Afinal, o que diz Cavaco? Nada

(Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 29/09/2023)

Miguel Sousa Tavares

Eu sei que venho com algum atraso, mas era preciso corresponder ao repto de Durão Barroso: ler o livro antes de o comentar. E acontece que o livro é de tal forma aborrecido que duvido até que Durão Barroso, o seu apresentador, o tenha lido todo. Falo, obviamente, de “O Primeiro-Ministro e a Arte de Governar”, a última obra do grande estadista Cavaco Silva que tanto entusiasmou a nossa direita, na medida em que tanto irritou a nossa esquerda. Mas sosseguem, uns e outros: não há quaisquer motivos para uma ou outra coisa.

Sobre Cavaco Silva, o homem e o personagem, o seu perfil ético, cívico e político, remeto para o artigo que Luís Aguiar-Conraria aqui escreveu há 15 dias e que eu não me importaria de ter assinado. Apenas realçaria o episódio da venda das acções do BPN, não cotadas em Bolsa, com um lucro de 300%, por decisão do presidente do banco e seu amigo pessoal, Oliveira e Costa. Tudo poderia ter ficado no domínio de um negócio entre amigos com dinheiros de um banco privado não fosse o caso de terem sido negócios desses que levaram o BPN à falência e obrigaram os contribuintes a pagar a conta. Que Cavaco Silva não se tenha perturbado com a revelação do episódio é uma coisa; outra coisa é que se tenha vindo gabar dele, afirmando ter sido a sua competência como professor de Finanças que o tornou possível e que nem mesmo alguém que nascesse duas vezes seria tão sério como ele.

<span class="creditofoto">ILUSTRAÇÃO HUGO PINTO</span>
ILUSTRAÇÃO HUGO PINTO

Sobre Cavaco Silva e a sua lenda de estadista e “fazedor” é tudo uma questão de opinião. A minha, e sempre dita desde então, é que ele foi o primeiro-ministro a quem o acaso pôs nas mãos uma oportunidade única para mudar Portugal e desperdiçou a oportunidade. Herdou um país com contas postas em ordem por Ernâni Lopes e que, contra as suas dúvidas, entrara na União Europeia pela mão de Mário Soares. Encontrou paz so­cial e institucional, uma enxurrada de dinheiros como nunca visto e maioria para governar. E começou por vender a agricultura a Bruxelas por 600 milhões de contos, em dinheiro da altura, com isso desmantelando o mundo rural e dando início ao processo de despovoamento do interior que, entre outras coisas, hoje está na origem da grave crise habitacional dos centros urbanos. Depois fez o mesmo com as pescas, com a construção naval, com as minas e com as indús­trias transformadoras, declarando que Portugal iria viver da prestação de serviços. Apostou tudo nas estradas, para, como disse ironicamente Ribeiro Telles, “os espanhóis trazerem mais depressa os produtos agrícolas deles para os nossos supermercados”, e, em contrapartida, começou o trágico processo de desmantelamento da ferrovia, liquidando uma empreitada que exigira 150 anos de esforço da nação. Engrossou o Estado para a eternidade e, das “reformas da década” que diz ter feito, uma — a da Saúde — já fora feita antes, com a criação do SNS, e outra — a do financiamento da Segurança Social — foi feita depois por Vieira da Silva, sendo que todas as outras, a começar pela da Justiça, permanecem por fazer até hoje. Mas criou a lenda e esse foi o seu grande feito.

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Não admira que, ciclicamente, Cavaco se sinta tentado a escrever e acrescentar a sua biografia, não vão outros, como eu, deslustrá-la. É disso, mais uma vez, que, directa ou subliminarmente, trata este livro, dividido em três partes. Na parte do meio, ele, o ex-eurocéptico, canta loas à Europa, a cuja construção se amarra e descreve sem grande originalidade nem distanciamento: na Wikipédia há peças semelhantes mais interessantes. A terceira e última parte é composta por duas conferên­cias e sete artigos já publicados, entre os quais o “célebre” artigo sobre a Lei de Gresham, que ele estima um marco no pensamento político português, pois que o republica 19 anos depois “porque não parece ter perdido pertinência”. Os outros artigos, está bem de ver, são todos a bater no actual Governo e já por demais lidos e comentados. Resta, então, como original, a primeira parte do livro, que lhe dá título.

