Porque é o Ocidente o principal responsável pela crise ucraniana

(John Mearsheimer, in The Economist, 19/03/2022)

(Este blog tem defendido a tese deste artigo: Que o Ocidente é o principal responsável pelo que se está a passar na Ucrânia. E por isso tem sido acusado por muitos de ser “pró-russo”, “pró-Putin” e outros mimos soezes, reveladores de histeria e de falta de argumentos.

Espero, pois, que esses meus detratores mimoseiem agora também este professor da Universidade de Chicago e a prestigiada revista inglesa The Economist com tais aleivosias ou que, ao menos, arrepiem caminho, parem para pensar e tomem consciência de quanto é ridícula a figura que andam a fazer.

Estátua de Sal, 31/03/2022)


A GUERRA na Ucrânia é o conflito internacional mais perigoso desde a crise dos mísseis cubanos de 1962. Compreender as suas causas profundas é essencial se quisermos evitar que se agrave e, em vez disso, encontrar uma forma de o terminar.

Não há dúvida que Vladimir Putin iniciou a guerra e é responsável pela forma como ela está a ser travada. Mas a razão pela qual ele o fez é outra questão. A opinião dominante no Ocidente é que ele é um agressor irracional, fora de si, inclinado a criar uma Rússia maior nos moldes da antiga União Soviética. Assim, só ele teria plena responsabilidade pela crise da Ucrânia.

Mas essa história está errada. O Ocidente, e especialmente a América, é o principal responsável pela crise que começou em Fevereiro de 2014. Transformou-se agora numa guerra que não só ameaça destruir a Ucrânia, como também tem o potencial de se transformar numa guerra nuclear entre a Rússia e a OTAN.

O problema da Ucrânia começou realmente na cimeira da OTAN em Bucareste, em Abril de 2008, quando a administração de George W. Bush pressionou a aliança a anunciar que a Ucrânia e a Geórgia “se tornarão membros”. Os líderes russos responderam imediatamente com indignação, caracterizando esta decisão como uma ameaça existencial para a Rússia e jurando frustrá-la. De acordo com um respeitado jornalista russo, o Sr. Putin “voou com raiva” e avisou que “se a Ucrânia aderir à OTAN, fá-lo-á sem a Crimeia e as regiões orientais”. Vai simplesmente desmoronar-se”. No entanto, a América ignorou as linhas vermelhas de Moscovo e avançou para fazer da Ucrânia um baluarte ocidental na fronteira com a Rússia. Essa estratégia incluía dois outros elementos: aproximar a Ucrânia da UE e torná-la uma democracia pró-americana.

Estes esforços acabaram por desencadear hostilidades em Fevereiro de 2014, após uma revolta (que foi apoiada pela América) ter levado o presidente pró-russo da Ucrânia, Viktor Yanukovych, a fugir do país. Em resposta, a Rússia tomou a Crimeia e ajudou a alimentar uma guerra civil que eclodiu na região de Donbass, no leste da Ucrânia.

O próximo grande confronto ocorreu em Dezembro de 2021 e conduziu diretamente à guerra atual. A principal causa foi que a Ucrânia se estava a tornar um membro de facto da OTAN. O processo começou em Dezembro de 2017, quando a administração Trump decidiu vender a Kiev “armas defensivas”. Contudo, o que conta como “defensivo” dificilmente é claro, e estas armas pareciam certamente ofensivas para Moscovo e os seus aliados na região de Donbass. Outros países da OTAN entraram em ação, enviando armas para a Ucrânia, treinando as suas forças armadas e permitindo a sua participação em exercícios conjuntos aéreos e navais. Em Julho de 2021, a Ucrânia e a América coorganizaram um importante exercício naval na região do Mar Negro, envolvendo as marinhas de 32 países. A operação Sea Breeze quase provocou a Rússia a disparar contra um destruidor naval britânico que entrou deliberadamente no que a Rússia considera serem as suas águas territoriais.

