A varíola na Pax Americana

(Por Larry Johnson, in sonar21.com, 29/12/2022, Trad. Estátua de Sal)

Se o leitor já se questionou como era viver, logo após a Segunda Guerra Mundial, quando a Guerra Fria começou e os Estados Unidos se tornaram a potência dominante no mundo, não torne a questionar-se. Você está vivendo um momento histórico decisivo. Está repleto de perigos, de perigos e de um realinhamento fundamental da ordem internacional. Foi-se o tempo em que os Estados Unidos podiam ordenar a países como a Arábia Saudita e o Catar que cumprissem as suas ordens como o velho Tio Ben numa plantação no sul.

Os Estados Unidos estão prestes a tornar-se o Hitler retratado no filme “A Queda” – dando ordens a exércitos imaginários que não mais as podem cumprir.

Não estou sugerindo que os Estados Unidos estão prestes a entrar em colapso, como o Terceiro Reich em maio de 1945, mas acredito que acabaram os dias em que os Estados Unidos invadiam outros países à vontade, e derrubavam os governos que não queriam curvar-se diante do altar do poder americano. A guerra na Ucrânia pôs a nu a fraqueza dos Estados Unidos para controlar a arena internacional.

O ano de 2022 será registado pelos futuros historiadores como o momento decisivo em que a Rússia tomou a pílula vermelha e acordou da ilusão de que poderia ser um parceiro do Ocidente. Desde a dissolução da antiga União Soviética, os líderes russos – e não apenas Putin – acreditaram ingenuamente que poderiam ser aceites como parceiros na ordem mundial controlada pelos EUA. 

Vladimir Putin, no seu discurso de 21 de dezembro de 2022, perante o colégio do Ministério da Defesa, censurou-se por ter acreditado nas promessas ocidentais e anunciou que doravante a Rússia confiará apenas em si mesma e tratará o Ocidente como uma ameaça hostil. Eu encorajo o leitor a assistir ao vídeo. Enquanto o Ocidente tenta desesperadamente retratar Putin como louco, o homem que fala é calmo, inteligente e consistente. Que contraste com os anões políticos que povoam os Estados Unidos e a Europa.

As ações secretas dos Estados Unidos e da Europa para tentarem desestabilizar a Rússia falharam. O próximo ano, 2023, verá o fim do mundo unipolar dominado pelo petrodólar dos EUA e pelas intervenções militares dos EUA. Sou frequentemente atacado como sendo bajulador de Putin. É uma mentira perniciosa. Simplesmente, eu acredito que a Rússia não está a fazer bluff e reconheço que a Rússia é um dos poucos países do mundo que pode crescer e prosperar sem se prostituir a soldo do Ocidente.

Os Estados Unidos conheceram apenas uma ameaça existencial na sua história: a Guerra Civil na década de 1860. Ironicamente, a Rússia desempenhou um papel significativo nesse conflito, ao impedir que os britânicos interviessem nessa guerra para ajudar o sul. A Rússia, por outro lado, enfrentou séculos de ameaças existenciais e sempre encontrou maneiras de enfrentar e as derrotar, como a invasão de Napoleão em 1800,  ou a invasão nazi em 1941. A não ser provocando uma guerra nuclear, não há nada que os Estados Unidos possam fazer para impedir que a Rússia proteja as suas fronteiras. Os Estados Unidos descobrirão em 2023 que os seus militares multibilionários são impotentes quando se trata de apontar o seu poderio para a Rússia.

Putin e o seu governo entendem que a atual guerra com o Ocidente não ocorrerá apenas nos campos da Ucrânia. É também uma batalha política e económica. Por isso mesmo a Rússia está a construir relações importantes com a China, com a Índia e com as ex-colónias imperiais da Europa e dos Estados Unidos. Os líderes políticos, em Washington, ainda não compreenderam isso. Ainda acreditam que podem intimidar e ameaçar os países mais fracos para que cumpram as suas exigências. Joe Biden tentou essa manobra com a Arábia Saudita e esses ricos xeiques do petróleo disseram-lhe, na verdade, para se ir foder.