Para quem esperava de alguém que foi PM durante dez anos uma reflexão política profunda e meditada sobre o exercício do poder e a sua capacidade transformadora, as instruções de Cavaco são qualquer coisa de absolutamente indigente, variando entre o banal, o cómico e o ridículo.

Essa primeira parte é difícil de classificar, mas talvez se possa dizer que é uma espécie de manual de instruções para a Universidade de Verão dos jotinhas, em particular aqueles que aspiram a um dia virem a ser primeiros-ministros. Para quem esperava de alguém que foi PM durante dez anos uma reflexão política profunda e meditada sobre o exercício do poder e a sua capacidade transformadora, as instruções de Cavaco — a que ele chama “reflexões normativas” — são qualquer coisa de absolutamente indigente, variando entre o banal, o cómico e o ridículo. O que dizer da afirmação de que a escolha das pes­soas para o Governo “não pode ser feita na praça pública, para não prejudicar a aceitação dos convites”, ou que “o PM deve apresentar-se devidamente preparado sobre cada um dos pontos da agenda do Conselho de Ministros”? Mais cómicas são as afirmações de que “é mesmo muito provável que os ministeriáveis do partido estejam ansiosos que o telemóvel toque” ou que “as reuniões do Conselho de Ministros devem decorrer sem dispensa do formalismo necessário. Dentro da sala, os ministros devem tratar-se uns aos outros pelas respectivas designações oficiais e evitar informalidades excessivas e tratamentos por tu” (imaginem: “srª Ministra da Coesão Interterritorial, pode passar-me a água? Faça favor, sr. Ministro dos Transportes e Comunicações”). Mais a sério, é de reter a afirmação de que “o exercício de funções de chefe do Executivo é uma tarefa muito exigente”, quanto mais não seja porque é preciso manter sempre um olho vigilante no PR, pois que “a principal preocupação do PM no seu relacionamento com o PR deve ser a de evitar que o Presidente utilize os seus poderes para impedir o Governo de executar o seu programa e que tenha sucesso na sua acção”. Isto dito por quem exerceu ambas as funções é, enfim, uma reflexão carregada de sentido. Talvez mesmo a única. Porque o resto, se querem a minha opinião, não vale 17,75 euros e, sobretudo, o tempo perdido.

2 O que aconteceu na Madeira, isso, ultrapassa o ridículo para cair no domínio da total falta de decência. Um chefe de Governo que promete, jura, diz e volta a dizer que não governará se não lhe derem maioria absoluta e que logo, perante o insucesso, se enterra num pântano de malabarismos semânticos para tentar demonstrar que a palavra “não” dita por um político não significa o mesmo que a palavra “não” dita por uma pessoa de bem. E que, acto contínuo, começa a negociar um acordo para o sim com um partido que os madeirenses nem devem saber o que seja, com um programa de governo que mistura hotelaria com brócolos e subsídios ao turismo com subsídios à esterilização dos gatinhos. Um chefe do partido da oposição local que, tendo perdido 8 deputados em 19, longe de pensar em demitir-se, quer é saber se o chefe do Governo se demite, porque ele continua a ser “a alternativa”. É o dirigente nacional do principal partido da oposição que resolve ir cavalgar antecipadamente uma vitória regional que afinal o não foi, mas que canta vitória na mesma, sem se dar conta do ridículo a que se presta. Parecem garotos a brincar à política.

