A Justiça a brincar ao faz-de-conta

(Nuno Godinho de Matos, in Facebook, 27/01/2018)

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Quem tenha visto o telejornal da SIC, de Quinta-feira, às 20 horas, relativamente ao dito caso Manuel Vicente, constatou que um colega nosso, acompanhado de um jornalista, dono de uma empresa de comunicação, e um fotógrafo, procede à cobertura do julgamento, tirando notas de tudo o que é dito nas audiências.

Isto, no mínimo, significa que alguém está a suportar os custos económicos destas actividades. A resposta à pergunta: quem paga? Já só pode ser dada, com base numa opinião, ou “palpite”.

Agora, o facto, é inegável. Isto significa que uma entidade com a faculdade de pagar estes custos está interessada no julgamento, ao ponto de suportar despesas, aparentemente, inúteis.

É obrigatório pensar que tanto a Procuradoria Geral da República Angolana, como a Portuguesa conhecem, reciprocamente, as legislações próprias e do outro país.

Então, os dois Estados sabem que não sendo o arguido – Manuel Vicente – notificado da acusação, o mesmo não poderá ser julgado em Portugal, porque, apesar da separação de culpas, vai ser declarado contumaz e não será julgado, enquanto não comparecer no julgamento.

Se esta conclusão constitui uma evidência inegável e é-o, então, porquê, tanto interesse no impossível julgamento e tanta encenação à sua volta?

Porque se está perante uma grande manobra de propaganda. O que está em causa não é julgamento algum, de qualquer pessoa, mas sim a política de comunicação dos dois Estados.

Portugal, finge que julga Manuel Vicente, mas sabe que não o julgará, em momento algum, e a prova do que se escreveu resulta de se saber que, quando Portugal declarar Manuel Vicente contumaz, não irá ordenar um mandato de captura internacional, devido aos interesses dos Portugueses, que vivem e investiram em Angola, os quais tem o dever de preservar e acautelar.

Angola, por seu turno, nem quer pensar nisso, até porque já esclareceu que Manuel Vicente goza de uma imunidade constitucional até ao ano de 2022.

Então, para quê todo este dispendioso teatro?

Por banda de Portugal para, com muito “patos”, alegar que julga todos, independentemente da sua posição social e dos interesses em causa, quaisquer que eles sejam. Embora tenha perfeita consciência do embuste.

Por banda de Angola, para promover uma campanha de propaganda em Portugal, usando-a para destruir social e profissionalmente Carlos Silva, o qual, aliás, já está posto em causa como administrador do BCP Millenium.

A razão de ser desta perseguição política, terá de ser encontrada nas lutas de poder em Angola, decorrentes dos resultados das novas eleições, mas essas já não sei interpretar, por falta de conhecimento das relações de poder.

O que lastimo é que andemos, todos, a ser toureados por força dos interesses de propaganda dos dois Estados, enquanto dois arguidos, seres humanos, servem de pretexto para o golpe publicitário. A menos que estejam, também eles, a ser muito bem pagos, o que é o mais provável, mas somente eles saberão.

Não se está perante um julgamento. Está-se face a uma operação de propaganda de dois Estados, montada no que começou por ser um julgamento; sucede, porém, que o interesse de Manuel Vicente passava pelo maior silêncio e nunca por tanto “barulho”. Mas isso é um dano colateral, que não tem qualquer interesse, tal como o destino dos que estão a ser julgados.