(Karl Haki, in Strategic-Culture.org, 18/06/2022)

O dano duradouro, resultante das mentiras que se desmoronaram, é a erosão da presumível liderança por parte dos Estados Unidos e dos seus cúmplices da NATO.
A administração Biden, os meios de comunicação ocidentais (também conhecidos por sistema de propaganda) e o eixo militar da NATO estão em colisão frontal com a realidade. Um dos primeiros sinais disso é a diminuição do entusiasmo com o seu regime de estimação de Kiev, sendo este instado a reduzir suas perdas e a fazer um acordo com a Rússia.
Nos últimos quatro meses, desde que a Rússia lançou a sua operação militar especial na Ucrânia, o público ocidental tem sido inundado com chorrilhos de mentiras sobre a “agressão ilegal” de Moscovo, sobre como a Rússia estava a perder a guerra para os “defensores heroicos”, e como a NATO estava a defender princípios invioláveis da soberania da Ucrânia que, de alguma forma, “justificavam” a inundação do país com armas.
Agora Jens Stoltenberg, o chefe civil da aliança transatlântica liderada pelos EUA, acena provisoriamente com uma bandeira branca de rendição por força da realidade. Falando numa conferência na Finlândia no fim-de-semana passado, Stoltenberg instou o regime de Kiev a “pagar o preço da paz”, cedendo às reivindicações territoriais à Rússia. O antigo primeiro-ministro norueguês, cómica figura de madeira, está sem dúvida a ser utilizado como porta-voz dos planeadores estratégicos transatlânticos.
O “preço da paz” implicaria que as autoridades ucranianas reconhecessem a Península da Crimeia como parte da Federação Russa e a independência das repúblicas de Donbass. A invasão russa da Ucrânia, iniciada a 24 de Fevereiro, foi lançada para defender esses territórios de língua russa das ofensivas do regime de Kiev, apoiado pela NATO, e pelos seus batalhões nazis.
Isto marca uma reviravolta impressionante por parte do bloco da NATO. Desde o golpe de Estado patrocinado pela CIA em Kiev, em 2014, e a secessão da Crimeia para se juntar à Federação Russa, Moscovo tem sido continuamente vilipendiada por ter alegadamente anexado a península, enquanto os Estados Unidos e os seus aliados da União Europeia se têm amontoado em ronda após ronda de sanções económicas.
A suposta restauração da “integridade territorial” da Ucrânia tem sido uma razão recorrente para a crescente hostilidade do eixo da NATO liderado pelos EUA em relação à Rússia. Agora, porém, o chefe do bloco da NATO diz ao regime de Kiev que é melhor preparar-se para ceder território em nome da paz. Lá se vai o princípio! Então qual foi o objetivo de todos estes anos de sanções económicas crescentes contra a Rússia por causa da Crimeia?
A mudança de mentalidade é um reflexo da realidade emergente: a intervenção militar da Rússia na Ucrânia está, de facto, a revelar-se um sucesso. Moscovo assegurou as regiões de língua russa e danificou gravemente as forças armadas ucranianas infestadas de nazis. A pretensão de que a Ucrânia alguma vez aderirá à NATO está também fora de questão.
Há apenas algumas semanas atrás, os governos ocidentais e os seus meios de comunicação social alegavam em fanfarra que a Rússia estava a enfrentar uma derrota estratégica, imposta pelas as forças ucranianas armadas pela NATO. O Presidente dos EUA Joe Biden e o seu Secretário de Estado Antony Blinken estavam ufanos. Assim como o primeiro-ministro britânico Boris Johnson e a sua principal diplomata estrangeira, Liz Truss. O que dirão eles agora?
A natureza nazi das forças da Ucrânia foi encoberta com histórias de “defensores heroicos”. Quando a Rússia consolidou o seu poder de combate no leste da Ucrânia para tomar o Donbass, os meios de comunicação ocidentais alegremente relataram tal como um recuo. Em contraste, vários analistas e fontes militares independentes no terreno deram uma visão oposta e mais precisa, alegando que as forças russas e os seus aliados no Donbass estavam a fazer exatamente o que se propunham fazer: libertar o território de língua russa.
