Crónica de um homem só

(Bruno Amaral de Carvalho, in Facebook, 23/03/2023)

(Ao ler este texto, confesso, emocionei-me. Perante os tempos negros e de esperanças mortas que estamos a viver, existirem ainda seres humanos que arriscam a vida para nos darem a verdade inconveniente e não a unanimidade consensual da turba assanhada, acendeu no meu espírito uma luzinha ténue de fé no futuro da Humanidade. Sim, talvez ainda consigamos sobreviver e evitar a barbárie. Continua, Bruno. E que todos os deuses, de todas as religiões e latitudes te protejam.

Estátua de Sal, 23/03/2023)


Acabo de chegar a Lisboa da minha viagem ao Donbass e outros territórios controlados pela Rússia. Desde 2018, foi a quarta vez que visitei as regiões de Donetsk e Lugansk. Quando a Rússia decidiu intervir na Ucrânia, já havia uma guerra civil a desenrolar-se desde 2014. Ninguém me contou. Eu estive lá. No último ano, estive ali cerca de oito meses para acompanhar a escalada da guerra com a entrada da Rússia no conflito.

De cada vez que cruzo a fronteira em Uspenka ou em Novoazovsk, há uma sensação que teima em não desaparecer. A falta de jornalistas ocidentais no Donbass que mostrem o que ali se passa gera um profundo desconforto. É o confronto com o vazio mediático e com o óbvio desinteresse de boa parte dos meios europeus, incluindo portugueses, e norte-americanos em querer perceber a tragédia que se abate sobre a população destas regiões desde 2014.

Na fotografia, estou sobre os carris de Mariupol, perto da estação ferroviária completamente destruída. Neste lugar, há quase um ano, caminhei sobre as traves que separam os carris para evitar pisar minas numa caminhada entre comboios bombardeados, cadáveres e explosões, ao longe, quando tentava chegar ao porto da cidade, recém tomado pelas forças russas.

Desta vez, conversei com refugiados de Soledar e Artyomovsk (Bakhmut), entrei num presídio com centenas de prisioneiros de guerra ucranianos, entrevistei, novamente, o líder da República Popular de Donetsk, visitei a maior central nuclear da Europa, em Energodar, estive em Vasylivka, muito perto da linha da frente, onde as forças ucranianas tentam abrir uma nova frente, e pude caminhar pelas ruas de Melitopol.

Trabalhos que seriam valorizados, mesmo com todas as limitações técnicas, se não fosse este pormenor de estar naquele que parece ser o lugar “errado” da guerra. Como se houvesse lugares errados para se fazer jornalismo, não lugares, ocultados por um cemitério de propaganda. Como se eu próprio estivesse num casamento sem ter sido convidado para embaraço dos presentes ou fosse passageiro de terceira classe e andasse pelo convés do Titanic sem autorização.

Em Donetsk, onde normalmente estabeleço a minha base de trabalho, o som da artilharia era constante. Pude ver como Kiev continua a bombardear de forma insistente zonas residenciais, mercados, hospitais, escolas e terminais de autocarros. Uma vez mais, ninguém me contou. Eu vi. Há de haver sempre alguém que diga que a Rússia faz a mesma coisa do outro lado. Pois bem, se assim é, o dever dos jornalistas que lá estão é mostrar isso mesmo. E, pelo que temos assistido, não falta cobertura ao que acontece do lado da Ucrânia. Se há meios que não querem mandar repórteres para o Donbass ou que procuram desvalorizar o trabalho de quem lá está, devem ser, naturalmente, escrutinados também pelos seus leitores, espectadores ou ouvintes.

A democracia faz-se com pluralidade, mesmo quando pluralidade é sinónimo de coragem. Recordo que houve momentos, novamente, em que fui o único repórter no Donbass a trabalhar para meios ocidentais. Felizmente, também coincidiu com a presença de outro jornalista português da Antena 1 naquele lado. Independentemente dos meios para que trabalho, na qualidade de jornalista freelancer o meu compromisso é com os factos. Faço o melhor que posso, na maioria das vezes com o ruído das críticas de quem me quer silenciar, com obstáculos que praticamente nenhum outro repórter teve de contornar nesta guerra. E não o digo para romantizar as dificuldades. Digo-o porque não quero que outros jornalistas passem por isto. Não me sinto herói. E não sou.

