Cavaco Silva – Uma assombração

(Carlos Esperança, in Facebook, 21/05/2023)

Ontem, para fazer esquecer a melhoria da perspetiva da notação da dívida soberana pela agência americana Moody’s, surgida na véspera (ver aqui), apareceu a liderar a oposição de direita o rancoroso Professor Aníbal.

Substituiu Marcelo, convicto de que, à semelhança das águas residuais, que podem ser recicladas, os ativos tóxicos podem ser branqueados.

Aníbal Cavaco Silva, catedrático de Literatura pela Universidade de Goa, Grande Colar da Ordem da Liberdade por desvario de Marcelo, não se livrará do passado onde teve a sorte de as intrigas de Marcelo e as assinaturas falsas o fazerem, na Figueira da Foz, presidente do PSD contra o democrata João Salgueiro.

Marcelo, Júdice e Santana Lopes fizeram-no PM; Marcelo, Durão Barroso e Ricardo Salgado, ingratamente abandonado, prepararam na vivenda do último a sua candidatura vitoriosa a PR.

Mas não se julgue que o político videirinho foi apenas um salazarista beneficiado com a democracia, a que pretendeu abolir, conluiado com Passos Coelho, os feriados identitários do País, 5 de Outubro e 1.º de Dezembro.

Com o reiterado absentismo na Universidade Nova, para dar aulas na Católica, obrigou o reitor, Alfredo de Sousa, que o fizera catedrático, a levantar-lhe o processo disciplinar que o despediria por faltas injustificadas. Teve a sorte de ter como ministro da Educação João de Deus Pinheiro que lhe relevou as faltas e receberia em recompensa o Min. dos Negócios Estrangeiros.

O ressentido salazarista não foi apenas venal na docência, “mísero professor” no léxico cavaquista, foi igualmente no negócio das ações da SLN, para ele e filha, e no suspeito negócio da Vivenda Gaivota Azul, na Praia da Coelha.

Apesar de exigir que se nasça duas vezes para alguém ser tão sério como ele, há boas razões para pensar que sobra uma. Os seus negócios foram tão nebulosos como as razões do preenchimento da ficha na Pide, com erros de ortografia.

Ontem, o Professor Aníbal veio bolçar o ódio que o devora, depois de ter sido obrigado a dar posse ao primeiro Governo de António Costa, de ter então esbracejado e denunciado à União Europeia o perigo de um PM apoiado pelo PCP e BE. Exigiu que António Costa pedisse a demissão, apareceu nas televisões, rádios e cassetes piratas, e regressou aos sais de fruto enquanto a oposição de direita continuará a ser liderada por Marcelo.

O homem é assim, o salazarista inculto e primário que o marcelista culto, empático e igualmente perverso está a substituir com mais êxito.

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Marques Mendes e as suas homilias semanais

(Carlos Esperança, in Facebook, 10/04/2022)

Nunca sabemos se o bruxo de Fafe é ele próprio, o militante de uma das fações do PSD, o conselheiro de Estado, o candidato a PR ou o alcoviteiro de Belém, e qualquer um dos avatares é suficiente para que os jornais, emissoras de rádio, canais de televisão e redes sociais façam eco das homilias do comentador avençado do “Jornal da Noite”, da SIC.

Quando tinha acesso à agenda do Conselho de Ministros, na época insalubre de Passos Coelho, Paulo Portas e Maria Luís, era certeiro a predizer o futuro e a acertar no que se discutia em S. Bento, incluindo as reuniões que se faziam por telemóvel, onde os SMS podiam ser a ata para a resolução do grupo GES/BES e outras decisões graves.

A fama de pitonisa privilegiada do regime vem desses tempos. No início da legislatura do primeiro governo de António Costa, que o PS, BE, PCP e PEV sustentaram, já se enganava mais do que quem nunca teve dúvidas, seu antecessor na liderança do PSD.

Há mais de sete anos, no dia seguinte à tomada de posse do Governo PS, na primeira homilia, num domingo, como convém aos pregadores, dedicou-se a divagações sobre o “estado de espírito” do PM e saiu-se com este sombrio diagnóstico: “António Costa está com medo da sombra e psicologicamente frágil”.

Logo ecoaram as palavras em todos os megafones ao serviço da direita, então da direita que aguardava de Belém um sinal de que não lhe faltaria quando a casa do PSD e o táxi do CDS saíssem a brilhar da lavandaria dos congressos. Não previu o CDS que teria de prescindir do táxi por falta de passageiros.

