(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 23/10/2019)
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Há quem discuta a questão catalã com base num novo mantra que colhe automatismos em alguma esquerda: nós, internacionalistas, somos contra as nações e os nacionalismos. O raciocínio simples, que choca com quase todos os momentos relevantes da história da esquerda no século XIX e XX, é especialmente absurdo quando está em causa um confronto entre dois nacionalismos: o catalão e o espanholista. Sendo que na origem deste conflito está a recusa de Espanha em reconhecer a Catalunha enquanto nação e os catalães enquanto povo, permitindo as alterações constitucionais que abram espaço para uma solução verdadeiramente federal. Esta recusa não é um pormenor. Ela é o cimento da identidade nacional de Espanha: a ideia de um só povo e de uma só Nação. E isto torna impossível construir um espaço de cooperação onde aqueles que não se consideram espanhóis se possam sentir bem.
Como em tantas outras circunstâncias em que estiveram em causa outras independências, a minha posição resume-se a um valor democrático bastante elementar: a defesa do direito à autodeterminação dos povos. E não ando a medir o PIB de cada um para discutir a validade desse direito. Nem a genética, nem a História. Nem sequer o que eu acho sobre a independência daquela nação. Nem vou saltitando de posição conforme o caso – estou, aliás, ansioso por ver a cambalhota que muitos terão de dar se a Escócia quiser sair do Reino Unido depois do Brexit.
Pessoalmente, e observando de fora, o que via com bons olhos era a construção de uma solução federal, com o pleno reconhecimento da Catalunha como nação. Mas nem sou eu que o tenho de decidir nem me parece que isso seja um debate em Espanha. E é por não o ser que as coisas chegaram ao ponto a que chegaram. Quando a base da identidade da nação espanhola se baseia na mentira de que por ali só há um povo e uma nação pouco se pode fazer dentro desse espaço.
A questão é a democracia. É por ela que defendo o direito à autodeterminação democrática de qualquer povo e recuso a prisão de políticos que liderem movimentos pacíficos. Porque não me esqueci dos meus valores. E não basta agitarem a palavra “nação” para me fazer babar, qual cão de Pavlov
A questão em torno da Catalunha, assim como no debate que recorrentemente temos sobre a União Europeia, não é sobre os perigos do regresso (quando se foi embora?) do Estado-Nação. Ele trouxe-nos o Holocausto e o Estado Social, as guerras e o Estado de Direito, a xenofobia e a democracia. Até nos trouxe o fim de alguns impérios. A questão é que Estado-Nação queremos construir. Cabem nele culturas e crenças diferentes, para que seja um espaço de inclusão e democrático?
Poderíamos fazer o mesmo exercício para a Europa, não resumindo tudo à escolha entre europeísmo e nacionalismo: podemos construir uma União que não seja um espaço de “baixa intensidade democrática”, que vença o capitalismo selvagem, que inclua os que a procuram para melhorar as suas vidas e recuse a retórica imperial do passado. Teoricamente, podemos. O único problema é largarmos estruturas democráticas nacionais que demoraram séculos a construir para entregarmos os nossos destinos a poderes mais distantes, mais opacos e onde o povo tem menos poder.
Os catalães podem ser donos do seu destino fora ou dentro de Espanha. A questão é se Espanha quer ser uma coisa diferente do que é: um Estado plurinacional. E se não quer, os catalães têm o mesmo direito que nós a decidir se aceitam o não reconhecimento da sua existência como povo e como nação. Se vierem a ser independentes, poderão ser mais ou menos inclusivos do que são hoje. Depende das escolhas que fizerem, não depende de serem um Estado independente ou uma província de Espanha.
A questão não é a recusa ou a aceitação do Estado-Nação como elemento central de organização do mundo. A questão é a democracia. É por ela e apenas por ela que recuso a transferência de poderes soberanos para uma União onde se pratica uma democracia de baixa intensidade e já se propõe um olhar imperial do mundo. E é por ela que defendo o direito à autodeterminação democrática de qualquer povo e recuso a prisão de políticos que liderem movimentos pacíficos.
Porque não me esqueci dos meus valores. E não basta agitarem a palavra “nação” para me fazerem babar de ódio, qual cão de Pavlov. Nacionalismos há muitos e o nacionalismo espanhol é, no seu rasto de opressão e na sua cegueira perante os outros, tudo menos recomendável.
Se o problema é a nação para as elites revolucionárias do Starbucks, será que acham que o muro de Berlim é que estava bem? E que devia voltar a haver Jugoslávia (à força, outra vez)?