Embora eu deseje a todos que me estão a ler um feliz e próspero Ano Novo, temo que 2023 seja um tempo de escuridão e sofrimento para o Ocidente. A Europa já está devastada pela inflação e as economias estão todas em retração. 

Se o duplo golpe da inflação e da deflação económica atingir os Estados Unidos, a crise será exponencialmente pior do que a derrocada de 2008. Estamos diante da apócrifa maldição chinesa: “Que possamos viver em tempos interessantes”. Eu rezo para que consigamos sobreviver.

Fonte aqui


Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.

6 pensamentos sobre “A varíola na Pax Americana

  1. A nova ordem mundial será mais ou menos assim:

    BRICS:
    1- as suas próprias moedas , a sua própria política monetária, o seu próprio sistema bancário…
    2- a regulação do mercado das suas matérias-primas…
    E esta é a asfixia, a morte inelutável da hegemonia imperialista ocidental….

    Esta nova moeda se baseia mais especificamente nas suas moedas,o ouro, a China, compra quase 100 toneladas por mês e mais … estimama-se estas reservas em mais de 12.000 toneladas … a armadilha fecha-se com a energia (petróleo e gás) que fará do valor desta moeda uma base real, porque os Brics são unidos pelos produtores, o que estabilizará esta nova moeda a 50% do cabaz …

    É interessante ver a posição de Israel sobre a Ucrânia recusando-se a apoiar a NATO e a fornecer armas, Israel não quer encontrar-se amanhã de mãos e punhos atados diplomaticamente… são finalmente as tenazes que se estão a fechar sobre a UE e o seu Euro que explodirão no momento em que a China criar oficialmente esta nova moeda: O sistema interbancário está a ser criado, permitindo a 120 países trocar em moedas locais sem passar pelo sistema internacional do dólar obrigatório.

    Quando tudo isto for posto em marcha, os títulos americanos serão activos podres… o investimento irá progressivamente para os títulos asiáticos, incluindo os russos… podemos também ver que a contraparte do Banco Mundial, uma ferramenta para a dolarização do mundo, está a colapsar em benefício do banco de desenvolvimento asiático.

    Em suma, esta nova moeda pode provocar uma 3ª guerra mundial com o pretexto de taiwan ou ucrânia, porque o animal americano está ferido … ou acabamos, ou num último rugido causará danos sem precedentes ao mundo, incluindo armas nucleares, porque o estado profundo dos Estados Unidos não será capaz de deixar o bezerro de ouro ir para a Ásia, as consequências para o povo americano seriam desastrosas: falência dos fundos de pensões, dinheiro fácil e o despertar dos americanos contra o seu líder, o que poderia levar a uma revolução ou à independência de vários Estados… o que deslocaria de facto os Estados Unidos… esse é o objectivo da China… avança lentamente, para retirar as algemas de cada país, libertando os maiores reféns financeiros, um por um dos países … o que será feito amanhã … ninguém sabe, excepto que voltaremos com esta nova moeda … o fim dos EUA, do Euro, deixará de estar sob a tutela do FED ..

    Pois, afinal, a crise é quando o novo mundo se recusa a nascer e o velho mundo a desaparecer…
    Esta nova forma económica que vamos ver na nossa vida é silenciosa económica… Desejemos o melhor a todos… há anos que observo a China e a Rússia, a criação da rota da Seda foi o primeiro passo deste inacreditável plano de fracasso, no último congresso do Pc chinês, o ex-presidente foi preso em pleno congresso pela polícia… porque os EUA e a Europa, que tinham dado à China o título de oficina do Mundo transferindo todas as suas fábricas e o seu know-how, melhorado pela China, não deveriam ter suspeitas sobre o que estava a preparar… a guerra na Ucrânia acelerou a agenda, tendo o presidente chinês feito visitas diplomáticas sem precedentes, os Brics obedecendo cada um a uma agenda… o cursor de tempo era : A resposta de Nova Deli ao secretariado norte-americano sobre a utilização dos seus portos e comércio com a Rússia… respostas sem precedentes… a mudança nas esferas de influência europeia para este bloco e a monumental bofetada na diplomacia europeia.

