As Causas. Processo Marquês: um campo minado

(José Miguel Júdice, in Expresso Diário, 13/04/2021)

José Miguel Júdice

(Júdice não terá, seguramente, qualquer simpatia por Sócrates mas é um experimentado jurista e conhecedor do funcionamento dos nosso sistema de Justiça. Mas até ele sentiu necessidade de se precaver, por antecipação, das críticas que lhe vão ser dirigidas pelo facto de não embandeirar em arco na lapidação pública ao juiz Ivo Rosa.

Contrariamente à indigência jurídica e à menoridade intelectual de outro comentador de direita – Marques Mendes -, Júdice é outra loiça: sólido no argumentário jurídico, escorreito nas suas considerações. Por isso o publicamos.

É que, ele há juristas e juristas. É como os vinhos: ele há os Reserva e ele há as zurrapas… 🙂

Comentário da Estátua, 14/04/2021)


Vou entrar, em plena consciência e por isso sem demasiadas ilusões, num terreno minado. Vou tratar hoje do chamado “Processo Marquês”.

A situação está de tal modo radicalizada e emocional que André Ventura até pareceu moderado (comparado com o que li de pessoas moderadas) no modo como tentou aproveitar a seu favor a Decisão de 6ª feira do Juiz Ivo Rosa.

Quando as coisas estão assim, a opinião pública não tolera que se aborde com serenidade e independência o tema. Mas – talvez sobretudo por isso – acho que tenho o dever de tentar.

Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.

E faço-o sobretudo pelas seguintes razões: dediquei a minha vida à Justiça, acumulei 40 anos de experiência de tribunais (o que não creio que ocorra com nenhum dos habituais comentadores televisivos regulares e com quase ninguém que abordou o tema nos media), fui Bastonário e Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados.

Como é natural, hoje não surgem as secções finais de “As Causas”: por falta de tempo, claro; mas sobretudo porque neste tema há espaço para elogio, para lembrar que ler é sempre o melhor remédio, para fazer perguntas que não vão ter respostas e para revelar loucura mansa.

O ESSENCIAL DA DECISÃO IVO ROSA

A começar, um resumo das conclusões essenciais:

A Decisão Instrutória foi escrita por um juiz experiente, preparado e independente, mas revela as fragilidades que também o definem e erra em pontos muito importantes.

A revolta social, que se compreende, está a ocultar que a investigação criminal foi esforçada, beneditina, atenta aos detalhes, mas estrategicamente incompetente, e nela está a origem do que estamos a viver.

A estratégia socratiana de “animal feroz” destrói a mera possibilidade social de empatia com as sucessivas violações dos direitos fundamentais, desrespeito do processo devido e abusos de poder, de que são exemplos marcantes as prisões preventivas (e o modo como foram feitas) e os acessos de certos meios de comunicação ao inquérito, que assim fizeram durante anos um julgamento na praça pública, o que por sua vez condicionou os próprios investigadores.

O processo penal é contraditório a partir da instrução, e os advogados (a quase totalidade são profissionais especialistas em prática individual ou sócios de pequenos escritórios) aproveitaram como é seu dever a investigação criminal pouco competente; e os seus argumentos de um modo geral tiveram sucesso.

Se hoje houvesse um capítulo para o Elogio ele seria para os advogados de defesa dos arguidos, até pela coragem que em ambientes deste tipo é preciso para defender quem a opinião pública acha que não merece defesa.

Ivo Rosa é a antítese de Carlos Alexandre e assume-se como juiz das liberdades e nisso aplica o mandato constitucional, o que torna objetivamente mais grave para o ex-Primeiro Ministro e outros arguidos as conclusões a que ele chegou.

Por isso Ivo Rosa matou politicamente José Sócrates – goste-se ou não que assim seja – muito mais claramente do que se fosse Carlos Alexandre (“justiceiro” e colaborador do MP) a pronunciá-lo e a todos os arguidos mesmo que por todos os crimes de que vinham acusados, como seria mais do que provável.

Finalmente, o sistema judicial tem em si todos os instrumentos para rever – se for caso disso – o Despacho de Ivo Rosa, pelo que escusam de rasgar as vestes os que acham que não há Justiça em Portugal.

