La combinazione

(José Sócrates, 29/06/2019)

Quem já viveu o suficiente conhece o drama, que se desenrola em três atos. O primeiro é, digamos assim, hegeliano – a identificação do indivíduo com o princípio. O personagem aparece em cena, brilhante e heróico, favorecido pela veste judicial e pelo mito da independência. O seu sentimento é elevado e sonha em deixar o seu nome gravado a letras de fogo no céu estrelado da história universal. Glória e grandeza – uma biografia, finalmente.

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Depois vem o segundo ato que se desenrola já no palco político. O dramatis persona revela-se então na sua escandalosa vulgaridade, no vocabulário limitado e na dificuldade em lidar com o risco e a contingência da ação que constituem a natureza do novo palco que pisa – no seu mundo anterior só existia mando e obediência. O general Wellington, quando exercia as funções de primeiro ministro e lhe foi perguntado sobre as suas impressões acerca da primeira reunião do Gabinete, confessou a sua profunda surpresa : “dei as minhas instruções e eles quiseram discuti-las”. Sim, é outro terreno, a política – aqui é preciso debater, convencer, disputar e saber perder. Aqui aprende-se a legitimar o adversário.

Passamos, então, ao final, ao terceiro ato, que é sempre o mais penoso. À mediocridade junta- se agora o engano, a hipocrisia, acrescidos do escândalo que vem de trás – o prémio da nomeação governamental. Afinal, tudo era falso e pechisbeque. O mérito estava apenas no engano e na ocultação. Quando o véu é finalmente retirado, o figurante fica exposto como realmente é e o público, em silêncio, baixa lentamente os olhos. O desorientado personagem vagueia no palco sem perceber o que lhe aconteceu. Afinal, a história não o destinou a grandes feitos – na vasta plateia, só as pedras do deserto lhe respondem.

Para quem ache o retrato cruel peço que pense por um minuto nos exemplos das nossas vidas – quantos já vimos assim? Quantos Di Pietro já vimos? Quantos Baltasar Garzón, quantas Eva Joly? O fenómeno é moderno e é massivo . Protegido do debate e do confronto pela toga que enverga, o personagem vê, enfim, chegada a oportunidade de dar a conhecer ao mundo as suas qualidades extraordinárias. Nessa altura entra em cena essa nova indústria de profissionais do “story telling “ convencida que é possível, do nada, produzir um personagem político. Eis o terreno onde os especialistas das narrativas populares se sentem à vontade – a criação do novo herói nacional. Como é pobre este roteiro. Como é cansativo. Como conspurca a arte política, a arte da controvérsia, da disputa leal e do que há de mais fascinante na ação humana – a incerteza de iniciar, de propor, de tentar. Nada pode haver de seguro nisto porque a beleza está justamente no imprevisível. Falsear a política, fazendo-a ao mesmo tempo que se finge não a fazer, é um truque antigo que, de tão repetido, se torna absolutamente enfadonho . O que resta em palco, então, é uma arte contrafeita, uma arte superficial que nenhum esforço interpretativo exige do espetador, só aplauso – e imbecilidade. Que horror.

Depois, o contraste. O patético espetáculo de um personagem perdido que ainda deambula em palco, compara com quem dignamente enfrenta a provação da prisão. O primeiro foi criado pelo embuste e pela encenação; ao segundo nunca nada lhe foi oferecido sem luta. Teve sempre que prestar provas no terreno da batalha política para se fazer aceitar. Nunca teve do seu lado nem a legitimidade do nascimento nem a proteção de um qualquer establishment. Foi preciso fazer-se a si próprio e tantas vezes sozinho. O trauma do passado violento e iníquo foi ultrapassado sem ressentimento, em nome de um novo pacto social de desenvolvimento e igualdade. O que o qualificou não foi nenhum truque ou habilidade narrativa, mas a excepcionalidade de uma governação que foi além do esperado e do repetido. Sim, o contraste.