Agora, que a Rússia está no bom caminho para atingir os seus objetivos, a narrativa de propaganda ocidental está a desmoronar-se a partir das mentiras sobre as quais sempre foi construída.
Vai haver muito ranger de dentes devido ao derradeiro fracasso da propaganda. O desastre do Afeganistão vai parecer uma brincadeira em comparação com este fracasso épico. Centenas de biliões de dólares e euros de armamento dos EUA e da NATO enviados para a Ucrânia não fizeram nada para “defender” o país. Tem sido apenas uma bênção para o complexo militar-industrial e para os seus mercenários políticos. Mas a inundação de armamento não dissuadiu a Rússia de atingir os seus objetivos.
As repercussões económicas globais do conflito – totalmente inevitáveis se os EUA e os seus parceiros da NATO se tivessem empenhado com a Rússia na diplomacia para resolver as preocupações de segurança de Moscovo, há muito tempo exigidas por Moscovo – atingiram os Estados ocidentais como uma vingança. A subida dos preços e das contas de energia estão a prejudicar gravemente milhões de trabalhadores que veem a calamidade económica, não como culpa da Rússia (a chamada “subida dos preços de Putin”), mas como resultado dos jogos geopolíticos de Washington e Bruxelas e da indiferença das elites ocidentais. Este é apenas outro aspeto da realidade – uma das imensas implicações de uma convulsão social sem precedentes – que está a obrigar a classe dominante ocidental a salvar-se do seu desastre na Ucrânia.
A colisão frontal com a realidade vai criar reações explosivas. As potências ocidentais já estão a levar Kiev a aceitar o seu destino como um peão redundante. O conselho de Stoltenberg de “pagar um preço pela paz” é a ordem para Kiev cair na realidade e reduzir as suas perdas. O público ocidental vai ver, com razão, a total falta de escrúpulos que este expediente manifesta e perguntar para que foi todo o falso drama e as despesas absurdas financiadas pelos contribuintes. Uma revoltante reação negativa virá, pois, a chegar para os charlatães em funções.
Podemos esperar que os meios de comunicação ocidentais comecem a procurar bodes expiatórios para “explicar” o sucesso da Rússia. Dar, por exemplo, a conhecer relatórios como este recente do New York Times culpando o Presidente da Ucrânia, Vladimir Zelensky, por erros táticos. Mas a vitimização insuportável do regime de Kiev e do seu presidente-comediante, demasiado atrofiado, irá, sem dúvida, ficar em alta e duplicar, devido às exigências impossíveis de satisfazer pela a “defesa” americana e da NATO. Zelensky tem talento para nomear e envergonhar a perceção de falta de indulgência. Ele tem sido preparado para funcionar assim e o seu estatuto de celebridade ocidental dá-lhe um falso sentido de importância.
A história está repleta de bonecos patrocinados pela CIA que sobrevivem à sua utilidade e são assim descartados como lixo. Se Zelensky e a sua turma se enervarem por terem de deixar de jogar à bola com os EUA e os seus parceiros da NATO, tentando encobrir a sua pilha de mentiras, ou seja, não aceitando o seu papel de bode expiatório, então Zelensky enfrentará um “plano de reforma” mais enérgico.
Mas, em última análise, o dano duradouro das mentiras desmoronadas é a erosão da presumível liderança dos Estados Unidos e dos seus cúmplices da NATO. O Presidente russo Vladimir Putin ridicularizou as pretensões dos EUA como o “império das mentiras”. Isso está a revelar-se um destino factual.
Os líderes europeus e americanos já perceberam que não vão conseguir aguentar muito mais tempo as consequências dos boicotes, ou “sanções”, que eles próprios patrocinaram na sua patética tentativa de “destruir” a economia e a própria sociedade russas. Com efeito, essas medidas não se têm revelado nada eficazes contra os russos, mas para compensar estão a fazer um excelente trabalho de destruição das próprias economias ocidentais.
Eles começam a ver a tempestade perfeita que se aproxima, e percebem finalmente que é tempo de correr para tentarem salvar o que ainda for possível das suas carreiras políticas.
E as coisas ainda vão piorar muito. Percebemos agora de maneira muito clara que estamos a ser governados por ineptos imbecis. É impressionante a ignorância, a irresponsabilidade e o servilismo dos políticos do Ocidente, e particularmente dos europeus, face à mais elementar realidade.
