(Sandra Maximiano, in Expresso, 09/05/2015)
Esta semana um amigo convida-me para dois dedos de conversa em sua casa. Horas antes, envia uma mensagem dizendo “tem em consideração que sou homem e vivo sozinho, por isso espera alguma desarrumação.” Ao chegar a sua casa a primeira coisa que me saltou à vista não foi a desarrumação, mas uma máquina de costura na bancada da cozinha, que usa para pequenas modificações na sua roupa.
Este meu amigo até pode costurar, lavar, limpar e desempenhar outras tarefas domésticas, como muitos homens do século XXI fazem, mas pressupõe que se fosse mulher teria a casa mais arrumada, ou pressupõe que eu o pressuponho. Mesmo quando não impomos uma divisão clara quanto aos papéis de género no nosso quotidiano, desempenhando tarefas que em geral estão associadas ao género oposto, sofremos de estereótipos ou assumimos que os outros os têm.
A existência de estereótipos é a principal causa para a baixa representatividade das mulheres em altos cargos da administração pública e empresarial e na política. Como o Expresso referiu (na edição de 25 de abril), em quatro décadas de democracia foram nomeados para funções governativas 1609 homens e apenas 127 mulheres.
A assertividade, competitividade, confiança, são ingredientes assumidamente necessários para uma liderança de sucesso e como são traços de personalidade associados aos homens, estes são considerados como líderes ideais. Em comparação, características tradicionalmente femininas, como afetividade, empatia, gentileza, são vistas como mais apropriadas para funções subordinadas e de apoio. Assim sendo, muitas mulheres para ascenderem a cargos de direção optam por uma masculinização da liderança e ao fazê-lo são criticadas e catalogadas como “homens de saias”.
Mas o conceito de uma liderança eficaz está a mudar, em parte produto da crise financeira de 2008 que alterou a estrutura organizacional das empresas, tornando-as menos hierárquicas, mais baseadas no trabalho de equipa e na interação. Assim, ambos os estilos de liderança, femininos e masculinos, têm de coexistir. Ou seja, a igualdade de oportunidades em lugares de topo deve ser então alcançada através de um estilo de liderança mais andrógino. Este tipo de liderança destrói a polarização existente entre os géneros, é livre de estereótipos e incentiva os indivíduos a adotarem um continuum de comportamentos humanos, permitindo uma liderança mais flexível e capaz de responder de uma forma socialmente mais eficaz às exigências organizacionais num mundo em constante mudança.
P.S. — Para que fique claro, uma liderança andrógina não deve ser confundida com orientações sexuais nem com a falta de identificação sexual. Não esquecer que o sexo descreve o corpo físico e o género o papel social que a nossa (in)consciência atribui a esse mesmo corpo.