AS NECESSÁRIAS EXPLICAÇÕES

Feito o resumo, agora algumas explicações:

Ivo Rosa foi – sem nenhuma necessidade jurídica – muito para além da missão do Juiz de Instrução, que é pronunciar ou não pronunciar, não sendo útil criticar com enfase e adjetivos a acusação, como não o seria fazer o mesmo à defesa. Nesse sentido, vestiu a pele do Juiz do Julgamento – mas isso morre com a Decisão e não tem efeitos jurídicos.

Creio que Ivo Rosa errou na questão fiscal e quando decidiu não pronunciar Ricardo Salgado e Helder Bataglia, o que deveria ter feito registando que – devido à confissão de Bataglia – há fortes indícios de que ao menos um deles corrompeu ou tentou corromper, e que deveria ser o juiz do julgamento a decidir – mas isso pode ser alterado pelo Tribunal da Relação.

A decisão sobre prescrição segue a doutrina conhecida do Tribunal Constitucional, mas como esta não tem (ainda) força obrigatória geral, pode também ser revista e alterada pelo Tribunal da Relação.

A pronúncia com base em indícios de corrupção de Sócrates feita por Santos Silva foi defendida por advogados de defesa na instrução, e o MP teria podido aditar à acusação essa tese de forma subsidiária, fortalecendo-a, o que não quis fazer; e ela é compatível com a existência de corrupções a montante, pelo que a insistência na teoria do “testa de ferro” foi um erro estratégico do MP.

Se hoje houvesse o capítulo da Pergunta sem Resposta, ela seria para o MP que não teve a cautela de fazer o óbvio, o que permite agora – corretamente, ou não – ao advogado de José Sócrates ir defender a nulidade da pronúncia com esse fundamento.

O MP partiu de dois factos inequívocos – Carlos Santos Silva fornecia dinheiro a Sócrates a partir de contas com mais de 30 milhões de euros – para tentar a seguir descobrir corruptores ativos, foi passando de uns para outros, tudo isso foi divulgado por alguns meios de comunicação social, e desse modo o MP ficou refém da sua estratégia, optando – como tantas vezes faz, e em regra com o apoio de Carlos Alexandre – por acusar tudo e todos e por todos os crimes que tenha à mão, e depois quando perde no julgamento a “culpa” é dos juízes.

A linha da decisão de Ivo Rosa está correta, pois segue a sábia doutrina dos meus mestres Eduardo Correia, Figueiredo Dias, Costa Andrade e outros (a doutrina aliás já vem do tempo da Ditadura o que não é dizer pouco…).

Esta linha doutrinária é muito rigorosa e defende que para se poder pronunciar um arguido é necessário que existam “indícios suficientemente consistentes para tornarem previsível a condenação” (ou, nas palavras do art. 308, nº1 do CPP, “indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena”, ao passo que a acusação (art. 283 2 do CPP) exige e basta-se com indícios de que haja “uma possibilidade razoável” de vir a ser aplicada, por força deles, uma pena em julgamento.

Em termos legais, há um oceano a separar a “possibilidade razoável” da “previsibilidade” de condenação. Por isso é normal – mesmo que o MP seja cauteloso, mas nos casos mediáticos prefere não ser – que a pronúncia não coincida com a acusação (até porque na fase da instrução surge o contraditório que não havia no inquérito).

Vou entrar, em plena consciência e por isso sem demasiadas ilusões, num terreno minado. Vou tratar hoje do chamado “Processo Marquês”.

A situação está de tal modo radicalizada e emocional que André Ventura até pareceu moderado (comparado com o que li de pessoas moderadas) no modo como tentou aproveitar a seu favor a Decisão de 6ª feira do Juiz Ivo Rosa.

Quando as coisas estão assim, a opinião pública não tolera que se aborde com serenidade e independência o tema. Mas – talvez sobretudo por isso – acho que tenho o dever de tentar.

E faço-o sobretudo pelas seguintes razões: dediquei a minha vida à Justiça, acumulei 40 anos de experiência de tribunais (o que não creio que ocorra com nenhum dos habituais comentadores televisivos regulares e com quase ninguém que abordou o tema nos media), fui Bastonário e Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados.

Como é natural, hoje não surgem as secções finais de “As Causas”: por falta de tempo, claro; mas sobretudo porque neste tema há espaço para elogio, para lembrar que ler é sempre o melhor remédio, para fazer perguntas que não vão ter respostas e para revelar loucura mansa.

O ESSENCIAL DA DECISÃO IVO ROSA

A começar, um resumo das conclusões essenciais:

A Decisão Instrutória foi escrita por um juiz experiente, preparado e independente, mas revela as fragilidades que também o definem e erra em pontos muito importantes.

