(Martin Wolf, economista chefe do Finantial Times, traduzido em DN de 08/07/2015)
Então o que deve fazer agora a zona euro? Na semana passada conclui que a Grécia deveria votar sim. Em vez disso, os gregos decidiram rejeitar esmagadoramente os termos do acordo que já tinha sido retirado. O que poderá isso significar? E como deverá responder a zona euro?
Aparentemente, muitos, talvez a maioria, dos que votaram acreditam que a sua rejeição forçaria uma mudança de atitude no resto da zona euro. Os parceiros da Grécia viriam a reconhecer o erro dos seus caminhos brutais e dar-lhe–iam os recursos de que necessita para utilizar o euro livremente, ao mesmo tempo que a libertaria da austeridade. Mas a maioria dos seus parceiros iria ver este resultado como uma rendição humilhante. Muito mais provável, então, é um impasse entre um encorajado governo grego e os seus credores enfurecidos.
Tal impasse levaria a uma “saída furtiva”. Os bancos não conseguiriam reabrir. Em seguida, o governo iria criar algum tipo de instrumento monetário (supostamente temporário). Mais tarde ainda, as pessoas iriam ver que o plano provisório tinha-se tornado permanente. Finalmente, ainda que depois de muita disputa, a Grécia teria uma nova moeda, mas continuaria ainda dentro da União Europeia.
Apenas um (ou mais) de três desenvolvimentos podem bloquear o caminho para uma saída.
Em primeiro lugar, os gregos poderiam viver com os bancos fechados por um tempo indefinido. Isto não é impossível. Mas é improvável.
Em segundo lugar, o Banco Central Europeu (BCE) poderia aumentar os seus empréstimos de emergência ao sistema bancário grego. Se o BCE fosse um banco central normal seria exatamente isso o que faria. A Grécia tem uma corrida aos seus bancos. Como financiador de última instância, o banco central deveria emprestar em tais circunstâncias. Se o BCE acredita que os bancos são solventes, deve emprestar. Se o BCE acredita que os bancos estão insolventes, deve providenciar a recapitalização – através da conversão de obrigações não garantidas em capital, com a venda dos bancos a novos proprietários ou garantindo o financiamento do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE).
Infelizmente, o BCE não é um banco central normal. É o banco central de uma união monetária mal concebida. Ao proteger-se contra perdas, o BCE arrisca-se a recriar o risco de redenominação que o discurso de “o que for preciso” de Mario Draghi em julho de 2012 pretendia eliminar. O medo cria o que é temido.
Em terceiro lugar, os governos da zona euro poderiam ainda chegar a um acordo com a Grécia. Isto é o que Atenas está a tentar alcançar. Mas faria sentido para a zona euro? Para responder a esta pergunta é preciso perceber como as pessoas veem agora a própria união monetária.
Uma maneira de pensar na zona euro é como uma zona de solidariedade mútua. É a isso que os próprios gregos apelam. A resposta dos seus credores é que a solidariedade é construída sobre obrigações mútuas. Os gregos, insistem aqueles, fizeram batota com as suas obrigações, tanto antes como depois da crise, portanto não merecem a solidariedade. Esta visão é simplista.
A culpa da balbúrdia pertence tanto aos irresponsáveis credores privados (principalmente franceses e alemães) como aos governos que decidiram dar os empréstimos à Grécia para que com eles esta salvasse aqueles credores. O benefício deste refinanciamento foi insignificante para a Grécia. O argumento da solidariedade para que haja cedências mútuas é poderoso, especialmente tendo em vista a crise económica que os gregos estão a viver.
Uma visão alternativa é transacional. Cada país faz o que acredita ser do interesse do seu próprio povo. A razão para haver cedências mútuas seria, então, a de que a alternativa – o grexit – não se limitaria a ter como certo um grave default, mas geraria uma instabilidade permanente na zona euro. Os choques levariam a uma especulação desestabilizadora. Uma união monetária com uma opção de saída é apenas uma versão mais rígida do velho mecanismo de taxas de câmbio (MTC), vulnerável a crises da dívida em vez de a crises cambiais.
Há quem nos países centrais pareça até acreditar que o medo de tais crises iria impor uma disciplina valiosa aos devedores irresponsáveis. Os líderes dos países que estão a sair de crises querem esmagar os rivais políticos internos que prometem uma saída suave da austeridade. Entretanto, a França está do outro lado. Para os franceses, a união monetária foi a alternativa ao MTC. Se a zona euro permitir a saída, a sua criação poderá ter sido em vão.
A grande pergunta, em suma, é saber se os membros da união monetária quererão que o risco de saída seja uma parte essencial da construção da zona euro. Eu acho que eles não o devem querer porque uma tal zona euro seria assustadoramente frágil. À luz desse risco, é do interesse dos membros procurar uma solução para a crise que não force a saída, pelo menos até que todas as alternativas estejam esgotadas. Eles devem também reconhecer que a dívida grega é insustentável. O alívio da dívida é inevitável.
Então, o que deve oferecer a zona euro? Willem Buiter, do Citigroup, forneceu um plano possível. Em primeiro lugar, nada de mais programas. Em segundo lugar, a zona euro deve usar o MEE para pagar os empréstimos com vencimento devido ao BCE e ao Fundo Monetário Internacional, lidando assim com os problemas de liquidez enfrentados pela Grécia ao longo dos próximos anos. Em terceiro lugar, prorrogar os vencimentos dos empréstimos pendentes oficiais até a um futuro distante e travar as taxas de juro sobre eles. Finalmente, recapitalizar os bancos gregos se necessário. O Estado grego dependeria então da sua capacidade de contrair empréstimos no mercado. Se não o conseguisse fazer teria de equilibrar o seu orçamento ou criar uma nova moeda, de modo a colocar-se no caminho para a saída.
A Grécia está na sua “última oportunidade”. A lógica do ponto em que se encontra agora é definitivamente a da direção da saída. Mas eu continuo convencido de que esta não é do interesse da Grécia nem da maioria dos outros membros da zona euro. Eles devem tentar uma alternativa. Isso seria reconhecer a realidade de que mais assistência para as dívidas da Grécia é a coisa certa e sensata. Assim encontrar-se-ia uma maneira de proteger os bancos do seu Estado. Seria, então, deixar a Grécia à própria sorte. O tempo dedicado a este país seria, então, gasto noutro lugar. Com dívidas administráveis e o sistema bancário são, a Grécia pode escolher o seu próprio caminho, dentro da zona euro ou fora dela. Uma última oportunidade: é só isso.
Um pensamento sobre “Se a Grécia sair, o euro ficará frágil”