    Para além da moeda que é o meio para a alcançar, existem, antes de mais, os recursos minerais! Quer se trate de matérias-primas ou de energia, esse é o nervo da guerra!
    E nesta área, o bloco ocidental, que pode ser resumido como o bloco da NATO, está em total desordem! Existem recursos na Austrália, EUA e Canadá e para os outros nada!

    E a Europa é o pior! Para além de alguns recursos petrolíferos na Escandinávia, não temos nada!

    Para além do défice FEDERAL dos EUA, que está mais próximo dos 25 triliões de dólares, todas as dívidas dos EUA combinadas estão próximas dos 200.000 mil milhões de dólares (dívida federal + dívida estatal + dívida empresarial + dívida pessoal).
    Com o G7 – Os 7 países mais endividados do mundo……

    O dinheiro é um meio hiper-poderoso de controlo…
    E não é para ser emancipado…
    Esta moeda é feita para contrariar o dólar, para se empenhar num braço de ferro com os EUA, e para fazer avançar o imperialismo chinês.

    O dólar na medida em que é o reflexo do poder económico dos EUA, a expressão do seu poder (dólar de prata = armamento militar, armas de guerra, compra de petróleo, entre outros) pelo qual impõe a sua hegemonia… O problema vem da natureza das relações de poder! E então o que é o poder? Na nossa sociedade consumista e materialista? É dinheiro! Portanto, quem tem o dinheiro tem o poder! Sendo o dólar a principal moeda de troca a única moeda de pagamento para o petróleo ! Assim, quando outros países querem emancipar-se e criar outra moeda, acabam por ser vítimas de guerra, pilhagem, sanções… Porque ao criar outra moeda, o dólar enfraquece e os EUA perdem o seu poder de domínio sobre o mundo…
    Mas, no final, a culpa é da sua ganância.

  2. A palavra ‘tecnologia’ está ausente do texto e dos comentários como se não fosse definidora dos poderes que fizeram o extraordinário aumento do bem-estar no mundo e não contasse para o futuro da humanidade!
    A Rússia não soube e não quis acompanhar o Ocidente nas condições que aí se designam por progresso. Decidiu, em alternativa, assegurar-se de território e de instrumentos militares de dominação.
    De império colonial a coberto de uma ideologia internacionalista, despiu-se da ideologia para se concentrar em dominar território e afirmar-se internacionalmente por meios de terror.

  3. O texto é curto no tamanho e no conteúdo. Para além de wulishful thinking e bajulação a Putin, tem mais mais o quê? A meu ver não acrescenta nada. Ou melhor, acrescenta delírios.
    Vou analisar só duas citações:

    (1)
    “O próximo ano, 2023, verá o fim do mundo unipolar dominado pelo petrodólar dos EUA e pelas intervenções militares dos EUA.”

    Gente mais séria já falou disto e diz que a transição para o Mundo Multipolar levará anos, senão décadas. A própria guerra na Ucrânia pode nem acabar em 2023, quanto mais o Mundo Unipolar dos dominantes EUA.

    O dólar pode ficar um pouco menos Petro, mas continua de longe a ser a moeda que mais empresas e governos usam como reserva, e também isto demorará anos ou décadas até ser alterado.

    Quanto às intervenções militares dos EUA, elas continuam com boots on the ground na Síria apenas em missões de suporte aos Cursos e missões de roubo descarado de petróleo, e com HIMARS on the ground na Ucrânia e Taiwan. Mudou o método, agora com menos baixas para o seu próprio exército, mas essa mudança foi por iniciativa própria, e o novo método continua tão ou mais perigos que o anterior, agora que a oligarquia USAmericana provou dessa droga: muito lucro para o Complexo Militar Industrial, poucas baixas no seu exército, e ainda mais danos causados em adversários directos: Rússia e China e… Europa (caso o mais distraídos não tenham dado conta).

    (2)
    “Sou frequentemente atacado como sendo bajulador de Putin. É uma mentira perniciosa.”

