As Cassandras e o Dombrovski falharam. O OE passou

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 05/02/2016)

nicolau

As Cassandras estão a ter um dia mau. Tinham previsto que era tiro e queda. O Orçamento do Estado 2016 chegava a Bruxelas e era de imediato recambiado, inaugurando assim uma prática que nunca se verificou até hoje, nem com os orçamentos gregos. A alimentar as esperanças estava o vice-presidente da Comissão Europeia e ex-primeiro-ministro da Letónia, Valdis Dombrovski, o representante da linha dura europeia. António Costa viria de Berlim vergado a uma humilhante derrota e a preparar-se para pedir a demissão. E como Pedro Passos Coelho já disse que está preparado para ser de novo primeiro-ministro, tudo se encaixava às mil maravilhas. Tenho más notícias. O Orçamento passou. Vai aumentar o consumo de anti-depressivos.

Costa cedeu? Claro que cedeu. Não há nenhuma negociação em que as duas partes não cedam alguma coisa. Sim, porque a Comissão também cedeu. Dombrovski, que pelos vistos faz política na Europa através de tweets, teve de dizer que a proposta orçamental portuguesa tinha sido aprovada por unanimidade, vou repetir, por unanimidade, pela Comissão Europeia. Mas depois colocou dois tweets, um dizendo que a proposta orçamental está em risco de não cumprir as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento, e outro onde acrescenta que as autoridades europeias convidam Portugal a dar os passos certos no sentido da proposta cumprir as regras orçamentais da União.

Não se percebe. Ou bem que a proposta foi aprovada por unanimidade ou bem que não foi. Se foi, não fazem sentido os reparos. Se os reparos fazem sentido, então a Comissão não deveria ter aprovado a proposta orçamental portuguesa, nem por maioria, quanto mais por unanimidade. Portanto, ou o sr. Dombrovski estravasa e toma os seus desejos pela realidade ou o sr. Dombrovski está certo e então não se percebe a decisão anunciada publicamente por Bruxelas.

Ora até prova em contrário o que conta é que o orçamento passou em Bruxelas. Foi aprovado por unanimidade, ponto final. E ao ser aprovado, António Costa conseguiu uma enorme vitória política e uma pequena vitória técnica. A enorme vitória política tem a ver com o facto de ter provado que afinal não havia só um caminho orçamental para responder a esta crise e para cumprir os objetivos de redução da dívida e do défice. Todos os que apostaram no falhanço deste caminho logo no primeiro embate vão ter de guardar as espadas e engolir o fel que lhes está a envenenar as almas. Quanto à pequena vitória técnica, ela tem a ver com o facto do orçamento ter sido aceite mas de o Governo ter tido necessidade de introduzir um conjunto de novas medidas ou de esquecer outras que fizera para ir de encontro às exigências de Bruxelas. Não é, pois, este orçamento aquele que o Governo queria. Mas como é óbvio isso não poderia acontecer porque, insisto, o resultado de uma negociação pressupõe cedências das duas partes. E foi o que aconteceu. Insisto também: o Governo cedeu, mas Bruxelas cedeu igualmente. Ninguém estava interessado no fracasso das negociações.

António Costa ganhou. Provou que há alternativa, mesmo que estreita. Bruxelas teve de aceitar isso mesmo. As Cassandras cá de casa e o Dombrovski estão a caminho da farmácia para comprar os anti-depressivos. É a vida

E assim António Costa ganhou o primeiro embate com a Comissão Europeia. Não é pouca coisa, porque a sua orientação de política económica não agrada de todo aos eurocratas que se sentam no Edifício Berlaymont, na capital belga. E não é pouca coisa do ponto de vista político, porque internamente ganha a autoridade e o tempo de que precisava para consolidar a sua estratégia político-económica.

