(Por Paulo Marques, in Facebook, 14/09/2022)

(“A história repete-se sempre, pelo menos duas vezes”, disse Hegel. Karl Marx acrescentou: “a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa.” E diz a Estátua: por vezes a segunda também como tragédia. A história que segue ameaça repetir-se hoje com outros personagens. A tragédia de novo.
Estátua de Sal, 15/09/2022)
A 10 de abril de 1938, os austríacos pronunciaram-se esmagadoramente a favor da unificação com a Alemanha hitleriana: 99,73%.
Embora existindo forte possibilidade de o plebiscito ter sido adulterado, e havendo considerável pressão para aceitar um facto basicamente consumado, a maioria dos austríacos apoiavam Hitler.
Estariam cientes daquilo que os esperava, ou imaginariam que o mal é uma coisa que “só acontece aos outros”?
Pouco depois, começaram as perseguições, os interrogatórios, as vandalizações, as pilhagens, as agressões, as denúncias, as prisões, os insultos, as humilhações… enfim, todo o tipo de atrocidades contra os austríacos e especificamente contra os austríacos judeus.
Um deles, Sigmund Freud (1856 – 1939), o fundador da psicanálise, então com 81 anos, lutando há muito tempo com um cancro na boca, consciente da escassez do tempo de vida que lhe restava, mas ainda com uma energia tremenda, na ânsia de terminar o seu livro “Moisés e o monoteísmo (1939), passava aqueles negros dias encerrado a escrever.
O consagrado médico neurologista morava no nº 19 da Bergasse, em Viena de Áustria (onde viveu, estudou e exerceu psicanálise durante 47 anos), com a mulher Martha, alguns filhos, duas criadas e um cão.
Bandeiras com a cruz suástica por tudo quanto era lado, tiros e mais tiros, passos apressados, vozes alteradas, gritos, sirenes, soldados a marchar, carros acelerados, palavras de ordem em alemão, ladrar de cães em fúria, choros.
Uma manhã, um grupo de soldados nazis armados até aos dentes, bateu-lhes à porta. Irromperam pela casa revistando todas as divisões. Precipitaram-se vorazes sobre um cofre e dele sacaram uns apreciáveis seis mil xelins. Por fim, retiraram-se com cara de poucos amigos.
Era o sinal. Estava na hora de abandonar a Áustria, tentar o exílio, buscar a liberdade.
Havia que ser rápido. Tratar com urgência todas as burocracias, nomeadamente, saldar as dívidas da sua editora, arranjar novos passaportes, destruir documentos comprometedores, conseguir a “declaração de não impedimento de saída do país”, fazer malas, empacotar alguns livros da biblioteca e as peças da sua magnífica coleção de antiguidades.
Graças ao seu prestígio, Freud contava com apoios que não estavam à disposição da esmagadora maioria dos judeus de Viena, concretamente, a ajuda financeira que lhe foi concedida pela princesa Bonaparte, psicanalista e escritora, sobrinha de Napoleão.
Quando estava tudo pronto para seguirem a bordo no Expresso do Oriente em direção a Paris (de onde partiriam para o exílio em Londres) as autoridades fazem-lhe uma derradeira exigência: deveria subscrever uma declaração afirmando que os nazis o tinham tratado bem. Na folha que lhe deram para assinar, escreveu, com ironia cortante:
“Recomendo vivamente a Gestapo a toda a gente.”
Se nós abstrairmos do detalhe de se tratar de um doutor prestigiado, a esposa e duas criadas, podíamos estar a falar da Gestapo israelense na Palestina actual, certo? Ou mesmo do tratamento dos russos pelo judeu Zelensky.
É verdade, a história repete-se, mesmo.
Desculpem mas estou cansado de estórias do nazismo passado. Quero saber do actual.