Mercados financeiros satisfeitos com novas máscaras gregas

(Jorge Nascimento Rodrigues, in Expresso Diário, 28/04/2015)

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A Bolsa de Atenas continua a acumular ganhos e os juros da dívida grega caíram significativamente desde o anúncio, na segunda-feira, de que a Grécia tem uma equipa de negociadores com os credores oficiais “refrescada”

Os mercados financeiros reagiram positivamente à saída do mediático, e polémico, ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, da primeira linha do embate das negociações com os credores oficiais da Grécia.

Recorde-se que Varoufakis foi atacado fortemente pelos seus pares na última reunião do Eurogrupo (órgão dos ministros das Finanças da zona euro), em Riga, na sexta-feira passada, envolvendo insultos a que o ministro grego respondeu citando Roosevelt e reenviando no tweet um cartoon jocoso à atenção dos parceiros de reunião.

Com o clima no ponto mais baixo, o primeiro ministro grego, Alexis Tsipras, e a chanceler alemã, Angela Merkel, pegaram no telefone no domingo e decidiram manter um contacto direto, uma espécie de telefone vermelho entre os dois, para evitar que as negociações descambem para algum “acidente”, o tão falado “acidente grego”, que nunca se sabe se acaba apenas em incumprimento de dívida externa já em maio ou mesmo em transição para uma saída do euro (a já famosa contração em inglês Grexit).

“Tenho de admitir que há um clima negativo. Eles [os pares do Eurogrupo] não querem negociar com Varoufakis”, referiu Tsipras na sua primeira entrevista como chefe do Governo ao programa Ston Eniko, do canal privado Star TV, dada na terça-feira à noite, ao longo de três horas.

Varoufakis, um “ativo” com 55% de apoio popular

Os media, os credores oficiais e as equipas de negociação no designado Grupo de Bruxelas e no Grupo de Trabalho do Euro (que prepara as reuniões do Eurogrupo) têm de se habituar a dois nomes novos nos lugares de chefia das negociações do dia-a-dia: Euclid Tsakalotos e Giorgos Houliarakis. Por sinal dois académicos, como Varoufakis, com doutoramentos no Reino Unido, o primeiro em Oxford e o segundo na Universidade de Warwick, até há algum tempo professor na Universidade de Manchester, onde dava aulas de Macroeconomia e Economia do Trabalho. Desde que o governo liderado pelo Syriza tomou posse, os dois já participaram em negociações e Tsakalotos acompanhou Varoufakis em muitas reuniões Varoufakis.

São ambos discretos. Tsakalotos, ministro-adjunto dos Negócios Estrangeiros, vai dirigir a equipa política; Houliarakis, chefe da comissão de peritos económicos, chefiará a equipa técnica.

Tsipras não demitiu Varoufakis, cuja cabeça era pedida por vários analistas nos media internacionais – interpretando os desejos dos pares do Eurogrupo – e pela Oposição no Parlamento grego, sobretudo por parte da Nova Democracia e do PASOK. O “refrescamento” foi entendido como uma “despromoção” de Varoufakis e o PASOK chegou mesmo a falar da “castração” do académico-ministro. Na entrevista de ontem, Tsipras considerou-o um “ativo” do país e atacou Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, e Jeroen Dijsselboem, presidente do Eurogrupo, por terem faltado à palavra dada.

Os “erros” nas negociações com os credores oficiais a que Tsipras se referiu, e também Tsakalotos no Parlamento grego, têm a ver com o facto de a delegação grega – e Varoufakis à sua cabeça – ter tomado a palavra dada pelos parceiros de reunião como válida e não ter exigido compromissos escritos.

