No 1.º aniversário da tragédia de Pedrógão Grande

(Carlos Esperança, 17/01/2018)

fogom

A comunicação social procede à mórbida celebração do incêndio. Enquanto requeima as vítimas em imagens repetidas até à náusea e se resssufragam as almas em remissas televisionadas, com mais pessoas do que crentes, impede-se o luto dos que sofrem a dor da ausência dos que o fogo devorou, a sangrar por dentro.

Há nesta lúgubre ostentação da tragédia o aproveitamento que, desde o início, serviu objetivos políticos que apenas o delírio do presidente da Misericórdia e do PSD de Pedrógão atenuou com os suicídios que imaginou em transe partidário e oportunismo antidemocrático.

Foram mais respeitados os mortos que um carvalho paroquial esmagou no adro da igreja ao tombar sobre uma procissão, na Madeira, mas tiveram menos sorte os estropiados e os herdeiros dos falecidos porque os fundos da diocese eram para a salvação das almas e os do Estado para reparar os danos oriundos de matas particulares e da inclemência do tempo.

Das 13 pessoas mortas no Funchal, incluindo uma criança, pela queda da árvore, em 15 de agosto do ano passado, não mais se ouviu falar, nem dos 49 feridos, 12 dos quais em estado grave, se sabe quantos vieram a falecer. As famílias de 13 mortos e os numerosos estropiados terão certamente missa, mas não terão o PR, o PM e a Dr.ª Cristas, dois por exibição pia e um por chantagem ímpia, para os carpir.

Hoje, percorre-se a estrada da morte, em sucessivas romagens televisivas que dilaceram os sobreviventes, enquanto a presidente da comissão de vítimas, esgotada a angariação de inscrições no CDS, se desdobra em entrevistas, disponível e com visual cuidado.

Os mortos não merecem e os vivos podiam ser poupados ao chumbo derretido que lhes aviva as feridas por cicatrizar, com as imagens que alimentam a patologia televisiva.