Quando o silêncio é uma forma de cumplicidade

(Carlos Esperança, 22/11/2020)

Em 46 anos de democracia nunca assisti a uma campanha tão bem orquestrada e eficaz contra o PCP como aquela que os média, os partidos concorrentes, as redes sociais e os fascistas ressuscitados organizaram de forma demolidora, e mantêm em marcha.

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Em política não há gratidão, mas exige-se pudor nas atoardas, um mínimo de decência nos ataques e alguma verdade no combate democrático. Podem esquecer-se os militantes que morreram nas masmorras da Pide, os combatentes contra a ditadura, os torturados, assassinados, demitidos da função pública e deportados; pode esquecer-se o seu sofrimento, o contributo do PCP para a arquitetura democrática do Portugal de Abril, para o equilíbrio partidário da democracia oferecida pelo MFA; pode esquecer-se a sua participação na elaboração da CRL, na organização sindical dos trabalhadores e no combate democrático; o que não se pode negar ao PCP ou a qualquer outro partido é o direito de reunião.

As reuniões partidárias não podem ser proibidas pelo Governo, como pretende o bando de agitadores ignorantes que o acusa de permitir aos comunistas o que não permite a outros portugueses. Simplesmente não pode. É a Constituição que o impede. Qualquer jurista explica isso a quem está de boa fé. É uma mentira útil, que ataca o PS e o PCP.

A restrição de direitos individuais que a AR, pluripartidária, tem votado não engloba as reuniões dos partidos. A suspensão da atividade partidária, quiçá dos partidos políticos, e da própria democracia é o desejo que nasce, cresce e se reproduz no lamaçal fascista que intoxica as mentes e corrói a democracia.

Os salazaristas, perdida a memória e a vergonha, esquecidos dos crimes praticados pelo ELP e MDLP contra a democracia, voltaram agora a conspirar e a quererem suprimir os direitos de quem lutou por eles. Aos comunistas não conheço, depois da normalização democrática, já lá vão 45 anos, a mais leve tentativa de conquista do poder pela via revolucionária, uma única proposta de lei contra a democracia, qualquer tentativa de destabilização política ou embrião de atividade conspirativa, ao contrário de outros partidos.

Quando o silêncio mata, cada um de nós que se cala torna-se cúmplice de uma traição à democracia, a esta democracia liberal que a pluralidade partidária mantém viva, mesmo nas horas amargas e incertas que estamos a viver. Perante a obscena perseguição ao PCP, a lembrar a ditadura fascista, é meu dever deixar aqui a minha solidariedade ao partido que encontrei na luta contra a ditadura e contra a guerra colonial.


6 pensamentos sobre “Quando o silêncio é uma forma de cumplicidade

  1. A campanha contra o regime democrático, tal como foi concebido pelo 25 de Abril de 1974, está mesmo em marcha. Os verdugos, saudosistas do Estado Novo, que se têm vindo a endireitar e engravatar de neofascitsas, não se cansam de fazer ensaios…como a noticiada e valorizada encenação de André Ventura…é preocupante! Subscrevo, sem qualquer rodeio, o artigo que acabo de ler. Parabéns ao autor.

  2. – Não há dúvida que está a haver um aproveitamento contra o PC mas também não é preciso entrar em histeria que não vem aí o Pinochet por se apelar à contenção momentânea da actividade partidária com a justificada razão de estarmos em plena pandemia.

    Afinal a juventude centrista já deu o exemplo e adiou as actividades previstas.

    – Sim, o PC não tem atentado contra as liberdades democráticas… Desde o 25 de Novembro quando ficou provado não ter capacidade para impor a sua ditadura.

    – Mas mantém a sua ideologia ditatorial, identifica-se com ditaduras como Cuba ou a Coreia do Norte ou a defunta ditadura soviética.

    – Por exemplo o PCP continua a festejar a revolução de outubro. Que consistiu precisamente em derrubar a democracia de esquerda que tinha derrubado o Czar.

    – É verdade que o PCP foi um grande inimigo do estado novo. A questão é que pretendia substitui-lo por outra ditadura se calhar ainda mais violenta. Pelo que os seus militantes que lutaram contra o salazarismo podem ser heróis. Mas não são com certeza da liberdade.

    – E embora tenham sido inimigos do salazarismo não foram indispensáveis ao seu derrube.
    Porque conforme se viu no 25 de Novembro, a maior parte do MFA era contra os projectos ditatoriais do PCP. Vasco Lourenço, Eanes, Jaime Neves, o grupo do nove, são exemplos.

  3. Os media têm razão, não é altura para fazer congressos políticos inoportunos. Já deu para perceber que o PCP gosta de se pôr a jeito perante o país, e depois quando chegam as críticas põem a tocar a cassete de que é anticomunismo, ou que o fascismo vem aí. O povo não é estúpido, senhores comunistas… vocês assim descredibilizam-se até ao zero e, um dia desaparecem debaixo dos pés do Bloco de Esquerda e do Chega.

  4. Nota. Como a das masmorras é um clássico, gostei especialmente da evocação da CRL… Faz lembrar a SARL, evoca um acrónimo duma marca de cervejola, a Cergal, e dá-te um estilo de modernidade nessa caverna e um imenso passado na publixidade (Cergal vulgo a CeRgaL, io!).

    • … e essa tal elaboração da CeRgaL poderia ser uma aposta revolucionária no cultivo de campos de cevada a perdervde vistacue, sob direcção do ministério da Agricultura, a solidariedade internacionalista da URSS e das debulhadoras da RDA e, ainda, dos quadros do colectivo do Partido, as massas camponesas alentejanas produziriam para alimentar o País. Dar uma garrafa de CeRgaL é dar se comer a um milhão de portugueses, porra!

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