Assim o quiseste, assim o tiveste — o preço da energia

(Carlos Matos Gomes, in Medium.com, 25/08/2022)

Os agentes de comunicação de massas impuseram uma verdade. Essa verdade tem consequências que começam a doer. Agora, os mesmos que apoiavam as sanções e os embargos perguntam aos políticos o que vão fazer. É hipocrisia em estado puro. Os assim designados jornalistas são cúmplices da situação que estamos e vamos viver.


Os jornalistas têm responsabilidades sociais. Não podem atirar a pedra e esconder a mão.

Digámos. Assim começava um dos televangelistas contratados para formatar a opinião pública para das intenções expansionistas da Rússia as suas prédicas diárias. Era necessário formar uma opinião que aderisse à narrativa de que a Ucrânia era pacífica e democrática, um Estado exemplar que, de um momento para o outro, e sem qualquer motivo, se vê invadido pelo ameaçador vizinho.

Houve alguns, poucos, que se atreveram a desmascarar esta história de cobertura de intenções. Os grandes meios de manipulação adotaram com fervor militante a tese da iníqua e criminosa invasão, que contrariava os princípios do Direito Internacional e até a doutrina da guerra justa de Santo Agostinho.

Sabe-se hoje pela voz da administração americana e do governo do Reino Unido que americanos e ingleses, com a cobertura da NATO (essa virtuosa aliança defensiva) andavam a treinar o exército ucraniano desde 2004, com maior intensidade a partir de 2014, que lhe haviam fornecido material moderno e apoio de informações (intelligence), incluindo via satélite. Um exército especialmente criado para o efeito foi instalado na zona russófila do Leste da Ucrânia, causando cerca de 14 mil mortos. O novo governo pró-americano da Ucrânia, que tinha como figura de boca de cena Zelenski, foi incentivado a provocar a Rússia com um pedido de adesão à NATO. O que tinha ficado acordado que não aconteceria e que colocaria Moscovo a 10 minutos de voo dos novos misseis táticos. Isto é, a capital da Rússia ficava dentro do teatro de combate e sem possibilidades de defesa!

A guerra da comunicação, contando com o entusiástico empenhamento dos jornalistas, obteve uma vitória estrondosa, há que reconhecê-lo: as opiniões publicas europeias abraçaram as teses americanas e as lições da doutora Ursula Van der Leyen. Esta vitória da manipulação preparou as opiniões públicas para a fase seguinte: havia que castigar os russos pelo atrevimento de não querem um vizinho que subalugava o seu território para ali serem instaladas armas contra si. Saíram as conhecidas sanções — em pacotes! — seis pacotes, meia dúzia. Houve quem, deitando mão a bom senso, tivesse avisado que as sanções seriam tiros nos pés, fariam ricochete. Foram acusados de putinistas.

Os dirigentes europeus anunciaram o seu grande objetivo: a independência energética da Rússia. Nenhum jornalista se atreveu a perguntar de quem passava a Europa a ser dependente, dado a Europa não possuir grandes recursos energéticos. Ficaram em respeitoso silencia e seguiram de capacete e colete (PRESS) como pequenos rafeiros os guias que na Ucrânia lhes mostravam casas destruídas, ruas com corpos, desgraças de todos os conflitos, diárias em várias partes do mundo àquela mesma hora, na Palestina, na Eritreia, na Nigéria, no Haiti, até nas favelas do Brasil, ou nas dos Estados Unidos (sim, há favelas nos EUA).

Os dirigentes europeus transferiram enormes quantidades de dinheiro, de materiais e de armamento a um grupo dirigente que sabiam ser notoriamente corrupto, que eles próprios haviam classificado como dos mais corruptos do mundo. De repente ficaram com o cadastro limpo e até com certificado de bom comportamento. Quem está preso é o Assange.

Os dirigentes europeus sabiam das causas da invasão. Sabiam que estavam a lidar com um homem de mão dos EUA, sabiam que a maioria das notícias sobre a guerra eram mentira, ou deturpações. Casos dos massacres de civis — que foram apelidados de genocídios. Caso da central de AZOV, caso agora da central nuclear. A tecnologia hoje disponível permite saber a marca dos cigarros que um condutor vai a fumar, a 50 km de distância. Sabe-se através de infravermelhos onde estiveram aeronaves e peças de artilharia. Os dirigentes europeus tem toda a informação e mentem, ou deixam correr as mentiras que os serviços de propaganda de Kiev, da NATO, ou do Pentágono injetam nas redações. Algumas das reportagens veem já pre-editadas, não vá o apresentador esquecer-se de algum pormenor.