A revolta social, que se compreende, está a ocultar que a investigação criminal foi esforçada, beneditina, atenta aos detalhes, mas estrategicamente incompetente, e nela está a origem do que estamos a viver.

A estratégia socratiana de “animal feroz” destrói a mera possibilidade social de empatia com as sucessivas violações dos direitos fundamentais, desrespeito do processo devido e abusos de poder, de que são exemplos marcantes as prisões preventivas (e o modo como foram feitas) e os acessos de certos meios de comunicação ao inquérito, que assim fizeram durante anos um julgamento na praça pública, o que por sua vez condicionou os próprios investigadores.

O processo penal é contraditório a partir da instrução, e os advogados (a quase totalidade são profissionais especialistas em prática individual ou sócios de pequenos escritórios) aproveitaram como é seu dever a investigação criminal pouco competente; e os seus argumentos de um modo geral tiveram sucesso.

Se hoje houvesse um capítulo para o Elogio ele seria para os advogados de defesa dos arguidos, até pela coragem que em ambientes deste tipo é preciso para defender quem a opinião pública acha que não merece defesa.

Ivo Rosa é a antítese de Carlos Alexandre e assume-se como juiz das liberdades e nisso aplica o mandato constitucional, o que torna objetivamente mais grave para o ex-Primeiro Ministro e outros arguidos as conclusões a que ele chegou.about:blank

Por isso Ivo Rosa matou politicamente José Sócrates – goste-se ou não que assim seja – muito mais claramente do que se fosse Carlos Alexandre (“justiceiro” e colaborador do MP) a pronunciá-lo e a todos os arguidos mesmo que por todos os crimes de que vinham acusados, como seria mais do que provável.

Finalmente, o sistema judicial tem em si todos os instrumentos para rever – se for caso disso – o Despacho de Ivo Rosa, pelo que escusam de rasgar as vestes os que acham que não há Justiça em Portugal.

AS NECESSÁRIAS EXPLICAÇÕES

Feito o resumo, agora algumas explicações:

Ivo Rosa foi – sem nenhuma necessidade jurídica – muito para além da missão do Juiz de Instrução, que é pronunciar ou não pronunciar, não sendo útil criticar com enfase e adjetivos a acusação, como não o seria fazer o mesmo à defesa. Nesse sentido, vestiu a pele do Juiz do Julgamento – mas isso morre com a Decisão e não tem efeitos jurídicos.

Creio que Ivo Rosa errou na questão fiscal e quando decidiu não pronunciar Ricardo Salgado e Helder Bataglia, o que deveria ter feito registando que – devido à confissão de Bataglia – há fortes indícios de que ao menos um deles corrompeu ou tentou corromper, e que deveria ser o juiz do julgamento a decidir – mas isso pode ser alterado pelo Tribunal da Relação.

A decisão sobre prescrição segue a doutrina conhecida do Tribunal Constitucional, mas como esta não tem (ainda) força obrigatória geral, pode também ser revista e alterada pelo Tribunal da Relação.about:blank

A pronúncia com base em indícios de corrupção de Sócrates feita por Santos Silva foi defendida por advogados de defesa na instrução, e o MP teria podido aditar à acusação essa tese de forma subsidiária, fortalecendo-a, o que não quis fazer; e ela é compatível com a existência de corrupções a montante, pelo que a insistência na teoria do “testa de ferro” foi um erro estratégico do MP.

Se hoje houvesse o capítulo da Pergunta sem Resposta, ela seria para o MP que não teve a cautela de fazer o óbvio, o que permite agora – corretamente, ou não – ao advogado de José Sócrates ir defender a nulidade da pronúncia com esse fundamento.

O MP partiu de dois factos inequívocos – Carlos Santos Silva fornecia dinheiro a Sócrates a partir de contas com mais de 30 milhões de euros – para tentar a seguir descobrir corruptores ativos, foi passando de uns para outros, tudo isso foi divulgado por alguns meios de comunicação social, e desse modo o MP ficou refém da sua estratégia, optando – como tantas vezes faz, e em regra com o apoio de Carlos Alexandre – por acusar tudo e todos e por todos os crimes que tenha à mão, e depois quando perde no julgamento a “culpa” é dos juízes.

