Não vale tudo

(Alexandra Leitão, in Expresso Diário, 29/04/2021)

Agora que toda a sociedade se vira para o Estado (e bem) para que resolva a crise pandémica e também a crise económica e social pós-pandémica, o momento favorece e valoriza este debate [sobre o papel do Estado]. A discussão acontece em cima de factos concretos, o que força os argumentos ao teste da realidade, isto é, ao que isto realmente significa no Serviço Nacional de Saúde, na escola pública, nos apoios que a segurança social tem multiplicado.


O anúncio recente da abertura de um equipamento temporário para alojamento de estudantes filhos de trabalhadores da Administração Pública suscitou uma onda de comentários nas redes sociais e em alguns órgãos de comunicação social.

Começaria por uma breve explicação da medida: os Serviços Sociais da Administração Pública (SSAP) têm por missão a proteção social complementar dos trabalhadores da Administração Pública, incluindo, em certas situações, dos seus agregados familiares.

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Assim, a utilização de um imóvel que já era propriedade dos SSAP para um apoio destinado aos filhos dos trabalhadores públicos que cumpram os critérios pré-definidos, dos quais ressaltam os baixos rendimentos do agregado familiar e residirem a mais de 100 km, corresponde ainda às responsabilidades do Estado enquanto empregador. Não é um privilégio, é mesmo uma resposta social para quem mais dela necessita.

E é o cumprimento da função social do Estado empregador, que deve dar o exemplo de responsabilidade social que todos os empregadores (públicos e privados) devem assumir. É também liderar pelo exemplo.

Outra coisa – que decorre do Estado Social que defendo convictamente – são as responsabilidades do Estado para com os cidadãos em geral, trabalhadores públicos ou não, e que se traduz na abertura de residências para todos os estudantes no âmbito do Plano Nacional de Alojamento no Ensino Superior, com o qual os SSAP podem também colaborar. Não esquecendo que a medida agora anunciada também contribui para aumentar a disponibilidade do alojamento a estudantes em Lisboa, ao criar uma primeira alternativa para 47 estudantes.

Como já dissemos, continuaremos a trabalhar no sentido de criar soluções noutras regiões do país, recordando, no entanto, que esta medida se aplica exatamente a quem é de fora de Lisboa.

A explicação é esta e é simples. Mas o assunto que motivou tantas e tão acesas – e até injuriosas – proclamações não é este. É outro. É ideológico.

Contra a Administração Pública, contra os seus trabalhadores, contra o Estado.

O mesmo preconceito ideológico que alimenta decisões que inevitavelmente resultariam num Estado mais fraco, envelhecido e desprovido de massa crítica, forçando-o a contratualizar com os privados tudo o que é importante: na saúde, na educação, no apoio jurídico, no desenvolvimento de projetos … em tudo o que é relevante.

Vamos, então, à discussão ideológica. Agora que toda a sociedade se vira para o Estado (e bem) para que resolva a crise pandémica e também a crise económica e social pós-pandémica, o momento favorece e valoriza este debate. A discussão acontece em cima de factos concretos, o que força os argumentos ao teste da realidade, isto é, ao que isto realmente significa no Serviço Nacional de Saúde, na escola pública, nos apoios que a segurança social tem multiplicado. É mesmo com isto que pretendem acabar, deixando apenas ao mercado a solução para tudo? O mercado terá soluções para quem as quer e pode pagar… e os outros, o que lhes acontece?

Para os outros, o mercado também tem solução: que o Estado pague aos privados para receberem esses “outros”, como acontecia no modelo dos contratos de associação, que se multiplicaram entre 2011 e 2015, custando mais de 150 M€ por ano ao Estado, enquanto a escola pública definhava durante todo esse período.

Não tenho nada contra a discordância política. É saudável, é a alma da democracia, as sociedades ganham sempre quando a troca de argumentos convida ao pensamento e a políticas públicas bem calibradas e fundamentadas. Quem me conhece sabe que nunca viro a cara a esgrimir argumentos. É meu dever justificar as escolhas que faço enquanto ministra e responsável política.

