Parlamento europeu: o lugar das mulheres é em casa a ter filhos

(Paula Cosme Pinto, in Expresso Diário, 16/11/2017)

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As mulheres não ficam em casa. Não têm crianças. Todos se empenham tanto para que a mulher trabalhe fora de casa. Se não resolvermos isto, não faz sentido debater isto”. Palavras de Janusz Korwin-Mikke, em pleno Parlamento Europeu, num debate sobre a demografia. Podíamos revirar os olhos e dizer algo “lá vem ele outra vez”, porque, na verdade, comentários sexistas, racistas ou xenófobos vindos deste eurodeputado não são novidade. Mas não basta. É preciso que nos indignemos com tais palavras, é preciso que elas sejam punidas e que o repúdio a tal mensagem discriminatória seja deixado bem claro pelas entidades competentes. E porquê? Acima de tudo, porque esta pessoa é paga para representar e defender os interesses dos cidadãos europeus, com toda a dignidade que lhes – nos – é devida.

Já em março deste ano, este político polaco, fundador de um partido de extrema-direita, tinha feitos comentários altamente machistas em pleno Parlamento Europeu, defendendo que “as mulheres são mais fracas, mais pequenas e menos inteligentes” do que o homens, e que, por isso, “devem ganhar menos”. Estas declarações foram punidas com uma multa de mais de 9 mil euros e dez dias de suspensão da sua atividade no Parlamento.

Para trás ficam outros momentos públicos de tremenda falta de respeito e profissionalismo, como o dia em que disse que os refugiados não passam de “lixo humano” ou a orgulhosa saudação nazi que decidiu fazer em pleno Parlamento Europeu. As multas e sucessivas suspensões não o parecem demover de comentários do género.

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NÃO SEJAMOS INGÉNUOS: O QUE DIZ KORWIN-MIKKE É AQUILO QUE AINDA VAI NA CABEÇA DE MUITA GENTE

Não querendo soar a discurso paternalista, o exemplo deve vir de cima e a política não pode, nem deve, ser exceção, bem pelo contrário. Um eurodeputado é pago para se dedicar ao processo legislativo comunitário, ao debate, à procura e à gestão de soluções. Mesmo que estejam agrupados por partidos, o seu trabalho deve ir ao encontro do bem da comunidade, uma comunidade que privilegia – ou assim deveria ser – o respeito pelos direitos previstos em todas as convenções, tratados constitucionais e demais linhas condutoras da vida na Europa.

Não consigo perceber em que medida um comportamento que prima tantas vezes por fomentar discursos de ódio e de preconceito se encaixa naquilo que deve ser a prestação de um eurodeputado à Europa e aos seus residentes. Além de um total desserviço público, é altamente perigoso, até porque o que não falta por cá são cidadãos alinhados a este tipo de pensamento discriminatório e inaceitável, que acabam por validar os seus preconceitos ao assistirem na primeira fila a declarações como estas. Feitas por quem tem o dever máximo de ajudar a suprimir a continuidade de tais comportamentos nefastos na nossa sociedade.

Não sejamos ingénuos: aquilo que Korwin-Mikke disse há dois dias é aquilo que ainda vai na cabeça de muita gente Europa fora, incluindo por cá. É o tipo de pensamento que leva a que ainda se ache que é muito estranho que uma mulher não queira ter filhos, como se com isso estivesse a falhar no seu propósito máximo. O tipo de pensamento que continua a penalizar as mulheres nas suas carreiras e demais domínios das suas vidas, porque se parte do princípio que a sua capacidade biológica para gerar e carregar uma criança no ventre tem inevitavelmente de ser cumprida.

PENALIZARMOS AS MULHERES PELA BAIXA NATALIDADE DA EUROPA É DE UM DESRESPEITO DESMEDIDO

Continuamos a separar os supostos papéis dos homens e das mulheres na sociedade com um enfoque enorme na capacidade biológica de cada um, e a questionar quem não entra nas habituais regras do jogo. É exatamente essa expectativa sobre o que é suposto cada um ser, fazer ou ter que nos leva, por exemplo, a tantas vezes ainda ficarmos desconfortáveis quando uma mulher ganha mais do que um homem dentro de um casal. Ou a achar que, à partida, quem fica em casa quando um filho nasce ou adoece é a obviamente a mulher. A penalizar as mulheres por isso, como se estivessem em falha com as empresas ao usufruírem de algo que não é mais do que um direito, mas também a não achar “normal” que seja um homem a ficar por casa nessas situações porque não é esse o papel que se espera dele. Esta lista de exemplos podia ser tão longa, asseguro-vos.

