A montanha pariu um rato

(Estátua de Sal, 09/04/2021)

Sócrates foi corrompido? Talvez. Rosário Teixeira é um incompetente? É!

Seguindo a leitura que Ivo Rosa esteve a fazer do despacho instrutório do processo Marquês, fiquei com os cabelos em pé. Crimes imputados mas já prescritos, acusações sem qualquer indício que vá além de um argumento de romance, incongruências e contradições factuais de datas, desconhecimento dos acórdãos do Tribunal Constitucional, contradições mesmo entre partes várias da acusação. Como é possível que um processo desta importância tenha tantas falhas, aberrações e atropelos ao Direito?

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Tudo começou com a prisão de Sócrates. À época o Ministério Público não tinha qualquer prova que incriminasse o detido. Prendeu para investigar. Investigou e deve dizer-se que nenhum político em Portugal, em algum tempo, foi tão devassado e escrutinado como Sócrates. O facto de o MP não ter encontrado nenhuma prova objetiva e insofismável de que Sócrates tenha sido corrompido, deve levar-nos a pensar. Com milhares de escutas ao próprio e a todos os que o rodeavam, apreensão de emails e correspondência cobrindo largos períodos de tempo, em nenhum momento vem ao de cima “conversas” que indiciem os presumíveis crimes?! É, de facto, tão estranha essa ocorrência, tanto ou mais estranha ainda que a facilidade com que o amigo de Sócrates lhe fazia chegar elevadas quantias de dinheiro.

Depois de ter promovido a prisão de um ex-Primeiro Ministro, com informação prévia à imprensa e às televisões, o Ministério Público tinha que construir posteriormente uma acusação que justificasse uma tão grave diligência. Não conseguiu, apesar de ter recorrido a uma panóplia de atropelos aos formalismos e às regras mínimas do processo penal, como ficou patente na longa leitura de Ivo Rosa.

No final da decisão de Ivo Rosa o que restou? Essencialmente as dúvidas do Juiz em o amigo de Sócrates lhe entregar dinheiro de forma capciosa e sub-reptícia, indiciando tal um crime de corrupção sem objeto identificado – ainda que já prescrito -, originando em consequência um crime de branqueamento de capitais.

É sabido que a Justiça ainda vai seguir o seu percurso e que o MP irá seguramente recorrer da decisão de Ivo Rosa. Contudo, apesar de não ser jurista, parece-me que dificilmente a decisão agora havida poderá ser muito alterada, tal o cuidado e a qualidade jurídica dos argumentos contidos neste despacho de pronúncia.

Contudo, deve desde já elogiar-se Ivo Rosa. Pela primeira vez no processo Marquês a comunicação social e as televisões não foram informadas previamente do que iria ser o resultado das suas decisões. O segredo de justiça foi respeitado até ao fim, o que é inédito no âmbito do dito processo.

Sendo a Justiça um sistema imperfeito – porque humanos e imperfeitos são os seus agentes -, fiquei hoje com a sensação de que o sistema contém em si, ainda assim, uma lógica de contrapesos que lhe permite corrigir os seus próprios limites e falhas.

Assim o consiga fazer em tempo útil e com um mínimo de danos para quem sofra de tais deficiências. No caso de Sócrates, tal já não será possível, devido à mediatização do processo, decorrente das reiteradas violações do segredo de justiça. Para o bem ou para o mal, já todos o julgámos.

8 pensamentos sobre “A montanha pariu um rato

  1. Desculpe a sugestão mas o título devia ser : “Um rato pariu uma montanha”-(22 volumes).
    Ivo Rosa deixou para o fim a proverbial cereja em cima do dito: A acusação de fraude fiscal por Sócrates não ter declarado em sede de IRS os lucros alegadamente fruto dos seus “crimes”. Terão os também alegadamente Procuradores tirado mesmo o curso de Direito ?

  2. O Rosário além de incompetente move-se por motivos obscuros e tem uma saida : Demitir-se ,Portugal é o Brasil da Europa ? Em que a justiça está ao serviço da direita e não dos cidadãos em geral ,prende-se para investigar ? em que país estamos ?
    Estive a assistir a instrução toda na tv e conforme liam o acordão é de ficar de boca aberta com a falta de vergonha
    de quem geriu o processo e a incompetência .