Aqueles que deixei para trás são verdadeiros heróis. Mulheres, homens e crianças que enfrentam uma tragédia ano após ano desde 2014. Sem perspetivas de futuro, envelhecem sem pensar no dia de amanhã, sem saber se no fim do dia estarão vivos. E esperemos que esta guerra que alastra e se intensifica termine, em vez de ultrapassar aquelas fronteiras. Porque se assim for, esse será também o nosso destino.

Uma vez mais, agradeço o apoio de todas e todos os que nunca deixaram cair o interesse por aquilo que se passa do outro lado da linha da frente e que nunca deixaram de estar ao meu lado apesar de todos os ataques.


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32 pensamentos sobre “Crónica de um homem só

  1. Este texto transpira verdade e honestidade. É assim mesmo e ñ o facciosismo que mtas vzs a Estátua de Sal apresenta.

    • Repara na contradição: estás a chamar de “faccioso” um dos poucos sítios online onde podes ler textos do outro lado, textos neutrais, textos de jornalismo factual, textos factuais, textos sem propaganda do regime genocida ocidental, textos sem branqueamento desavergonhado da ditadura Nazi, e também ao mesmo tempo podes ler textos do Miguel Sousa Tavares… lol

      Agora mais a sério, não consegues mesmo reparar na contradição que é chamar “facciosismo” ao blog onde podes ler o Bruno Amaral de Carvalho?

      O que a EstátuaDeSal faz é verdadeiro serviço público, mesmo nos casos em que publica coisas que eu critico. Aprendi (ela ensinou-me) a aceitar o que é diferente. Já vi aqui textos de gente que idolatra Putin, e de gente que odeia Putin. De gente neutral mas que percebe os argumentos da Rússia, e de gente neutral mas que critica os argumentos da Rússia. Não vês este pluralismo em praticamente mais lado nenhum em Portugal.

      A EstátuaDeSal não precisa que eu a defenda. O seu trabalho fala por si, e ela comenta sempre que pode/deve. Mas acho que devo relembrar que a EstátuaDeSal uma vez explicou que, se me lembro bem, tem dado destaque a um dos lados exatamente para compensar o total regime de propaganda unilateral que se vive nos restantes órgãos de comunicação social e blogs ocidentais.

      Repara também noutra coisa: os agentes do regime genocida ocidental em que vivemos, já ameaçaram o Bruno Amaral de Carvalho, já o insultaram e chamara de tudo. Uns deixaram de lhe pagar por artigos de jornalismo, outros desejaram-lhe mal (e estou a usar um eufemismo aqui).

      Há gente para quem a mera publicação de um texto do Bruno Amaral de Carvalho é “putinismo”, porque não se pode ir para o Donbass, porque não se pode dizer quando a guerra realmente começou, porque não se pode mostrar os crimes da ditadura UkraNazi, e porque agora se um Nazi combate contra o povo Russo ou pró-Russo (mesmo aquele que vive na ainda Ucrãnia) passou a ser um “defensor da democracia e da liberdade”.

      Perante isto, criticas com um “faccionismo” quem se atreveu a dar voz ao outro lado (e basta ser neutral e pró-paz para se ser do outro lado), e se arriscou a perder se calhar a maioria dos visitantes devido a essa decisão?

      Facciosismo é chegar a 2023 e ainda ser a favor da NATO, do €uro, do USAtlantismo na Europa, das sanções ilegais com efeito boomerang, da corrida ao armamento para prolongar e quiçá escalar a guerra.

      Facciosismo é ver a inflação derivada da especulação e ainda querer viver num Estado mínimo (NeoLiberal) sem sequer poder de regulação da concorrência e muito menos controlo de preços, ou defender ainda um sistema económico onde nem sequer é possível uma subida salarial que acompanhe esses preços e impeça o corte real nos rendimentos de quem trabalha/trabalhou.

