(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 30/09/2016)
No dia 29 de junho, durante uma conferência de imprensa, Wolfgang Schauble, ministro alemão das Finanças, quando questionado sobre a situação do Deutsche Bank, disse que estava mais preocupado com Portugal. E acrescentou mesmo que o país poderia precisar de um novo resgate, para depois corrigir: “Portugal tem de cumprir as regras ou corre o risco de precisar de um novo programa de ajuda”.
Exatamente três meses depois era bom que alguém perguntasse a Herr Schauble se mantém a mesma opinião. Não é que, por cá, a situação seja brilhante. Longe disso. Mas por lá, o Deutsche Bank está no epicentro de uma enorme tempestade, que ameaça varrer outra vez o sistema financeiro mundial, estando a ser comparado ao caso da Lehmann Brothers. E tudo por as autoridades norte-americanas, que não brincam em serviço, terem decidido multar o banco alemão em 12,5 mil milhões de euros por ter vendido a milhares de clientes produtos derivados que sabia que não valiam nada e que estão na origem da grande crise mundial que se iniciou em 2008.
Ontem as acções do banco afundaram 6,7% em Wall Street, fazendo o índice do sector financeiro perder 1,5%. E apesar da animação com a subida do preço do petróleo, a bolsa de Nova Iorque fechou em queda a perder 1%.
Agora, o Governo alemão está confrontado com uma dificílima escolha: ou acode ao banco, injetando-lhe dinheiros públicos; ou o deixa cair, com o impacto que daí decorrerá para o sistema financeiro mundial. No primeiro caso, se optar por colocar capital público na instituição, o Governo alemão terá de seguir as novas regras europeias nesta matéria: primeiro são chamados os acionistas, os obrigacionistas e os grandes depositantes a colaborar nas perdas e só depois é que entra o dinheiro dos contribuintes. Mas esta solução está a encontrar uma enorme resistência por parte da opinião pública alemã e de vários responsáveis políticos. O próprio governo não dá sinais de apostar nesse caminho. E se o seguir, sem impor perdas aos privados, perde toda a autoridade para obrigar outros países a fazer o mesmo (como, por exemplo, se passou no caso do BES e Banif em Portugal).
A queda do gigante alemão, presente em 70 países, terá um impacto difícil de calcular. Certo é que o banco já perdeu mais de 50% do valor das suas ações desde o início do ano. Ontem, a agência financeira Bloomberg revelava que vários fundos que recorrem ao Deutsche para fazer a negociação de contratos derivados, usando-o como contraparte na garantia das transacções, estavam a retirar operações e fundos que têm alocados no banco alemão.
A reestruturação em curso no banco já chegou a Portugal, estando previsto o fecho de 15 agências, sobretudo em Lisboa e Porto, e a saída de um número não revelado de trabalhadores. O Deutsche Bank tem actualmente cerca de 400 trabalhadores em Portugal, com 50 balcões.
Certo, certo, é que até agora não se ouviu uma palavra de Wolfgang Schauble sobre a situação do Deutsche Bank. Será que continua mais preocupado com Portugal? Ou que está a meditar na frase de Guillermo Cabrera Infante, “os acontecimentos tinham a brusquidão e o caráter imprevisível dos sonhos”? É possível. Tudo é possível. Até estar a guardar de Conrado o prudente silêncio – que não guardou quando falou de Portugal.
O rating de Merkel e Schauble a caírem no lixo?