(Nicolau Santos, in Expresso Curto, 22/12/2016)
Bom dia.
Este é o seu Expresso Curto, que vai do resgate de um banco a 12 milhões de bêbados, passando pelas angústias existenciais de Arnold Schwarzenegger aos convites ministeriáveis a Sylvester Stallone, acabando na inversão da imorredoura frase de Luís Montenegro (“a vida das pessoas não está melhor mas a do país está muito melhor”).
Fartos de serem chamados a resgatar bancos (BES em 2014, Banif em 2015), os portugueses podem por estes dias assistir de cadeirinha ao resgate de mais um banco. Mas desta vez não é nosso. É o mais antigo banco italiano, Monte dei Paschi di Siena, cujo plano de recapitalização por parte de investidores privados, elaborado pelo J.P. Morgan, falhou rotundamente. E quando os investidores privados falham, lá vem o Estado, sempre acusado de gerir muito pior que os privados, limpar com o dinheiro dos contribuintes a estrumeira que os acionistas e gestores privados fizeram. Serão “apenas” cinco mil milhões de euros que o Estado italiano terá de injetar no banco até ao final do ano (faltam nove dias!), passando a participação pública dos atuais 4% para uma posição entre 50% a 75%, segundo os analistas. Por outras palavras, o Monte dei Paschi di Siena vai ser nacionalizado para não ter de fechar as portas. O contribuinte italiano paga. E la nave vá.
Por cá, também continua por esclarecer quem vai suportar os encargos com os 286 milhões de euros que os lesados do BES vão receber depois do acordo a que chegaram com o Governo e as autoridades de supervisão, intermediado pelo amigo de peito do primeiro-ministro e negociador exímio, Diogo Lacerda Machado. Acontece que entre as várias declarações de satisfação não se ouviu a do Zé Povinho: é que o Fundo de Indemnização tem de ir buscar dinheiro a algum sítio para pagar aos lesados. Ao que parece, tentará um empréstimo bancário. E os bancos emprestam, mas desde que haja um aval do Estado e uma contra-garantia do Fundo de Resolução. Ou seja, os bancos só se atiram para fora de pé com bóia e suspensórios. E quem lhes garante que eles não engolirão água neste negócio são os mesmos de sempre: os contribuintes portugueses. Isto a não ser, claro, que Diogo Lacerda Machado ou António Costa nos venham esclarecer muito bem, timtim por timtim, que não será assim.
Em qualquer caso, os portugueses parecem andar bem melhor que o país, ao contrário do que acontecia quando Luís Montenegro apoiava militantemente a ação do Governo PSD/CDS.
Com efeito, a síntese de conjuntura do INE regista que “o indicador de atividade económica diminuiu em setembro e outubro, prolongando o perfil descendente anterior”. E também o indicador de clima económico, que traduz a confiança dos empresários dos principais sectores de atividade, aponta para um agravamento.
Em contrapartida, o número de desempregados baixou em novembro. São menos 4 mil do que no mês anterior e, pelo quinto mês consecutivo, o número total de desempregados mantém-se abaixo dos 500 mil. Os dados foram divulgados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional e dão conta da maior descida homóloga do ano.
Com mais dinheiro no bolso e menos desemprego, a confiança dos consumidores está em alta e continua a subir. Os portugueses estão a andar mais de carro. O número de veículos a circular nas auto-estradas nacionais voltou a aumentar no terceiro trimestre. É preciso recuar a 2010 para encontrar níveis de tráfego diário superiores ao registado em Setembro último. E os gastos dos portugueses no Natal vão ser também os mais elevados desde aquele ano. Os consumidores pensam gastar, em média, 373 euros com os consumos relacionados com o Natal, o valor mais elevado desde 2010, mostra estudo do IPAM.
Também o turismo está impante. As receitas turísticas subiram 16,8% no mês de outubro, atingindo 1,3 mil milhões de euros, segundo os dados do Banco de Portugal, que revelam ainda que no acumulado do ano já ultrapassaram em cerca de mil milhões de euros o resultado obtido no mesmo período de 2015.
E houve mesmo 80.000 contribuintes relapsos que aderiram ao Plano Especial de Redução do Endividamento ao Estado (PERES), tendo o Estado encaixado perto de 400 milhões de euros. O valor comprometido, que pode ser pago em 150 prestações mensais, é de 1100 milhões de euros.
Conclusão: o país está pior mas os portugueses estão irresponsavelmente a pensar que estão melhor. Alguém que vá ouvir o dr. Montenegro sobre esta momentosa questão!
Entretanto, o primeiro-ministro garantiu que o défice este ano vai mesmo ficar abaixo dos 2,4%, para espanto de muitas e especializadas almas na arte de bem prever todas as evoluções económicas. E grande parte da ajuda vem das exportações, que crescem 6%, mas também do perdão fiscal. Será o défice mais baixo em 42 anos de democracia e permitirá ao país sair finalmente do Procedimento por Défice Excessivo.
Por seu turno, o Presidente da República recebeu à tarde e promulgou quase de imediato o Orçamento do Estado para 2017 – o que “não quer dizer que concorde com tudo política e juridicamente” – justificando a decisão com quatro razões e enunciando quatro desafios para 2017 (que inicialmente eram três, mas se desdobraram em mais um, porque quando se fala de improviso as ideias são como as cerejas – há sempre mais uma).
A concertação social reúne hoje de novo para tentar fechar um acordo para o próximo ano. O processo começou mal porque o Governo anunciou um novo valor para o salário mínimo nacional sem consultar os parceiros sociais. Agora, procura manter a face e está a dar aos patrões uma redução de 25 pontos na taxa social única. Claro que os sindicatos estão contra, não querem que sejam os contribuintes a suportar o aumento do salário mínimo que as empresas terão de pagar. A proposta em cima da mesa é a de atualização do salário mínimo nacional para os 557 euros, a partir de janeiro de 2017, a par da redução de um ponto percentual da Taxa Social Única para as empresas. Veremos se hoje acontece o milagre de haver um acordo.
Agora é que é: a investigação a José Sócrates vai mesmo ter de terminar em março de 2017. A procuradora geral da República, Joana Marques Vidal, podia ter alargado o prazo, que já alargou por várias vezes, mas resolveu mantê-lo – embora tenha prescindido do relatório intercalar que lhe deveria ter sido apresentado agora (e que também não foi). Estamos, todos, muito mais descansados.