3 “Basicamente, sou uma puta. Ob viamente, o que eu quero é ter bens materiais, sentir a minha vida boa.” Esta frase, escutada e gravada pela PJ há dois anos, pertence a um dos arguidos da Operação Tempestade Perfeita e foi dita em conversa com outro comparsa nos negócios montados no Ministério da Defesa, e não só, para roubar o Estado português. Trata-se de dois directores de serviços, um cargo superior da Administração Pública, falando com o à-vontade de quem não esconde o que faz, o que quer e a total ausência de escrúpulos com que ac­tuam. Provavelmente, os seus processos acabarão prescritos, arquivados por falta de provas, amnistiados pela visita papal, e, até lá, eles continuarão a receber o seu ordenado, embora suspensos de funções, com o processo disciplinar a aguardar pelo processo-crime — ou seja, de férias pagas e prolongadas. Nada que os incomode, presumo. Todavia, pergunto: esta puta não terá pais, mulher, filhos que encarar? Alguns amigos ou conhecidos que o julguem honesto, o homem que lhe serve o café de manhã?

Esta puta vai andar por aí como se nada fosse, à espera que a justiça funcione e os outros se esqueçam dele? Não se vai internar voluntariamente na prisão ou num convento? “Basicamente, é uma puta”? Não, o que ele é é um chulo. Puta, ao pé disto, é uma profissão honesta.

Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia

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“Para não dizerem que não falei de flores”

(Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 31/03/2023)

Miguel Sousa Tavares

Antes de entrar no habitual cardápio de desgraças e indignações, deixem-me começar por um elogio: um elogio à ilha da Madeira. Desde antes da pandemia que não ia lá e, antes disso, passei quase uma vida inteira sem lá ir, cumprindo a promessa feita de não pôr lá os pés enquanto a Madeira fosse governada por um aprendiz de ditador que se divertia a insultar os “cubanos” do continente, a ameaçar com o separatismo e a desdenhar o esforço dos contribuintes para resgatar da miséria aquele pedaço de jardim atlântico. Posso achar muita graça a muitas graças dos políticos, mas não acho graça nenhuma aos que brincam com os meus impostos.

Mas, depois disso, desde que o dr. Jardim bolinou da Quinta da Vigia, em cada nova visita à Madeira constato que, afinal, ele — que certamente será uma excelente e engraçadíssima pessoa — não era nem indispensável nem insubstituível para o progresso da região. Porque a Madeira está cada vez melhor: mais arrumada, mais organizada, mais limpa, mais bonita, mais sedutora. E o Funchal está quase uma cidade modelo, agora que a parte velha foi recuperada e tem dezenas ou centenas de bares e restaurantes, nenhum com cadeiras ou guarda-sóis de plástico patrocinados por refrigerantes, mas todos decorados com brio e imaginação e onde a simpatia para com os turistas, portugueses incluídos, não se confunde com servilismo — ambas as coisas uma lição para o turismo do continente. Tudo está incrivelmente cuidado — ruas, praças, casas, jardins, canteiros, iluminação pública, indicações de trânsito — naquilo que só pode ser uma vontade colectiva e assumida de tornar a vida de locais e forasteiros mais agradável, sem cair num exibicionismo ostensivo e saloio. Num mundo que nos parece em acelerada decomposição e onde o turismo é quase sempre sinónimo de depravação, a Madeira surge como um oásis no meio do mar, dir-se-ia surreal de tão perfeito e tão frágil. Mas frágil, como todos os oásis. E esse é o seu desafio para o futuro: não quebrar essa fragilidade por excesso de ambição.

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ILUSTRAÇÃO HUGO PINTO

2 E vamos, então, às desgraças. Eu sou a favor de sociedades e países multiétnicos e multiculturais. Por todas as razões — e também, mas não principalmente, as económicas (que, todavia, desafiam a hipocrisia dos nossos supremacistas xenófobos) — entendo que Portugal só tem a ganhar com a imigração de diferentes grupos étnicos para cá. Desde que os tratemos como cidadãos de pleno direito e não como mão-de-obra escrava, como fazemos com tanta leviandade. Aliás, agora que o mais racista dos povos, o inglês, tem um primeiro-ministro da Inglaterra indiano e vai ter um paquistanês na Escócia, só mesmo uma franja de lusitano-trogloditas é que se pode lembrar de carpir pela pureza da cidadania. Acho curioso que estes cristãos de missa e mão no peito, como André Ventura, vejam o diabo à solta nas ruas porque um imigrante afegão, num gesto de loucura que qualquer português aqui nascido poderia ter cometido e comete, matou duas pessoas à facada, mas não vê pecado algum naqueles que os alojam em contentores e os fazem trabalhar 12 horas por dia, sem contratos nem qualquer protecção social. De cristãos destes está o Inferno cheio. Mas, a partir das miseráveis e obscenas declarações de André Ventura sobre o crime na comunidade ismaelita, pelo menos uma coisa ficou esclarecida: ele resolveu um dilema que Luís Montenegro não conseguia ultrapassar por si só.