Verdadeiramente incrível, por exemplo, foi a solene declaração dos líderes da UE, de que iriam cancelar até ao fim do corrente ano o petróleo russo que chega por via marítima. Fizeram-no como fariam crianças de dez anos, sem se preocuparem sequer em solicitar uma opinião científica credível. Simplesmente não é possível concluir em seis meses um processo que levaria quase uma década, mesmo dando de barato os prejuízos abissais que ele acarretaria. Pergunto-me como irão descalçar esta bota se a guerra não terminar antes de Dezembro.
Recordando os processos de intenções que fomos ouvindo durante meses, temos de ficar estupefactos perante a tamanha ignorância, que foi sendo difundida de forma acéfala por praticamente toda a Imprensa. A Europa ia destruir a economia da Rússia, a Europa ia “isolar” a Rússia. Bem só se esqueceram de estudar um pouco. A economia russa é auto-suficiente em praticamente todas as suas vertentes e na realidade não precisa da Europa para nada. Se deixar de vender aos europeus as suas imensas riquezas naturais, poderá facilmente fazê-lo aos asiáticos. A Europa, pelo contrário, precisa desesperadamente do petróleo russo, do gás natural russo, dos fertilizantes russos, dos metais russos, e por aí fora. E quanto ao isolamento, também já se percebeu que é a Europa que está a ficar isolada do resto do mundo e cada vez mais dependente do seu dono americano.
A presente iniciativa de tentar convencer Zelensky a finalmente dialogar com os russos, depois de terem passado meses a proibi-lo de o fazer, é uma patética demonstração de pânico e está votada ao fracasso. A Rússia teria aceitado um acordo desse tipo no início da intervenção, mas não agora. Não vão tolerar nunca um “acordo sujo” que venha a permitir que daqui a dois ou três anos tenham novamente que enfrentar bombardeamentos no Donbass e na Crimeia. Eles só irão aceitar agora uma capitulação incondicional de Kiev, que lhes abra o caminho para uma limpeza geral dos ukronazis no território, e o assegurar que a Ucrânia nunca mais será uma ameaça para a Rússia. Se a própria Ucrânia ainda será um país no final do processo é coisa de que eu pessoalmente tenho muitas dúvidas.
Os russos têm uma anedota engraçada. Eles dizem frequentemente que “um dia destes ainda vamos ter que finalizar a II Guerra Mundial”. E de facto o recrudescimento do nazismo no Ocidente, mesmo em ambientes onde ele não se esperaria nada, como sejam as próprias estruturas de poder dos seus países mais importantes, indica sem margem para dúvidas que muito ficou por fazer em tempo útil. A besta continua bem viva e está cada vez mais poderosa, o que não augura nada de bom para a Humanidade.
Sabe-se que esta guerra não é realmente entre russos e ucranianos.
Desde 2014 que a estrutura da NATO preparou as Forças Armadas da Ucrânia para a guerra com a Rússia (e isto no seguimento de um processo que terá começado muito antes), que os armou e treinou intensivamente, e foi convencendo os líderes fanáticos nazis chegados ao Poder com o golpe da Praça Maidan, de que eles poderiam vencer a Rússia com o armamento ocidental e finalmente vingarem a derrota de 39/45. A Ucrânia só fornece a mão-de-obra, a carne de canhão. É a estrutura militar da NATO que a Rússia tem vindo tranquilamente a desmantelar ali dia após dia, sem apelo nem agravo.
E os russos, em conjunto com os seus aliados naturais, não deixarão de tirar todo o proveito possível desta vitória que se aproxima. A humilhação americana e a derrocada do seu poder imperial ainda mal começaram. As rodas da História estão em movimento e o mundo vai começar a mudar muito rapidamente, só não sabemos ainda se será no sentido que se deseja, da emancipação dos povos, ou para a sua própria destruição.
“Vivam tempos interessantes”, é a velha maldição chinesa.
Excelente comentário.
Excelente comentário bem verídico, só é pena não ser mais divulgado a todos os cidadãos Europeus, para verem que para nós Europeus o melhores aliados e parceiros, seriam os Russos e não os ditadores dos EUA e seus familiares aliados Ingleses.