A linha da decisão de Ivo Rosa está correta, pois segue a sábia doutrina dos meus mestres Eduardo Correia, Figueiredo Dias, Costa Andrade e outros (a doutrina aliás já vem do tempo da Ditadura o que não é dizer pouco…).

Esta linha doutrinária é muito rigorosa e defende que para se poder pronunciar um arguido é necessário que existam “indícios suficientemente consistentes para tornarem previsível a condenação” (ou, nas palavras do art. 308, nº1 do CPP, “indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena”, ao passo que a acusação (art. 283 2 do CPP) exige e basta-se com indícios de que haja “uma possibilidade razoável” de vir a ser aplicada, por força deles, uma pena em julgamento.

Em termos legais, há um oceano a separar a “possibilidade razoável” da “previsibilidade” de condenação. Por isso é normal – mesmo que o MP seja cauteloso, mas nos casos mediáticos prefere não ser – que a pronúncia não coincida com a acusação (até porque na fase da instrução surge o contraditório que não havia no inquérito).

Se hoje houvesse o capítulo Ler é o Melhor Remédio, a sugestão era para se lerem as lições destes professores da Escola de Coimbra.

Se o MP tivesse optado por acusações separadas para cada tipo de situação, em vez do tradicional megaprocesso, o efeito mediático seria muito menor, mas a eficácia processual muito maior.

Uma decisão de um juiz como Ivo Rosa – que é muito mais exigente do que outros no conceito de “previsibilidade” da condenação – é muito pior para Sócrates em termos políticos.

Não acredito – conheço o MP bem – que houvesse uma conspiração para o destruir politicamente e evitar que viesse a ser eleito presidente da República. Pessoas como Rosário Teixeira merecem o meu respeito em termos éticos.

Mas, com toda a sinceridade, um político com a experiência e ambição que José Sócrates (ele confessa agora que queria ter sido eleito presidente da República em 2016) nunca deveria ter aceite o que aceitou receber de Santos Silva, e como o aceitou, mesmo que não se prove – ou mesmo que não tenha havido – corrupção. E disso só ele é responsável.

Por isso se houvesse hoje o capítulo Loucura Mansa, seria para a forma como o ex-Primeiro-Ministro desgraçou o seu futuro político.

Finalmente, 7 procuradores durante 5 anos, apoiados em permanência por um Inspetor Tributário, realizaram um

inquérito com meios e condições nunca existentes, reuniram milhares de documentos, acusaram em documento com mais de 3200 páginas, depois dezenas de advogados carrearam para o processo largas centenas de documentos durante 2 anos e meio e um juiz de instrução – sozinho – em 8 meses, sem férias nem fins de semana, segundo o próprio, teve de decidir e para isso de escrever mais de 6500 páginas.

Ivo Rosa seguramente que não tomou uma decisão sem erros, mas com a minha experiência de julgador o que me admira é que sejam tão poucos. E isso é matéria essencial para reflexão.

QUE FAZER? REFORMAS DO SISTEMA JUDICIAL PENAL

Agora algumas sugestões que resultam de tudo isto:

É urgente mudar radicalmente a cultura do inquérito, reforçando o caráter de magistratura do MP e admitir no futuro que o Estado Português se possa constituir assistente, para separar as águas e evitar a tentação dos procuradores em se tornarem advogados de acusação.

É urgente acabar com o “Ticão”, por tantas razões que uma hora não chegava para de todas falar.


16 pensamentos sobre “As Causas. Processo Marquês: um campo minado

  1. Primeiro José Sócrates, o comprovadamente corrupto, que se safa da maioria dos crimes (óbvios para quem tem olhos na cara) graças às ridículas prescrições.
    Depois Garcia Pereira, o lunático do MRPP.
    E agora José Miguel Júdice, o terrorista da Extrema-Direita fascista no pós-25-Abril-1974.
    Não sei se o Estátua de Sal está infectado com SARS-CoV-2 e desenvolveu Covid-19, mas sei que isto é uma semana negra para este blog.
    É que uma coisa é o pluralismo e o debate técnico dos assuntos, outra coisa é o MERCADEJAR dos princípios básicos da decência em nome da defesa do indefensável, ou em nome de um aliviar do peso na consciência devido ao que se defendeu até 2011… Não há qualquer combate contra a Direita, nem mesmo contra a Direita mais demagógica e radical que se tem aproveitado desde caso desde início, que justifique isto.
    Desejo portanto as melhoras à Estátua de Sal, e que regresse rapidamente às semanas normais com textos escritos por gente minimamente decente.

