(Por Carlos Esperança, 06/05/2019)
Quando em 17 de abril de 1969 não foi concedida a palavra ao presidente da Associação Académica de Coimbra, Alberto Martins, que a solicitara numa cerimónia académica, presidida pelo lacaio de Salazar, Américo Tomás, abateu-se a repressão policial contra os estudantes. Seguiram-se a greve e a falta aos exames pelos alunos que contestaram a ditadura e acabaram presos e mobilizados para a guerra colonial, que lhes interrompeu os cursos.
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Neste ano, a pretexto do cinquentenário, tem vindo a ser comemorada a data – e bem –, na homenagem que é devida, pela coragem, aos que ousaram desafiar a ditadura e a sua feroz repressão enquanto ainda andam por aí os que, por convicção fascista, traíram.
Pela importância do movimento académico na luta contra o fascismo, compreende-se a omissão das lutas dos trabalhadores e oposicionistas, em geral, e dos comunistas e anarquistas, em particular, vítimas de ainda maior e mais violenta repressão.
Lamento, na evocação da crise de 1969, o facto de não ter sido utilizada para associar, na recordação desta corajosa luta académica, as que a precederam. Já não digo que se recuasse à heroica luta da greve de 1907 contra a ditadura de João Franco, mas a todas as que desgastaram o consulado salazarista.
Em 1962, a crise académica, começada em Lisboa, foi um dos principais momentos da luta dos estudantes universitários portugueses contra a ditadura. O I Encontro Nacional de Estudantes acabou por se realizar em Coimbra e os dirigentes da AAC acabaram na prisão e no exílio com a feroz repressão a ser exercida sobre todos, desta vez incluindo, pela primeira vez, alunas que foram presas na PIDE de Coimbra, por não haver cadeias políticas para mulheres.
O futebol, instrumento de alienação do salazarismo, teve momentos épicos através do clube de futebol da AAC (a Académica) cujos atletas eram estudantes universitários e que arriscaram o que para muitos era o único recurso para um curso superior.
Seria ingratidão não aludir à corajosa luta dos estudantes-atletas no final da taça de 1969 que, em solidariedade com os dirigentes expulsos da Universidade, depois de negadas sucessivas formas de manifestação de luto académico, no Jamor, acabaram a empunhar cartazes que passaram de mão em mão pelos jogadores e acabaram a circular entre os do clube adversário, galvanizados pelos estudantes de Coimbra, num desafio à ditadura.
Finalmente, por ser um episódio quase desconhecido e de grande relevância cívica, deve ser lembrado que os jogadores da Académica, já em 1967, na disputa do Troféu cidade do México, homenagearam Simão Bolívar em cujo monumento depuseram uma coroa de flores. A equipa, acompanhada pelo grande jornalista e democrata Carlos Pinhão, viu o ato ficar perpetuado no jornal “A Bola”, então um baluarte da democracia que, perante a desatenção da censura, perpetuou o nobre ato democrático.
Por gentileza de um dos participantes deste feito, que nunca mais seria alheio à defesa da democracia, aqui fica o recorte que a ignorância do censor, sobre a figura de Simão Bolívar, deixou passar nas páginas honradas do jornal desportivo.
(Ler legenda – foto canto inferior esquerdo)