As ligações entre a Ucrânia e a América continuaram a crescer sob a administração de Biden. Este compromisso reflete-se num importante documento – a “Carta Ucraniana sobre Parceria Estratégica” – que foi assinada em Novembro por Antony Blinken, Secretário de Estado americano, e Dmytro Kuleba, o seu homólogo ucraniano. O objetivo era “sublinhar … um empenho na implementação pela Ucrânia das reformas profundas e abrangentes necessárias para a plena integração nas instituições europeias e euro-atlânticas”. O documento baseia-se explicitamente “nos compromissos assumidos pelos presidentes Zelensky e Biden para reforçar a parceria estratégica Ucrânia-EUA”, e sublinha também que os dois países serão guiados pela “Declaração da Cimeira de Bucareste de 2008”.

Não surpreendentemente, Moscovo considerou esta situação em evolução intolerável e começou a mobilizar o seu exército na fronteira da Ucrânia na Primavera passada para assinalar a sua determinação a Washington. Mas não teve qualquer efeito, uma vez que a administração Biden continuou a aproximar-se da Ucrânia. Isto levou a Rússia a precipitar um impasse diplomático total em Dezembro. Como disse Sergey Lavrov, o ministro dos negócios estrangeiros da Rússia: “Chegámos ao nosso ponto de ebulição”. A Rússia exigiu uma garantia escrita de que a Ucrânia nunca faria parte da OTAN e de que a aliança retiraria os meios militares que tinha destacado para a Europa de Leste desde 1997. As negociações subsequentes fracassaram, como o Sr. Blinken deixou claro: “Não há mudança. Não haverá mudança”. Um mês depois, o Sr. Putin lançou uma invasão da Ucrânia para eliminar a ameaça que via da NATO.

Esta interpretação dos acontecimentos está em desacordo com o mantra dominante no Ocidente, que retrata a expansão da OTAN como irrelevante para a crise da Ucrânia, culpando em vez disso os objetivos expansionistas do Sr. Putin. De acordo com um documento recente da OTAN enviado aos líderes russos, “a OTAN é uma Aliança defensiva e não representa qualquer ameaça para a Rússia”. As provas disponíveis contradizem estas afirmações. Para começar, a questão em causa não é o que os líderes ocidentais dizem ser o objetivo ou intenções da OTAN; é a forma como Moscovo vê as ações da OTAN.

O Sr. Putin sabe certamente que os custos da conquista e ocupação de grandes quantidades de território na Europa Oriental seriam proibitivos para a Rússia. Como ele disse uma vez, “Quem não sente a falta da União Soviética não tem coração”. Quem a quiser de volta, não tem cérebro”. Apesar das suas crenças sobre os estreitos laços entre a Rússia e a Ucrânia, tentar recuperar toda a Ucrânia seria como tentar engolir um porco-espinho. Além disso, os decisores políticos russos – incluindo o Sr. Putin – quase nada disseram sobre a conquista de novo território para recriar a União Soviética ou construir uma Rússia maior. Pelo contrário, desde a cimeira de Bucareste de 2008, os líderes russos têm afirmado repetidamente que consideram a adesão da Ucrânia à OTAN como uma ameaça existencial que deve ser evitada. Como o Sr. Lavrov observou em Janeiro, “a chave para tudo é a garantia de que a OTAN não se expandirá para leste”.

Dizendo, os líderes ocidentais raramente descreveram a Rússia como uma ameaça militar para a Europa antes de 2014. Como o antigo embaixador americano em Moscovo, Michael McFaul, observa, a tomada da Crimeia por Putin não foi planeada por muito tempo; foi um movimento impulsivo em resposta ao golpe que derrubou o líder pró-russo da Ucrânia. De facto, até então, a expansão da OTAN visava transformar toda a Europa numa zona gigantesca de paz, não contendo uma Rússia perigosa. Contudo, quando a crise começou, os decisores políticos americanos e europeus não puderam admitir que a tinham provocado ao tentarem integrar a Ucrânia no Ocidente. Eles declararam que a verdadeira fonte do problema era o revanchismo da Rússia e o seu desejo de dominar se não conquistar a Ucrânia.

