. A fronteira entre o legal e o ilegal, a fraude e o planeamento neste tipo de esquemas é, propositadamente, muito ténue. Mas, para além da legalidade, o que está em causa é a legitimidade de todo o sistema fiscal e, por inerência, do Estado. Como pode um Estado ter credibilidade quando os cidadãos sentem, legitimamente, que o esforço fiscal não recai sobre todos da mesma forma? E como pode um Estado manter uma situação financeira sustentável se a sua base tributária se vai erodindo com a fuga dos que mais podem? Este não é um pequeno problema e, sobretudo, não se resolve enquanto os tabus sobre a livre circulação de capitais, o segredo bancário e a liberalização financeira impedirem qualquer debate sério sobre a matéria.

* DEPUTADA DO BE