Vamos lá ver se alguém me esclarece. Tenho seguido o caso da Catalunha desde o referendo, eleições etc…. tudo o que foi transmitido em direto pela TVE ( onde estava era o meu canal alternativo, e tinha tempo).. Fui formulando a minha opinião , que não vem aqui para o caso, mas houve (há!) um fator que por mais voltas que dê não consigo esclarecer e que me faz uma confusão do caraças: o que é preciso para se considerar que é catalão e tem direito a participar numa qualquer decisão que só diga respeito aos catalães. Os que nasceram na Catalunha? Os que são filiados nos partidos catalães? Os que falam catalão ? Os que trabalham na Catalunha? Os que residem na Catalunha? Os que têm processos por falcatruas económicas e a quem uma independência poderia dar um jeitão ( é uma teoria…) ? Os que só falam catalão ( por opção…) ? Os sócios do Barcelona ? etc. etc. etc.
NOTO que não falo dos “verdadeiros catalães”, porque desses eu desconfio. tal como desconfio de outros “verdadeiros” sejam eles portugueses, franceses, finlandeses, esquerdistas, direitistas etc. e também não compro que os portugueses são culpados por terem sido alternativa há época. E também não compro a comparação do estado de direito como é entendido agora e o “estado de direito no seculo XVII” ( !!!) como já tenho escutado algumas vezes !
Logo, quem são os catalães atualmente ?
Nota. Ó Sóares, pá: ou estás a desconversar, ou estás a fazer confusão com a assembleia-geral da Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino*, ou, então, não sabes pura e simplesmente que um referendo ou um acto eleitoral, lá como cá, dispõem previamente de cadernos eleitorais. De resto, do muito que ANOTAS em caixa alta, aproveita-se nada e, assim sendo, isso parece ter sido uma tentativa fracassada de te expressares em mirandês… Nun falo bien anglés!, pois entendo-te.
Asterisco, qu’isto representa o espectador-tipo da TVE madridista quando habla da Catalunya..
https://www.aepga.pt/imagens/galeria/galeria_656_1.jpg
Cadernos eleitorais… Estou na mesma . Então quais são as condições para ser inscrito nos cadernos eleitorais e quem os controla.? É só levantar o dedo ? … e vi todos os debates em direto… sem comentários , como cá no burgo.
Quanto à AEPGA, vê lá se colaboras e apadrinhas o Atenor. Até gosta de palco e deita a língua de fora…
https://www.aepga.pt/apadrinhamentos/animais-para-adoptar-1453247582/
Nome: Atenor
Cognome: O Brincalhão
Nota. Ná, pelo cognome parece-me que faria uma boa parelha era com o José do Remanso Pernalta (visto que o Joaquim/José Madeira desposou há pouco o Jumento, do Sancho)…
A única resposta razoável é quem lá mora, com mais ou menos os mesmos critérios dos cadernos eleitorais. Ou talvez quem lá nasceu. Por estranho que pareça aos globalistas, é mais ou menos a mesma coisa. Havendo separação, pode haver, como há sempre, um período em que as pessoas podem escolher a quem pertencem, com mais ou menos restrições.
Quando ao “estado de direito no seculo XVII”, parece estranho, mas não é. Não sei qual é o contexto de quem o disse, mas a sua relevância surge do facto de que antes não havia, pura e simplesmente, estados. Qualquer detentor de terra podia decidir a quem prestava vassalagem (ou ser obrigado a isso à espada), dando origem a situações caricatas na guerra dos 100 anos, por exemplo.
O nacionalismo espanhol (entenda-se) castelhano é a cola de farinha que tenta manter unido o que nunca geneticamente nasceu para isso. A Galiza, o País Basco, a Catalunha, as Astúrias e Andorra (que já gozam do estatuto de principados) se forem subtraidas a Espanha, sobra pouco mais, que Castela e a Andaluzia, um território administrativo e outro paupérrimo. E se os primeiros ja por diversas vezes demonstraram vontade de terem a sua própria autonomia, administração e caminhos distintos, parece-me absurdo, e teimosamente perigoso insistir numa espanha nos moldes actuais, sobretudo quando,o que os separa é mais forte do que os une, e a casa real para além de não ser unanimemente aceite não passa de um dispendioso adereço. Urge mudar a cola eventualmente por um estado federado que respeite a identidade dos povos. A solução… não sei. Sou português e olho fora. Mas que algo vai ter mudar, lá isso vai.