O que vale a “unidade” do Ocidente imperialista?

(Jornalmudardevida.net, 22/03/2022)

A verde, países que aplicam sanções à Rússia desde 2014. O panorama pouco mudou em 2022.

(Este texto esclarece tudo. A razão porque a Ocidente se condena esta guerra e não outras. É o excepcionalismo do Ocidente que justifica tudo. Pratica-se o “mal” mas sempre em nome do “bem”, a nossa superioridade dá-nos direito a tal… Como no tempo das cruzadas: levávamos o terror e a morte a povos distantes, mas era sempre em nome de uma “boa” causa, e para expandir a fé cristã aos ímpios e aos incréus… E fico-me por aqui.

Estátua de Sal, 23/03/2022)


O Ocidente europeu e norte-americano, mais os seus amigos australianos e japoneses, invocam a cada passo a “unidade” conseguida entre eles em resposta à guerra na Ucrânia para demonstrarem o “isolamento” da Rússia e até da China. A realidade é um pouco diferente se olharmos para o conjunto do mundo. Por exemplo, mais de cem países recusam seguir as imposições dos EUA e da Europa acerca das sanções à Rússia. Entre eles contam-se não só a China e o Irão, mas também a Índia, a África do Sul, o Brasil ou o Egipto, e muitos outros da América Latina, da Ásia e da África. Que efeito terá, a prazo, esta dissidência em relação aos ditames norte-americanos e europeus, sabendo que aqueles países representam a larga maioria da população mundial?

Os males económicos causados à Rússia são evidentes, mas os efeitos sobre as economias de praticamente todo o mundo são igualmente negativos, incluindo a própria Europa. Coloca-se assim a questão de saber por quanto tempo poderão estes países suportar o ricochete das sanções, que são essencialmente uma arma norte-americana. 

Para fugir quanto possível à ditadura do dólar (factor em que se baseia a política de sanções dos EUA) vários países encaram medidas de efeito imediato para “desdolarizar” as transacções comerciais, fazendo uso das suas próprias moedas, ou outras, para trocas bilaterais. Mesmo não sendo isto o fim do dólar como moeda dominante, o sinal está dado para que a maioria do mundo, sobretudo o chamado Sul global, encare a necessidade de se libertar da tirania financeira do imperialismo.

E isto leva-nos a outra questão: a de saber que efeitos políticos a prazo terá esta reacção sobre a hegemonia do Ocidente imperialista. A “unidade” que o Ocidente se gaba de ter conseguido, entre si, em face da guerra e para o efeito de sancionar a Rússia, tem como contraponto um afastamento progressivo de boa parte do mundo, não só em relação ao uso da chantagem económica como arma de guerra, mas também em relação à tentativa de isolar politicamente a Rússia e a China.

O texto que reproduzimos mostra como a hipocrisia e a duplicidade do Ocidente no respeitante à justiça e ao direito nas relações internacionais conduz o resto do mundo a rejeitar cada vez mais a arrogância das potências imperialistas e a tentar escapar ao seu domínio.


CRISE NA UCRÂNIA MOSTRA DOIS PESOS DE JUSTIÇA INTERNACIONAL

James Smith, Global Times

Desde o início do conflito na Ucrânia, o público ocidental reagiu quase unanimemente com indignação. A Rússia de Putin foi apontada como moralmente má, enquanto os líderes políticos lhe aplicavam duras sanções, levando a um êxodo de empresas ocidentais. O Ocidente também se envolveu em censura em larga escala contra fontes de notícias e meios de comunicação sociais russos, marcando-os como “propaganda”. Ao mesmo tempo, abriu um processo contra Moscovo no Tribunal Penal Internacional. Tudo isso foi enquadrado na narrativa ocidental tradicional, de longa data, própria de um grupo excepcionalista de nações “justas” que encarnam uma luta global do bem contra o mal, ou da democracia contra o autoritarismo.

Sem sinal de remorso

À medida que o sentimento ocidental se enfurece contra a Rússia, parece haver uma amnésia colectiva acerca da realidade das próprias acções e do legado do Ocidente em todo o mundo, tanto no passado como no presente, sem sinal de remorso em relação aos países que os EUA e seus aliados destruíram desenfreadamente, só falando das últimas duas décadas. 

A Ucrânia é vista como uma tragédia, um estado de coisas horrível sobre o qual justiça deve ser feita. Mas o legado do Ocidente no Afeganistão, no Iraque, na Síria e no conflito em curso no Iémen é recebido com uma indiferença colectiva, um encolher de ombros e a conclusão de que em tais países esses eventos são “normais”. Na longa história de colonialismo brutal no Sul global, o Ocidente não se desculpa, e acredita mesmo que fez um “favor” a esses países. A política externa ocidental vive numa falsa consciência de larga escala.