  3. Exactamente “Tudo começou com a prisão de Sócrates. À época o Ministério Público não tinha qualquer prova que incriminasse o detido. Prendeu para investigar.”
    “Depois de ter promovido a prisão de um ex-Primeiro Ministro, com informação prévia à imprensa e às televisões, o Ministério Público tinha que construir posteriormente uma acusação que justificasse uma tão grave diligência.”

  4. O Juíz Ivo Rosa está a enterrar a democracia portuguesa.

    O Ventura acaba de ganhar o seu grupo parlamentar, só falta saber se vai ser muito grande.

  5. Hum.

    Notas, várias.

    Depois de tanta excitação normal, em jovens como vós, quero propor um título alternativo para o post do ó d’A Estátua… Aqui vai, a substância do problema fica para depois:

    – O ilhéu do Pico, e aqui não se pode ler nada de diferente que vos encaminhe para enviesadas leituras sobre a sexualidade do juiz Ivo, pariu, produziu?, um rato…mesmo assim de possíveis 12 anos de cadeia que é aquilo a que se arrisca co José Sócrates!

    O PDF das tais 6000 páginas está disponível para download desde ontem, Expresso online.

    Chove!

    • Adenda. Não percebeste bem o que está em causa com o pilim da tal conta do BES que o Carlos Santos Silva movimentava e em depois iam entregar ao pelintra do Carlos José Sócrates. Sim, os tais um milhão e setecentos mil de que se fala… Se me lembro bem, o dinheiro que inchou o saldo dessa conta secreta existente no BES foi transferido, de um dos cofres mafiosos que existem na Suíça onde estava escondido, ao abrigo de um dos famosos regimes especiais que ao longo dos anos permitiram que uns milhões de dinheiro sujo regressassem a Portugal a uma taxa de impostos ridiculos. Quebra uma das decisões sobre a sua criação tenha sido de um governo do próprio José Sócrates, que tenha sido o seu amigo Santos Silva a tratar da papelada para o fazer regressar, que, depois, ele tenha servido exclusivamente para liquidar as despesas do José Sócrates e assim o tenha tornado obviamente suspeito aos olhos do MP, tais como se lê na acusação para oferecer uns milhares em troca de carinhos, que tenha servido para falsear o “sucesso” de vendas da sua tese de mestrado, que tenha servido até para pagar anteriormente a um ghost-writter, idem para a compra dos quadros do Júlio Pomar e tal apreendidos nas paredes de sua casa do Marquês de Pombal, et voilà!, as calientes férias em Formentera, o monte da ex- ao sol alentejano, eu sei lá!, e chegarás facilmente à conclusão de que muuuuiiiittto da acusação do MP em levar a julgamento outros pardais e pardalinhas, neste pormenor apenas, fará vencimento no recurso a apresentar no Tribunal da Relação de Lisboa onde o juiz Ivo Rosa é tido como pouco mais do que juridicamente analfabeto (onde é que foste buscar a ideia de que o tipo prima pela competência, a propósito?). Existe um problema de amplitude nas decisões do juiz Ivo Rosa, no entanto, quando, convenientemente, se preparam para acabar por lei com o TICÃO onde ele e o juiz Carlos Alexandre estão de plantão: é que por muito, ou pouco, que os desembargadores do TRL remendem as nabices, digamos assim, os danos estão feitos… Quanto à essência do problema tenho algumas dúvidas que quero ver esclarecidas, fica para depois, mas aparentemente o desgraçado do Armando Vara arrisca-se a continuar na pousada d’Évora por mais uns tempos.

      Chocante, pá!

        • Nota. Isso foi no tempo en que gozaram com a nossa inocência, pá! É exactamente esse o período que conduz o MP a prender o José Sócrates e que está retratado nas escutas sobre os seus tempos de candidato a filósofo no seu (!) apartamento de Paris. Aliás, vi ontem que o juiz Ivo Rosa contrariou também a fundamentada tese do MP sobre a sua propriedade e o expediente, ou seja mais um crime, de falsificar um contrato de arrendamento à posteriori depois das primeiras notícias do CM, também aqui com base numa série de argumentos rebuscadamente estapafúrdios para lhe salvar o pescoço. Quantas vezes e qual a razão para o fazer, esperemos pelos considerandos do TRL…

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