E se a Rússia ganhar? Pergunta a revista conservadora britânica The Critic

(Alfredo Jalife-Rahme, in Geopol.pt, 02/03/2023)

A Anglosfera “deve saber o que quer conseguir da Ucrânia (…) porque à medida que as coisas se desenrolarem, estarão a favor de Putin.


A revista britânica The Critic, próxima do Partido Conservador no poder – que está a tentar colocar o antigo primeiro-ministro destituído Boris Johnson no secretariado da NATO, suspeito de ter impedido as negociações de paz entre a Ucrânia e a Rússia – pergunta na sua capa: E se a Rússia ganhar? (bit.ly/3J0Dqnv), ao lado de um balão da China em ascensão a tentar esvaziar o Tio Sam americano com uma baioneta, fazendo outra pergunta obstinada: Será que Pequim tomou o lado errado?(bit.ly/3ZnzLFG).

No próprio artigo, The Critic afirma que, numa verificação da realidade: a Rússia pode ganhar.

O seu diagnóstico é simplesmente sombrio quando as coisas vão piorar para a população da Ucrânia, com muitos mais milhares de mortos e o país a levar décadas a recuperar, sugerindo que a Anglosfera “deve saber o que quer conseguir da Ucrânia (…) porque à medida que as coisas se desenrolarem, estarão a favor de Putin”.

Acontece que o modelo anglo-saxónico de guerra através de sanções, lançado por Londres e mais tarde imitado por Washington, já não funciona eficazmente face à ascensão da China e à medida que Moscovo se prepara para uma guerra dura.

Argumenta que os objectivos de mudança de regime no Kremlin e a balcanização da Rússia são rebuscados, dado o apoio da sua população à guerra quando as sanções fracassaram.

Actualmente as linhas defensivas da Ucrânia estão a desmoronar-se; os russos estão a avançar em grandes secções da linha da frente e a maioria dos factores (sic) indicam que é provável que a Rússia consiga algum tipo de resultado favorável na Ucrânia, mesmo com a chegada urgente do armamento moderno da NATO para apoiar Kiev.

A revista observa que o potencial para conversações de paz tem sido envenenado pela linguagem desajeitada de uma grande quantidade de funcionários norte-americanos, sobretudo da secretária de Estado adjunta Victoria Nuland (VN; bit.ly/3ZqCsGL), que esteve profundamente envolvida nos bastidores das maquinações políticas da crise da Ucrânia de 2014, e que acaba de se recrear ao constatar que ela estava “muito gratificada (sic) por saber que NordStream 2 é agora (…) um pedaço de metal no fundo do mar”. Outro “Fuck Europe” de VN!

Depois das confissões da ex-chanceler alemã Angela Merkel – sobre os enganosos acordos de Minsk (bit.ly/3xYcNJB) – e do ex-presidente ucraniano Petro Poroshenko à BBC — que deu à Ucrânia oito anos para construir uma coligação global anti-Putin — Moscovo já não está confiante em lidar com os EUA e a NATO.

The Critic destaca a angustiante afirmação existencial de Putin: o objectivo dos nossos adversários estratégicos é debilitar e fracturar a Rússia porque acreditam que o nosso país é demasiado grande e representa uma ameaça, quando a máquina militar da NATO causou estragos e destruição na Sérvia, Iraque, Líbia e Síria.

A revista comenta que o actual director da CIA e antigo embaixador dos EUA na Rússia, William Burns, enviou um telegrama em 2008 (sic) ao chefe das forças conjuntas dos EUA recordando-lhe que a adesão da Ucrânia à NATO é a mais brilhante de todas as linhas vermelhas (sic) para a elite russa.

The Critic defende que a intervenção da Rússia na Ucrânia foi um acto de desespero, não de força, e adopta a tese do geopolítico americano John Mearsheimer da Universidade de Chicago (bit.ly/3xXVecH) e (bit.ly/3kDPkKP).

É impressionante que The Critic fulmine ferozmente — tão analiticamente asinina (sic) — que os interesses vitais da Rússia não foram tidos em conta quando hoje goza com o “equilíbrio da determinação” (balance of resolve).

Faltou ao The Critic perceber que a singularidade militar no teatro de batalha ucraniano foi ultrapassada por duas reviravoltas supremas: a desdolarização/fim da hegemonia financeira anglo-saxónica e a visibilidade de uma nova ordem multipolar (bit.ly/3meoN7m).

Imagem de capa por Matthias Berg sob licença CC BY-NC-ND 2.0

Peça traduzida do espanhol para GeoPol desde La Jornada


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2 pensamentos sobre “E se a Rússia ganhar? Pergunta a revista conservadora britânica The Critic

  1. Sempre se fala em multipolaridade como se fosse a negação da existência de um Direito Internacional.
    É esse um destino inevitável da multipolaridade?
    Se não, estamos a falar de quê?

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