A minha história sobre as causas do conflito não deve ser controversa, dado que muitos proeminentes peritos americanos em política externa têm alertado contra a expansão da OTAN desde o final dos anos 90. O secretário de defesa americano na altura da cimeira de Bucareste, Robert Gates, reconheceu que “tentar trazer a Geórgia e a Ucrânia para a OTAN era verdadeiramente exagerado”. Na verdade, nessa cimeira, tanto a chanceler alemã, Angela Merkel, como o presidente francês, Nicolas Sarkozy, opuseram-se a que se avançasse na adesão da Ucrânia à OTAN porque temiam que isso enfurecesse Russia.

O resultado da minha interpretação é que nos encontramos numa situação extremamente perigosa, e a política ocidental está a exacerbar estes riscos. Para os líderes russos, o que acontece na Ucrânia tem pouco a ver com o facto de as suas ambições imperiais serem frustradas; trata-se de lidar com o que eles consideram uma ameaça direta ao futuro da Rússia.

Putin pode ter julgado mal as capacidades militares da Rússia, a eficácia da resistência ucraniana e o alcance e velocidade da resposta ocidental, mas nunca se deve subestimar quão impiedosas as grandes potências podem ser quando acreditam que estão em apuros terríveis.

A América e os seus aliados, contudo, estão a duplicar, esperando infligir uma derrota humilhante ao Sr. Putin e talvez até despoletar a sua remoção. Estão a aumentar a ajuda à Ucrânia enquanto utilizam sanções económicas para infligir um castigo maciço à Rússia, um passo que Putin vê agora como “semelhante a uma declaração de guerra”.

A América e os seus aliados podem ser capazes de impedir uma vitória russa na Ucrânia, mas o país será gravemente danificado, se não desmembrado. Além disso, existe uma séria ameaça de escalada para além da Ucrânia, para não mencionar o perigo de guerra nuclear. Se o Ocidente não só frustra Moscovo nos campos de batalha da Ucrânia, mas também causa danos graves e duradouros à economia russa, está de facto a empurrar uma grande potência para a beira do abismo. O Sr. Putin poderá então virar-se para as armas nucleares.

Neste momento, é impossível conhecer os termos em que este conflito será resolvido. Mas, se não compreendermos a sua causa profunda, não conseguiremos pôr-lhe termo antes do naufrágio da Ucrânia e do fim da OTAN numa guerra com a Rússia.

John J. Mearsheimer é o R. Wendell Harrison Distinguished Service Professor de Ciência Política na Universidade de Chicago.


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23 pensamentos sobre “Porque é o Ocidente o principal responsável pela crise ucraniana

  1. Francamente. Que o “Ocidente” tenha muitas responsabilidades no escalar da tensão, terá seguramente; enormes. A contínua expansão da NATO foi claramente uma imbecilidade (dos americanos em primeiro lugar, dos restantes países já pertencentes em segundo; dos países “de leste” que quiseram aderir nem tanto, por razões, que se entendem, de proximidade – geográfica e outras – à Russia, com o que isso implica). Mas foi “apenas” isso, uma expansão em direção à fronteira russa, com a adesão livre dos países que assim o entenderam, pelos motivos que entenderam, não se andou para aí aos tiros ou aos mísseis nem há nem houve nem haveria nunca intenção de invadir/declarar guerra à Rússia. Pelo contrário, foi a Rússia (Putin, portanto) que decidiu invadir o país vizinho, bombardear, matar civis, causar deslocados, etc. Ora, colocar os dois níveis de responsabilidade ao mesmo nível já seria tonto; dizer que o “Ocidente” tem mais responsabilidades do que o país invasor roça o absurdo, e não é por ser escrito na Economist por um tipo de Chicago que se torna menos absurdo. Que se diga que foi em resposta à expansão da NATO e outras coisas esotéricas, tudo bem, come quem quer. Tenho para mim que há milhares de formas de lidar com os problemas entre os países, e que a guerra dificilmente será uma delas (e neste caso, como entra pelos olhos dentro, não era).