      Faccionismo é ter canais de TV que passam 24h/dia, 7dias/semana, a fazer propaganda a um lado, ainda por cima o lado que planeou, provocou, e iniciou o conflito, e recusa pará-lo. E depois apresentar numa única madrugada uma única opinião neutral (ex: General Carlos Branco), e ainda por cima colocar um pivot arrogante e agressivo a atacá-lo para fazer de conta que a posição neutral é “putinista”. Isto feito em TODOS os meios de comunicação social Mainstream já não é só faccionismo, é DITADURA. E tu és a vítima.

      Lembro um episódio, antes de deixar de ver a SIC “Notícias”, em que o Alexandre Guerreiro estava só a expor factos, FACTOS, ainda nem tinha chegado à sua opinião, e a prostituta que “moderava” o debate entre ele e um propagandista qualquer, interrompeu-o para perguntar o que NUNCA perguntou em qualquer outra guerra de agressão ocidental nem sequer em relação à guerra dos UkraNazis contra o povo do Donbass ao longo de 8 anos:
      “então mas você não tem pena das crianças?”
      – assim o trabalho dela estava feito: condicionar os telespectadores com uma manipulação emocional, e neutralizar os argumentos factuais daquele comentador. Isso sim é facciosismo, e quando feito por estas (e estes) prostitutas de luxo que apresentam os “jornais”, a maioria das pessoas nem dá por ele.

      Ou porque não falar das N vezes em que a RTP (que também deixei de ver, mas sei disto via redes sociais) mandou o Cláudio Calhau (nome justíssimo) ao UkraNazistão para mostrar só o que os Nazis lhe mandam mostrar, com a narrativa dos Nazis e sem qualquer espírito crítico, e andar até a repetir a propaganda “forças da resistência” ou “em nome da democracia e da liberdade” ao mesmo tempo que o bicho (só humano de aparência) fardado ao lado dele usava uma insígnia com a bandeira da OUN-B ou da UPA do Stepan Bandera, o colaborador de Hitler no holocausto, agora tornado “herói” do UkraNazistão.

      Em cada milhão de portugueses que virem aquelas imagens, quantos sabem o que se está realmente a passar? Sou eu, o Bruno, a Estátua, o Alexandre, os do PCP, os generais, mais meia dúzia de anónimos, e mais ninguém. Assim se chega ao “lindo” resultado das sondagens mostrarem que em Portugal está um dos povos que mais colocam as culpas na Rússia e não na NATO/Nazis. Ou seja, dentro do super manipulado povo do Ocidente, Portugal é um dos mais manipulados.
      Isto, se estudado seriamente daqui a uns anos, deve levar à conclusão que os Portugueses são um povo mais impreparado (sem capacidade de identificar e pensar criticamente sobre a propaganda) e condicionado (totalmente manipulado e a acreditar nas mentiras do regime) do que o povo da Coreia do Norte.

      Portanto um viva à EstátuaDeSal, e outro viva o Bruno no Amaral de Carvalho, por serem diferentes disso e defenderem a dignidade, a verdade, o respeito, e o pluralismo, sem os quais não há Democracia nem Liberdade. Não deviam ser a excepção, deviam ser a regra!

      PS: eu já cometi o mesmo erro que tu, quando critiquei a EstátuaDeSal por publicar textos do Sócrates. Só tenho que reconhecer que a EstátuaDeSal esteve bem, e que eu estive mal. Só tenho de olhar para essas publicações e ser eu a decidir ignorá-las. Mas essa decisão só é minha se os tais textos forem publicados. Se alguém os censurar previamente, então eu fico sem o direito a tomar qualquer decisão. A mesma coisa em relação aos textos bafientos do Miguel Sousa Tavares, ou aos do, esse sim Putinista até dizer chega, Batiushka.
      Outra coisa diferente são textos com erros factuais, como os do propagandista T.Meyssan, que eu acho que minam a credibilidade de quem os re-publica, mas isso é outra estória…

      • Obrigado CM pelas suas palavras. Sempre são reconfortantes perante a arrogância da canalha. E também a Estátua recebe mensagens ameaçadoras de esbirros nazis na sua página do Facebook. Enquanto nos deixarem falar e publicar contem connosco.