Marques Mendes devia lembrar-se da coincidência das suas homilias com as capas dos jornais no início do primeiro Governo de António Costa, quando o Professor Cavaco ululava imprecações e, já laureado com o Grande Colar da Ordem da Liberdade, devorava frascos de sais de fruto a debelar a azia de um Governo, apoiado por toda a esquerda, que o velho salazarista foi obrigado a empossar.

Num país onde minguam notícias e sobram opiniões é um regalo recordar as capas dos jornais desse tempo, já que as profecias do bruxo se perderam no ruído da intoxicação da opinião pública.

Admira que a credibilidade do bruxo se reforce depois dos desatinos. Alguém se lembra ter dito que Mário Centeno na presidência do Eurogrupo só podia ser a piada do 1.º de abril?

Tudo se esquece, desde problemas eventuais com alegados negócios problemáticos, de cuja investigação o Conselho de Estado o livrou, até às profecias que só acerta depois.

António Costa há de deixar de ser PM, só não se sabe quando! O PR há de dissolver a AR, mas está com medo do partido fascista e não quer que o País julgue que é ele que pretende o regresso a um governo onde o pai coubesse.

Assim, à espera de incêndios que hão de surgir, não será difícil deixar a direita abraçada à extrema-direita, mas não sabe o PR nem o seu alter ego Marques Mendes quando será.

A concretização do desejo por voluntarismo do PR pode transformar o narcisista que é em tão odiado PR quanto o salazarista que o precedeu em Belém.


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Sofrerei de daltonismo político?

(Carlos Esperança, 17/10/2018)

independente

Não garanto que alguma vez, por grave distração, não tenha passado por um sinal vermelho sem o ver, mas não o confundo com o verde, mesmo com acuidade visual atenuada.

Já em política não estou tão certo de que algum fenómeno catatímico interfira na minha visão, apesar de ser exigente com a conduta de quem nos governa, quer dos partidos da minha simpatia, quer dos adversários.

Quando o atual governo iniciou funções, foram constituídos arguidos os secretários de Estado que aceitaram a viagem a uma Empresa, à vista de todo o país, para um jogo da seleção nacional de futebol, o que levou à demissão das funções para que lhes sobejava competência. O próprio ministro das Finanças esteve em risco, por ter solicitado dois lugares no camarote da direção a um clube para ver um desafio de futebol, uma paixão a que não é imune um doutorado por Harvard. Na minha opinião, os primeiros não deviam ter aceitado. No caso do ministro pareceu-me pura perseguição partidária.

No anterior governo, uma secretária de Estado que negociara Swaps com o Estado numa empresa privada, viu sair colegas por esse motivo, mas permaneceu e, à falta de melhor, chegou a ministra das Finanças. Saiu para um fundo abutre, em Londres, acumulando o lugar de deputada. Passos Coelho chegou a PM após a fraude com fundos europeus na Tecnoforma, o pedido de salário como deputado em exclusividade (não concedido), a falta de pagamento às Finanças e à Segurança Social. Saiu como catedrático.

Autarcas acusados de corrupção pela revista Visão, em que se destacam Marco António e Luís Filipe Meneses, continuam tranquilos à espera da prescrição dos crimes que a revista lhes imputou. O País só queria saber se foi calúnia ou se a PGR não soube.

Durão Barroso era PM e foi em jato privado ao Brasil, com a família, para uma estadia numa ilha paradisíaca, a convite de um amigo com negócios com o Estado. Foi de férias no iate de um magnata, quando estava indigitado para presidente da Comissão Europeia, e acabou, depois de suspeitas e furtivas reuniões, como CEO de Goldman Sachs, em Londres.

Paulo Portas, desde as trapalhadas da Universidade Moderna, da falência fraudulenta da empresa de sondagens Amostra, da falta de recibos de pagamento aos sondadores e do atraso de pagamentos às Finanças, comprou submarinos sem que fosse averiguado o destino das comissões que levaram a condenações dos corruptores alemães.

Com exceção de Cavaco Silva, uma referência ética, incorruptível, incapaz de intrigas e de rancores, com um passado imaculado como investigador da Gulbenkian, assiduidade inexcedível na docência de uma Universidade pública, que alia uma invulgar cultura ao inexcedível sentido de Estado, com exceção de Cavaco – dizia –, sobre as referências da direita pairam suspeitas que nunca foram investigadas.

Provavelmente sofro de facciosismo político. Aliás, nunca disfarcei o posicionamento político.