(Alexandre Abreu, in Expresso Diário, 18/06/2020)

Realmente não é fácil de entender. Não é este o mesmo país em que toda a despesa pública deve estar sujeita a mecanismos rigorosos de escrutínio, incluindo nalguns casos em termos de fiscalização prévia pelo Tribunal de Contas? Não é este o mesmo país em que o artigo 167.º, n.º 2 da Constituição proíbe a introdução de legislação que implique aumentos de despesa ou diminuições de receita face ao que consta do OE? Não é este o mesmo país em que cada milímetro de intenção de despesa pública é sujeita aos mecanismos do semestre europeu e às consultas no âmbito do Artigo IV do FMI, que mapeiam a sustentabilidade da dívida do Estado, incluindo responsabilidades contingentes?
Então como é que pode existir um contrato que, direta ou indiretamente, compromete o Estado com responsabilidades contingentes (pouco contingentes, na verdade, visto que se concretizam sempre) de milhares de milhões de euros e que esse contrato não seja conhecido por ninguém? O Parlamento só agora o recebeu e pelos vistos com partes em falta; o Presidente da República parece desconhecê-lo; e a generalidade dos portugueses, obviamente, não lhe pôe a vista em cima exceto através de fugas parciais para a imprensa que, apesar de tudo, constituem neste caso o único resquício de mecanismo de controlo democrático.
Há mesmo muito bons motivos para ficarmos estupefactos com toda esta história, mas a estupefação não devia ser de agora. A estupefação devia começar com o facto de ter sido possível a Sérgio Monteiro, Maria Luís Albuquerque e Pedro Passos Coelho organizarem uma negociata obscura – porque realmente não pode ter outro nome – que deixa nas mãos dos gestores e acionistas do banco o controlo sobre a possibilidade de irem buscar milhares de milhões de euros aos bolsos dos portugueses, recompensando-os tanto mais quanto pior o banco for gerido.
A estupefação devia continuar no facto desta negociata ter sido assinada com uma empresa de fachada – nem sequer com o próprio fundo abutre, mas com uma empresa criada para este efeito, no final de uma longa cadeia de holdings e offshores, à qual será impossível ir buscar de volta qualquer cêntimo de pagamentos entretanto realizados. Devia passar pela absoluta vergonha de Sérgio Monteiro ter sido pago principescamente com dinheiros públicos – 30 mil euros neste caso e meio milhão de euros no total das várias assessorias, tudo pago pelo Banco de Portugal – para organizar esta espoliação ao bolso dos portugueses. E devia estender-se ao facto de tudo isto ter sido feito sem que o contrato fosse minimamente conhecido ou escrutinado, impedindo que os seus responsáveis fossem pelo menos punidos no plano eleitoral por aquilo que, na melhor das hipóteses, é de uma incompetência a raiar o criminoso.
A venda do Novo Banco é um caso vergonhoso que ficará para a História pelos piores motivos, cobrindo os seus responsáveis de um opróbrio indelével. Mostra bem porque é que é inaceitável que o Estado assine contratos secretos: porque impede o necessário escrutínio, porque promove a corrupção e a má gestão e porque lança o descrédito sobre as instituições da democracia.
Não sendo eu jurista, sugiro aos deputados que verifiquem bem a legalidade da falta de publicidade deste contrato. E se estranhamente for legal, sugiro que legislem para que passe a deixar de sê-lo. Neste caso já não nos livramos de termos sido coletivamente lesados por abutres depois de nos terem vendado os olhos. Ao menos que tal não possa voltar a acontecer.
Errata acrescentada às 15h31, a pedido do autor:
O contrato de venda do Novo Banco à Lone Star foi assinado em 18 de outubro de 2017, durante o primeiro mandato de António Costa enquanto primeiro ministro, cabendo as responsabilidades diretas pelo mesmo a Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, e Sérgio Monteiro, responsável pela operação. Independentemente de outras responsabilidades políticas que possam ter no âmbito do desastroso processo de resolução do BES, Pedro Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque não são responsáveis por este contrato lesivo e obscuro. Por este erro, penitencio-me perante os visados e os leitores.
A errata tocou no ponto principal.
PS-PSD-CDS foram cúmplices nos últimos 45 anos no saque do pais por empresários piratas.
Este governo PS assinou o contrato, mas seguiu as linhas deixadas para a privatização pelo governo Passos. Até entregou a pasta ao negociador das privatizações do anterior governo. Um tipo do PSD… Uma mão lava a outra… Não é por acaso que o PS é o campeão das privatizações e das PPP’s, respectivamente com Guterres e Sócrates.
Vimos centenas de vezes – privatizações e PPP’s, rendas e swaps em que o estado (nós) aparece como vaca leiteira a ser mugida até á morte por “empreendedores privados” que não empreendem nada e vivem á custa de rendas e esquemas. Os responsáveis pela direção do estado aparecem sempre como uns meninos inocentes que deixam sempre que os “empreendedores” nos roubem o dinheiro dos impostos.
