Na véspera de Agosto atira-se milho aos pardais — ou pão seco antes do circo estival

(Carlos Matos Gomes, in Medium.com, 29/07/2023)

Agosto é entre muitas outras coisas o mês do esquecimento: os problemas ficam esquecidos, assim como as más notícias. O final de Julho é a época de colocar as “vergonhas” que não convém serem muito badaladas fora de portas. Até a Justiça realiza as suas últimas tropelias e se veraneia. Os bancos não escapam à regra de camuflar as garras. Logo os bancos! Este ano aproveitaram a última semana de Julho para anunciaram os seus feitos, os pornográficos lucros obtidos à custa de um sistema financeiro imposto pelos banqueiros aos povos e aos Estados.

O que deveria ser um crime de esbulho, de imposição de regras leoninas, de abuso de poder, é apresentado como sucesso em todo o mundo. Aqui em Portugal também. Antes de fazerem a mala para o Agosto na terra de origem, à beira mar, num parque de campismo, num quarto alugado, num hotel, os portugueses de todos os níveis rendimentos e classes receberam, as seguintes notícias bancárias, sem alarido, ou com o menos alarido possível:

“Maiores bancos com lucros acima de 950 milhões de euros” — sapo.pt“

Banca. Lucros do primeiro semestre rondam os dois mil …” — RTP

“O “super ano” dos bancos: mais de 2.000 milhões de lucros …” -CNN (delegação portuguesa na TVI)

“Aumento das taxas de juro leva lucros da banca para mil milhões” — Abril, Abril

“Lucro do BCP dispara mais de 500% para 423 milhões … “ – sapo.pt (07/07/2023)

“Lucro do Novo Banco sobe 39,9% no primeiro semestre — “O Novo Banco apresenta um resultado líquido de 373,2 milhões de euros (1.º trimestre: 148,4 milhões de euros; 2.º trimestre: 224,8 milhões de euros), demonstrativo da evolução sustentada do negócio e da capacidade de geração de receita e de capital”, refere a entidade em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). No período em análise, primeiro semestre, a margem financeira ascendeu a 524 milhões de euros, mais 95,5% em termos homólogos.” — SIC Notícias 28/07/2023

“Lucro do BPI aumenta 26% para 256 milhões de euros até junho “- Banca & Finanças“Lucros da CGD sobem 25% no semestre para 608 milhões” — Jornal de Negócios

“Lucros do Montepio mais que triplicam, para 35,3 milhões, com subida da Euribor.Margem financeira cresceu 70,4%, beneficiando do aumento das taxas de juro, mas depósitos e créditos diminuíram”. — Público

Em 2008 a situação em que os bancos, o sistema financeira e bancário colocou os cidadãos, foi de crise e empobrecimento. A chamada crise do subprime obrigou os Estados, os contribuintes e cidadãos em geral a pagar as más práticas (os crimes) dos bancos.

Um exemplo da internet, do Público, com uma notícia da Lusa de 23 de Dezembro de 2008: “O ano da crise que obrigou estados a voltar a intervir na economia. 2008: O ano da crise que obrigou estados a voltar a intervir na economia.

As consequências imediatas deste colapso (o colapso do sistema de aliciação dos bancos para a contração empréstimos sem garantias, uma burla gigantesca) ficariam restritas ao sector bancário norte-americano, porém, se o risco não se encontrasse disperso por todo o sistema financeiro internacional (a dolarização imposta pelos EUA). O risco do ‘subprime’ passou a ser partilhado não só pelos bancos norte-americanos que concederam os empréstimos, como também pelos seus congéneres europeus e asiáticos que compraram estes activos ‘tóxicos’, bem como por todo o tipo de investidores institucionais (seguradoras, fundos de investimento, etc).”

Os cidadãos de todo o mundo foram obrigados a pagar a criminosa burla do subprime, o BCE colaborou com ela impondo regras draconianas aos bancos nacionais e aos Estados (a troika em Portugal e na Grécia, p.ex). Em Portugal o maior estoiro foi o do BES, mas há também o Banco Privado e os casos de aproveitamento do tipo gangster do BPN e do BANIF.

Agora, após a lição do subprime, o sistema bancário com sede nos EUA (a Reserva Federal (FED)) precaveu-se e antecipou o combate à inflação que a guerra na Ucrânia e o surgimento da moeda dos Brics irá provocar no “Ocidente Alargado”, na verdade o “Ocidente Dolarizado” decretando aumentos brutais de taxas de juro, que permitem aos bancos privados acumular reservas, de jogar com as taxas de juro, tudo à custa dos cidadãos.