As opiniões públicas foram devidamente hipnotizadas. Pintaram caras de azul e amarelo, até votaram numa cançoneta só porque era dos pobres de Zelenski. Arrancaram os cabelos. E a unanimidade não olhou a divisões civilizacionais e políticas. A esquerda europeia amigou-se com Boris Johnson, com Ursula van Der Leyen, com o beato presidente da Polónia, com Biden. Quem não se dobrava diante das charlas de Zelenski (se repararem os seus técnicos de imagem filmam o comediante de baixo para cima parra parecer que ele fala de cima para baixo. Truques de sucesso) era banido e execrado.

Mas chegou a hora pagar tanta bondade, tanto ucranianismo, tanto zelenkismo. E aqui é que a porca torce o rabo. A energia vai subir entre 30 e 40 por cento. E energia são combustíveis e gás para as refeições, o banho, o aquecimento, o pão. Mas somos independentes da energia da Rússia! Isso é que é importante. Mas somos dependentes do petróleo e do gás americano obtido através do caríssimo processo do fracking e que tem de ser transportado de barco através do Atlântico, ou comprá-lo as petrolíferas que dominam a Arábia Saudita e o Médio Oriente e que são estados vassalos dos EUA. Mas estamos no mundo livre. Embora só tenhamos um fornecedor de energia e uma fonte de verdade.

Os agentes de ação psicológica (APsic) de serviço nas redações, jornalistas, assim ditos, agora interrogam o governo e parecem surpreendidos porque o governo não toma medidas para baixar o preço do gás! Abençoada hipocrisia. O governo, todos os governos europeus tomaram as decisões que conduziram a esta situação. Os ditos jornalistas que andaram pela Ucrânia, ou por Bruxelas, sabiam que este seria o resultado, ou então ainda são mais lerdos do que parecem quando perguntam com um olhar espantadiço: e agora, senhor ministro? O senhor não sabe produzir gás a pataco? Bilhas milagrosas como a lâmpada de Aladino? Não nos aconselha a mudar de eletrodomésticos, como fez a senhora Van der Leyen?

De facto, os governos europeus tomaram as medidas que conduziram a esta situação. Alguns, poucos, disseram que as sanções eram estúpidas ou, se eram pensadas, iriam conduzir ao desastre que já se anuncia. Putinistas. Vamos quebrar a espinha aos russos. Nem hambúrgueres vão comer! (Nem nós, pelos vistos).

A Europa está livre da dependência da Rússia. Aleluia! Devemos alegrar-nos, ou não? Foi esta a cama que fizemos, é nela que nos vamos deitar. Os jornalistas são parte do coro. São cúmplices da situação. Nada de queixumes.

Por fim, não há nada que possa alterar esta situação: inflação galopante e recessão. Os atuais dirigentes europeus nem sequer têm arte para salvar a face numa retirada com o mínimo de perdas (aprende-se no póquer, mas eles são mais de videojogos).

A situação pode ser caricaturada com o ministro português dos negócios estrangeiros: a Europa, através do Casão Militar fabricante de camuflados e quicos, fornece fardamentos (de boa alfaiataria) aos soldados de Zelenski, os americanos. através de Biden, oferecem mais três biliões de material militar. É esta oferta dos EUA que determina o preço da energia que os europeus vão pagar. Mas «os» e «as» tele evangelistas recrutados/as para os telejornais dirão que a culpa é, «digámos», do Bladimiro, como um deles trata o homem que fechou a torneira do gás a pedido dos europeus, diga-se.


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10 pensamentos sobre “Assim o quiseste, assim o tiveste — o preço da energia

  1. A verdade aí está em todo o seu esplendor
    Excelente texto
    Cambada de idiotas
    E agora face à realidade toda esta cambada de comentadores,analistas,TV jornais de m……vão meter o rabo entre as
    pernas e ganir
    Tarde piaram

    • Excelente texto de facto.
      E quase tudo dito por si também..

      Mas pensar que eles (a Manipulação Social) vão meter o rabo entre as pernas, é ingenuidade. Agora vai passar a ser a hora de fazer a fase seguinte da manipulação para colocar no poder “os líderes certos”. É que não sei se sabe, mas na Alemanha o Scholz ainda é criticado por não ser suficientemente pró-Zelensky. A seguir, hão de fazer a cama para o próximo Hitler… que será uma mulher pró-LGBT e defensora dos “valores europeus”, da NATO “defensiva”, e que irá fazer o que Scholz recusa fazer: enviar aos NAZIS as armas para eles atingirem território Russo.