    • Schiii.

      Nota. Ai!, ai!, ai qu’esta até me doeu! Herdaste o tal barrote do gajo d’Abrantes ou compraste um ainda melhor no OLX, ó Karl?

      🙂

    • Quando estamos dispostos a hipotecar princípios básicos (quem cala consente) para assim podermos restringir a análise de um caso à condenação de um homem só e das suas acções, mal vai a exigência política da esquerda a qual, suponho, você se deve orgulhar de integrar.
      Gostava de ter visto os seus veredictos, à época, sobre a prisão do homem – que hoje está mais que provado que foi um grave atentado ao Estado de Direito -, sobre as campanhas nos pasquins, sobre as violações do segredo de justiça, etc.
      Ser conivente com isto, não é ser de esquerda, mesmo que Sócrates possa ser o maior larápio do sistema solar.
      E é lamentável que um tipo a quem você chama fascista – José Miguel Júdice -, revele uma maior capacidade de defender o Estado de Direito (para si será o Estado burguês que é preciso destruir?) do que você revela no seu comentário.

      Tome lá e reflicta sobre o que origina a tolerância da esquerda, para com o arbítrio:

      “Primeiro levaram os negros
      Mas não me importei com isso
      Eu não era negro

      Em seguida levaram alguns operários
      Mas não me importei com isso
      Eu também não era operário

      Depois prenderam os miseráveis
      Mas não me importei com isso
      Porque eu não sou miserável

      Depois agarraram uns desempregados
      Mas como tenho meu emprego
      Também não me importei

      Agora estão me levando
      Agora estão me levando
      Mas já é tarde.
      Como eu não me importei com ninguém
      Ninguém se importa comigo.

      Bertolt Brecht

      • Se o Ministério Público tivesse sido competente a separar os casos, em vez de criar um mega processo, Sócrates já estava julgado, condenado, e preso, não só pelos 6 crimes de que o “juiz das garantias” o acusou, mas também de vários outros que entretanto prescreveram.

        Quanto a quem levam antes de mim, se primeiro levarem os corruptos, depois os corruptores, a seguir os que desenharam o sistema da corrupção, e por fim os que deixam corruptos à solta, por mim tudo bem.

        Agora estar a colocar negros, operários, miseráveis, e desempregados, no mesmo saco do Sócrates, isso é que eu não lhe admito. O que é que essa gente fez para ser assim insultada por si?

        Por fim, uma última característica do comprovadamente TERRORISTA, comprovadamente da EXTREMA-Direita, comprovadamente FASCISTA, a quem você chama de grande jurista, José Miguel Júdice, não me interessa absolutamente nada se o que ele diz do ponto de vista técnico está ou não correcto. Interessa sim o dono da boca de quem as palavras saem. É que o Hitler também dizia que era humanista…

        Neste caso não chega a tanto a comparação, mas relembro só que um dos grandes defensores da corrupta e assassina Isabel dos Santos, da ditadura de Angola apoiada por PS e Direita, era este mesmo jurista, que nada mais faz na p*ta da vida do que defender os maiores vigaristas que por este país passam.
        Citar Júdice aqui, seria como citar Donald Trump num artigo sobre boa diplomacia e respeito pelas instituições democráticas…

        Quanto a Brecht, a citação é errada, e além disso o verdadeiro autor foi Martin Niemöller em 1946:
        «
        First of all, they came to take the GYPSIES
        and I was happy because they pilfered.
        Then they came to take the JEWS and I said nothing,
        because they were unpleasant to me.
        Then they came to take HOMOSEXUALS,
        and I was relieved, because they were annoying me.
        Then they came to take the COMMUNISTS,
        and I said nothing because I was not a Communist.
        One day they came to take me,
        and there was nobody left to protest.
        »
        E mais uma vez, nada aqui se compara a um corrupto bem acusado e cuja prisão só peca por tardia. Um corrupto, e comprovadamente mentiroso compulsivo, José Sócrates, não é uma vítima!

        Por fim, uma nota para final de conversa: sempre vim aqui ler textos, uns que podia subscrever, outros de que discordo, mas sempre para discutir conteúdos. No entanto, quando os autores são desta estirpe, eu não so de ferro. Não é por Júdice verborrear na SIC “Notícias” que passa a ser legítimo. Não! Isso diz é muito daquilo que é o verdadeiro projecto político por trás daquele canal.
        Alguém que tem na sua biografia algo como isto, não pode nunca ser branqueado, seja a propósito de que assunto for:

        «José Miguel de Alarcão Júdice é um advogado português. Foi um dos fundadores do MDLP, uma rede armada de extrema-direita liderado pelo general António de Spínola.»