      • A pessoa que escreve este comentário, um tal de Carlos Marques, ainda tem a lata de achar que os nazis são os outros. Apelida os ucranianos todos de nazis e fala do má que é a NATO porque é nazi? Mil vezes mais nazi é o Carlos Marques e as suas generalizações idiotas e ultra facciosas. O seu texto com palavras como “ukranazis” “ukranazistão” mostram que desse lado está, também, um nazi incapaz de olhar para esta guerra com imparcialidade, um mentiroso, um aldrabão…

  2. Nada há de novo em saber-se que há uma guerra na Ucrânia.
    Quanto a saber-se quem invade e quem é invadido, quem se revolta em armas e quem se manifesta pacificamente, nada transparece neste artigo.
    Os lados da guerra raramente se distinguem pelo sofrimento.
    Pela razão e pelo direito haverá que diferençar!

    • «Quanto a saber-se quem invade e quem é invadido, quem se revolta em armas e quem se manifesta pacificamente, nada transparece neste artigo.»

      Pela N-ésima vez, vou listar os factos, os quais só não conhece quem ainda não quer conhecer:

      Ucrânia 2004: maioria vota pró-Rússia.
      Ocidente: golpe de 2004, a “revolução laranja”.

      Ucrânia 2010 e 2012: maioria vota Presidente pró-Russo e Parlamento de maioria pró-Rússia.
      Ocidente: golpe de 2014, a “revolução Maidan”.

      Pessoas neutrais, intelectualmente honestas, e com a paz como objectivo: se calhar um divórcio de veludo como na Checoslováquia teria sido a solução, já que a Ucrânia se divide ao meio nas eleições. Isto da NATO é uma provocação/ameaça desnecessária. Aquilo ainda acaba em guerra civil, ou pior, com a Rússia a ter de intervir junto à sua fronteira.

      Donbass e Crimeia: estamos fartos, se não respeitam o nosso voto, queremos exercer o Direito Humano à Autodeterminação. Crimeia quer voltar à Rússia, e Donbass quer ser independente.

      Ocidente: ai queres ser independente? Golpistas nazis, tomem lá armas, têm permissão para iniciar guerra e bombardeamentos dos civis do Donbass.

      2019: Zelensky ganha eleições a falar Russo e a apelar à Paz, a prometer desenvolvimento e combate à corrupção. Faz o oposto depois de eleito. Começa a deriva ditatorial do regime.

      2021: exercícios da NATO junto à Rússia, batalhões Nazis cada vez mais armados, cada vez mais ódio disseminado pela propaganda, ameaça de violação do acordo de paz de Minsk e de invasão da Crimeia.
      Rússia coloca tropas na sua fronteira como factor de dissuasão, e EUA aproveitam para provocar ainda mais com proposta da Ucrânia aderir de vez à NATO.

      16-Fevereiro-2022: re-início da guerra, com agressão de batalhões Nazis contra civis do Donbass, bombardeamentos massivos contra cidades de Donetsk e Lugansk.
      19-Fevereiro-2022: conferência de Munique onde ditador Zelensky ameaça alargar guerra, já a decorrer, até à Crimeia.

      21-Fevereiro-2022: finalmente a Rússia reconhece independência do Donbass.
      23-Fevereiro-2022: Rússia confirma que todo o Ocidente (os regimes) faz parte da agressão, ao ver que imprensa omite os bombardeamentos, e só difunde propaganda do medo e Russofobia.

      24-Fevereiro-2022: Rússia intervém para colocar fim à guerra no Donbass e travar ameaça à Crimeia.

      Final de Março: após negociações promovidas pela Bielorússia e pela Turquia, Rússia está em vias de conseguir um novo acordo de paz da Ucrânia. Ocidente intervém para o impedir. É então encenada a provocação de Bucha, mentira totalmente desmontada, entre outros, pelos generais portugueses que estiveram na Sérvia e presenciaram logo aí as mentiras da NATO.