A partir de agora, caída a última máscara de Ventura e dos seus seguidores do lúmpen social que albergamos, o presidente do PSD, um dos partidos fundadores do regime democrático em que vivemos, sabe que não pode continuar mais no seu jogo dúbio em relação ao Chega. Por mais que isso lhe custe, por mais que isso facilite a vida ao PS, Montenegro e o PSD sabem agora, de uma vez por todas, que este Chega não é frequentável. Há limites para a falta de decência: não queremos viver num país onde André Ventura e as suas ideias possam fazer parte de qualquer solução de governo. Porque eles não são solução, são problema.

3 As opiniões dividem-se sobre o real alcance que terá a taxa zero de IVA sobre 44 produtos alimentares. A maior parte dos consumidores não acredita que ela venha servir para fazer baixar o preço dos bens incluídos: ou porque daqui até à sua entrada em vigor eles irão subir o suficiente para absorver a baixa ou porque, no final, a cadeia que fixa os preços encarregar-se-á de fazer repercutir a seu favor o IVA zero e até ganhar com isso. Sinal dos tempos, essa maioria de consumidores atribui à distribuição (supermercados) a responsabilidade principal pelo aumento de 23% no preço dos produtos alimentares no último ano — um dos maiores da zona euro. E para isso contribuíram não apenas os lucros incríveis das principais cadeias de distribuição no último ano como também um raciocínio simples: se a produção não entrou em ruptura e o consumo não aumentou, uma inflação destas só pode dever-se a especulação na distribuição. E também concorreram coisas como a conferência de imprensa de Pedro Soares dos Santos, o patrão da Jerónimo Martins, ao anunciar lucros recordes de 590 milhões de euros. É extraordinário que uma empresa com a dimensão daquela não tenha ninguém que aconselhe o seu CEO a abster-se publicamente de se dirigir aos seus clientes e ao país no tom de arrogância e más maneiras como o que foi utilizado. Pela parte que me toca, o recado ficou entregue e digerido: não me verá mais nos seus supermercados. Com o que, aliás, só tenho a ganhar.

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4 Neste país facilmente se passa de bestial a besta. Bastou à CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, já oficialmente despedida com justa causa, apresentar postumamente lucros de 65 milhões no exercício de 2022 para que de esbanjadora passasse a heroí­na e até a candidata a um prémio milionário de gestão. Mas, salvo melhor opinião, parece-me difícil que ela ou o Rato Mickey não conseguissem apresentar lucros de gestão quando: a) Portugal registou uma brutal recuperação do turismo e todas as companhias aéreas tiveram idêntica recuperação de actividade; b) a TAP beneficiou de centenas de milhões de euros de isenções fiscais concedidas pelo Estado; c) poupou 100 milhões em cortes salariais que não poderão durar para sempre; d) praticou preços de usura nas linhas em que ainda mantém um monopólio de facto, como o Brasil e certos destinos nos EUA, que também não durarão para sempre; e) e poupou dinheiro degradando até um nível extremo o serviço de bordo aos passageiros. Ou seja, sem estas circunstân­cias ou ajudas anormais, a TAP teria dado prejuízo, como sempre. E, mesmo com elas, à razão de 65 milhões de lucro por ano, demoraria 35 anos, sem contar com a inflação, a devolver aos contribuintes os 3,2 mil milhões que lá pusemos. Felizmente que, ao contrário do anterior, o novo ministro da tutela já esclareceu que esse dinheiro, afinal, não é para devolver.

