A revista Vogue e a bela da guerra

(Zé-António Pimenta da França, in Facebook, 28/07/2022)

A reportagem fotográfica sobre o casal Zelensky de que tanto se fala nesta semana é apenas mais um elemento, neste caso um elemento poderosíssimo, da mais esmagadora campanha mediática de imagem (leia-se propaganda) a que assisti na minha vida, através da qual nos tem vindo a ser vendida a ‘inevitabilidade e justeza’ desta guerra. E não falta quem compre, pelos vistos…

Uma ideia simples extremamente bem trabalhada: um génio da fotografia a retratar uma mulher bonita, mas frágil (a fragilidade da mulher é uma ideia antiga que a realidade desmente, mas que continua bem lá no fundo do subconsciente coletivo) e o seu heroico marido transformado em cavaleiro andante. O cavalheiro é um Robin Hood do século XXI em luta contra a injustiça e a maldade universal demoníaca, ela a bela Lady Marian (uma projeção personificada da Ucrânia) que tem que ser defendida da guerra que os rodeia.

A romantização da guerra? Certamente. Vale tudo para manter a opinião pública europeia – que em condições normais se horroriza (com razão) com a guerra, foge dela e a combate por todos os meios – a apoiar o prolongamento desta guerra.

Só uma campanha desta dimensão esmagadora, na minha opinião a mais poderosa campanha de imagem (leia-se propaganda) da história, conseguiria seduzir um continente inteiro que foi dilacerado por duas guerras horrendas no último século a apoiar com afinco esta guerra e o seu prosseguimento, em vez de se empenhar no seu fim, o qual só pode acontecer através de três desfechos: uma paz negociada, do esmagamento de um dos contendores, ou de uma conflagração mundial devastadora para o planeta…

Escolhi estas duas fotos (aliás não escolhi, só consegui apanhar estas duas na Net, além da capa da Vogue de Outubro em que sairá esta reportagem, mas ontem à noite vi mais seis ou sete). Haverá muitas mais, certamente, todas elas excelentes, a Annie Leibowitz é uma fotógrafa que dispensa superlativos. A narrativa sub-reptícia que nos trazem é que será certamente só uma. E claríssima, para quem não se deixar ficar superficialmente enfeitiçado pela beleza das fotografias.

Na primeira, a bela Olena Zelenska atrás da coluna de mármore de uma escadaria de um palácio protegido por sacos de areia, com uma nesga de céu em fundo e o marido Volodymir em plano intermédio, de costas num patamar, em contraluz, vestido e equipado para a guerra, pronto para receber a tiro o ataque do inimigo, que se intui como diabólico. Na segunda, o herói romântico Volodymir Zelenski na sua dimensão íntima, abraçando de forma mais protetora que terna a bela amada, num intervalo da guerra contra a maldade e a opressão.

Temos aqui o regresso ao imaginário dos contos infantis que dividem o mundo numa luta entre o Bem e o Mal. Em suma, um passo em frente no processo em curso de infantilização da opinião pública europeia e americana…

Só uma equipa de génios da comunicação e imagem conseguiria converter a maioria dos europeus ao belicismo. Para isso há que fazê-los regressar ao imaginário da infância, a um mundo de belas e monstros…

Este portfólio da Vogue constituirá, sem dúvida, um momento histórico e um caso de estudo para os futuros manuais da história da comunicação, da propaganda de guerra e das campanhas de imagem…


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11 pensamentos sobre “A revista Vogue e a bela da guerra

  1. É preciso dizer que os gringos já não enganam ninguém e esta nazi à frente dos destinos da Europa não tem nenhuma credibilidade. Temos que desconfiar desta gente que nos esmaga e desgoverna

  2. Como caso de estudo só se for pela negativa, a coisa é tão kitsch que o efeito deve ser o contrário ao pretendido… mas não sei porquê, as fotos destes pombinhos trazem-me à ideia umas fotos a preto e branco de outro casal, Mussolini e a sua dama… sinceramente e sem ironias espero que estes tenham um final mais feliz.

  3. Desculpem, mas sobre esta triste notícia não me apetece escrever. Demasiado repugnante. Tenho os meus limites, que diabo.

    Por esse motivo faço copy-past do comentário publicado no site resistir.info. que subscrevo inteiramente.

    “As forças armadas do regime de Kiev estão a sofrer mais de mil baixas por dia. Nesse mar de sangue, a primeira-dama da Ucrânia dedica-se a dar entrevistas a revistas de futilidades como a Vogue. O amoralismo do comediante fantoche estende-se à sua consorte.”

    Perfeito.

    P.S.: Entretanto saiu a notícia de que os Estados Unidos entraram oficialmente em recessão.

    Tretas. Eles já estão assim há muito tempo e a UE também. O que tem maquilhado o desastre é o criativo critério de dedução do PIB predominantemente financeiro, que permite o apuramento de um gigantesco produto interno bruto em que quase nada é realmente produzido excepto bits e Bytes nos sistemas informáticos bancários.

    Mas enfim, desta vez tiveram mesmo que reconhecer.

    E agora, o que se segue?

    • “bits e Bytes nos sistemas informáticos bancários” uma ova, Eu era um dos muitos poucos a quem o confisco roubo a que chama manutenção de conta passava ao lado e o boca ao lado da cgd de há 5 meses a esta parte que me rouba todos os meses 5,15€. a reforma em 10 anos aumentou +- 6% a inflamação em 7 meses subiu 9% e vai de lá este cabrão que ganha milhões por ano e deve estar com medo que se seque a teta ferrasse-me nos tomates e ala que se faz tarde. isto cá fora não são bits e Bytes de realidade virtual dói quando estes asquerosos chatos se ferram nos tomates dum homem.

  4. Milhares a morrer. Milhões a fugir da Ucrânia. E esta energúmena/oportunista vale-se de uma revista para se propagandear. Quando não se tem miolos dá nisto.

  5. Gostava mais se eles tivessem feito um filme hardcore, tendo em conta que os EUA são especialistas no assunto.

  6. Como dizia o Rangel “com o controle da TV tanto vendo sabonetes como crio um PR quer falando para analfabetos quer falando para doutorados”

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