A “CARTA-CASSETE” DE PENEDA

(Por Soares Novais, in A Viagem dos Argonautas, 11/02/2018)

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Apesar das falinha mansas que sempre usa em público, o ex-presidente do Conselho Económico e Social (CES), ex-assalariado ao serviço de Junker, figura notável do antigo “grupo da sueca” e membro “VIP” de várias confrarias gastronómicas, engrossou a voz para dizer: “É altura de todos os parceiros sociais tomarem uma posição clara sobre a postura da CGTP no processo da Autoeuropa e na própria concertação social.»

Esta afirmação de Peneda, tornada pública em carta aberta, que melhor será designar por “carta-cassete”, bem podia ser subscrita pelo Saraiva da CIP ou pelo Silva da UGT. Ou seja: diz aquilo que os personagens citados, e outros da mesma laia, sempre dizem quando está em causa a sua santificada Autoeuropa. É a cassete do costume. Roufenha de tão usada.

Acresce: as semelhanças entre esta “carta cassete” e todos os vómitos anteriores não se ficam por aqui. Para o autor da carta, é também o Partido Comunista que está por trás da CGTP.  “À falta de mobilização no sector privado descobriu agora a Autoeuropa como palco para a sua investida”, pois assevera o ex-ministro do erudito Cavaco, “a sua sobrevivência como força política depende da desordem e da falta de confiança que consiga instalar no tecido económico. Sempre foi e assim será.” (Salazar não diria melhor).

Por isso, sugere com alarde: “É preciso que se denuncie de forma clara que a estratégia dos comunistas para a Autoeuropa é que esta feche as portas e se desloque para outras paragens. Aí o PCP cantará vitória e como sempre serão vitórias “conquistadas” à custa de milhares de trabalhadores que ficarão no desemprego e a Península de Setúbal voltará a viver os tempos de fome da década de 80, mas aí o PCP e a CGTP estarão no seu terreno favorito a desfraldar as bandeiras negras, nunca assumindo culpas, mas remetendo-as para os vícios do capitalismo.”

“Vícios do capitalismo” que, recordo, ele beatificou enquanto ministro do Emprego do Dr. Cavaco e em que, como já lembrou a CGTP, foi “co-responsável pela política que na altura gerou desemprego, salários em atraso, fome no distrito de Setúbal, cargas policiais sobre os trabalhadores e a população em geral.”

As afirmações do ex-presidente do CES mostram o seu mundo. Um mundo que começa em São Mamede de Infesta e acaba em Palmela. Convenientemente. Explico: é que na mesma altura em que tornou pública a sua “carta-cassete”, a Reuters noticiava:

“Mais de 300 mil trabalhadores estiveram envolvidos nos primeiros dois dias de greve, que atingiram a produção em inúmeras unidades industriais alemãs de empresas como a MAN, a ZF Friedrichshafen, a Porsche, a Ford e a Audi. A greve está a ter forte impacto nas fábricas da BMW na Baviera (Sul da Alemanha), bem como nas fábricas da Airbus em Bremen, Hamburgo e Baixa Saxónia.” (Sendo certo que nenhum destes gigantes ameaçou deslocalizar as suas fábricas).

E o portal El Salto anunciava:

“O IG Metall, com cerca de 2,3 milhões de filiados, estima que mais de 250 empresas sejam atingidas nestes três dias de greve, que, de acordo com fontes sindicais, serve como último aviso antes do endurecimento da luta, caso o patronato faça ouvidos moucos às reivindicações dos trabalhadores. Estes exigem um aumento salarial de 6% e a possibilidade de optarem por uma semana laboral de 28 horas ― para cuidarem de crianças, pessoas mais velhas e familiares doentes ― por um período de dois anos, com direito a regressarem à semana de 35 horas no final desse tempo.”

A luta dos trabalhadores alemães, que por cá foi convenientemente silenciada pela imprensa, levou a um acordo entre o sindicato IG Metall e a federação patronal Suedwestmettal e prevê um aumento salarial de 4,3% para este ano e contempla o pagamento de outros prémios ao longo de 27 meses.

Além da remuneração, o acordo também prevê uma redução da carga horária semanal de 35 para 28 horas durante dois anos, se os trabalhadores tiverem de cuidar de crianças, ou de familiares que precisem de cuidados ou que estejam doentes.

Perante a dura jornada de luta dos trabalhadores alemães, desconfio que o IG Metall, tal como a portuguesa CGTP, segundo Peneda, “não apoia nem nunca apoiou a concertação social porque nunca teve nem terá uma postura baseada numa cultura de compromisso.”

Também o IG Metall como a CGTP quer “impor de forma unilateral os seus pontos de vista, através de práticas que são imposição sobre os outros.”

Uma afirmação que o ex-presidente do CES sustenta assim:

“A CGTP nunca conviveu bem com a negociação. A CGTP é cada vez mais um braço armado ao serviço de uma ideologia comunista que não tem pontos de ligação aos princípios que estão na base do projeto europeu, nem da sã convivência democrática. É altura de todos os parceiros sociais tomarem uma posição clara sobre a postura da CGTP no processo da Autoeuropa e na própria concertação social.”

Ainda bem que o ex-presidente do CES se deixou de palavrinhas mansas e voltou a manifestar a sua fidelidade ao capitalismo, aos seus “vícios”, bem como ao patronato português que, como se sabe, está sempre aberto ao diálogo e à “concertação social”…


A tempo: A partir do “curriculum vitae” de Peneda, plasmado em www.parlamento.pt, vê-se que, o ex-assalariado de Junker, é um daqueles bem-aventurados que nasceu para ser ministro, deputado no Parlamento Europeu, administrador de empresas, e que nunca esteve sujeito aos salários pagos à aristocracia operária da Autoeuropa. E, concluo, também, por aquilo que diz na sua “carta-cassete” que, enquanto presidente do CES, olhou sempre de soslaio para Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP e membro do Comité Central do Partido Comunista – um operário cuja visão da vida e do mundo não se queda por ir “à bola” ou jogar a “sueca” com os seus amigalhaços…


Fonte aqui

2 pensamentos sobre “A “CARTA-CASSETE” DE PENEDA

  1. Eu ainda não percebi o que é que a CGTP, o PCP ou o BE têm a ver com a comissão de trabalhadores da Autoeuropa, que nunca precisou de ninguém para defender os seus membros.

  2. Pelo contrário, se a comissão de trabalhadores da Autoeuropa fosse eficaz, trataria de se informar sobre o que os trabalhadores querem antes de se reunir com os patrões, para depois não haver o triste espectáculo de ser desautorizada por aqueles a quem devia representar.

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