(Por Valupi, in Blog Aspirina B, 03/07/2021)

Alguns dos nossos melhores jornalistas (o seu currículo, o seu trajecto, os seus salários, a sua farronca assim o prova e comprova) já só querem é ser informadores do Ministério Público. Não para todos os casos, calma! Nem eles teriam tempo para tanto, embora não lhes falte a vontade. Só para aqueles em que, mistérios da profissão, calha terem informação preciosa para entregar ao Ministério Público e assim conseguir-se meter em Évora uma certa bandidagem do pior. Um desses casos é o famoso “assalto ao BCP”, em que um primeiro-ministro mandou o conselho de administração da CGD dar dinheiro a Joe Berardo para ir fazer maldades à gente séria e depois, não satisfeito, ainda obrigou o Banco de Portugal a deixar que Santos Ferreira e Vara fossem conspurcar as sacras alcatifas do BCP. Donde, a ânsia destes jornalistas em ajudar a Justiça em ordem a que se faça justiça não pode ser maior.
Um deles é o extraordinário Pedro Santos Guerreiro. Um crânio superior e uma pena de diamante. Eis como o homem se oferece aos procuradores interessados:
«Na semana em que Joe Berardo foi ao Parlamento, na CPI da Caixa, rir-se na nossa cara e dos nossos impostos, escrevi aqui no Expresso que já não interessava chorar das bestialidades: “O Ministério Público tem de analisar as suspeitas criminais de que os bancos possam ter sido burlados. E se sim, então a associação que interessa analisar é a de Joe Berardo & André Luiz Gomes, porque ninguém acredita que Joe saiba fazer contratos complexos.” Nesse texto, explicava como a renegociação do contrato da coleção Berardo tinha incompreensivelmente prejudicado o Estado, e perguntava: “Houve burla? Burla dá cadeia”. O texto é de maio de 2019. Hoje, junho de 2021, Joe Berado e André Luiz Gomes foram detidos por suspeitas de burla qualificada, de administração danosa, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.
[…]
A associação Berardo & Gomes segue agora para um juiz, mas por prender duas andorinhas não acaba a primavera. É preciso mais, é preciso continuar a investigar e a inquirir. Se não, apenas continuaremos nos ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André.»
Percebido? Em 2019, já estava tudo explicadinho numa página do Expresso graças ao brilhantismo deste Guerreiro. Contudo, o Ministério Público demorou dois anos a decifrar a caligrafia, daí o atraso em mandar a ramona. Se o cooptarem, promete, o bando completo das andorinhas será apanhado e depenado em menos tempo do que ele demora a teclar os seus relatórios semanais. Ai olé, ai olé.
Outro bravíssimo jornalista disposto a sacrificar a sua carteira profissional pela honra e prazer de perseguir uns certos malfeitores que ele conhece de ginjeira é o João Vieira Pereira, actual director do PSG. Com vista a ajudar a boa gente do MP a entender o que lhes está a oferecer, escreveu um artigo intitulado A quadrilha, onde se pode ler o seguinte:
«Esta semana recordaram-me um texto que escrevi no Expresso em outubro de 2011 onde acusava Berardo de se ter especializado em investimentos de guerrilha, pois entrava em empresas de forma hostil, atacando a gestão e outros acionistas até estes pagarem para ele se ir embora. No mesmo texto defendia que não precisávamos de “empresários” como ele. Naquela altura, há dez anos, Berardo era notícia por existirem dúvidas sobre o valor da sua coleção, que tinha sido dada como garantia aos bancos depois de um negócio duvidoso com o Estado que levou à criação da atual exposição.
[…]
Falta o capítulo final. Qual será o próximo passo de Berardo, que hoje com 76 anos enfrenta a possibilidade de passar até 12 anos na prisão? Não acredito que o faça, mas ia adorar que ele não ficasse calado.»
Este Vieira ganha ao Santos por 8 anos. Ao ir buscar um texto seu de 2011, com a supina beleza de já nem se lembrar dele não fora uma alma atenta e devota que lho recordou, mostra os seus incandescentes predicados para tratar do Joe. O Joe sabe coisas, sabe nomes, recorda-se das datas e dos locais, e só precisa da motivação certa para abrir a boca e começar a cantar. O João valentão gostaria de ajudar o velhote nesse processo, só precisa de ficar a sós com ele um bocadinho, de preferência com um rottweiler ao lado e uma moca de Rio Maior nas mãos.
O Expresso e a SIC têm outros jornalistas doidinhos para colaborarem com o Ministério Público em certos casos literalmente fantásticos, como este do filme “O Assalto ao BCP”. Seria muito bom que tal acontecesse, nem que fosse para acabar com as doridas lamentações de falta de recursos em que tropeçamos sempre que uma parte do Ministério Público se entretém a mandar-nos areia para os olhinhos.
Um pensamento sobre “Os informadores do Ministério Público”