Já não há ângulo para olhar para o espetáculo. Impossível encarar o que se passa sem um esgar de repugnância. Os acontecimentos deixam no mundo um rasto de descrédito na justiça brasileira que afeta seriamente a reputação internacional do País. Vejo para aí a tese do sangramento, a ideia de que é preciso que mais seja revelado até que as instituições brasileiras decidam agir. Não sei.

Não sei que caminho o Brasil escolherá, mas uma coisa sei: o que vimos e o que lemos é suficiente para perceber a fraude judicial, a motivação política e a punição de um inocente. O que sobrevive em cena aflige a decência democrática.

Ericeira, 25 de junho de 2019

12 pensamentos sobre “La combinazione

    • Duh!

      Nota. Que merda de teorias, pás, sabem se isto ainda faz parte do biscate do professor Domingos Farinho? Ó Manuel G., olha: tens medo de meter a fonte ou escapou? É naquela cena brasileira, a cena marada? E achas que o xô Chócratis tem tantos e tão bons comentários como o Aspirina B? Ou simplesmente é isto, assim, o que explicará que o Valulupi tenha perdido o resto da clientela que sobrava (José Neves, Lucas Galuxo, Tóino, outros nicks do Mouro, para além dos que morreram de cirrose claro)? É que só anda lá o Madeira e, há bocado, vi as garatujas do jpferra, a Guiducha (!), pelo que fiquei a pensar se a restante troupe alcoólica se internacionalizou? Andam agora nos trópicos, lusofonia, mulatas e mulatos, feijão preto e cachaca?

      Que dizes, pá?

      • Adenda, ainda.

        Estive aqui a pensar profundamente, pá, e, atendendo aos antecedentes criminosos, posso dizer isto?, do José Sócrates face a alguns dos blogues que apoiaram o governo do PS a troco de bué de papel, sabendo eu que os mesmos antecendentes se aplicam ao Carlos Santos Silva, à sua ex-esposa (?), ao Rui Mão de Ferro e a outras lindinhas para irem às lojas da Fnac e comprarem milhares de livros do best-seller da tese de mestrado da SciencesPo que, segundo a acusação dos bandidos do MP, foi escrita pelo Domingos Farinho, e outras patifarias!, estiva aqui a pensar, dizia, se a troupe alcoolizada do Aspirina B que anda desaparecida, pondo mesmo em dúvida a lua de mel do casal alargado constituído pelo Sancho, o Burro e o Madeira não foi uma cortina de fumo, e se não andam eles agora a ganhar as sopas em comentários desbragados aos artigos apresentados pelo xô Chóxratis na net do Brasil?

        O que achas, sabes alguma coisa disto?

        Representam duas das 15 novas investigações que nasceram da
        Operação Marquês e duas das situações mais mediáticas da investigação
        realizada a José Sócrates: os pagamentos realizados ao blogger
        António Costa Peixoto, do blogue “Câmara Corporativa”, para atacar
        os adversários políticos do ex-líder do PS; e a contratação de
        Domingos Farinho como ghostwriter do ex-primeiro-ministro. Costa
        Peixoto e Farinho receberam avenças mensais que totalizaram os 6.500
        euros líquidos mensais para, entre outros serviços, realizarem o
        mesmo trabalho: ajudar José Sócrates a desenvolver a sua tese de
        mestrado que apresentou no Institut d’Études Politiques de Paris.

        No Observador, online.

        • Ó RFC, por essa massa até a Estátua apoiava o Sócrates todos os dias… Mas não me manda nenhum papel. Só há anónimos, boa gente, que a troco de nada me mandam 5 euritos de vez em quando… 🙂

          • Hum.