      Daí até cá: Rússia aceita paz se acabarem bombardeamentos do Donbass e ameaça sobre a Crimeia, se NATO travar expansão e Ucrânia tiver política de desnazificação (semelhante ao que os Aliados impuseram à Alemanha, e que a URSS impôs à Finlândia). Ucrânia pede mais armas e recusa paz. Ocidente recusa paz e quer armar Ucrânia até esta poder invadir a Crimeia. Faz-se branqueamento a Nazis na “imprensa livre” ocidental, e fazem-se promessas de destruir a Rússia.

      Isto são os factos. O resto é a propaganda.

      A minha conclusão é simples: quem está do lado do povo do Donbass e da Crimeia, merece o meu apoio a 100%. Quem está do lado da NATO e dos Nazis, não merece o oxigénio que respira. Quem exige paz e condena quem provocou e iniciou a guerra está do lado certo da história. Quem diz que quer paz, mas diz que a culpa é toda do “agressor Rússia”, não está bom da cabeça, mas pode ser que passe com o tempo, tal como aconteceu com as “armas de destruição do Iraque”…

      • De 2004 nada sei.
        «golpe de 2014, a “revolução Maidan”»
        o tal presidente pró-russo tinha-se comprometido a uma candidatura à UE; o ter recuado, em oposição ao parlamento eleito, provocou Maiden,
        Ignorá-lo é falsear factos!
        Aceitou demitir-se mas fugiu para a Rússia.

        • Pois, só é preciso mencionar o facto que o tal acordo com a UE estava diretamente ligado a um empréstimo de 17 mil milhões de dólares e implicava a entrada das corporações da ocidentais na Ucrânia para se refastalarem na rapina dos abundantes recursos disponíveis no Leste – a nível agrícola e industrial.

          Como forma de pagamento da dívida, claro. E tal não é de estranhar, já que é prática recorrente dos últimos 75 anos.

          Ora, só havia um problema: é que o Leste do país era sedicioso (não concordava com o golpe de Estado e queria manter o controlo dos seus recursos) e, como tal, era preciso que os Ucranianos tomassem o controlo das regiões libertinas para fazer valer as condições do acordo de empréstimo.

          Aí tem os seus factos.

          Pró-russo, pró-isto, pró-aquilo, não diz nada.

          Para mais detalhes ver aqui:

          https://ourworld.unu.edu/en/what-do-the-world-bank-and-imf-have-to-do-with-the-ukraine-conflict

        • “o tal presidente pró-russo tinha-se comprometido a uma candidatura à UE; o ter recuado, em oposição ao parlamento eleito, provocou Maiden,
          Ignorá-lo é falsear factos!”

          De 2004 nada sabes. Mas do golpe de 2014 sabes ainda menos, ou finges que não sabes, vá-se lá saber. Mas eu explico: o presidente “pró-russo” NÃO se tinha “comprometido a uma candidatura à UE”, como, com a ignorância dos que tudo sabem, afirmas. O que ele fez foi tentar concretizar uma candidatura à UE, o que é “ligeiramente” diferente. Mas, ciente dos fortíssimos laços que ligavam o país à vizinha Rússia (a nível económico, social, cultural, familiar, etc.), tentou conciliar a candidatura à UE com a manutenção desses laços. Foi isso que o teu famigerado “presidente “pró-russo” tentou concretizar. O que tinha isso de mal? Para mim, nada, excepto a promessa de um futuro de paz e harmonia entre países e povos, colaboração e progresso económico, exploração de sinergias em inúmeros sectores. A promessa de um bom futuro para ucranianos, russos e europeus em geral. Quais foram as reacções a essa subversiva proposta do teu famigerado “presidente “pró-russo”? Essa também é fácil: a Rússia respondeu que sim, que nada tinha contra a candidatura da Ucrânia à UE e que ficaria satisfeitíssima com a manutenção dos seus laços seculares com a Ucrânia, enriquecida com o reforço das já então existentes relações com a maior parte dos países que constituem a UE, nomeadamente a nível económico (Portugal incluído).