Monopólio da verdade e da civilização

Mas é o legado desse imperialismo, em oposição aos valores apregoados, que permitiu ao mundo ocidental (e especialmente aos países de língua inglesa) viver com privilégios extremos, mantendo por muito tempo uma supremacia cultural, económica e militar sobre o globo. Esse privilégio acrescentou ao seu orgulho próprio a ideia de que a sua posição foi conquistada por meio de uma dedicação piedosa à sua supremacia moral, em oposição à realidade material do imperialismo, marcada por dominação e conquista. 

Por acção das suas classes dominantes, o público ocidental foi ensinado a acreditar piamente no seu próprio mito de excepcionalismo através da democracia liberal. E, com essa ideologia, foi levado a acreditar no seu direito de evangelizar os outros como estratagema para a dominação. E ainda a considerar que possui o monopólio sobre o que constitui a verdade e a civilização, aceitando acriticamente a demonização, por junto, dos designados inimigos como as verdadeiras ameaças à paz global.

Em nome da democracia e dos direitos humanos

Esse senso distorcido de si próprio cria uma concepção de “justiça” no mundo com dois pesos, tanto pelo poder quanto pelo status. Na visão dos media e das classes políticas ocidentais, é perfeitamente aceitável destruir um país em nome da democracia e dos direitos humanos, matando milhões de civis e causando sofrimentos inimagináveis, sem quaisquer consequências. 

Quando o Reino Unido e os EUA invadiram o Iraque em 2003 sob o falso pretexto de “armas de destruição em massa”, a condenação global foi silenciada, a grande comunicação social não a denunciou, os perpetradores não enfrentaram formalmente acusações de crimes de guerra e as vítimas não tiveram voz ou qualquer tipo de solidariedade ou apoio global. 

Em agosto passado, um ataque de drone dos EUA matou várias crianças em Cabul, no Afeganistão. O mundo novamente nem pestanejou. É como se a vida dessas pessoas simplesmente não importasse ou não tivesse um valor igual à dos que vivem na Europa. A hegemonia ocidental e o privilégio ocidental são a razão por que nem o Reino Unido nem os EUA foram proclamados “estados párias”.

Ferramentas para manter hegemonia

No entanto, mesmo agora, o Reino Unido e os EUA estão a apoiar uma guerra brutal no Iémen, que tem envolvido o bombardeio indiscriminado de civis. O bloqueio a que o país está sujeito induziu fome, doenças e crises humanitárias. Onde está a descarga de emoção, tristeza e raiva que se vê manifestar pela Ucrânia? Não há, e tal situação demonstra que o Ocidente apenas utiliza a sua ideologia, os seus valores e o chamado “iluminismo” como meras ferramentas para manter a sua hegemonia e, portanto, criar um mundo estruturalmente desigual e injusto. 

Antes da guerra da Ucrânia, o ódio também foi espicaçado contra a China. Mas o público ocidental parece não ter capacidade de reconhecer quando está a ser enganado e manipulado, porque o mito do “excepcionalismo ocidental” — em contraste com a distorção de um Leste atrasado, incivilizado e cruel — foi aceite como normal.

Cerco emocional

Enquanto a guerra na Ucrânia continuar, o público ocidental será continuamente submetido a um cerco de argumentos emocionais e de incitamento. Com certeza, a guerra é uma coisa terrível, mas o julgamento e a consciência da maioria das pessoas são controlados por uma mera questão: “Quem está a fazer a guerra? E quem são as vítimas?” 

É, por isso, hipocrisia do mais alto grau acusar a Rússia por crimes de guerra quando está em curso uma carnificina conduzida pela Grã-Bretanha e pelos EUA. Esta dualidade permite perceber por que razão o Sul global vai ficando cada vez mais desenganado com a arrogância do Ocidente.

Fonte aqui


Gosta da Estátua de Sal? Click aqui.

5 pensamentos sobre “O que vale a “unidade” do Ocidente imperialista?

  1. Pois pode ser tudo verdade mas infelizmente o mundo não é perfeito e o género humano pouco evoluiu ao longo dos séculos mas a grande verdade é que no fim do dia todos querem vir para o ocidente. Porque será? Não vejo movimentos migratórios para a China ou Rússia.

  2. É triste e é lamentável cuspir no prato em que se come. Este blogue, se não quer continuar a desacreditar-se, pergunto a qualquer pobre deste planeta para onde quer emigrar, caso essa possibilidade se lhe ofereça. Para a Rússia ou para um país da Europa ocidental ou da América. Depois, tire as conclusões que entender.

    • Minha senhora. Eu não me vendo nem âs minhas ideias. Defendo aquilo em que acredito e que acho justo. Faça o mesmo e seja feliz. São os meus votos. Mas seja aberta a quem pensa diferente de si. Só vejo bandeirinhas de democratas com conversa de censores e de autocratas, como é o seu caso.,

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.