Sim, o orçamento tem riscos. Sim, o orçamento tem incoerências, depois de todos os enxertos que sofreu. Sim, pode ser necessário tomar medidas extra ao longo do ano para corrigir a tendência e cumprir o défice. Mas quantos orçamentos retificativos elaborou o Governo PSD/CDS, em cima dos quatro orçamentos que apresentou? Pois teve de elaborar oito orçamentos retificativos, dois em cada ano em que foi Governo. Vou frisar: em quatro anos e em cima de quatro orçamentos, o Governo PSD/CDS teve de apresentar oito orçamentos retificativos. Para lá disto pôr em causa a famosa competência técnica de Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque, a pergunta é: e se Mário Centeno tiver de fazer um orçamento retificativo? Ou mesmo dois? Haverá algum drama? Ou só há drama quando o governo é do PS e não há problema quando é do PSD/CDS?

Voltamos ao princípio. António Costa ganhou. Provou que há alternativa, mesmo que estreita. Bruxelas teve de aceitar isso mesmo. As Cassandras cá de casa e o Dombrovski estão a caminho da farmácia para comprar os anti-depressivos. É a vida.

11 pensamentos sobre “As Cassandras e o Dombrovski falharam. O OE passou

  1. Ai que a santa esquerdina nos valha, e que fique cada vez mais unidinha, meu Santo Antoninho, agora por uns anos és tu o Padroeiro deste singelo Pais e POVO, tem cuidado, anda praí um bruxedo danado, com caldeirões cheios de cozinhados envenenados, sempre que tiverdes de ir a Bruxelas vê-de bem onde pondes os pés, está tudo minado, com bombas explosivas para vos destruírem ou mesmo matarem, eles andam aí os mafiosos perigosos, prás pensar não as sonham, só maldades, eles alimentam-se destas coisas, da mentira, da calunia, do bota abaixo e do muito denegrir, e os mafiosos muito ricos esses ainda são piores, a sugar o sangue do Povo que trabalha, e eles cada vez mais ricos e o Povo cada vez mais Pobrezinho, esta luta dos de cá de baixo com os de lá de cima dura há milénios, mas isto está em mudança, mais tarde ou mais cedo vai surgir um mundo novo em que o Sol brilhará para todos nós, Santo Antoninho, usa o amuleto, é defensivo, protege contra os malefícios de todos os diabretes que se apresentarem no teu caminho olha que este Santo POVO tão humilhado, está com os olhos postos em ti cheios de esperança…

  2. Não sou politica nem técnica de contas…mas é fácil perceber duas coisas: um orçamento, bom ou mau, é uma previsão e como tal tem riscos, sempre; E penso que fica aqui demonstrado que o anterior governo nunca foi a Bruxelas negociar nada foi sim ouvir as ordens, baixar a cabeça a tudo quanto lhe era imposto e depois não satisfeito chegava cá e reforçava as ordens e a comissão europeia era o escudo que protegia todoss os mandos e desmandos.
    PARABÉNS, SIM! Parabéns ao Dr António Costa e à sua equipa que negociaram cá e lá, como deve ser. Espero que sejam rigorosos no cumprimento dos acordos e saibam gerir os dinheiros públicos, com a honestidade, honradez e transparência a que há muito não estamos habituados.

  3. E, repare-se, como A. Costa fez passar o Orçamento e ganhou politicamente, o medíocre político pacheco logo, na última quadratura, iniciou um pensamento intricado de alta sofística para criticar o dito Orçamento e até o comportamento de Costa com Bruxelas.
    Na sua declaração final, pena de sofística à sua maneira, já estava inteiramente alinhado com o maior sofista político da nossa praça, lobo xavier.
    Vai começar a defesa de sua linha politico-intelectual peculiar que passa a ser “o mais importante” ou “a questão fundamental” ou “o problema está”, etc.
    Bem dizia Costa, mal saiu da “quadratura”, que preferia dialogar e ter como parceiro o sofista lobo xavier que o inconstante polemista pacheco que apoia uma visão para logo de seguida inventar outra que destrói a primeira.
    Costa caça moscas com açúcar e não com vinagre para limpar terreno e concretizar uma visão política determinada e não é cata-vento como pacheco, embora, de maneira diferente de Marcelo. .

