O “vencedor” apressado

(Joaquim Vassalo Abreu, 07/10/2019)

Assisti como muitíssimos mais à noite Eleitoral nas TV’s e, perante a amostragem por estas das sondagens à boca das urnas, que dado o enorme intervalo que apresentavam todas reclamaram como certas, logo perplexo fiquei quando a maioria dos comentadores presentes, na ânsia de apresentarem de imediato vencedores e vencidos sem cuidarem sequer de uma normal prudência, desde logo apresentaram o BE como um inequívoco  vencedor da noite!

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Também a Catarina Martins, ainda a noite era uma criança e muitos votos por apurar, naquele registo arrogante e eufórico que lhe é peculiar, veio proclamar a estrondosa vitória de seu BE afirmando este como a terceira força política em Portugal ( uma evidente verdade ), força esta essencial e imprescindível para qualquer solução de Governo, apressando-se a apresentar a Costa o seu caderno de encargos e da aceitação por este de tudo quanto o BE reivindicar, acrescento eu!

Mas a grande verdade é que final da noite o BE se ficou pelo mínimo das tais sondagens e não obteve nem os 22, nem os 24, nem muito menos os 26 mandatos que elas prognosticavam e ficou-se pelos mesmos deputados que obteve em 2015: Dezanove (19)! O BE um grande vencedor?

Mas mais: em 2015 tinha obtido 10,19% e à volta dos 550 mil votos. Agora em 2019 apenas atingiu os 9,67% e cerca de 493 mil votos. Perdeu quase 60 mil votos. Manteve os mesmos deputados, isso sim. Um grande vencedor o BE?

Vencedor em relação ao PCP aqui sim pois este, apresentado e bem como um dos grandes derrotados, teve na verdade um recuo eleitoral, passando dos 8,25% para os 6,5%, perdendo cinco deputados (passou de 17 para 12) e cerca de 115000 votos em relação à últimas eleições. Muitos eleitores que antes votavam PC votaram desta vez PS, dando assim relevância ao papel do PS na governação. Também as sondagens já isso revelavam quando indicavam ser o eleitorado do PCP o maior adepto da Geringonça!

Mas nesta geometria eleitoral, naquela que realmente conta, o grande vencedor é apenas um, o PS, que ganha 20 deputados e tem apenas ele mais  votação e mais deputados que toda a Direita junta. E ainda um outro vencedor, noutra ordem de grandeza, o PAN, que passa de 1 para 4 deputados e que passando a grupo parlamentar regista uma meritória vitória.

Mas fazendo um pequeno exercício de matemática, podendo o PS atingir os 107 ou mesmo os 108 deputados, ficará a 8 ou 9 da maioria necessária para aprovar Orçamentos e Leis normais. Mas abstraindo-nos do facto da Geringonça atingir a alargada maioria de cerca de 140 deputados, não serão  os 19 deputados do BE que, por si sós, poderão obstaculizar a aprovação dessas Leis!

E porquê? É que atingindo toda a Direita o máximo de 87 deputados (78/80 o PSD, 5 o CDS mais os 2 da IL e do Chega), somando estes numa coligação negativa não inédita aos 19 do BE, apenas se chegará aos 106, a um ou dois menos que os do PS, pelo que uma simples abstenção do PCP, do PAN e do Livre bastarão a Costa para ultrapassar possíveis inexequíveis exigências do BE. Tenho portanto para mim que terão tanta importância decisiva os deputados do PCP, do PAN e do Livre juntos (17) quanto os do BE. Vencedor o BE?

São diversas para o PS as soluções numéricas mas fez muito bem António Costa, em nome da Estabilidade e da Continuidade, em propor a renovação da Geringonça, já dada por todos esses comentadores como morta na própria noite eleitoral, pois, tendo ela saído vitoriosa e reforçada, correspondendo assim à vontade da maior parte do eleitorado (mais de 53%), que razões poderão apresentar tanto o BE como o PC para a sua não continuação. 

Irão eles de um modo irresponsável e não adequado ao inequívoco mandato do eleitorado obstaculizar um próximo Governo? Será que lhes passará pela cabeça aliarem-se mais uma vez à Direita?

Tal como antes e tendo em consideração que com estes resultados eleitorais fica mais que provado que os Portugueses prezam antes que tudo o mais a Estabilidade, todos os que a ela se opuserem e traírem o espírito que vigorou nos últimos quatro anos, sairão no futuro fortemente penalizados.

E também ficou mais que provado que quem é apenas contra e não apresenta alternativas coerentes, sólidas e credíveis será pelo mesmo eleitorado castigado, como aconteceu com o CDS. O ser-se apenas contra é árvore que já não dá frutos!

”Geringoncem”, portanto! E viva a Geringonça!