        «O Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP), formalmente constituído em 5 de maio de 1975, foi um movimento político com ligações à igreja católica (…) criado após a Intentona de 11 de Março de 1975.»

        «Alguns membros do MDLP foram suspeitos de vários atentados bombistas que resultaram na morte de múltiplos inocentes e foram presos pela Polícia Judiciária.»

        «O Golpe ou Intentona de 11 de Março de 1975 foi uma tentativa de golpe de estado dirigida por António de Spínola.»

        Quem branqueia Júdice, não é democrata, e muito menos defensor da Liberdade.

        • Servi-te o Júdice numa bandeja, cuja biografia conheço talvez melhor que tu – bem como as façanhas do MDLP em 75, tendo eu sido quase linchado por esses facínoras nessa altura. Foi de propósito. Para ver a enormidade que é pactuares com os atentados ao Estado de Direito só para poderes incenerar Sócrates. Eu não o defendo. Mas se para o condenar é preciso a Justiça prostituir-se, prefiro que ele se safe, percebes? É fazer a comparação entre dois males e preferir o menor. És capaz de dizer, em consciência, que o homem tem tido um processo judicial justo? Atreves-te? Ou achas que a Justiça deve ser desenhada à medida das conveniências de quem a controla e orquestra? Isso é o que sucede nos Estados totalitários. É por isso que pugnas?
          ,

          • José Sócrates nunca devia ter sido preso durante quase um ano para ser investigado, preso sem ser sequer acusado e muito menos julgado. Mas a injustiça do processo acaba aí, e nem sequer é uma injustiça contra Sócrates, mas sim um problema recorrente do nosso sistema Judicial, que pode calhar a qualquer um.

            Fiquei chocado quando, no início da pandemia, soube que há milhares de pessoas presas só porque não têm mil ou 2 mil € na conta para poderem pagar uma multa. E nunca esquecerei o homem que foi preso porque perdeu o comprovativo de pagamento ao fisco, e só foi solto no dia em que a mulher finalmente encontrou o papel lá em casa. Ou os presos políticos da NATO que sobrevoaram o nosso espaço aéreo a caminho de Guantánamo. Ou o Coelho, o político com humor da Madeira, que foi preso por dizer o que pensava. Ou o Ihor assassinado no SEF, mas cujos assassinos não serão sequer julgados pelo crime que cometeram? Já para não falar das pessoas recentemente detidas e/ou multadas por se atreverem a comer uma refeição dentro do carro, à boleia dos abusos que um Estado de Emergência interminável propicia. Etc. Isto é um Estado de Direito? Isto que o PS e a Direita construíram só é mau quando calha a fava a um da “elite” do PS?

            No entanto, ao fim de 7 anos, o juiz conhecido como “juiz das garantias” é quem considera Sócrates corrupto, acusa-o de 6 crimes, e acusa-o ainda de outros que só não vão a julgamento por mera prescrição, que pode até nem se verificar após o recurso do Ministério Público para o Tribunal da Relação que, como é sabido, reverte muitas das decisões de Ivo Rosa. Ou seja, se há algo injusto aqui, é o facto de Sócrates ainda não ter sido julgado, condenado, e preso. Cada segundo que ele passa à solta é uma injustiça, e pior, é revoltante.

            Sabemos portanto várias coisas:
            – justiça é lenta e tem falhas na protecção do segredo de justiça, e as vítimas disto são TODOS os portugueses sob alçada de tal sistema;
            – ministério público errou ao fazer mega-processo, e vítimas disto são todas as pessoas do país que desesperam por uma decisão. Há uma enorme possibilidade de que com processos mais pequenos, Sócrates já teria sido julgado e preso por vários dos crimes.
            – Sócrates é corrupto, mercadejou o cargo de 1º Ministro, vai a julgamento, com todas as garantias e mais algumas, por pelo menos 6 crimes e, para já, só não será julgado por mais crimes (fraude fiscal e corrupção incluídas) se a Relação concordar com a visão de Ivo Rosa.