    • É … um incómodo para as nossas confortáveis consciências. Uma chatice este “tipo de Chicago”. Mas foi um bom esforço para ficar de consciência tranquila…👌

      • Ahahah que tontice. Cada um é livre de ter as suas opiniões, em Chicago, em Moscovo e até aqui. Os outros é que não têm que concordar com elas. A minha consciência está tranquila, não mandei ou apoiei nem a NATO avançar nem a Rússia invadir, ainda que esteja terrivelmente desconfortável com tudo isto. Obrigado.

    • “não se andou para aí aos tiros ou aos mísseis nem há nem houve nem haveria nunca intenção de invadir/declarar guerra à Rússia”

      Portanto, nos últimos 25 anos de invasões e guerras, e bombardeamentos de zonas civis e outros crimes de guerra, perpretados pela NATO (Jugoslávia) ou pelos seus principais exércitos (EUA no médio oriente, Turquia contra Curdos, etc), já para não falar no armamento da ucrânia dado a ultra-nazionalistas que mataram +13 mil russófonos no Donbass e com o claro fim de atacar a Rússia e deixá-la numa posição sem resposta no queao nuclear diz respeito, tu estiveste a dormir…

      Ou melhor dizendo, estiveste sentadinho em frente da tv ocidental, aka a máquina de propaganda da NATO/EUA, uma máquina de lavar cérebros que faz inveja até ao Kim Jong-un!

      A Rússia terá contribuído nesta invasão para a morte de +1200 civis, tendo esta operação cirúrgica 10x menos mortes que a guerra de 8 anos que a Ucrânia recusou parar, e cujos acordos de paz foram violados pela Ucrânia durante 7 anos. E quando há provas do genocídio final que o batalhão Azov se preparava para fazer, já pata não falaf da promessa do lunático Zelensky de invadir a Crimeia. É só fazer as contas às vidas que a Rússia salvou com esta operação, e às vidas que a UE tirou ao enviar armas para prolongar um conflito. Uma vergonha, tal como disse o Papa Francisco.

      E nem vamos contabilizar as mortes em guerras/invasões bem mais brutais que ESTÃO a acontecer AGORA com patrocício da UE/NATO: Sauditas contra Iémen, APARTHEID de Israel contra Palestina. Ou os esfomeados no Afeganistão após 20 anos de invasão e roubo, etc.

      São milhões de mortos causados directa ou indirectamente pelos EUA/NATO/UE e seus aliados ou parceiroa comerciais, e ditaduras “amigas” sob ZERO sanções.

      Mas ai do Putin que mande um míssil cirúrgico contra um alvo militar legítimo onde nazis de Azov se protegem cobardemente atrás de escudos humanos, e que ao longo de um mês isso cause APENAS (sim, é essa a palavra certa) +1200 mortos civis. Que até são ora os “civis” de Kapashnikov na mão, ou daqueles civis que não verteram uma única lágrima pelos +13 mil mortos no Donbass, ou que fazem marchas com as cores Preto+Vermelho do Sector Direiro, com tochas, e com quadros do Stepan Bandera, ou a defender um governo/Presidenre que vota na ONU a favor da glorificação do nazismo.

      O teu problema é mesmo de quase todos no Ocidente: desinformação total devido às fake news da “imprensa livre”, ou completa falta de vergonha com um toque de xenofobia. Qual é o teu caso?

  2. A forma como a “Estátua de Sal” trata os que se se atrevem a discordar dos seus pontos de vista (cito: aleivosias, mimos soezes, histeria, parem para pensar, etc.), para não falar de censura que faz às opiniões divergentes, é bem denotativa do sua incapacidade de compreender em que consiste o debate democrático. Por isso não vale a pena alimentar qualquer discussão com a “Estátua de Sal”. Sublinho apenas a ridícula reverência ao Prof. Mearsheimer. Os anti-ocidentalistas primários não falam de outra coisa que não seja do Prof. Mearsheimer, não têm mais nenhum?