            Nota. Pois, entendo-te mais uma vez. Se do métier do José Sócrates dos bons velhos tempos ainda restra alguma coisa, a Operação Tupi do rapaz obedeceria, sempre!, a que os seus cães de guarda se antecipassem e preparassem o terreno (com o pilim do OE, sob a batuta do Luís Bernardo, ou com as sopinhas permitidas pelo orçamento municipal do Fernado Medina, o da CML, etc., ou sob segredo através do CC, pelo menos, com a chancela de veracidade fornecida solitariamente pela madame Fernanda Câncio, e cujo caldinho foi posto a nu pelos bandidos do MP o que torna todas estas coisas divertidamente mirabolantes). Entretanto, mete lá no post o link da prosa do sô Chócratis a.k.a. Domingos Farinho que, como sabes?, eu tenho um olhar clínico para espreitar os comentários, seguramente religiosamente desbragados!, no tal site brasilêro (são muitos anos a virar frangos, pá!, para mim é fácil de desencriptar, diz-se assim?, as bacoradas que se escondem sob nicks extravagantes). A excepção, claro, reside no Doutor José Neves cuja arte política, literária e filosófica é inconfundível!… Digo-te logo quem anda por lá, prometo. Deal? 🙂

            Valulupi, gostas?

          • […]

            O anúncio é acompanhado por uma entrevista ao ex-primeiro-ministro em que, além do Brasil, Sócrates fala também de Portugal. Pergunta a CartaCapital: “O senhor é vítima de um processo judicial que, em muitos aspetos, lembra a perseguição ao ex-presidente Lula no Brasil. Há quem enxergue essa judicialização da política, recorrente em vários países, como uma estratégia geopolítica. O senhor concorda?”

            Na resposta, José Sócrates diz-se alvo de “uma grave, injusta e falsa acusação que está neste momento em fase de instrução, momento em que um juiz decidirá se a aceita para seguir a julgamento​.​​​​​” “Não encontro outra explicação para ela a não ser a motivação política”, diz o ex-primeiro-ministro, acrescentando que o “chamado fenómeno de lawfare, a utilização da justiça com objetivos políticos, parece ter-se transformado na nova arma de assassinato político, o novo punhal de Brutus da política moderna”.

            Nota. Eheheheh, sempre do melhor o xô Schócratis.

            No DN, online.

            Para além d’A Estátua de Sal, do DN, também os queridinhos velhinhos do Tornado vibram*… mas a malta do Observador é do piorio.**

            Asterosco, um.
            https://www.jornaltornado.pt/la-combinazione-di-pietro-baltasar-garzon-eva-joly/

            Asterisco, dois.

            J M
            15 d
            Os zucas, devem estar desesperados!Nta

            Utilizador Removido
            15 d
            Sugeria ao jornal Carta Capital que poupasse algum dinheiro e contratasse já o professor a quem Sócrates vai pedir que lhe escreva os artigos.
            Pergunto-me a título de curiosidade se nesta altura o homem já descobriu que demais não é “de-mais

            lopez turrillo
            15 d
            ahahahah!

            🙂, …?

  1. Parece mentira que permitas comentários como os desse tal do RFCm um sem eira nem beira, que resolveu embicar sobre um dos períodos mais formosos da História da Pátria, os meus governos do PS, porreiros pá! Eu já disse no DCIAP que as quatro mil páginas da acusação do MP são apenas calúnias e maledicências, eu o disse e os meus escudeiros do Aspirina B estão sempre a dizer o mesmo. Fica sabendo que os coitados deitam-se, têm pesadelos e acordam a pensar nas patifarias que o Correio da Manhã e dos gajos da Cofina vão inventar,,desporreiros pá!!

    Olha só o que agora está no blogue do Valupi, achas isto bem? Digam lá se eu fiz mal a alguém, c******?

    Podemos confiar em magistrados que atacam a liberdade?
    2 JULHO 2019 ÀS 8:56 POR VALUPI

    XXXX
    3 DE JULHO DE 2019 ÀS 14:48

    Mas c’a grande bebedeira, Valulupizinho.
    Tu, o bronco do PML gordo e a Fernandinha embrulhavammmmm-se e metiammmm-se num contentor de roupa para África, olaré|

    Acham o quê, eu mereço?

    • É assim mesmo, José, esse tal do RFC é um engraçadista igual ao fedorento-mor!

      Morte à PIDE, morte à PIDE, mor… o quê?!

      • Morte à PIDE, morte á PIDE, morte ã PIDE, morte â PIDE, morte ä PIDE, morte ª PIDE e morte a PIDE.

        Enganei-me, desculpa ó da Estátua, o que é que queres?!

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