      E se a inflação subir mais, a culpa é do Putin. E se alguém se queixar, é “putinista”.
      Isto ainda está no início. O pior ainda está para mim. Marquem as minhas palavras. A estupidez não tem limites. E ser propagandista do regime, só em Portugal que é um país pobre, dá salários de 5 mil €uros para cima! É um fartote. Porque é que esta gente se havia de preocupar com mais alguém ou com o que quer que seja? Vamos morrer todos, e eles vão continuar a facturar e a lucrar.

      Chama-se “democracia liberal” em “economia de mercado”. Dizem que é de tal forma a receita certa, que não vale a pena experimentar mais receita nenhuma. É o fim da história. Um eleitor do BE/PCP que queira um salário mínimo mais decente é um “extremista”. Um comentador do regime que branqueie Nazis, é um do “centro moderado”.

      Na Ucrânia só os Russos morrem, a Ucrânia “avança” todos os dias (na direção oposta à Rússia), os HIMARS fazem milagres mesmo depois de destruídos, e a Rússia está quase sem mísseis e os seus soldados já morreram todos. Falta só mais um bocadinho… É nisso que os peasants têm de acreditar. A nobreza (oligarquia ocidental) à frente do regime precisa dessa ilusão para sobreviver a 2022 e 2023. E os tolinhos papam tudo e ainda batem palmas. É como diz o Carlos Matos GOmes, a culpa de tudo é só do Bladimiro.

      • Nada é a preto e branco. Mas, confesso, não sabia a quantidade de russofilos bem inseridos na sociedade portuguesa. Os ucranianos não são santos, mas é indisfarçável um objectivo genocida por parte dos russos, que de fascistas não têm nada…

        • O Genocidio no Donbas pelos Nazis ao Povo que aí vivia e vive não te incomoda? basta o rótulo de Russófilos ……já o Oliveira de Santa Comba e seus Bilros sofria da mesma doença…..e tu como “herdeiro” sobreviveste ,ma scomo vês a Demogracia que não é o teu prato preferido ,dá-te a Liberdade que recusas aos outros….sabes quantos Cidadãos morreram às mãos dos fascistas Azovs 40 mil? Não importa são Russófilos ……

  2. Sem energia, as empresas fecharão, os serviços serão inúteis e o desemprego explodirá,e o euro entrará em colapso. Como os cofres já estão mais do que vazios, isto não augura nada de bom para a dívida pública, aumento dos preços, inflação e taxas de juro. Quanto ao racionamento, dado que Portugal não produz nada por si só sem importações (nem sequer a sua própria comida), não tenho muita certeza do que será racionado com passes..(Passe carburante,passe verde,passe para comprar comida,etc,etc).

    Desde o início, previ este cataclismo e especialmente o facto de irmos dar um tiro no nosso pé.
    Para a Rússia, as exportações vão para a China e África, o que não faz qualquer diferença para este país. Além disso, neste combate de braço de ferro, Van der Layen e politicos europeus apenas piorou a situação. Uma pessoa teve uma vingança pessoal para se afirmar após a afronta da Turquia em Abril de 2021. A outra precisava de uma crise para existir. E Putin ofereceu-lhes os dois meios de existir.
    Eles simplesmente não mediram as consequências do seu orgulho. E dos seus egos.

    Quanto ao GNL americano, muito mais caro do que todas as outras fontes, em princípio é fixe, mas na prática é apenas risível, e não é realmente acessível, mesmo a curto prazo e a taxas pontuais. O empréstimo para combater a “pobreza energética” não vai durar muito tempo, pois podemos pedir empréstimos sem aumentar as taxas para níveis que matarão muito mais a nossa economia.

    Analisei os preços da electricidade nos mercados. 580 euros por megawatt. 1 mw= 1000 kwh assim 580/1000= 0,58 euros HT o kwh sem escudo tarifário (que terminará em 31/12/2022). As pessoas vão para rua com isto…

    A taxa de inflação é subestimada pelo INE porque o instituto europeu equivalente a anuncia bastante a 9%, o que talvez também seja minimizado, pelo que acredito que vamos encarecer e não é com o poder actual em Portugal e com os líderes europeus que isso é susceptível de melhorar, eles conduzem-nos à catástrofe e por orgulho deslocado não mudarão a directriz, Só que este caso pode acabar na rua, e o Srs ministros que se gabavam tanto de ter afundado a economia russa, bem, tanto quanto posso ver, tenho a impressão de que somos nós que estamos a afundar-nos, penso que agora os politicos está a tentar usar o truque do patriotismo e liberdade para fazer passar a coisa..

