(Jorge Gonçalves, in Público, 20/12/2021)
(Independentemente da eficácia das vacinas contra a Covid-19, não há dúvida que elas representam um negócio milionário para as farmacêuticas, ainda por cima quando já se fala em quartas doses, quintas doses e sabe-se lá até que numeral. Não admira que a informação deste artigo não tenha tido divulgação que se visse na comunicação social: estraga grande parte do negócio das vacinas.
E não me venham falar de fake-news. Devido ao perfil científico do autor e pelas fontes que cita, concluo que há toda uma vertente de negócio e de política alinhada com negócios na ocultação da verdade científica que é revelada. Estátua de Sal, 20/12/2021)
É provável que a China tenha encontrado um tratamento que evita as manifestações mais graves da covid-19. Em causa está a contribuição de uma hormona para a evolução da doença, informação que ninguém poderá acusar a China de ter ocultado.
A China tem cerca de 140 vezes mais habitantes do que Portugal. Porém, tem registado menos de um terço de óbitos atribuídos à covid-19 do que em Portugal. Com a proporção da China, Portugal teria um pouco mais de uma centena de óbitos por covid-19 e não os mais de 18 mil.
Estes números dão que pensar! Quando os tento discutir os meus interlocutores agilmente os explicam: a China está a mentir!
Compreendendo a reação e as razões. Mas há algo que não encaixa nesta explicação. No início a China empenhou-se em mostrar a sua capacidade para combater a epidemia. Quem não se lembra da construção em dez dias do hospital de Leishenshan, em Whuan? Porque é que em meados de fevereiro de 2020, os números começam a baixar e nunca mais aumentaram de forma significativa? Porque encerra em Abril o hospital de Leishenshan? Se a intenção era ocultar, porque é que no dia 17 de abril acrescentam mais 25% ao número oficial de vítimas alegadamente por falhas na contabilização anterior? E porque é que a China continua a notificar a OMS (mais 1054 óbitos desde então)? Se os números fossem proporcionais aos de Portugal, a China teria tido mais de 161 milhões de casos e mais de 2,6 milhões de óbitos por covid-19. Seria possível ocultar tal realidade e disfarçar o seu impacto sobre a economia?
A explicação pode ser outra! É provável que tenham encontrado e aplicado um tratamento que evita as manifestações clínicas mais graves da covid-19. É uma hipótese que até pode ser considerada ofensiva face à realidade que vivemos. Mas analisemos os factos e os estudos científicos que os suportam (indico os respetivos códigos PMID para quem estiver interessado em os estudar).
Em fins de janeiro e princípios de fevereiro de 2020 foram aprovados para publicação em revistas científicas de grande qualidade (Nature, J. Virology, Cell e Science) quatro estudos (PMID: 32015507, PMID: 31996437, PMID:32275855 e PMID: 32132184) com a demonstração que a proteína ACE2 é o recetor do vírus SARS-CoV2. Todos os estudos são de grupos de investigação da China, exceto o segundo que é dos EUA mas liderado por um investigador de origem chinesa.
Parece-me que poucos perceberam a importância de tal descoberta. Estes estudos vêm na sequência de uma investigação constante que a China manteve desde a epidemia de SARS em 2003/4 e podem relacionar-se com um trabalho publicado em 2005 na Nature Medicine (PMID: 16007097) que mostra que não precisamos do vírus para causar a insuficiência respiratória. Basta a parte que se liga ao recetor e que a insuficiência respiratória pode ser tratada com medicamentos anti-hipertensores. Parece-me que poucos perceberam a importância de tal descoberta.
Mas que relação pode haver entre a infeção pelo vírus e os anti-hipertensores? A relação não é direta. De uma forma simplista podemos dizer que a ligação do vírus ao recetor é “fatal” para o recetor. Ambos são transferidos para dentro da célula! A célula infetada passa, por isso, a ter dois “problemas”: (i) os causados pelo vírus que entra na célula para se replicar e (ii) os causados pela falta que o recetor faz no seu “local normal”. No caso da ACE2, esta falta é particularmente grave nos pulmões. A sua falta leva à acumulação de uma hormona que aumenta a pressão arterial. Um dos modos como esta hormona atua é através da diminuição do paladar para estimular a ingestão de sal; outro é por causar uma inflamação arterial. Curiosamente, isso é observado na covid-19 (e as semelhanças não ficam por aqui!).
O investimento em I&D que a China fez mostrou-lhes, em primeira mão, que esta hormona pode ter uma contribuição para a doença. Havendo medicamentos seguros e baratos que inibem o efeito dessa hormona, é muito provável que tenha sido esta a via que permitiu às autoridades chinesas controlar a covid-19 de forma tão rápida e eficaz [até porque é sabido que nessa altura a informação sobre esta possibilidade passou a circular na comunidade científica e médica chinesa (PMID: 32061198, PMID: 32164092)]. O racional da abordagem é simples. Basta que os que testam positivo SARS-CoV-2 tomem um desses fármacos durante alguns dias, numa dose ajustada às circunstâncias, para se prevenir as formas graves de doença. Se o futuro vier a confirmar a validade deste modo de tratamento, ninguém poderá acusar a China de ter ocultado informação. Na Europa esta possibilidade também circulou (ver, por exemplo, PMID:32464637), mas, até agora, as autoridades de saúde têm-na ignorado. Porquê? A história o dirá!
Esta hipótese não é apenas baseada em ciência made in China. Num estudo publicado na revista da Associação Médica Norte-Americana (o JAMA) em Abril de 2021 (PMID: 33787911) por autores do Reino Unido compara-se o número de óbitos e de formas graves de covid-19 em mais de 102 mil hipertensos, de acordo com a medicação que estavam a tomar. Destes, mais de 26 mil tomavam fármacos que inibem a hormona que está sob controlo do recetor do SARS-CoV-2. Os resultados mostram que, mesmo nas doses habitualmente usadas para a hipertensão, estes medicamentos reduziram, para quase metade, a mortalidade e as formas graves de covid-19. Além deste estudo, num ensaio clínico realizado na Argentina (PMID:34189447) foi testado em doentes com covid-19 já a necessitar de hospitalização, um medicamento dessa classe de anti-hipertensores. De entre os efeitos do medicamento sobre a redução da gravidade e mortalidade, o mais impressionante é a redução do tempo médio de internamento de 15 (grupo placebo) para nove dias (grupo tratado). Para se perceber a importância deste resultado, refira-se que, em 2020, Portugal terá gasto 34 milhões de euros para comprar um medicamento que reduzia em menos de um dia o tempo de internamento.
Se é assim tão simples, sendo os medicamentos seguros, abundantes e baratos, e estando nós nesta situação “miserável” de viver entre vagas de covid-19, porque é que não se tenta? Na minha modesta opinião, as razões são várias e são mais políticas (não de políticos) do que científicas. É mais um exemplo da incapacidade da Europa para aplicar o conhecimento científico. Com uma diferença que, neste caso, a Europa está muito acompanhada! E a China parece ser quem está a beneficiar com isso!
E agora? Continuam a achar que a China está a mentir? Não se precipitem na resposta! Respostas precipitadas podem ter consequências graves na vossa saúde. E no nosso futuro coletivo!
Prof. Catedrático de Farmacologia/Faculdade de Farmácia da U.Porto/Director do Dep. de Ciências do Medicamento