          Qual foi a resposta da UE a essa proposta, a essa promessa de um futuro de paz, progresso e harmonia para países e povos promovida pelo teu famigerado “presidente “pró-russo”, a que a Rússia deu a sua concordância? Essa também é fácil: “NEM PENSAR! Ou fazem negócio exclusivo connosco ou não há nada para ninguém. Não queremos ter nada a ver com esses desprezíveis “pretos das neves” lá da Moscóvia! A não ser matérias-primas baratas e de qualidade, como as que fornecem energia às nossas fábricas, por exemplo. Os nossos donos do lado de lá do Atlântico dizem-nos que os gajos são feios, porcos e maus, têm lepra, sífilis e gonorreia crónica, que não nos autorizam a assinatura de um acordo assim e que, se não obedecermos, nunca mais nos convidam para as vernissages e nos dão tautau no tutu!”

          Perante o ultimato, o que fez o teu famigerado “presidente “pró-russo”? Também é fácil: optou por, provisoriamente, adiar a candidatura à UE, sem no entanto a cancelar de vez, e manteve as vantajosas relações que Ucrânia ainda tinha com a Rússia. O resultado foi o teu glorioso Maidan, aqui bem explicadinho por um dos seus participantes e dinamizadores:

          https://youtu.be/03AqKuCg96I

          Podes chamar revolução a isto, claro, mas também podes jurar que era preto o cavalo branco de Napoleão, ninguém te vai impedir. Neste magnífico Ocidente farol da liberdade, não há nada mais livre do que a asneira.

        • A estratégia passou pela primeira vez à prática com a «revolução colorida» em tons laranja organizada em 2004 pelos suspeitos do costume, as fundações do magnata George Soros e as agências conspirativas norte-americanas desempenhando os papéis da CIA que à CIA (e à Casa Branca) não convém interpretar directamente. Tal como acontece agora na Geórgia, como já todos perceberam: uma ingerência externa, sucedendo a várias outras, para pôr fora de cena os dirigentes que, embora com pouca convicção, não cumprem as directivas de submissão à NATO tal como a NATO exige.

  3. Obrigado Bruno Amaral de Carvalho, pelas crónicas publicadas. Muitos parabéns pela coragem e resiliência mostradas. Continue a contar-nos a verdade da guerra. Muita força, sempre.

  4. Este trabalho que o faz não é apenas um resumo da imprensa,mas uma análise multidimensional das notícias,em geopolítica,em diplomacia de “conspiração” contra o ocidente difícil,mas muito sensível e muito interessante.

    A unidade europeia parece-me estar directamente ameaçada pela russofobia polaca e pela americanofilia, mesmo que isto seja compreensível. Mas a negociação deve ser favorecida e deveria ter sido favorecida muito antes pela Polónia para evitar a crise ucraniana. E isto é tanto mais verdade quanto os dois povos se conhecem bem um ao outro. Se eu fosse a Grécia, ameaçaria mudar de lado para obter algum dinheiro. Ela não o fez porque, caso contrário, a Turquia faria guerra contra ela em nome da NATO. Foi por isso que Churchill fez com que os alemães massacrassem inteligentemente a resistência comunista grega. Os britânicos nunca quiseram os russos no Mediterrâneo, nem os EUA.

    O nosso dinheiro vai para Zelensky na Ucrânia. Biliões de euros desapareceram em fumo das conchas!

    A China é solicitada a fornecer armas apenas à Ucrânia!

    O ministro estónio (um país que adora as SS) quer que a cooperação para o fabrico de munições esteja operacional dentro de 12 meses, vai ser uma batata quente, leva pelo menos 5 anos em tempos normais para construir tais fábricas, forçando-a, eu diria que vão precisar de pelo menos 3 anos, Não são fábricas de lego, são ultra complexas, e como querem fazer munições guiadas, vão precisar de muitos chips e super-condutores, e como já há uma escassez mundial nesta área, vão ter de chamar o Capitão Kirck para isso.

    Enquanto estamos ocupados com problemas da TAP e melões, as verdadeiras questões decisivas para as nossas actuais e futuras condições de vida ou sobrevivência estão actualmente a ser jogadas numa guerra económica e ideológica.

