(Por José Gabriel, in Facebook, 30/08/2022)

Marta Temido pediu a demissão do seu cargo de Ministra da Saúde, a qual foi aceite com surpreendente rapidez. Alegou a Ministra demissionária falta de condições para o exercício do cargo. E querem saber que mais? Eu acredito. E se bem leio a situação, acho improvabilíssimo que António Costa encontre melhor. Talvez venha a optar por alguém de muito baixo perfil e disposição para obedecer ao ministro das finanças e calar, alguém que não tenha pensamento próprio sobre a área da saúde; talvez um contabilista ou economista vindo daquelas escolas com nomes parolos em inglês.
Poucas figuras nomeadas para o Ministério da Saúde partiram com tanto crédito – incluindo da esquerda propriamente dita – para o cargo. Mas os tempos não foram fáceis. A pandemia, claro, mas, mesmo que tão complexo processo não tivesse ocorrido, não faltariam obstáculos. Isso foi claro logo no debate sobre a Lei de Bases da Saúde. Apanhada entre os fogos do servilismo do governo para com os lóbis da medicina privada e os ataques do bastonário da Ordem dos Médicos, sujeita a uma pressão tremenda durante estes anos de pandemia e uma comunicação social agressiva a mentirosa – não poupemos nas palavras -, teve, ainda, o azar de a sua popularidade ter atingido os altos níveis de que os seus novos companheiros de partido não gostavam nada. Isto é, tornou-se uma ameaça interna para os candidatos a mais altos voos. Nomeadamente para o financeiro Medina, candidato a candidato.
E agora, que o alívio da pressão da pandemia parecia proporcionar espaço e tempo para, finalmente, enfrentar os problemas de fundo e levar a cabo – pelo menos – a Lei de Bases aprovada, era preciso que Marta Temido saísse, não fosse ela começar a governar a sério o seu ministério.
Marta Temido tinha, desde o início, alguns dilemas e opções de fundo a enfrentar. E, ou o fazia sem reservas e preocupações em se manter no lugar a qualquer custo, em obediência a princípios que sabemos que eram também os seus, ou ia de compromisso em compromisso em obediência aos medíocres e servis objectivos do governo até à inanidade política a que a quiseram – e conseguiram – reduzir.
Foi pena. Foi pena ver a trajectória descendente de alguém em quem tantos puseram – por boas razões – a sua confiança. E que acabou, valha a verdade, por ser uma das poucas ministras da Saúde que conhecia bem o sector e tinha ideias para ele.
Marta Temido acabaria sempre por sair, não tenhamos ilusões. Mas dela ficaria a memória de alguém que enfrentou os tremendos obstáculos que as políticas de Saúde sempre erguem em frente de quem tente, a sério, fazer obra de relevo no caminho certo, que é sempre o de uma Saúde pública de alta qualidade ao serviço da equidade social e de uma verdadeira democracia. E ficaria o exemplo para quem viesse a tentar fazer melhor.
Marta Temido já não é Ministra da Saúde. O ministério das finanças pode, assim, respirar de alívio e governar em paz o sector – não é o que tenta, quase sempre, fazer?