    Que ninguém se esqueça,a pobreza no dá liberdade,pelo contrário !

    O PIB real irá de facto diminuir em 2022.
    Mas ao subestimar a inflação ainda podemos mostrar um crescimento artificial.
    Os números da inflação têm vindo a ser subestimados há anos.
    Não poderemos recomeçar numa base sólida enquanto não esvaziarmos as bolhas especulativas que atingiram níveis estratosféricos, começando pelas acções e bens imóveis, mas também a mais delicada, a bolha de ligação.

    Infelizmente, a inflação não afecta todos os produtos, mas se afecta a energia, então afecta todos os lares.
    Do lado do Reino Unido, os meteorologistas também alertam para um possível aumento meteórico de 8% até ao final de 2022 .

    “A inflação dos preços ao consumidor no Reino Unido deverá atingir um pico de 23% – 12 vezes o objectivo do Banco de Inglaterra – no início de 2023, disse na segunda-feira um economista do banco norte-americano City, aumentando novamente a sua previsão à luz do último salto nos preços da energia”.

    O grande problema deste Inverno é a energia, em particular o gás e petroleo, e como a electricidade no mercado grossista se baseia no gás, será difícil para o governo continuar o escudo tarifário sem afundar as finanças públicas. Se acrescentarmos a isso arriscamo-nos a ter uma escassez de electricidade em dias muito frios. Alguns politicos disseram que este é o fim da abundância, obviamente para o portugués médio, não para aqueles que viajam de jacto privado.

    Faz-me lembrar um amigo a quem tentei fazer compreender que a situação ia piorar, ele fez ouvidos de mercador, penso que é sintomático da nossa sociedade, a maioria das pessoas prefere uma mentira suave a uma verdade cruel..

    As histórias de dificuldades temporárias são uma grande piada, a crise energética não vai melhorar, nem a queda do euro, este é apenas um argumento político para manter as pessoas em frente às suas televisões e não responsabilizar os seus líderes, é apenas um enredo alternativo da cenoura ao burro (vindo de pessoas irresponsáveis, acreditando que é irracional).

    Além disso, o que pensam os progressistas do tão apregoado “mundo anterior” que já tinha acabado?

    Quando os nossos líderes decidem “pôr a Rússia de joelhos economicamente”, vemos o que acontece! Especialmente porque estou convencido de que continuamos a comprar petróleo russo, mas indirectamente; de facto, penso que os países produtores não produzem o suficiente para acompanhar este aumento, e que por isso compram parte do seu petróleo à Rússia. Petróleo que compramos de volta com o ganho de capital que o acompanha (mas não passámos o cheque directamente aos russos, por isso estamos felizes, pensandos que o petróleo não é russo).

    Encontramo-nos numa situação historicamente bastante inédita.
    Não estamos em guerra, mas estamos !
    Declarámos guerra económica à Rússia, mas compreendemos que podem passar sem nós, o contrário é mais complicado (devido à nossa dependência da energia)

    Assim, podemos resolver isto rapidamente, fazendo a paz com a Rússia de alguma forma, mas os nossos chefes (os EUA e a UE) parecem estar determinados, de momento, a liderar a sua cruzada contra a Rússia.

    Outro ponto novo é que antes eram os industriais que davam as ordens, portanto, se uma decisão política fosse matar a indústria, esta decisão política seria rapidamente contrariada ou cancelada.

    Mas hoje, é muito mais o mundo das finanças que nos governa … pode dizer-se, um país bastante desindustrializado, e que, se acabarmos com a indústria … isso não irrita realmente os financiadores.
    Só que agora só podemos observar o colapso do euro, e mesmo que seja um financiador, mesmo com um bacharelato em finanças, compreende rapidamente que um país desindustrializado não será capaz de resistir a uma crise, por isso vai ser interessante seguir o que acontece.

    Há anos que se grita que tudo parece estar planeado para organizar esta sequência de eventos que não são mais do que ataques contra as massas… Costumávamos ter prazer em pagar impostos para ter paz de espírito sobre tudo isto e, pouco a pouco, todos estes serviços foram privatizados.

  3. A luta pela liberdade tem o seu preço. Por esta linha de pensamento fico somente confortado, que um dia que o PCP ganhe as eleições está dada a justificação pelos próprios para uma intervenção dos EUA em Portugal para nos livrar da Aliança Defensiva da URSS.

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