            Atrevo-me portanto a concluir que o processo é justo para Sócrates, do ponto de vista em que ele é tratado como todos os outros, vítima das mesmas asneiras, fugas, e atrasos.
            Não é por Pinto da Costa e Paulo Portas e Berardo e Salgado, entre outros numa longa lista, estarem soltos, que isto passa a ser injusto para Sócrates. Não sou adepto do “two wrongs make one right”. DEVIAM ESTAR TODOS PRESOS!!

            Mas se a Justiça que temos os deixa à solta, então esse é que é o maior problema. Quer judicial quer político. Judicial porque mina qualquer confiança dos portugueses que ainda restasse no sistema de Justiça. Político porque não vendo soluções nos políticos/partidos tradicionais, o voto escapa sempre para as mãos de quem quer simplesmente destruir o sistema todo, liberdade e democracia incluídas. Por isso eu devolvo-te a pergunta: atreves-te? Atreves-te a colocar em risco a democracia só para salvar a pele a um corrupto? Um corrupto que até já devia estar preso se o Ministério Público tivesse sido mais competente?

            E em nome de alegadas “garantias” do nosso sistema? O nosso sistema, que deixa comprovadamente corruptos à solta, não é um sistema com “garantias”, é um sistema com buracos e alçapões feitos à medida de, por, e para as “elites” que se querem safar à grande. Isto não é resultado de leis bem feitas, é resultado do Centrão da negociata, com leis encomendadas por/a escritórios de advogados especializados em safar os maiores vigaristas, e o Júdice é uma das caras do problema. Ele não é um jurista especializado em Estado de Direito, é um vigarista especializado em ajudar a roubar a torto e a direito. Não confundir!

            A única defesa que Sócrates ainda merece é a do seu próprio advogado, e de mais ninguém. Relembro que o princípio do “inocente até prova em contrário” só se aplica ao juiz, não se aplica a nós cidadãos, muito menos depois de termos visto tantas provas de corrupção, e um juiz de instrução a dizê-lo com todas as letras: mercadejou o cargo, foi comprado pelo “amigo”, e branqueou dinheiro sujo (que é sujo porque foi obtido no acto de corrupção, que só não é julgado pois estará alegadamente prescrito). Um cidadão comum a continuar a defender Sócrates neste momento, é algo indefensável.

            Quanto a incinerar Sócrates? Já o fiz, politicamente, com conteúdo e razão. Fi-lo em 2005, em 2009, e em 2011, nas urnas de voto. E fi-lo também em todos os anos desde que percebi quem era a pessoa em causa. Eu, ao contrário dos mais de 2 milhões de “socialistas” que votaram repetidamente neste corrupto (e ainda hoje choram hipocritamente e ridiculamente pelo não apoio do BE em 2011), não sou culpado e tenho a consciência tranquila.

            Por fim, se sabias quem Júdice é, o advogado dos vigaristas, o terrorista fascista de extrema-direita, o demagogo ao serviço dos interesses dos donos da Sic “Notícias”, então não tens desculpa nenhuma por tê-lo citado, e discordo completamente de que isso sirva para provar um qualquer ponto “pluralista” ou garante do Estado de Direito. É como a estória da mulher de César, não basta sê-lo, é preciso parecê-lo. E ao citar Júdice, mesmo nas exceções em que o que ele diz está certo, pareces-te com tudo, menos com aquilo com que te querias/devias parecer.

            • Conseguiste fazer um texto longo mas cheio de contradições. Então pelo facto de os arbítrios da Justiça tocarem a todos, desde o Zé da Esquina ao Zé dos anzóis, o processo do Sócrates passou a ser justo?? Essa é de almanaque. Estás ao nível do Borda D’água, sem desprimor para os agricultores. Quando, para condenar Sócrates absolves os atentados ao Estado de Direito – com a justificação de que tocam a todos -, desculpa estás a ser mais facho do que o Júdice que – por muito mau currículo que tenha -, nunca defendeu tal monstruosidade, pelo menos em texto publicado.

              É que, não basta veres-te ao espelho e achares que “pensas à esquerda”. Tens que pensar além da etiqueta. Quer-me parecer que se tivesses sido deputado também terias votado contra o PEC IV porque o Sócrates e o seu governo à época eram de Direita. Pois bem, viste, espero eu, o efeito das tuas opções “de esquerda”. Mas, ao que parece, não aprendeste com os erros. Se tivesses aprendido não continuarias com a tua prosápia de que “vale tudo” no Estado de Direito desde que isso sirva para destruir um adversário político, independentemente das culpas no cartório que ele tenha. Isso sim, é ser de Direita, e foi essa matriz de pensamento que a Direita usou e continua a usar. Sócrates, nesse xadrez, é apenas um peão. E se culpas tem – independentemente daquilo a que vier a ser condenado – é ter-se colocado a jeito nesse papel.

