(Isabel Paulo, in Expresso Diário, 14/06/2017)
“O candidato que não chegou a sê-lo” é o título do novo livro de Joaquim Jorge, presidente do Clube dos Pensadores e professor universitário, que será lançado dia 29, na FNAC de Matosinhos. Relato da “peça teatral trágica” da corrida do independente escolhido pelo PSD de Matosinhos, “vetado pelo aparelho dominado por Marco António”
Após ter sido chumbado pelo Plenário da Concelhia do PSD/Matosinhos, Joaquim Jorge vai publicar em livro a odisseia da sua “corrida de obstáculos” à Câmara da sua cidade natal.
O relato, a editar pela Quinto Império e que será lançado, a 29 de junho, na FNAC do Norteshopping, promete não ser meigo para a distrital liderada por Bragança Fernandes, que, segundo o mentor do Clube dos Pensadores, é um “bunker” dominado por Marco António Costa, “o homem do aparelho que domina a velha política do PSD contra a regeneração partidária”.
O independente, ex-militante do PS e que dividiu o partido laranja desde a primeira hora, alega que quando foi convidado por José António Barbosa, líder da concelhia de Matosinhos, “não foi para uma prova de atletismo viciada”. “Tive de continuar a correr mesmo quando cortei a meta, só porque não tenho cartão de militante”, alega.
O livro, de 90 páginas, já na gráfica, e cuja primeira edição terá 500 exemplares, é polémico, dirigido a um público específico, refere o editor Bruno Mourado, que, em setembro, irá publicar outra obra de Joaquim Jorge, sobre o estado das democracias europeias – e da portuguesa em particular.
Joaquim Jorge vai contar como foi “desinquietado”, em casa, por uma chamada para o seu telemóvel, para se candidatar a Matosinhos. “Quem me convidou foi o presidente da concelhia do PSD, não um anónimo qualquer, nem fui eu que coloquei a mão no ar”, diz, embora não esconda que a proposta era um desafio interessante, por poder colocar em prática as suas ideias ao serviço de Matosinhos.
“Era uma forma de colocar no terreno o meu ativismo cívico, a minha forma de pensar a democracia há 11 anos através do debate no Clube dos Pensadores”, refere, desiludido com as lutas partidárias, quezílias processuais e impasses internos vividos ao longo de quatro meses. Apesar de ter pressentido que “a telenovela negra tinha tudo para acabar mal”, não se arrepende de ter persistido na contenda, em parte por ser da sua natureza “bater-se pelo seu projeto de cidadania” e ainda por solidariedade por quem sempre o apoiou, com destaque para José António Barbosa.
Sem papas na língua, o independente, de 60 anos, não poupa nas críticas ao partido laranja, que considera “refém do aparelho, anquilosado e desfasado da realidade”. Fora de jogo, escreve que “o dossier Matosinhos foi uma peça teatral trágica ao nível de Hamlet, de Shakespeare, em que abunda intriga, deslealdade, traição, vingança e imoralidade”.
Joaquim Jorge afirma ao Expresso que manifestou a sua opinião em carta dirigida a Pedro Passos Coelho, em final de maio, antes de Bragança Fernandes, líder do PSD do Porto, ter “feito tábua rasa da aprovação da Comissão Política e proposto um sufrágio cobarde e instrumentalizado do plenário da concelhia”.
O candidato, que esteve aprovado após ter sido votado três vezes, mas que acabou chumbado por esmagadora maioria em plenário, vai reproduzir no livro a missiva endereçada ao líder do PSD, onde, diz, lançou o alerta da luta do aparelho que mina o PSD e inibe a sua regeneração e abertura.
Afirma que Passos Coelho lhe respondeu por telefone, não revela o teor da conversa, embora ainda equacione se um dia não levantará um pouco o véu. “Tenho grande estima por ele e sei que é recíproco. Quando esteve no Clube dos Pensadores, até profetizei que iria ser primeiro-ministro – e foi”, recorda.
Apesar de não economizar nas críticas a Bragança Fernandes – “faz o que lhe mandam” -, o alvo predileto da ira de Joaquim Jorge é Marco António Costa, a quem dá os parabéns pela forma “sonsa” como boicotou o seu nome, sem nunca se comprometer.
“Esta luta foi pelo poder na concelhia de Matosinhos, mas também pela sucessão no partido. Marco António é uma pessoa muito ambiciosa: primeiro vai tentar ser líder parlamentar e depois vai tentar ser líder do PSD. Para isso, tem de colocar pessoas da sua confiança em lugares chave. Os elogios públicos a Passos Coelho não passam de faits-divers”, escreve, concluindo sarcasticamente que Marco António “é muito bom” para se manter tantos anos no PSD, “a dominar e sem haver ninguém que lhe faça frente”.
O Expresso tentou contactar o vice-presidente do PSD, que há cerca de um mês afirmou num encontro autárquico, no Porto, que “a novela de Matosinhos” devia ser resolvida, sem se ter manifestado contra o nome de Joaquim Jorge.
A falsa partida a Matosinhos nas eleições de 1 de outubro não fará, contudo, Joaquim Jorge desistir de um dia protagonizar uma candidatura totalmente independente com os cidadãos que o queiram: “Quem sabe em Matosinhos, onde vi uma grande onda de entusiasmo em torno do meu nome.”
Após meses de impasse, a Distrital do PSD Porto acabou por escolher como candidato o médico e militante social-democrata Jorge Magalhães, ex-vereador da Câmara de Matosinhos no mandato de 1997/2001.
A apresentação do livro estará a cargo de José António Barbosa e Ernesto Páscoa, líder da concelhia do PS, também aprovado pela Comissão Política local mas impedido de se candidatar pela Distrital do Porto, presidida por Manuel Pizarro, que avocou o processo autárquico em Matosinhos para apoiar a deputada Luísa Salgueiro.