5 O défice das contas públicas em 2022 ficou em 0,4% do PIB, o que constitui uma proe­za muito além das previsões mais optimistas de toda a gente. Mas, atenção, tudo isto é enganador. O Estado não gastou menos nem gastou apenas 0,5% a mais. Em termos nominais gastou muito mais do que isso; o que aconteceu foi que as receitas subiram ainda mais, muito mais do que se esperava: 9000 milhões a mais de cobrança fiscal, à conta da inflação, sobretudo. Ou seja, enquanto os portugueses empobreciam, o Estado enriquecia. E as poupanças que fez na despesa não foram com as despesas correntes — com o funcionamento dos seus serviços e os seus funcionários — mas com as despesas de investimento, a despesa produtiva, como de costume. Temos assim um Estado rico num país pobre, que tributa alegremente a riqueza produzida, amealhando o dinheiro dos impostos para o gastar consigo próprio. Ver o défice público diminuir em percentagem do PIB não é má notícia. Mas melhor seria se essa descida resultasse da poupança do Estado, quer na sua despesa corrente, quer na carga fiscal cobrada, deixando margem para a economia fazer crescer o PIB de forma saudável.

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Miguel Albuquerque e a grotesca imitação de A. J. Jardim

(Por Carlos Esperança, 07/11/2019)

O novo sátrapa pretende ser um novo Jardim, e não passa de medíocre avatar. O louvor do Governo Regional ao major-general Cardoso Perestrelo, afastado do Comando Operacional da Madeira pelo EMGFA, por ter mandado transportar, para um torneio de golfe, o canhão que um civil disparou, foi uma afronta à decisão da hierarquia militar do País.

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A Madeira vive ainda do confronto com o Governo de Lisboa, que atura os desmandos dos sobas autóctones. O louvor, vindo de onde vem, é a pena acessória ao afastamento do militar que fez do material de guerra brinquedos para divertimento da elite local.

As exigências dos governantes da Madeira que não mudam de partido, nem na ditadura, que apoiaram, nem na democracia, que contestam, tornam-se intoleráveis.

O pomposamente designado XIII Governo Regional da Madeira faz exigências a Lisboa que o elementar bom senso devia obrigar a recusar. Os excessos autonómicos vacinaram o Continente contra a Regionalização e os sucessivos governos nacionais subjugaram-se aos desmandos insulares, dotados de uma faraónica máquina político-administrativa.

Os impostos recebidos nas Regiões Autónomas são aí retidos e os seus Orçamentos são participados em cerca de 40% pelo OE e subsídios da UE para regiões ultraperiféricas. Açores e Madeira não pagam as despesas com as forças militares, policiais e prisionais, nem com os Tribunais, e não participam nos encargos com organismos internacionais, ONU, NATO, representação externa do Estado ou para a própria UE de onde recebem uma fatia do seu orçamento.

O dever de solidariedade do País com todo o seu território, isto é, com todos os seus cidadãos, não se discute, mas acontece que a Madeira é já uma das regiões mais ricas do País, indiferente ao abandono a que o interior continental e as suas gentes são votados.

É fácil aumentar funcionários públicos, que o OE não contempla, quando os sucessivos défices excessivos são endossados ao Governo da República. Foi imoral o desrespeito à moralização imposta, impossibilitar a adição de vencimentos do Estado às reformas da Segurança Social, que obrigou Cavaco Silva a prescindir do vencimento de PR e a optar pelas reformas, mais substanciais, mas não impediu Jardim de receber o vencimento de Governador, equivalente a ministro, com a reforma de professor, no 7.º escalão.

O crescimento superior à média nacional que Miguel Albuquerque exige para a Madeira à custa dos desequilíbrios agravados nas Beiras, Alentejo e Trás-os-Montes é ultrajante. É a indiferença de quem quer manter o poder à custa dos privilégios que comprometem cada vez mais a equidade nacional.

O programa do XIII Governo Regional da Madeira é o caderno de encargos para o OE, cheio de ameaças e tiques autoritários, que morde a mão que perpetua o poder político do sátrapa local.

É altura de olhar para as zonas mais desfavorecidas e resistir à permanente chantagem da Madeira sem permitir a perpetuação do paraíso de governantes inimputáveis.