13 pensamentos sobre “O “vencedor” apressado

  1. > naquele registo arrogante e eufórico que lhe é peculiar,

    Sim, completamente diferente de Costa a festejar a eleição de Zimmerman.

    > fica mais que provado que os Portugueses prezam antes que tudo o mais a Estabilidade

    Ou isso, ou fica mais que provado que ninguém quer dar poder absoluto ao aparelho de negociatas. Ou que prezam “antes que tudo o mais” a devolução de rendimentos. Dá para tudo. Mas “Estabilidade” nos cortes durante a recessão, fiquem com ela.

  2. Nota. Isto é de morrer a rir, LOL.

    […]

    No dia do .achamento, refere a acusação, Azeredo Lopes recebeu um telefonema de Joana Marques Vidal, em que esta lhe transmitiu a falta de correção, do ponto de vista jurídico, da atuação da PJM e lamentou o facto de não ter conseguido falar com o diretor da PJM. Na resposta, o ex-ministro disse que estava “profundamente contente” com a recuperação do armamento e que isso era o essencial e o mais importante.

    Joana Marques Vidal expressou o seu desagrado e disse-lhe que ficaria muito contente se soubesse como tinha desaparecido o material de guerra e quem eram os autores do crime. Azeredo Lopes apelou à complacência da PGR e recordou-lhe que, para a opinião pública, a PJM era vista, naquele momento, como um herói nacional.

    No Expresso, online

  3. O vencedor destas eleições chama-se PS. Tudo o resto é fantasia.
    Como em 2015, o vencedor foi a PàF. Uma coligação.
    Contudo a aritmética tem coisas tramadas, em especial quando se aplica o método de Hondt em processos eleitorais. Só que as eleições legislativas elegem deputados que podem ou não formar maiorias, não elegem primeiros ministros, ao contrário da PR. Logo, a legitimidade de Costa não foi menor antes do que é agora, apesar da direita continuar com azias antigas.
    O BE não deixa de ser também um vencedor, digam lá o que disserem. Ou se quiserem, uns sortudos. Perdem 57.000 votos e elegem na mesma 19 Deputados. “Melhor só aquele golo marcado pelo VATA contra o Marselha”. Num universo de 500.000 eleitores, perder 57 mil, quase 10%, e eleger os mesmos deputados, é obra. Mas também vence porque fixou grande parte do eleitorado que em 2015 se predispôs a votar BE, mais por desencanto e instinto de defesa, do que por opção ideológica.

  4. Quando uma sondagem em dia de eleições revela que 30% dos portugueses não confiam em nenhum partido e quando a abstenção volta a bater recordes, mesmo com o arranjinho com a FPF para limpar a semana de bola, só mesmo um ceguinho ideológico como o Abreu para se concentrar nas guerrinhas parvas que o PS mantém para mascarar o facto de ser um partido medíocre, desprovido de ambição e soluções.
    A birra com o BE é de facto evidente. E, como o típico formatado partidário, o Abreu é incapaz de explicar porque é que o PS é “melhor” que o BE, limitando-se a criticar o vestido e a cor do cabelo, tal e qual o velhote irrelevante teimoso que ainda olha para o mundo com o filtro de 1974.
    Entretanto os portugueses estão cada vez mais saturados com a política e políticos. Porque em Portugal, os Abreus deste país insistem em bombardear o público com politiquices e a maioria das pessoas, justificadamente, não está muito virada para propagandas nem formatações ideológicas. E como tal, no Domingo passado, entre descer a rua para ir votar na escola primária ou ficar a vegetar no sofá, a maioria dos portugueses optou pela última, mesmo sem o isco da bola ao fim da tarde.
    A vitória do PS no Domingo é tão oca quanto a vitória do partido conservador Britânico antes do Brexit. Sim, lá meteram mais um no poleiro, mais um dos mais do mesmo, até que a crise bateu à porta.
    Neste século o PS nunca conseguir segurar o poder por mais de um mandato. É o que acontece quando o partido das mudanças infinitesimais em ambas as direções esbarra com uma crise que exija pulso firme e decisões inteligentes. O PSD governa apenas até se autodestruir (o maior indicador da estupidez por trás do neoliberalismo, assim como a fraca inteligência dos seus militantes, mas pronto…) enquanto que o PS só se aguenta enquanto o tabuleiro do jogo permitir que as peças fiquem no mesmo lugar durante 4 anos.
    Entretanto, entre as não-soluções da crise de 2008 e as recentes querelas comerciais entre o idiota Trump e a China, pouco a pouco parece que se avizinha mais uma crise económica global (que de inesperada nada têm) e vai ser uma questão de tempo até o PS ter de lidar com ela, quer queira quer não. A última custou o poleiro ao Sócrates e a próxima já conta com o chupista de serviço no parlamento (o Ventura têm uma erecção cada vez que o PIB mundial abranda) que vai certamente explorá-la com a baixeza e falta de carácter que o PSD e CDS nunca conseguiram fazer.
    Quem vive com as orelhas entupidas de terra do buraco onde habitualmente descansa a cabeça considerou o resultado de Domingo como uma vitória. O resto que olha com apreensão para as nuvens negras que se formam no horizonte? Nem por isso.