  4. É claro que António Costa venceu, não apenas a direita radical nacional (PSD/CDS), que tudo apostou no chumbo do Orçamento, mas igualmente em Bruxelas onde o confronto se apresentava seguramente mais difícil dada a correlação de forças das Instituições europeias, favoráveis como sempre à linha da “austeridade virtuosa” e do “empobrecimento redentor”.

    Tanto mais que um eventual sucesso de uma política alternativa, poderá tornar-se contagiante para os restantes países europeus em especial para Espanha com o processo de escolha de governo em mãos. Daí, as dificuldades acrescidas de António Costa.

    O empenho frenético e obsessivo que a direita e os seus apoiantes nos meios de comunicação social têm manifestado em desacreditar o Orçamento de um governo que se esforçou junto de Bruxelas por torná-lo menos austero para com a maioria dos portugueses, é uma odiosa manifestação da acesa luta ideológica e partidária que vem mantendo contra o governo. Chegaram ao ponto de ir a Bruxelas pedir o chumbo do Orçamento. É um comportamento indigno, odioso e miserável e que custou um aumento de impostos mais do que o esboço do Orçamento inicialmente previa.
    Os portugueses ficam a dever à direita esta dose superior de austeridade. O aumento suplementar nos combustíveis e um menor crescimento económico (menor valor do PIB).

  5. A qualidade de um jornalista mede-se proporcionalmente, na mesma direcção, da sua capacidade de análise independente.
    Com todo o respeito lhe digo quero Sr Nivolau Santis está a perder esta ultima.
    Faço-lhe um pedido:
    Avalie as diferenças entre os dois documentos ( o “esboço” inicialmente chumbado e orçamente finalmente aprovado ) e partilhe connosco os respectivos impactos na sociedade média de Portugak, que são o motor do nosso país.

    Obrigado
    João

  6. Não sou político e detesto partidarismos cegos… Tanto no artigo como nos comentários li muito sobre a direita e sobre a esquerda… Mas só uma pergunta? Depois de tudo o que se passou nas eleições, sob pretexto de oferecer uma alternativa à governação em Portugal, supondo eu que para todos os portugueses…, será que alguém me consegue explicar, “como se fosse uma criança na escola primária”, o que realmente mudou em relação ao governo anterior?
    Em que é que a maioria dos portugueses vai sentir as ditas melhorias da alternativa ao governo anterior?
    Para mim, leigo em macro economia, parece-me que vou continuar a ter as mesmas dificuldades no final do mês para poupar algum dinheiro… não consigo ver como é que as empresas vão criar mais emprego… não vejo como é que a economia vai crescer… não vejo onde a população mais desfavorecida vá ter condições melhores ou mais oportunidades… não vejo onde as “regalias” e os deveres passem a ser repartidas de forma mais equitativa… não vejo o investimento no ensino (desde o pré-escolar ao superior) … não vejo investimento na saúde… não vejo mais incentivos à investigação científica… não vejo as renegociações das PPP de forma a repartir os riscos da exploração entre privados e o estado… enfim… tal como suspeitava parece-me que vai continuar tudo na mesma…

    Sugiro que nos deixemos de guerrilhas infantis sobre partidarismos e comecemos a exigir mudanças reais para melhorar Portugal e as condições de vida da maioria dos portugueses… acabando com a promiscuidades entre políticos e certos grupos/empresas, com as supostas regalias “legais” de certas classes sociais, ou seja, promovendo o populismo… sim, incrivelmente sou a favor do Populismo, essa palavra que deixa tantos de cabelos em pé… dê-se o exemplo ao povo… comece-se com o exemplo por parte das classes mais favorecidas… qual é o mal de se fazer políticas populistas????? Chocam-me bem menos que promover medidas que, no seu essencial, não alteram nada para a maioria dos portugueses…

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