De facto já parece inocência a mais e os sacos de dinheiro que o amigo empresário do Sócrates lhe “emprestava” constantemente e as sinecuras de que usufruem a maioria dos nossos politicos “do arco da governação” quando saem dos cargos parece estar mais na base de tanta asneira criminosa do que propriamente toneladas e toneladas de “inocência” em politicos profissionais…
A bem do Regime. Pois.
Liberte-se The Talented Mr Vara (nada a ver com Ripley em filme)
Não é possível falar do NB sem falar da resolução do BES sem a qual não havia NB – o suposto Banco Bom. Ou seja a parte já limpinha de uma nova experiência de resolução bancária que UE impôs em Portugal. Tão limpinho que a Marilu garantiu que o NB nunca ia custar 1 cêntimo aos portugueses. Tão limpinho que a Marilu ainda viu várias tentativas de venda do NB abortadas. A mesma Marilu que a seguir foi trabalhar para uma financeira inglesa líder da gestão de crédito mal parado, isto é, na compra e venda dos esqueletos que a própria Marilu tinha deixado nos armários das resoluções bancárias que preconizou. Ou seja, um fundo abutre que não difere muito da Lone Star.
E que ainda assim gerou menos estupefacção do que um ex- MF e ex-quadro do BdP – findo o seu contributo no Governo e na liderança do Eurogrupo que tanto prestigiou Portugal – voltar ao mesmo BdP como presidente?! Porque parece que com MC o BdP vai passar a ser responsável pela execução do OE?!
Já entregar a regulação bancária a um ex-banqueiro, como aconteceu com o ainda presidente do BdP, também não causou qualquer tipo de estupefacção durante a vigência do Governo da Marilu. Inclusive depois de várias falhas de regulação apuradas em vários escândalos bancários com o mesmo Governador do BdP. Quem torna qualquer mandato em qualquer instituição sério é a seriedade de quem o lidera.
Finalmente e quanto à venda do NB à Lone Star eu estou convencido que os activos menos próprios de um banco bom sempre estiveram lá e foram imediatamente detectados por todos. Acontece que o Governo achou mais prudente diluir essa despesa no tempo. Até por compromissos europeus que a isso obrigavam. Devíamos deixar-nos todos de estupefacções até o montante injectado no NB pelo Fundo de resolução não ultrapassar o montante de capital contingente estabelecido no contrato de venda. Claro que ajudas aos prejuízos da pandemia têm que ficar de fora da equação. No NB e em todo o sistema financeiro. Até porque a venda do NB só teve como intuito assegurar a estabilidade desse mesmo sistema financeiro e do país.
Eu estou estupefacto é com as ajudas de Estado a empresas portuguesas com veículos financeiros sediados noutros países para não pagarem os impostos devidos em Portugal. Mais, ainda antes do Estado, quem devia verdadeiramente penalizar essas empresas eram os portugueses. Eu queria ver se as lojas do pingo Doce às moscas não obrigavam a uma mudança de estratégia imediata por parte da Administração. Servem-se de tudo o que é público em Portugal e que os portugueses pagam todos os meses, como o SNS – só para citar um exemplo que diz muito aos portugueses por estes dias – e decidem pagar impostos num paraíso fiscal qualquer? Então vão explorar as lojas para esses paraísos fiscais. Tão simples como isto!
TP à liça pela propriedade, porque qualquer um com bom senso já tinha percebido o mesmo. Mas pelos vistos houve mesmo papéis assinados que só comprometiam os contributos, independentemente de deputados ou ministros, durante um mandato. Ou uma legislatura. E que a saída de Centeno foi decidida muito antes do aparecimento da pandemia. E como bom português só prolongou o seu compromisso devido ao mandato por terminar no Eurogrupo. Esclarecido este tema que eu estou convencido que só chegou à opinião publicada porque estamos habituados a ver MF cumprirem várias legislaturas. As pessoas nem têm vida própria e como se vê oJá agora, o PTP que também pertenceu ao gabinete que elaborou o programa macroecómico para o Governo PS de 2015, também já veio desmontar outra falácia que floresce no espaço público sobre a saída de Centeno. E só trago o P cargo de MF nem deve ser nada desgastante perante tanta atrocidade que se publica. Como Centeno foge da pandemia…
Entretanto o Paulo Trigo Pereira, que também integrou o gabinete de onde saiu o programa macroecómico do Governo de 2015 já veio esclarecer numa crónica publicada outra estupefacção que floresce na opinião publicada. E só trago o PTP aqui à liça pela propriedade de integrar o mesmo grupo de Centeno, porque qualquer um com bom senso já tinha percebido o mesmo. Mas pelos vistos houve mesmo papéis assinados que só comprometiam os contributos, independentemente de deputados ou ministros, durante um mandato. Ou uma legislatura. E que a saída de Centeno foi decidida muito antes do aparecimento da pandemia. E como bom português só prolongou o seu compromisso devido ao mandato por terminar no Eurogrupo e não por qualquer razão eleitoralista. Outro mito! Esclarecido este tema que eu estou convencido que só chegou à opinião publicada porque estamos habituados a ver MF cumprirem várias legislaturas. As pessoas nem têm vida própria e como se vê o cargo de MF nem deve ser nada desgastante perante tanta atrocidade que se publica. Como Centeno foge da pandemia…