Valeu a pena descer o IVA na restauração?

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 29/05/2017)

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As políticas públicas deveriam ser alvo regular de avaliação por entidades independentes, para saber se resultam. António Costa fez da descida do IVA na restauração uma das suas bandeiras eleitorais. Em 1 de Julho de 2016, entrou em vigor a descida do IVA na restauração para produtos alimentares, de 23% para 13%. Quais foram os resultados? Desceram os preços? Subiu o emprego?

Um estudo do Banco de Portugal revela que a descida da taxa de IVA na restauração, se tivesse sido repassada totalmente para os clientes, teria implicado uma queda de preços de cerca de 8% (se a restauração só vendesse produtos com IVA a 13%, o que não é o caso). De qualquer maneira, o que se verificou foi uma subida de 1,1% dos preços em termos homólogos no terceiro trimestre e 1,4% no último de 2016.

Conclusão: a margem criada pela descida de IVA foi quase totalmente apropriada pelos restaurantes.

Convém lembrar, contudo, que não era esse o desiderato do Governo. Como disse António Costa, “Se houver redução de preços, excelente. Mas não é esse o principal objectivo do Governo. O principal objectivo do Governo é a sustentabilidade das empresas, a criação de condições para que possam investir, e sobretudo para que possam criar emprego”.

E aí os resultados já são diferentes. Com efeito, o sector da restauração está a criar mais postos de trabalho – entre Julho de 2016 e Março de 2017 foram mais 9.700 – e registou até no último trimestre de 2016 e no primeiro trimestre de 2017 um dos maiores crescimentos homólogos dos últimos anos (de 13,1% e 15,%%, respectivamente). A associação do setor, a AHRESP, garante que, sem a descida do IVA, não teria sido possível criar 30 mil empregos no último ano.

Os cépticos da medida têm razão para dizer que o consumidor não ganhou com a descida do IVA. Mas já não têm razão quanto à criação do emprego. E como há mais emprego, há mais contribuições para a segurança social e mais IRS pago.

Contudo, o Banco de Portugal assinala que apesar de o ritmo de crescimento do emprego na restauração ser superior ao da média nacional, fica ainda assim atrás dos níveis de crescimento registados no alojamento e do imobiliário, dois sectores que não beneficiaram da descida de IVA mas do dinamismo do sector do turismo.

É, pois, difícil tirar uma conclusão peremptória sobre os efeitos da descida do IVA na restauração. No que toca aos preços, eles não desceram. Tem, no entanto, de se levar em linha de conta que o sector da restauração passou por uma gravíssima crise, fruto de cinco anos de pesada austeridade, com milhares de falências e um desemprego galopante. É natural que a folga fiscal tenha servido para recompor a tesouraria dos restaurantes, mas também para contratar mais pessoas – e para mantê-las durante a época baixa.

Na questão da criação do emprego não há qualquer dúvida: existiu mesmo. Fruto da descida do IVA ou do aquecimento da economia é difícil saber o que cabe a cada um dos motivos, porque a economia não está parada e passa por ciclos.

Os cépticos da medida têm razão para dizer que o consumidor não ganhou com a descida do IVA. Mas já não têm razão quanto à criação do emprego. E mesmo as receitas fiscais não caíram tanto como se esperava, precisamente porque há mais emprego, mais contribuições para a segurança social e mais IRS pago.

É com base em tudo isto que se deve fazer o balanço. E, pesando tudo, a medida não foi assim tão ineficaz como muitos diziam.


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Um pensamento sobre “Valeu a pena descer o IVA na restauração?

  1. Entende-se pelo texto acima que, terá sido algo ineficaz, porque… “não tão ineficaz como”… mas, quem agradece é mesmo o comerciante que, quando em “economia paralela”, embolsa mais 10%, do IVA a 23% cobrado e que não liquida ao Fisco, nem partilha com o cliente, pois o preço mantêm-se exactamente o mesmo que anteriormente, nÉ?!…
    Ora viva a “luminosidade brilhante e clara”, dos “iluminados” gestores/legisladores fiscais que temos e que nos vão prendando/iluminando com estas maravilhas a “pilhas, em LED e a cores”… lol

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