      • Ainda assim parece-me que continua a haver uma diferença entre não se concordar com alguém e estar a ameaçá-lo ou censurá-lo. Parece-me que a Estátua podia ao menos fazer essa distinção entre os leitores e comentadores do blog. A liberdade de opinião e crítica funciona para os dois lados, pelo menos entre nós, que nos temos por civilizados.

  3. John J. Mearsheimer é um Professor universitário, com obra feita, publicada, escrutinada e reconhecida. Agora, todas aquelas “sumidades” que aqui o criticam , onde está o vosso contributo, os vossos estudos e investigações, por mais pequeno que seja, para o desenvolvimento da Humanidade? Bem me parecia! É tudo no “eu acho que…” ou “ouvi dizer que…”.
    Muito obrigada Estátua de Sal. Aja paciência para aturar tanto clubismo ideológico bacoco.

  4. É curioso inferir da presente que os universitários da Universidade de Chicago têm um «track record» (americano assaz pertinente neste contexto) que é muito prezado por estas bandas. Aliás como todos sabemos «o principal responsável pelo 11 de Setembro (de 1973) foi o Sr. Allende.» Se ele não se tivesse posto a jeito, nada daquilo teria acontecido … faz lembrar a sujeita que se pôs a jeito com a mini-saia.

    Quem não vos conheça que vos compre.

  5. É o comentário do costume. Usado e abusado por quem não tem argumentos credíveis. A clubite ideológica cega e não vale de nada provar, argumentar, demonstrar, pois conseguem sempre negar todas as evidencias. São incapazes de ver para além do momento presente. São incapazes de procurar entender as causas que levaram o Mundo a esta situação aflitiva. Não, só sabem que a Rússia atacou a Ucrânia. Ponto final! Desta posição não arredam , não recuam, não procuram as raízes do problema, por isso também não têm soluções, a não ser, pedir mais armas, mais morte, mais destruição. E ai daqueles que se atrevem a sugerir que podem estar enganados, iludidos. O insulto ideológico salta qual serpente venenosa.

    • Mas, francamentem esta gente só sabe dizer que os EUA atacaram o Iraque. Desta posição não recuam, Não querem ver que foi o Iraque que atacou o Koweit e que está a constriur um arsenal de WMD. Ideologia, ideologia ….

      São todos iguais os “va-t-en-guerre”, só mudam as cores ….

  6. Começa com uma mentira em forma de “certeza”, o recurso estilístico usado por quem não gosta que o contradigam com factos:
    «Não há dúvida que Vladimir Putin iniciou a guerra»
    – não, não foi Putin que começou a guerra. A guerra começo há 8 anos. Putin, nesse período, foi quem mais dialogou pela paz. A Ucrânia foi quem a recusou e quem mais matou (+13 mil no Donbass). O que Putin iniciou foi a invasão, ou seja, a entrada oficial da Rússia no conflito e a expansão da guerra contra os hipócritas/xenófobos/ignorantes ucranianos mais ocidentais.

    A segunda mentira é esta:
    «Em resposta, a Rússia tomou a Crimeia »
    – primeiro começa por chamar “revolta” ao que de acto foi um golpe violento (em que os golpistas com armas não foram investigados após a mudança de regime… o que diz tudo sobre aquilo em que o golpe foi baseado: atiradores/snipers de falsa bandeira).
    Depois usa o termo “tomou”, como quem leva por sua decisão contra a decisão de outros, ou como quem rouba. Não, o que se passou foi a autodeterminação do povo da Crimeia, que pacifica e democraticamente, decidiu tornar-se independente, e depois, para não ficar sozinho e desprotegido perante batalhões de ultra-nacionalistas e nazis como o Azov, decidiu voltar a integrar a Rússia.
    Este referendo com duas perguntas (independência, e regresso à Rússia) foi muito mais participado e representativo do que qualquer etapa da integração europeia, ou do que o regime de OLIGARQUIA (não democracia) dos EUA.