    • […]

      «O PSD governa apenas até se autodestruir (o maior indicador da estupidez por trás do neoliberalismo, assim como a fraca inteligência dos seus militantes, mas pronto…) enquanto que o PS só se aguenta enquanto o tabuleiro do jogo permitir que as peças fiquem no mesmo lugar durante 4 anos.», cito.

      Nota. Não tenho a certeza, mas assino parte da tese sobre a autodestruição partidátia. No caso do PSD, com o Cavaquismo enxertado pelo Eucalyptus claramente, com a fuga de Barroso, as Santanices, e com o pós-Passos da PàF isso é evidente, quem as pagou foi o CDS da Assunção Cristas. No PS, por seu turno, o dossier José Sócrates parece apontar para um triplo efeito destruidor (omitindo que o António José Seguro foi devorado, recorde-se): para o própria personagem, para a sua pandilha mais próxima e para Portugal. Ou seja, pelo menos desde o pós-Barroso, tanto com o PSD/CDS como com o PS, há por aqui uma constante. Como com o António Costa e a sua entourage pode ser diferente, o que tenho por seguro é que os Vassalos, sublinhado, continuarão a parvejar por aí.

      • Adendas, duas. 1. «Como com o António Costa e a sua entourage pode [não] ser diferente, o que tenho por seguro é que os Vassalos, sublinhado, continuarão a parvejar por aí.», o que faz toda a diferença. 2. E os sinais do que aí vem não são os melhores, seja para a garotada pragmática e, fundamentalmente, aparelhista do PS que foi alimentada, não pelo leite materno, mas pelo aparelho de Estado, para o PSD (o Montenegro Guedelhudo, o Pinto Luz de Cascais que não dá uma para a caixa, o Miguel Morgado, socorro!, todos rezando pela benção do padroeiro Miguel Relvas) e, por fim, para o CDS-partido-de-quadros e do Chicão que é de fugir.

  5. Nota. Toma lá esta dica, ó da Estátua. Excerto do artigo de Manuel Loff, hoje.

    A vitória do alívio

    1. A maior derrota das direitas portuguesas desde 1975.

    2. A vitória do PS ou do alívio?

    Costa conseguiu para o PS uma das suas piores
    vitórias de sempre. Muito abaixo de Guterres
    e Sócrates, mas até mesmo de Ferro
    Rodrigues, que foi derrotado em 2002 por
    Durão Barroso com bem mais votos do que
    Costa agora. O PS ganhou 120 mil votos mas
    tem hoje menos 200 mil de quando Sócrates
    perdeu a maioria absoluta, em 2009, e
    menos 100 mil do que nas autárquicas de
    2017. Há dez anos que o PS não consegue
    atrair o milhão de votantes que apoiam
    partidos à sua esquerda (BE, CDU e outros),
    ainda que tenha conseguido convencer uma
    parte dos 110 mil votantes perdidos pela CDU
    e dos 60 mil pelo BE de que era seu o mérito
    da reposição de salários e de reformas ou o
    aumento do salário mínimo, que Costa e
    Centeno não tinham querido em 2015 mas
    que lhes garantiram, afinal, este pequeno
    sucesso. No essencial, na dúvida sobre se a
    austeridade acabou ou não (e não acabou),
    uma grande parte dos portugueses sente, em
    todo o caso, um grande alívio comparado
    com a angústia e a ofensa diária que sentiu
    no último ano Sócrates e nos anos de Passos
    e troika. Facilita tudo isto que meio milhão
    tivesse emigrado já até 2015, e que até 2018
    mais 300 mil pessoas tenham arranjado um
    emprego, mas os salários continuam
    esmagados e, apesar da redução da pobreza,
    a concentração de riqueza acentuou-se.
    Estes trinta anos de precarização dos
    contratos, privatização do público e
    financeirização da economia têm sido uma
    longa lição de resistência aprendida à força;
    sempre que se bloqueia o avanço da
    indignidade, é natural que quem resiste se
    sinta aliviado. Poucas são as vitórias que
    pode cantar, mas reconhece o alívio — e este
    premiou (limitadamente) o PS.

    3. A crise do sistema de representação não foi corrigida.

    […]

    Fonte: P., 10.10.2019, p. 9.

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