Eleições ao Pôr-do-sol

(José Gabriel, 17/01/2022)

Hoje, infortunium meu, vi aquela coisa do Marques Mendes assessorado, desta vez, por Clara de Sousa. Nós vemos e ouvimos aquilo e, apesar de habituados a todas as modalidades de lixo televisivo, não acreditamos. Em estado de enlevo, o parzinho esqueceu-se completamente daqueles truques com que, habitualmente, tentam fazer com que os incautos – só a estes, mas estes ainda são muitos – pensem que aqueles tipos de programas são sérios e independentes. Na verdade, a sessão de hoje foi praticamente dedicada a grelhar, em lume brando, António Costa.

Considerando que tudo e todos os demais são irrelevantes e já estão arrumados, Mendes & Sousa, operaram uma manobra tática que consiste em, ignorando todo o restante cenário político, agir como se só existisse Costa, o incumbente, e Rio, o desafiante. Portanto, como Rio não tem assunto, há que malhar no primeiro-ministro como se não houvesse amanhã. É assim que vai ser a partir de aqui. Costa e Rio.

Não é só o facto de o segundo ir ao colo da esmagadora maioria dos comentadores. É a transformação das eleições numa farsa audiovisual – e digo audiovisual porque a vida continua cá fora, queiram os mainatos televisivos ou não – distorcendo mais que o habitual – que já não era pouco – a natureza das eleições – estamos a eleger 230 deputados, não um qualquer iluminado mandante – o seu significado e os seus resultados.

Desfila uma fauna colorida: comentadores cartomantes, psicanalistas que interpretam a cor das gravatas, as posturas -sentados, de pé, de gatas; psicossociólogos mais psico e socio que ólogos; analistas de mico expressões, sondadores de sondagens várias, queimadores de servil incenso, enfim, há de tudo neste circo.

Há equilibristas, palhaços, animais – não há leões nem leopardos, mas há muitos burros. Tudo ao serviço das duas atracões.

(Não se esperem, nesta encenação, críticas procedentes e sérias; não é disso que se trata)

Tudo se passa com se, em vez de uma eleição parlamentar, fossemos obrigados a assistir a uma espécie de duelo de western spaghetti eleitoral, com os contendores apoiados pelas respetivas claques jornalísticas, cena a decorrer numa fedentinosa rua mediática, numa terreola a oeste da realidade e a leste dos problemas das populações.

O xerife e o juiz, como soem nestas histórias, estão ao serviço do rancheiro rico, claro. Os índios, esses, estão sempre lixados.


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