    Terceira mentira grave:
    «De facto, até então, a expansão da OTAN visava transformar toda a Europa numa zona gigantesca de paz, não contendo uma Rússia perigosa»
    – não só isto não é um facto, como os factos provam o contrário. A NATO é uma organização militar ofensiva, com um extenso historial de guerras, invasões, bombardeamentos de zonas civis e outros crimes de guerra, e envio de armas para zonas de conflito. O facto da NATO ser do Atlântico e querer expandir-se até à Geórgia, ao mesmo tempo que recusou integrar a Rússia no que seria, isso sim, uma aliança de não-agressão entre Ocidente e Rússia, diz tudo o que é preciso saber: o objetivo da NATO após os anos 90 foi sempre chegar a este ponto, nunca foi a defesa e muito menos a paz.
    E a Rússia de perigosa não tem nada, a não ser o facto de se defender, junto às suas fronteiras, quando é gravemente ameaçada de facto. Quem dera ao Mundo, em particular ao Médio Oriente, que os EUA se portassem desta maneira…

    Depois há as omissões: não falou dos nazi do Batalhão Azov, não falou da ameaça de ter armas nucleares feita por Zelensky na Conferência de Munique a 19-Fevereiro (esta sim a declaração de guerra final, e o ponto de esgotamento da paciência de Moscovo que tinha durado 8 anos), e que a tal guerra civil alimentada pela Rússia, foi muito mais alimentada pela NATO e foi o regime da Ucrânia quem recusou os acordos de paz de Minsk.

    De resto, mesmo assim, é dos artigos vindos de uma fonte mainstream da NATO, que menos manipulam e mais tentam falar a verdade. E só isso diz muito sobre a restante “imprensa livre”, que mais parece o exército escrito/televisivo de um Goebbels “moderno” e atlantista…

    Para os fanáticos da NATO (cães pavlovianos da UE, ou rinocerontes dos EUA) que virão de certeza com m*rdas depois deste comentário, eu pergunto 4 coisas:
    1- o que faria a UE/EUA se a Rússia/China planeasse na Polónia/Canadá um golpe de estado semelhante ao que os EUA planearam na Ucrânia em 2014, derrubando governo eleito, colocando lá um seu amigo, e perseguindo os pró-Europeus?
    2- o que fariam os EUA se a Rússia/China colocasse armas e mísseis no México/Canadá, e armasse milícias mexicanas/canadianas completamente fanáticas no seu anti-americanismo para fazerem uma guerra de 8 anos junto à fronteira dos EUA?
    3- como planeiam aquecer-se no próximo Inverno? Com gás importado de uma das mais brutais ditaduras genocidas do mundo, a Arábia Saudita, que mandou no mês passado matar 81 opositores, e está a bombardear o Iémen há 7 anos, com muito mais mortos e muito menos pontaria do que a Rússia na Ucrânia? É com parceiros destes que defendem os “valores europeus”?
    4- quando a China/Rússia começar a enviar para a Venezuela, Cuba, ou Palestina, armas, mísseis, tanques, aviões, etc, e a incentivar os líderes locais a fazer ameaças com armas nucleares aos EUA/Europa/Israel, vocês também vão apoiar esses governos locais e usar bandeirinhas desses países?

    PS: o político demagogo de extrema-Direita e líder de uma minoria da oposição, Navalny, foi finalmente julgado, e e condenado a uma pena de menos de 10 anos, após tantos anos solto e a falar coisas que seria consideradas traição nos EUA. Entretanto, o jornalista Assange, denunciante dos crimes de guerra dos EUA/NATO, continua preso em condições de tortura psicológica, sem julgamento, e em risco de ter pena perpétua (ou de morte) se for enviado para o gulag dos EUA. A diferença? É só fazer as contas…

      • Obrigado. Um BRAVO! ainda maior à EstátuaDeSal por publicar estes artigos todos no último mês. E dar espaço à discussão/comentário sem censura.
        Isto sim é serviço público.
        E percebe-se perfeitamente que tem dado preferência a textos que explicam e contextualizam a atual invasão, ou que fazem apelos NÃO hipócritas à paz, condenando TODAS as guerras (e não apenas as de que os EUA/UE não gostam). Só sabendo como aqui se chegou, é que se pode saber como daqui sair. A guerra náo pára quando se faz tudo para a prolongar usando um povo como arma para canhão e causar perdas em quem entrou nela. A guerra só pára, quando se pára quem a tornou inevitável.