    Dito isto é estranho explicar que a Europa está a perder dinamismo, que um mundo não ocidental está a emergir para tomar o lugar da Europa, que está a ficar para trás em todas as áreas… E, ao mesmo tempo, que o principal objectivo económico de todos estes países fora do Ocidente é conseguir negociar com a Europa e conquistar o mercado europeu, ou contornar as sanções para utilizar terceiros… Continuar a vender aos europeus.

    Não, porque são todos muito bonitos, os BRICS e tudo isso, mas sem o capital económico, cultural, financeiro e científico do mundo ocidental, não estariam em lado nenhum no final…

    Esta guerra acelerou uma tendência que está a surgir cada vez mais, a do isolamento do Ocidente em relação ao Terceiro Mundo. E as sanções, para além de falharem e caírem sobre os seus portadores, revelam a natureza belicista do Ocidente…

    As 12.000 sanções tiveram um impacto na economia russa de cerca de -5% ao longo do ano 2022. Mas estavam a +3% quando as sanções os atingiram. Por conseguinte, estão em cerca de -2% e certamente voltarão ao crescimento em 2024. Ao mesmo tempo, com a China, compraram milhares de toneladas de ouro com o objectivo de criar moedas criptográficas apoiadas por um padrão de ouro, a fim de desclassificar ainda mais a economia mundial e reconquistar a independência.

    De facto, para bem da Rússia, a guerra teria de terminar no próximo ano para que Kiev se ajoelhasse definitivamente, e pode, porque a NATO não tem munições nem carne para canhão para fornecer. Quanto ao comércio, é como a natureza, abomina um vácuo, sem preocupações.

    De qualquer maneira a quota do dólar no comércio internacional caiu 10% em 20 anos, mas ainda representa 60% do comércio mundial…

    Por isso a implementação do outro mundo ainda levará algum tempo, por isso ainda há esperança, tudo poderá mudar ou nada acontecerá como planeado…

    A França está prestes a ocupar o segundo lugar como fornecedor de armas à Rússia, que já não pode fornecer os seus clientes e que perdeu alguns deles devido à guerra e também devido à má

    A crise bancária vai afundar os grandes bancos Portugueses e outros viveram dos contratos sobre as matérias-primas russas está terminada!! A UE imprimiu pedaços de papel para se empanturrar sobre as matérias-primas russas está terminado….. O capitalismo de casino está terminada,e a economia financeira os contratos de futuros e outros kits comerciais fizeram a UE viver acima das suas possibilidades dando lições para todo o mundo sobre os Valores, também está terminada, será necessário trabalhar antes de ter um barril de petróleo russo porque pago em rublos e não em papel impresso.

    O problema é que nem sequer sabemos que país é realmente um verdadeiro aliado da Europa! Olhando para a Turquia é uma piada, a Rússia abastece-a de gás e petróleo! Que a Turquia vende muito mais caro à Europa…

    Então o problema russo é que eles estão a aumentar a sua produção de petróleo e gás, mas vendendo-o muito mais barato do que a Europa, o que acabará por fazer cair o seu império petrolífero financeiro. … o que, claro, não é preferível…. Apesar da actual guerra na Ucrânia, a Rússia é contemporânea com a “Europa”…

  5. É óbvio que há gente que não gosta de ouvir ou ler as verdades. As mentes andam formatadas unicamente para dizer mal de um dos lados.

  6. Não há a menor dúvida!
    Por aqui todas as esperanças se concentram no poder a Leste, o que só pode significar China, Rússia, adornadas com grandes civilizações como a persa e a indiana, mais uns berloques virados a Alá e promissores terceiro mundismos.
    Porquê assim?
    Para além da decadência do Ocidente, abundantemente descrita e celebrada. não se encontra qualquer exaltação dos valores e realizações que a Leste fundam essas esperanças.
    Provavelmente é segredo!

  7. Não estás só Bruno e estás do lado certo ainda que o contexto seja difícil. Força!
    Parabéns à Estátua de Sal pela firmeza e persistência. Bem haja!

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