Mas não vale tudo. Não vale o insulto e a injúria. Isso não é discutir, isso não é democracia, isso não é liberdade. É, aliás, o oposto porque tenta vexar o interlocutor. É um caminho que visa intimidar — não trocar ideias. Nos últimos anos temos assistido em todo o mundo aos resultados a que estas práticas nos conduzem: à xenofobia, ao racismo, ao populismo, à demagogia, ao ódio, à violência, ao totalitarismo.

Em política, como na vida, não vale tudo.

(Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública de Portugal)


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9 pensamentos sobre “Não vale tudo

  1. Nota. Schii, a Tia Edite Estrela do Acção Socialista não faria melhor!

    #socratete, qu’isto tem semanas!
    #costeta de teta principalmente
    (homenagem à bazuca?)

    🙂

  2. Quo usque abutere, RFC, patientia nostra? Até quando, RFC, abusas da nossa paciência?
    (Perguntou Cícero a Catilina há 2.000 anos atrás. Perguntamos nós o mesmo hoje a esse poluídor deste blog)

    • Ui?

      Nota. Eu daqui a bocado respondo-te à letra, com um ou outro desenho e tudo, mas entretanto vai pensando em responderes ao seguinte: como é que a ministra tem a lata de enxertar uma frase e transforma-a num parágrafo CHEIO ( e isto não é nenhuma graça, pois sabe-se que é das cheinhas que eles e elas gostam mais…), dizia, cheio de nada quando se refere à situação desesperante dos custos para aluguer imobiliário em Lisboa? É verdade, pá, a cidade-cemitério para turistas, primeiro, expulsou os pobres para longe das vistas como se fez em Paris, em meados do século XIX, ou no Rio de Janeiro, em princípios do século XX, por arrasto foi o aluguer de assoalhadas para a estudantada, para acabar tudo o que cheira a PS na CMS no xilindró na alegre companhia do ex-vereador Manuel Salgado. Portanto, é melhor não dizer nada: foi um erro levantar a poeira, Fernando Medina não existe e, da oferta de electrodomésticos com o dinheiro dos outros, o António Costa é que a sabe toda… Só não percebo é por que raio os portugueses pagam sem falhas o ordenado à senhora ministra, aos seus camaradas que se alaparam no aparelho de Estado e aos simpáticos okupas dos seus confortáveis gabinetes para ela vir a terreiro dar lições de moral e despejar uma série de banalidades sobre o que é a Razão (a de Estado) para essa cena indefinida que se chama política de Esquerda vinda deste governo do PS.

      Eu não salivo, era o que faltava!

      • Adenda. Toma lá, pázinho, que podes ainda andar de cabeça à roda à procura e nada enxergas (tens ali o “parágrafo”, ou assim, sobre Lisboa e dou-te, ainda, o “parágrafo” seguinte, ou assado, com aquilo que tanto vos faz salivar ó desmiolados de todo o mundo e agitar (o rabo!).

        […]

        «Como já dissemos, continuaremos a trabalhar no sentido de criar soluções noutras regiões do país, recordando, no entanto, que esta medida se aplica exatamente a quem é de fora de Lisboa.

        A explicação é esta e é simples. Mas o assunto que motivou tantas e tão acesas – e até injuriosas – proclamações não é este. É outro. É ideológico.»

        Béu-béu, 🙁 !

  3. Eh, eh, eh…., o discurso da ministra terceiro mundistga, é típica de um governo demagógico que vive de fachada e do património deixado pelo regime anterior, pois sem euro-esmolas, NADA fazem, bem além de alimentar clientelas, como é o caso!
    O que o PS pretende, é comprar o voto dos agregados a que pertencem os supostos candidatos…., o resto é conversa de treta. O que não dizem, é que são edifícios adquiridos pelo Estado e sem esmiolas há mais de 40 anos, caso daquele onde funcionou o Min. da desEducação, na 5 de Outubro (de 1143!).
    OBVIAMENTE É IMPORTANTE MANTER O POVO NA IGNORÂNCIA!

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