        Infelizmente a propaganda mainstream é tanta que a maioria passou a confundir isso com “apoio a Putin”.
        E aqui penso na pergunta 5:
        – se o problema é Putin porque invadiu a Ucrânia há um mês, e esse problema alegadamente se resolveria com uma mudança de líder ou mesmo de regime, então porque é que essas mesmas pessoas nunca se lembraram de defender tal coisa em relação a Presidentes dos EUA que mantiveram guerras e invasões durante os 8 anos dos respectivos mandatos?

        Ou a pergunta 6:
        – se alguns dizem que o que se passou na Ucrânia em 2014 foi uma revolução legítima só porque foi pró-UE e se acusou esse governo e Presidente de corruptos, será que nem sequer percebem que isso legitimiza todos os golpes que daqui em diante se farão em sentido contrário? Ou seja, contra governos/Presidentes pró-UE, sob acusação de corrupção pela oligarquia da NATO, e bastando para tal mobilizar uma minoria barulhenta para ocupar as ruas da capital? Percebem o perigo dessa narrativa e das suas consequências quando alguém a virar contra o feiticeiro? E pode nem ser a Rússia ou a China a fazer isso, mas sim o “aliado” de faca na mão escondida atrás das costas…

        É que a senhora Nulland, quando foi de saca na mão distribuir bolos a Kiev em 2014, não disse “f*ck Russia”, mas sim “f*ck EU”. E quem vai pagar as sanções todas são os Europeus, não são os EUA a quem as sanções não ricocheteiam, nem a Rússia que se andou a preparar para isto, é quase auto-suficiente, tem ao seu lado a China e todo o mercado Asiático, e já fez com sucesso o suficiente pata o Rublo recuperar da desvalorização inicial.

        E isto quando os pagamentos do gás em Rublos ainda nem sequer começaram!
        Quando começarem, ou quando o gás dor cortado, os preços dispararem ainda mais (inflação geral já vai em +7% na Alemanha), as fábricas pararem e o desemprego disparar e a falta de bens (acima de rudo cereais e seus derivados) se fizer notar, quantos governos Europeus vão chegar ao fim do ano, ou ao fim do próximo Inverno?
        Em Washington, onde o establishment e oligarcas, ou capatazes (corrompidos) de oligarcas como a Victoria “F*ck EU” Nulland se passeiam, já devem ter começado as apostas.

        Mas o Putin é que é o papão… Acreditem no que vos diz a “imprensa livre” que apoiou a censura à RT e Sputnik, chama “putinista” a quem discorda da narrativa da NATO e chamou “verdade” às armas de destruição massiva no Iraque, dá mais destaque ao extremista Navalny do que ao jornalista Assange, e tem nas suas estruturas acionistas os mesmos nomes que frequentam os offshores ocidentais, como o da Madeira, da Irlanda, do Luxemburgo, do Panamá, da Suíça, do Dubai, ou do Dellaware. Shhhiu, são só coincidências, e só na Rússia é que há oligarcas, corrupção, censura, propaganda, más intenções e maus governantes.

        E daqui a uns meses, quando isto passar, e os EUA voltarem a escolher um alvo, será só nesse país alvo que existem coisas más. Até ao dia em que os EUA precisem de mudar de alvo e depois o “mau” volta a ser o bom, e o “bom” é esquecido no caixote do lixo da história. E assim por diante. O Nicolás Maduro e o Guaidó que o digam…

        Daqui a uns meses já voltam a existir defeitos no Boris Johnson, no Duda, no Orbán, e no Erdogán. Até lá, são todos bravos defensores dos “valores europeus”, da “democracia” e da “liberdade”. Vejam bem como a UE já está a aprender como ser mais americana que os americanos.
        Ontem havia Hong Kong e Taiwan e havia que sancionar e dizer que há campos de reeducação e prender pessoas da Huawei. Hoje a China já não tem nada disso. Amanhã, quiçá, volta a ter.
        E tu, mansinho e obediente aí em casa em frente à TV ocidental, tens de ouvir, comer, e repetir. Sempre alinhadinho com a narrativa de cada momento. E sempre cego, surdo, e mudo quanto ao resto.