    Ele atreveu-se mesmo a escrever isto depois do que escreveu no parágrafo anterior, onde encoraja o leitor a ver um vídeo com um discurso do Putin, e o enche de elogios.
    Meu caro, vá ao dicionário, isso é bajular.

    (Priberam) Bajular: lisonjear de forma servido. I.e. enaltecer desmesuradamente, e de forma condescendente ou obediente em relação às acções ou ideias de outrem.

    Até podia adjectivar Putin daquela maneira, mas se antes e depois o contexto é um texto destes, em que tudo o que Putin faz está certo e no bom caminho, repete todas as promessas/wishful thinking e ilusões, e só os outros é que cometem erros e estão à beira do fim, então sim, isto é bajular.

    E para voltar à realidade, basta ler um pouco do Erwan Castel, a escrever a partir do Donbass, que em quase todos os textos dos últimos 10 meses, relembra: ainda há soldados russos a morrer devido aos HIMARS, ainda há civis ex-Ucranianos a serem bombardeados na cidade de Donetsk, isto (o conflito) ainda está muito longe de se parecer com uma vitória clara de um dos lados, é grande o número de asneiras cometidas pela liderança Russa, política e militar, e pior que isso só mesmo os propagandistas que passam os dias a bajular e a anunciar vitórias (e facilidades na sua obtenção) que não se verificam na prática.

    Vale mais um qualquer SitRep do Erwan Castel do que os textos todos juntos dos propagandistas e bajuladores, sejam do Kremlin ou sejam do regime genocida ocidental.

    Pior que isto, só mesmo o tresloucado Batiushka que chama “santo” ao czar, ou o Meyssan que disse que Rússia não sofreu derrota nenhuma na contra-ofensiva de Kharkov. Haja paciência!

  4. Moral do ano que acaba de passar para um observador da história e um visionário do futuro..

    Nunca ameace aquele que o aquecee o sustenta.
    Os EUA “africanizaram” totalmente a Europa.
    Os EUA estão em declínio.
    A China continua a ser um forasteiro graças ou por causa da covidez.
    Os BRICS podem tornar-se a principal potência da década se coordenarem bem.
    A Alemanha está economicamente morta.

    Espero estar enganado, mas não acredito de todo numa recuperação britânica, vejo uma ruptura do Reino Unido a curto prazo devido à violência do aumento dos preços.

    Talvez nos próxima anos próximos, o Reino Unido desapareça politicamente. Isto parece-me muito mais lógico dado que a pessoa que tinha o maior consenso sobre a unidade do reino está morta, nomeadamente a Rainha.

    A coroa sueca continua a desvalorizar-se face ao euro e ao dólar, e é provável que o mergulho continue, em parte para salvar a sua indústria.
    Para aumentar a tristeza do país, o mercado imobiliário é o mais deprimido do mundo, o que penalizará fortemente as famílias suecas, que também se encontram entre as mais endividadas do mundo. Com a inflação a não descer na Suécia durante muito tempo (9,7% em Novembro de 2022) e as taxas de juro a subir, é possível ver para onde se dirige o país.

    Não confundir a Suécia com a Noruega. A coroa norueguesa está a fazer melhor do que a coroa sueca e não se devem esquecer que a Noruega tem um activo importante, que é o fundo petrolífero do Estado norueguês, que vale NOK 1,316 mil milhões, ou seja, 125 mil milhões de euros.
    Além disso, o Estado sueco está abertamente viciado e a confiança da população nas suas instituições está a um mínimo histórico.
    Portanto, a Suécia é um país a evitar por muitas razões.

    A moralidade, o primeiro país da UE que tem a inteligência de se dedicar ao parlamento, e decidir fazer comércio normal com a Rússia (que não é nossa inimiga…!) teria ganho o seu futuro económico, e a confiança do principal fornecedor de energia do continente!!!
    Esperamos para ver de onde isto poderá vir com impaciência. Porque é aí que teremos de investir!!!

    Não estou optimista quanto ao futuro próximo, mas tenho grandes esperanças quanto ao que virá depois.

Leave a Reply to Carlos MarquesCancel reply

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.