“Poucos apostarão na demissão de Varoufakis, que, na verdade, é um dos membros mais moderados do partido [Syriza]. Mais, provavelmente ele voltará a ter destaque . logo que as negociações cheguem a uma conclusão”, escreve o analista Chris Papadopoullos no site City AM, de Londres. Uma sondagem deste fim de semana dava a Varoufakis um apoio de 55% entre os inquiridos pela Alco para o jornal “Protothema”

Bolsa de Atenas eufórica e juros da dívida grega em queda

O anúncio do “refrescamento” das equipas negociadoras com os credores oficiais foi feito na segunda-feira pelo governo e as bolsas europeias registaram um ganho de 1,16% ao final do dia e o mercado secundário da dívida soberana da zona euro acalmou, com uma queda significativa dos juros das obrigações gregas em todos os prazos. O que contagiou positivamente os restantes periféricos, com os juros das Obrigações do Tesouro português a cair para 1,91%, nove pontos base abaixo do fecho de sexta-feira passada. Finalmente descia do patamar dos 2% em que se mantinha desde 17 de abril.

Esta terça-feira a trajetória de descida continua a registar-se para os juros gregos. No prazo a 2 anos, desceram de 26,4% a 24 de abril para 20% pelas 15h de hoje. No prazo a 10 anos, a maturidade que serve de referência nas comparações (e determina o prémio de risco de uma dada dívida soberana), a queda foi de 174 pontos base, de 12,68% para 10,94% no mesmo período, um nível que já não se verificava há um mês. A bolsa de Atenas continua com ganhos. Nas últimas cinco sessões, incluindo a desta terça-feira, a valorização do índice geral já é superior a 14%.

No entanto, o contágio positivo aos países periféricos não se verifica esta terça-feira, com os juros das obrigações portuguesas, espanholas e italianas a 10 anos em alta, com destaque para as Obrigações do Tesouro português, que estão, de novo, com juros próximos de 2% e a liderar as subidas.

Os mercados financeiros esperam que os dois novos coordenadores de negociações acelerem as negociações e contam com um compromisso já no Eurogrupo a 11 de maio. Mas a mudança de máscaras gregas não altera, por enquanto, a matéria de substância, como muitos analistas sublinham a várias vozes da zona euro. O governador do Banco de França, Christian Noyer, disse claramente esta terça-feira que o apaziguamento de tensões ajuda, mas “não muda a substância de modo algum”.

Um funcionário europeu, citado pelo site Capital.gr, referiu que “qualitativamente nada mudou”, mas que o contacto direto entre Tsipras e Merkel é muito positivo para tranquilizar os mercados financeiros. O primeiro-ministro grego fez ontem na entrevista um rasgado elogio a Merkel, agora “que a conheceu pessoalmente”.

Impasse conduz a referendo

Ora a “substância” é distinta para as duas partes – como o ministro Varoufakis não se tem cansado de escrever e dizer, e como recordou Tsipras na entrevista de ontem. O governo grego tem linhas vermelhas traçadas. Até se admitem algumas concessões mais na retaguarda dessas linhas – claramente em matéria de privatizações, um ponto que foi salientado na imprensa alemã desta terça-feira, nos comentários à entrevista de Tsipras.

O ponto do primeiro-ministro grego é que os gregos já andaram 70% do caminho para a convergência e que falta aos credores oficiais e aos parceiros do Eurogrupo andarem agora os 30% que faltam connosco. O governo tem esperado que seja possível um acordo provisório, interino, nos pontos de convergência já possíveis, mas o último Eurogrupo fechou a porta. Como a revista “The Economist” sublinhou, os pares do Eurogrupo continuam a pretender o cenário de uma “capitulação” grega. Ora as áreas mais críticas sem convergência já o eram inclusive, em boa medida, nas negociações com o anterior Governo, liderado por Antonis Samaras. E precisamente por essa razão, o exame do andamento do programa de resgate não foi concluído e a situação vem-se arrastando desde agosto do ano passado, chama a atenção Nick Malkoutzis, editor-adjunto da edição inglesa do jornal grego “Kathimerini”.

No caso do impasse no Eurogrupo se manter, apesar de esforços de convergência por parte dos negociadores gregos, o Governo helénico poderá chamar os eleitores a pronunciarem-se sobre as opções que preferem. Colocou de lado a convocação de eleições legislativas antecipadas – que, segundo as sondagens divulgadas no fim de semana, continuariam a ser ganhas pelo Syriza ,com uma votação próxima ou mesmo superior à obtida em 25 de janeiro – e deu a entender que poderia recorrer a um referendo – opção que ainda não mobiliza a maioria dos inquiridos nas sondagens.

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