Penalizarmos as mulheres pela baixa natalidade da Europa é de um desrespeito desmedido, carregado de preconceitos e de preguiça mental. Ainda há umas semanas falava aqui sobre o livro e a série The Handmaid’s Tale, cuja história se baseia precisamente na queda da natalidade num mundo como é hoje o nosso, e nas medidas tomadas por um partido ultraconservador para resolver a situação nos EUA: penalizar as mulheres, reduzindo-as a uma vida dedicada à esfera familiar e doméstica, totalmente privadas de qualquer liberdade individual, de acesso à educação, carreiras, vida económica ou política, liberdade individual. Com o propósito exclusivo de trazer bebés ao mundo, ou de servir a quem o consiga fazer, sob as regras do patriarcado. Tudo para o bem da humanidade, é claro.

Na cabeça deste senhor, acredito que este até seja um cenário desejável para a Europa no futuro. Enfim. A mim parece-me que seria mais produtivo para todos termos eurodeputados que usassem o cargo para discussão e implementação séria de políticas que tornem o equilíbrio da esfera familiar e profissional numa equação mais justa e leve. Respeitando algo que é essencial em sociedades livres e pares como as nossas querem ser: a individualidade e liberdade de cada um e o direito à escolha do que quer para a sua vida, independentemente do género com que nasceu. Ter filhos não é uma obrigação de ninguém, é uma opção.

8 pensamentos sobre “Parlamento europeu: o lugar das mulheres é em casa a ter filhos

  1. Qual é a palavra que não percebem? Não há dinheiro (para alimentar os filhos). Deixem-se da economia da carochinha e voltem ao pleno emprego.

    • Pode não haver dinheiro (para alimentar os filhos)… mas há para muitas outras coisas!

      Até há para comprar a virgindade das ulheres!
      “The model said: ‘I am happy to have decided to sell my virginity through Cinderella Escorts.
      ‘I would never have dreamt that the bid would rise so high and we would have reached 2.5million Euros. This is a dream come true.’
      Giselle said she was ‘shocked’ by the outrage against women selling her virginity, describing it as a ‘form of emancipation.’
      ‘If I want to spend my first time with someone who is not my first love, that’s my decision,’ she said.
      ‘The fact that women can do what they want with their bodies and have the courage to live their sexuality free against the critics sets a sign for emancipation’.
      She added: ‘In retrospect, how many would probably give up their first time if they could have 2.5million Euros instead?’”

      Em tugês!
      “A modelo disse:” Estou feliz por ter decidido vender a minha virgindade através das Acompanhantes da Cinderela “. Nunca teria sonhado que a oferta seria tão alta e teríamos alcançado 2,5 milhões de euros. Este é um sonho tornado realidade.
      Giselle disse que estava “chocada” pela indignação contra as mulheres que vendiam sua virgindade, descrevendo-a como uma “forma de emancipação”. Se eu quiser passar a primeira vez com alguém que não é meu primeiro amor, essa é minha decisão “, ela disse: “O facto de que as mulheres podem fazer o que querem com seus corpos e ter a coragem de viver sua sexualidade livre contra os críticos marca um sinal de emancipação”. Ela acrescentou: “Em retrospectiva, quantos provavelmente desistiriam da primeira vez se eles pudessem ter 2,5 milhões de euros em vez disso?”

      Apreciem a EVOLUÇÃO da degeneração…

  2. Concordo que a mulher não deve ser descriminada. Concordo com o conceito de igualdade entre géneros. Mas… Isto há sempre uns “mas” um bocado para o chato… mas se a natalidade depender apenas da opção de cada mulher, imagine-se que a maioria delas, para não falar do absurdo que seria a totalidade das mulheres, optar por não ter filhos. Nesses casos, como faríamos para assegurar a continuidade da espécie???? Se calhar a solução para o planeta é mesmo essa, acabar com os nascimentos… A ver se a população humana se reduz e o planeta se torna sustentável. Bom fim-de-semana.

    • Isso seria o ideal!

      Infelizmente não me parece que a coisa vá por essa via… Porque enquanto umas ulheres andam a evitar/reduzir a infestação, outras – milhões – há que parecem as abusadas Vacas das explorações leiteiras!

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