Para já, a ligeira descida de inflação provocada nos bens de consumo pelo aumento das taxas de juro, as pessoas gastam menos, tem um efeito devastador no mercado da habitação, como se está a ver, que será pago por proprietários, arrendatários, por hipotecários e até por sem abrigo (contando nestes os jovens e menos jovens que necessitam de casa para uma vida autónoma). Mas a médio prazo o aumento das taxas de juro provocarão uma deflação, isto é uma diminuição na atividade económica ainda por quantificar. Vender-se-á e comprar-se-á muito menos, as falências aumentarão e com elas os desempregados.

Era a boa altura, se os banqueiros tivessem princípios e não mãos de rapinar e instinto de predadores que se atiram a tudo o que brilha, sem cuidar das consequências futuras colaborarem com a atenuação das consequências das suas políticas. Era também altura de os políticos eleitos se atravessarem impondo a vontade e as necessidades dos eleitores. Era altura de pensar numa ordem mundial plural e não hegemónica. Mas isso ia contra a manutenção do poder da banca e das indústrias de guerra e de manipulação civilizacional — a imposição de um pensamento e de um modelo de comportamento único.

Era…

Entretanto, antes destas férias, aqui em Portugal, os banqueiros e o “sistema” entretém-nos através dos seus meios de manipulação com a sala de partos dos vários hospitais, com as greves dos seus sindicatos (há os que o são deliberadamente outros por serem idiotas úteis), com o futebol e respetivos negócios, com os coloides fecais nas praias e com as alforrecas, com os incêndios, embora o tempo não tenha ajudado, com as peregrinações e a eterna questão dos professores, e jamais com a dos alunos e com a educação, com as diatribes do juiz Alexandre a pensão do Pinho, com o helicóptero do Pereira da Altice e com os namoros dos famosos.

Em vez de um roubo de proporções catastróficas e globais, os bancos impingem-nos fait-divers. Pão seco e circo.


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9 pensamentos sobre “Na véspera de Agosto atira-se milho aos pardais — ou pão seco antes do circo estival

    • Em sentido amplo, subprime (do inglês subprime loan ou subprime mortgage) é um crédito de risco, concedido a um tomador que não oferece garantias suficientes para se beneficiar da taxa de juros mais vantajosa (prime rate).
      (nada como perguntar ao buscador ‘google’ (como um primeiro passo de pesquisa)

  1. Geridos por bancários? Realmente há quem acredite em unicórnios. Isso é o mesmo que dizer que os preços no supermercado são decididos pelo triste que está na caixa a receber o ordenado mínimo, que as fábricas conserveiras eram geridas pelos operários explorados até ao tutano, pelas operárias assediadas de toda a maneira e feitio, que os campos do Alentejo eram geridos pelos jornaleiros e não pelos latifundiários. Em todos os sectores económicos quem manda é o dono. Mas o Menos deve ser daqueles senhores que vai ao balcão das Finanças e chama ladrão ao triste que está ao balcão porque o ladrão é ele e não o político que fixou impostos que, até à ele lhe custa a pagar. Os donos dos bancos são ou foram, no caso português, o senhor do “aguenta, aguenta, que os gregos ainda estão vivos”, o senhor que agora tem Alzheimer, o senhor que se enforcou na África do Sul, ou enforcaram porque esse mordia ricos e esses não perdoam, e outros que tais. Não os desgraçados trabalhadores bancários, muitos dos quais viram o olho da rua em idades de já não arranjarem trabalho em lado nenhum. Outro unicórnio em que não acredito, suicídios nas prisões. Por isso, faça o favor de ir ver se o mar dá choco.
    E claro que desta vez os banqueiros, não os bancários, não teem culpa de tudo que não hora eles que mandaram aquela psicopata da Lagarde subir os juros para ver se a inflação desce por não termos dinheiro para comprar nada. Mas claro que não piam, porque a coisa dá lhes muito jeito. Quem paga são sempre os mesmos mas ainda há gente que vive naqueles livros policiais em que o culpado era o mordomo. A sério, vá lá ver que no Verão o mar dá muito choco.

  2. O bancário é o empregado do banco, o banqueiro o dono, muitas vezes o vulgo confunde ambos como por exemplo quando acha que os empregados bancários ganham uma fortuna. Um membro de uma estrutura sindical queixava se disso, do vulgo confundir bancários, os trabalhadores da banca, com os banqueiros que levavam os lucros e nem lhes pagavam as horas extras. Pelos vistos o Menos também anda, a confundir conceitos. Vá ver se o mar dá choco, que isso passa.

    • Bancário é o empregado do banco.
      O dono é quem detém e representa capital bastante para condicionar decisões; desde logo nomeando gestores bancários.
      Quando o dono é bancário, diz-se banqueiro.

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