        Anteontem a Turquia era boa porque ia entrar na UE. Ontem era má porque era muçulmana. Hoje é boa porque a UE lhe paga para ficar com os refugiados escurinhos. Amanhã é má porque compra armas à Rússia. E depois de amanhã é boa porque é da NATO. Genocídio arménio e bombardeamento dos curdos? Não interessa! O que interessa é que fechou o Mar Negro aos barcos russos.

        E assim suvessivamente, com a indignação do momento a encher o tempo de antena da “imprensa livre” que tem a coincidência cósmica de estar SEMPRE alinhada com o que se diz em Washington, no que à política externa dis interesses da oligarquia dos países da NATO diz respeito.
        Vejam só que o homem laranja na casa branca era tão mau e mentiroso, mas sobre a Venezuela só dizia “verdades”.
        Esta imprensa ocidental é mesmo confiável, então não é?

        Agora até chama “heróis” aqueles que chamava nazis, “ajuda humanitária” às ações dos Mários Machados da Europa, e até nos mostra ela primeira vez na história uma guerra em que quem invade um território equivalenre ao Reino Unido num só mês é um “perdedor a avançar mais lento que o esperado”, e o lado invadido é tão bombardeado que houve até agora ZERO notícias sobre as suas baixas militares. Desta, nem a FOXNews se lembrou de inventar!
        Às tantas, com tantos laboratórios biológicos pagos pela “mão invisível” do Hunter Biden, a Ucrânia foi o primeiro país do Mundo a descobrir como fazer soldados imortais. E esta, hein? Só assim se explica como 13 guardas mortos numa ilha, e postumamente condecorados por Zelensky, e vários dias após o seu funeral e velório de dias a fio nos OCS dos países da NATO, tenham TODOS aparecido vivos.
        Um Ocidente com uma imprensa assim, só pode estar a dizer a verdade… Cheira àquela “liberdade de imprensa” que se viveu no Chile em 1973…

        PS: vinha só agradecer o comentário da EstátuaDeSal, mas um retoque aqui e um acrescento ali, e aqui vai mais um testamento. E tive que me conter… Hehehe

  7. É o mesmo Mearsheimer que, no início dos anos 90, defendia que a Ucrânia não se devia desfazer das armas nucleares para não ser invadida pela Rússia… Nas últimas eleições apoiou Sanders. Meus amigos, está tudo dito.

  8. Avento ainda que se as acções da Nato explicam em parte o agudizar das tensões entre a Ucrânia e a Rússia (conforme explicaram vários “cold warriors” norte-americanos), o discurso de Putin negando a existência daquela enquanto nação é uma outra importante razão profunda que não depende, nem sequer levemente, das intenções ocidentais. Há um padrão no comportamento de Putin que dura há mais de vinte anos. Já então ele não deixou pedra sobre pedra em Grozny e a Nato não estava em jogo dessa vez.

    Por que razão *todos* os países do antigo Pacto de Varsóvia querem/quiseram entrar para a Nato e para a UE? Porque são burros, nazis, imperialistas, capitalistas, (escolher o insulto mais apropriado) …. ou porque a experiência de décadas sob o jugo soviético lhes fez saber muito bem do que é que a casa gasta?

  9. A cegueira ideológica é profundamente mais perigosa que a cegueira física,
    Estátua de Sal, será que água mole em pedra dura tanto dá até que fura?

  10. Para complementar este artigo e sobre o mesmo assunto, aconselho a visão da entrevista deste prof. da Univ. de Chicago, John Mearsheimer que se encontra disponível em ‘Embaixada da Resistência’. Está legendada em português.

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