        • Caro Marques.

          É espantoso não é ?

          A esquerda a defender milionários corruptos.

          E ja não é a primeira vez.

          Precisamente no caso de Angola, que há muito resvalou para o neoliberalismo, o PCP continuou a apoiar o MPLA como se nada fosse.

          Tal como hoje a estátua se põe do lado do milionário terrorista-fascista-corrupto Júdice para defender outros milionários corruptos, assim o PCP, tal como o terrorista-fascista Júdice apoiou entusiasticamente durante décadas os multibilionários do MPLA que trairam e roubaram o povo angolano.

          Mas eu, só por constatar factos como que o povo não é racista e até acolhe bem imigrantes de outras culturas, é que fui aqui insultado de fascista e ameaçado de censura e agressão todos os dias.

          Então o povo é que é sempre o mau, que os policias os condutores da rodoviária e os trabalhadores das lojas a salário minimo são fascistas e racistas e tal.

          E a vox populi que é descrita desdenhosamente como “conversa de taxista e de café” pela nova aristocracia da esquerda e do politicamenre correto.

          E depois milionários corruptos de extrema direita como o Júdice é que são os “bons”.

          Que a esquerda tem agendas ocultas já não há qualquer dúvida possível.

  2. Comecei a ler mas tive de parar logo no comentário da estátua. Depois leio o resto, mas agora tenho de recuperar do ataque de riso.

    Cara estátua, o Júdice não está a ser prudente por elevado espirito civico.

    Está a ser prudente porque tem a reputação de ser um dos maiores corruptos do país e arrisca-se a levar com uma data de processos em cima. Claro que ele defende tudo o que favoreça os corruptos. É interesse próprio.

    Ainda por cima o gajo é da extrema direita liberal, que quer destruir o estado social e vocês “camaradas” a apoiar.

    Não deixa de ser útil para se ver a confusão que vai nas vossas cabecinhas, a mim, que até voto em vocês, só por eu dizer que a ditadura do proletariado é uma ditadura (!!!!) E que o povo não é racista, vocês querem-me censurar, bater, matar (sic).

    E depois andam a lamber as botas a corruptos de direita.

    Não tomem os comprimidos que não é preciso.

  3. Ó da estátua, se o Brecht não incluiu criminosos no seu poema por alguma razão foi.

    Em parte alguma ele dIz que criminosos não devem ser levados para a prisão.

    Se calhar por alguma razão terá sido.

    Você confundir operários, miseráveis, negros e desempregados com milionários corruptos deve ter feito o desgraçado do Brecht dar voltas dentro do caixão.

      • Cara estátua.

        Portanto, eu ficar lixado com o Ivo ter salvo o Ricardo Salgado o maior capitalista e maior corrupto do país é motivo para o teu mais profundo desprezo.

        Mas enalteceres um MDLP que é dos neoliberais mais fanáticos e corruptos do país já é prova da tua elevada inteligência.

        Não é só o Brecht, até o teu tio Lenine deve estar a dar voltas na cova.

        Ainda provocas uma espécie de apocalipse zombie socialista.

        Com os grandes lideres socialistas do passado a levantarem-se da terra para irem aos tombos à Soeiro Pereira Gomes exigirem a tua expulsão imediata do partido.

        Ja estou a ver o Estaline todo cadavérico e com o uniforme esfarrapado a apontar para ti com o dedo ossudo e a dizer:

        -FUZILEM-ME JÁ ESTE GAJO.

        Brrrr. Que medo.

          • Caro cravo.

            Pensava que Lenine tinha ido para a cova quando o governo russo deixou de pagar a manutenção depois da queda de Gorbachev.

            Mas a tua resposta despertou-me a curiosidade e fui ver. Ainda está fresco como uma alface no mausoléu. Parece que particulares e depois o Putin asseguraram as despesas da manutenção do embalsamamento.

            Ainda bem.

            A história é para preservar e não queremos ser como os imbecis totalitários que por cá querem destruir o padrão das descobertas e outros monumentos do tempo do colonialismo – o que a aplicar vai incluir 99% dos monumentos portugueses.

Leave a Reply to Carlos MarquesCancel reply

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.